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1. CEDU
Centro de Estudos em Direito da União Europeia
http://www.cedu.direito.uminho.pt/
PARA ONDE CAMINHA A CONSTITUIÇÃO?
Larissa A. Coelho
Doutoranda em Ciências Jurídicas Públicas
Centro de Estudos em Direito da União Europeia
Universidade do Minho
INTRODUÇÃO
OBJETIVOS
Compreender a partir de uma análise histórica a evolução do constitucionalismo desde a
antiguidade clássica até à era moderna;
No contexto contemporâneo, tendo sido detectado dois movimentos constitucionais, o
neoconstitucionalismo e a teoria da interconstitucionalidade, analisar nesta fase da pesquisa a
construção teórica deste segundo para determinar se a ideia de constituição atualmente em
sede da teoria da interconstitucionalidade permanece inalterada.
METODOLOGIA
Estudo descritivo-exploratório empregando como método de abordagem da investigação o
hipotético-dedutivo, pois que com base em conhecimentos prévios e com o surgimento de
conflitos, pressupõe-se soluções iniciais a partir de conjecturas que se encontram sujeitas a testes
(GUSTIN; DIAS, 2010, p. 20 – 23);
Através do método histórico-jurídico, analisa-se a evolução do constitucionalismo, com vista a
determinar se suas causas e efeitos tendem a permanecer constantes, especialmente nesta fase da
pesquisa, no contexto da teoria da interconstitucionalidade;
Procedimento de pesquisa: método histórico-comparativo pelo qual se investiga fatos e
acontecimentos passados para verificar-se as consequências e influências destes na atualidade
(LAKATOS; MARCONI, 1986).
No âmbito da tese de doutoramento sob o título “Os movimentos constitucionais na modernidade líquida: a
teoria da constituição entre a política e o poder”, ainda em desenvolvimento, a investigação encontra-se na
fase de caracterização da teoria da constituição, dedicando-se assim à construção histórica do
constitucionalismo moderno.
Uma vez que a pesquisa se desenvolve no campo da atualização da teoria da constituição, objeto em estudo
pelo Centro de Direito da União Europeia – UMinho, a abordagem histórica se faz não apenas no intuito de
se compreender a evolução do constitucionalismo ao longo do tempo, mas sobretudo verificar se a ideia de
Constituição permanece constante em sede da teoria da interconstitucionalidade.
Sendo certo que muito se tem escrito acerca da teoria da constituição, sobretudo a partir do século XVIII
com os movimentos liberais, entender a natureza da Constituição é determinar a essência do constitucional.
Sob a ótica da história o desenvolvimento do constitucionalismo pode ser observado em três momentos:
na sequência e desencadeada pelas revoluções oitocentistas;
a produzida no pós Primeira Guerra Mundial;
a desenvolvida com o fim da Segunda Guerra e os processos de descolonização (BARACHO, 1986, p. 30 - 39).
Atualmente o constitucionalismo tem se desenvolvido sob a ótica de dois paradigmas – ou movimentos – nos
países da América do Sul destaque-se a teoria do neoconstitucionalismo, na Europa em decorrência da
globalização e do processo de integração, a doutrina tem se dedicado à teoria da interconstitucionalidade.
Deste conjunto de fatores que se pretende compreender qual ou quais os caminhos que segue o
constitucionalismo na era pós-moderna.
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Carta Magna, Lei Maior, Lei Fundamental são alguns dos termos utilizados pela doutrina jurídica para
referir-se à Constituição, no entanto, através da interpretação verificamos que esses termos se referem à
constituição na época áurea do Estado-Nação.
O constitucionalismo significa:
a limitação do poder e supremacia da lei
Embora implique na existência de uma Constituição escrita, essa verdade
não é absoluta, vide o exemplo do Reino Unido.
A expressão “limitação do poder” é compreendida em três aspectos:
• material: corresponde aos valores básicos e direitos fundamentais
que devem ser preservados como dignidade da pessoa humana,
direitos à liberdade de religião e associação;
• orgânico: legislar, julgar e administrar são funções que devem ser
atribuídas a diferentes órgãos independentes mas também
interdependentes (checks and balances);
• processual: além de uma atuação em conformidade com a lei, os
órgãos do poder devem atuar de acordo com o processo legal, ou
seja, respeitando princípios processuais como do contraditório,
ampla defesa, inviolabilidade de domicilio, vedação de provas obtidas
por meio ilícito, como também sua adequação ao princípio da
proporcionalidade (BARROSO, 2015, p. 29 – 30).
Entretanto esse entendimento do
constitucionalismo corresponde à acumulação
das finalidades que a Constituição passa a ter em
função dos acontecimentos históricos, assim:
Constituição & Antiguidade Clássica: a sua finalidade
era organizar a comunidade política, estando em causa
determinar a função dos cidadãos, a forma, a estrutura
e a organização do governo.
Constituição & Idade Média: como esclarece Luís Roberto Barroso (2015, p. 32) “[…] o ideal constitucionalista,
que vinha dos gregos e havia sido retomado pelos romanos […] desapareceria do mundo ocidental por bem
mais de mil anos, até o final da Idade Média”.
Constituição & Era Moderna: em princípios do século XVI e em razão do fim do feudalismo ergue-se a figura
do Estado em sua versão absolutista, juntamente ganha força o conceito de soberania absoluta e indivisível.
Deste período destaca-se três movimentos que contribuem para a consolidação do constitucionalismo
moderno:
Revolução Inglesa
Constitution aparece como form of
government e fundamental laws
(GRIMM, 2012, p. 151).
Fatores: a) 1628: o Parlamento
submete o rei à Petition of Rights que
limita o poder do monarca; b)
Revolução Gloriosa: Orange derruba
James II, “[…] já sob um regime de
supremacia do Parlamento, com seus
poderes limitados pela Bill of Rights
(1689)” (BARROSO, 2015, p. 35).
Revolução Americana
Fatores: alta carga tributária e a restrição
a atividades econômicas e de comércio.
Documentos: Declaração de
Independência (1776). Convenção
Constitucional, sendo aprovado a
primeira constituição escrita (1787).
Introdução da declaração de direitos (Bill
of Rights - 1791). A Constituição é “[…]
estendida de mera ´form of government`
a vinculações materiais do poder do
Estado na forma dos direitos humanos”
(GRIMM, 2012, p. 154).
Revolução Francesa
Fatores: crise financeira gerada pelo
apoio a guerra de independência
americana, alta carga tributária e recusa
da nobreza em reduzir seus benefícios
fiscais. Insurreição do 3º estado
(autoproclama-se Assembleia
Constituinte). Lema: igualdade,
liberdade e fraternidade.
Documentos: Declaração de Direitos do
Homem e do Cidadão (1789) e a
elaboração de uma nova Constituição.
Constituição & Séc. XIX: período da codificação e juridificação do poder do Estado, conceito da constituição
passa de costumes jurídicos a uma lei escrita, formal. Ferdinand Lassalle em Über Verfassungswesen (1862),
afirma que os problemas constitucionais são problemas de poder pois que devemos ter uma Constituição
que reflita a realidade social, assim “[…] a verdadeira Constituição de um país somente tem por base os
fatores reais e efetivos do poder que naquele país regem […]” (LASSALLE, 2001, p. 40), configurando-se em um
problema quando as Constituições reais e escritas não se entrelaçam (o que a torna uma mera folha de
papel). Este estudo é associado ao sociologismo constitucional.
Constituição & Séc. XX: sob o domínio da ideologia positivista é construída a concepção jurídica, em que a
Constituição é entendida como a norma suprema de um Estado. Hans Kelsen na obra Teoria Pura do Direito
pretende compreender o direito sem ligações a qualquer elemento de outra ciência (como a sociologia,
filosofia, política). A norma é entendida como o dever-ser. A Constituição para Kelsen seria uma estrutura
formal, independentemente da legitimidade ou justiça de seu conteúdo e da realidade política subjacente.
Constituição & os Pós-Guerras: adotando um discurso socializante, a essência da Constituição passa a estar
ligada a questões como desenvolvimento econômico, liberdades individuais, criação e gestão de
oportunidades aos cidadãos. “[…] as Constituições passaram a se apresentar como programas de reforma
social, e ocuparam o centro de um projeto coletivo de ação política cuja aspiração é determinar a atuação
dos Poderes Públicos, a fim de materializar direitos” (SIQUEIRA, 2016, p. 195 - 197).
Desde modo, em razão dos processos históricos, as constituições
contemporâneas podem ser entendidas como um sistema de
normas jurídicas, escritas ou costumeiras, que regulam a forma
do Estado, a forma de seu governo, o modo de aquisição e o
exercício do poder, o estabelecimento de seus órgãos, os limites
de sua ação, os direitos fundamentais do homem e as respectivas
garantias (SILVA, 2005, p. 37 – 38).
Em razão deste contexto as
normas jurídicas passam a
comentar não apenas a
política, mas também as
relações econômicas e sociais
(BARACHO, 1986, p. 44)
Constituição & Séc. XXI: O atual contexto histórico no qual se encontra em desenvolvimento o
constitucionalismo compreende a implementação dos processos de integração regionais como a União
Europeia (UE) e o Mercado Comum do Sul (Mercosul), que em razão do crescimento dos fluxos migratórios,
da comunicação, transporte e tecnologia levam a soberania e independência do Estado a se reduzir apenas
à sua capacidade de repressão (BAUMAN, 1999, p. 72).
Neste cenário em que o Estado perde a centralidade, a vigência da constituição dissocia-se de certos
elementos considerados basilares como o seu poder advir de um momento constituinte, a abdicação
voluntária da soberania nacional como decorre da Constituição Europeia.
As constituições
dantes nacionais
passam também a
integrar-se, a entrar
em diálogo
Em razão dessas alterações a TEORIA DA INTERCONSTITUCIONALIDADE busca
construir uma doutrina atualizada para a teoria da constituição. Esta ideia foi
cunhada por Francisco Lucas Pires na obra Introdução ao Direito Constitucional
Europeu.
O que significa o termo interconstitucionalidade?
Compreende uma “[…] proposta teorética a partir da qual pode e deve estudar-
se o processo de integração europeia, ocupando-se, pois, do
enquadramento/tratamento da fenomenologia do ´pluralismo constitucional`
ou das ´constituições em rede`” (SILVEIRA, 2016, p. 73).
Qual a definição para a teoria da interconstitucionalidade?
Tem sido definida como o diálogo constitucional, ou ainda como a “[…] influência recíproca de certas
Constituições ou das jurisprudências constitucionais de uns países sobre as de outros países” (MIRANDA, 2013, p. 69);
Estuda as relações “[…] da concorrência, convergência, justaposição e conflito de várias constituições e de
vários poderes constituintes no mesmo espaço político” sendo este um termo preferível ao termo
constitucionalismo multilateral (CANOTILHO, 2008, p. 266).
Estamos diante de um novo constitucionalismo?
O quadro da teoria da interconstitucionalidade não pretende criar um novo constitucionalismo, apenas
adequar “[…] a correlação entre várias Constituições” (PIRES, 1997, p. 18).
A constituição não trata apenas do Estado, mas também de toda a sociedade (MENDES; COELHO; BRANCO, 2009, p. 5).
Dos movimentos liberais o conceito jurídico tradicional da Constituição pode ser construído sob a ótica
material (“quanto ao conteúdo de suas normas […] organiza o exercício do poder político, define os direitos
fundamentais, consagra valores e indica fins públicos a serem realizados”) e a ótica formal (“quanto à sua
posição no sistema […] é a norma fundamental e superior, que regula o modo de produção das demais
normas do ordenamento jurídico e limita o seu conteúdo”) (BARROSO, 2015, p. 99).
Com a teoria da interconstitucionalidade, apesar do sentido da Constituição permanecer inalterado, estamos
diante de uma pluralidade de fontes constitucionais que juntas têm que dar soluções e respostas a
problemas como da convivência entre Constituições, a aplicação de normas preferentes derivadas de
ordenamentos distintos, ao problema do nível de proteção mais elevado dos direitos fundamentais, entre
outros (SILVEIRA, 2010, p. 209 - 210).
BARACHO, J. A. de O. Teoria geral do constitucionalismo. Revista de Informação Legislativa Brasileira, Brasília, vol. 23, n.º 91, jul./set., p. 5 – 62, 1986.
BARROSO, L. R. Curso de direito constitucional contemporâneo: os conceitos fundamentais e a construção do novo mundo. 5ª ed. São Paulo: Saraiva, 2015.
BAUMAN, Z. Globalização: as consequências humanas. Trad. de M. Penchel. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1999.
CANOTILHO, J. J. G., “Brancosos” e interconstitucionalidade: itinerários dos discursos sobre a historicidade constitucional. 2ª ed. Coimbra: Almedina, 2008.
GRIMM, D. Constituição, lei fundamental (leis fundamentais) da Ilustração até os dias atuais. In: MOHNHAUPT, H.; GRIMM, D. Constituição: história do conceito da antiguidade aos nossos dias. Belo Horizonte:
Livraria Tempus, 2012.
GUSTIN, M. B. de S.; DIAS, M. T. F. (Re)pensando a pesquisa jurídica: teoria e prática. 3ª ed. rev. e atual. Belo Horizonte: Del Rey, 2010.
KANT, I. A paz perpétua: um projecto filosófico. Trad. De Artur Morão. Covilhã: LusoSofia, 2008.
KELSEN, H. Teoria pura do direito. Trad. de J. B. M. 6ª ed. São Paulo: Martins Fontes, 1999.
LAKATOS, E. M.; MARCONI, M. de A. Metodologia científica. São Paulo: Atlas, 1986.
LASSALLE, F. A essência da Constituição. 6ª ed. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2001.
MIRANDA, J. Manual de Direito Constitucional. 7ª ed., rev. e actual. Coimbra: Coimbra Editora, 2013, Tomo II.
MENDES, G. F.; COELHO, I. M.; BRANCO, P. G. G. Curso de direito constitucional. 4ª ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2009.
PIRES, F. L. Introdução ao direito constitucional europeu: seu sentido, problemas e limites. Coimbra: Almedina, 1997.
SILVA, J. A. da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 25ª ed., rev. e atual. São Paulo: Malheiros Editora, 2005.
SILVEIRA, A. Interconstitucionalidade: normas constitucionais em rede e integração europeia na sociedade mundial. In: WALMOTT, A.; COELHO, S. P. (coords.). Interconstitucionalidade e interdisciplinariedade:
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SILVEIRA, A. International Constitutional Court e integração (constitucional) europeia. International Studies on Law and Education, São Paulo, 24, CEMOrOC-Feusp/IJI – Univ. do Porto, set. – dez., 2016.
SIQUEIRA, J. P. F. H. de. A ideia de constituição: uma perspectiva ocidental - da antiguidade ao século XXI. Cuestiones Constitucionales, Ciudad de México, n.º 34, enero-junio, p. 169 – 209, 2016.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Enquanto isto… na Alemanha… a Constituição é “[…] um acto de vontade geral, pela qual a massa se torna um povo” (KANT, 2008, p. 13),
o conceito de Verfassung passou a ser o “[…] acordo dos cidadãos para a garantia dos direitos humanos e civis segundo determinadas leis
ou prescrições” (GRIMM, 2012, p. 163). Entendida como o meio para se garantir a liberdade os princípios do constitucionalismo passam a ser
ensinados à população. Documentos: Constituição do Império (1871), Constituição de Weimar em 1919 (concilia a organização do Estado
com a consagração de direitos fundamentais, com uma novidade: o catálogo era composto tanto por direitos individuais quanto por
direitos sociais. Início do constitucionalismo social).
A constituição entendida enquanto “[…] resultado de ações humanas […] é um degrau, que o gênero humano
precisa vencer, mas um degrau que ele em breve deverá transpor e no qual não poderá ficar eternamente”
(Karl Fr. VON STEIN ZUM ALTENSTEIN, 1807, apud GRIMM, 2012, p. 170)
DISCUSSÃO E RESULTADOS
CONSIDERAÇÕES FINAIS