1) A política econômica brasileira desde 1994 permitiu o crescimento do país, mas a crise financeira mundial continuará impactando negativamente a produção e o emprego.
2) A crise financeira é mais grave do que o esperado e seus efeitos serão mais prolongados, levando a uma recessão global em 2009, particularmente nos EUA, Rússia e Índia.
3) É importante garantir a continuidade das políticas econômicas no Brasil e usar intervenções pontuais para amortecer os efeitos da crise, mas
1. CURRENT ISSUES
Janeiro 2009 volume 9 número 1
Perspectivas Econômicas para 2009
Luiz Nelson Porto Araujo
A política adotada a partir de 1994 permitiu ao País atingir a maioridade econômica. Em conse-
quência, o Brasil é uma das economias mais importantes do mundo – sendo importante destina-
tário de investimentos internacionais – e as perspectivas de galgarmos posições são bastante
positivas. O cenário atual ainda é favorável aos negócios, em praticamente todos os setores de
atividade. É claro que a crise financeira mundial deve continuar impactando adversamente a
produção e o emprego.
Em dezembro de 2007 abordamos dois te-
mas principais, dentre outros. Na discussão
das perspectivas para a economia em 2009,
vamos retomá-los, em função da trajetória
de desenvolvimento local e internacional ob-
servada no ano que se encerrou. O primeiro
tema discutido no Guia do ano passado
apontou para a importância da continuidade
da política econômica. Naquela oportuni-
dade, observamos que:
"A partir de 1994, com a instituição do
Plano Real, a situação começou a me-
lhorar e a dar sinais de sustentabili-
dade, apesar de alguns choques inter-
nos e externos. De fato, nas Américas,
a continuidade da política econômica
– seja ela qual for – em países tão dis-
tintos quanto Canadá, Chile, Cuba e
Estados Unidos é digna de nota. No
Brasil, conseguimos, depois de muito
sacrifício e discussões, manter a es-
sência da gestão econômica por 13
anos. Emprestando-se da política, a
máxima em uma economia globali-
zada – onde a competição entre na-
ções e empresas é acirrada, os fluxos
de capitais são cada vez mais voláteis
e as oportunidades de investimento
desconhecem barreiras geopolíticas
ou culturais – deveria ser: é a continui-
dade, estúpido!"
Continuamos a defender que as últimas ad-
ministrações (Fernando Henrique Cardoso e
Luiz Inácio Lula da Silva) foram competentes
na administração da res pública. A formula-
ção e gestão da política econômica – com a
exceção de algumas poucas intervenções
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subsidiárias e de caráter mais populista e al-
guns descompassos entre as autoridades
monetária e fiscal – tem-se mostrado excep-
cional e, mais importante, fundamentada em
princípios derivados da melhor prática eco-
nômica. Não é outro o motivo do sucesso
que o País tem exibido em termos de desen-
volvimento econômico e inserção social.
Cabe aos formuladores das políticas públicas
garantirem a manutenção das atuais diretri-
zes e levarem adiante, mesmo sob condições
adversas, as reformas necessárias para o re-
posicionamento competitivo do Brasil na
economia global.
O segundo tema apontado, e que acabou por
adquirir uma relevância ainda maior neste
momento, foi a crise financeira que se inici-
ava nos Estados Unidos. Naquela ocasião
notamos que:
"Desde meados de 2007, o desempe-
nho futuro da economia americana ca-
racteriza-se por uma incerteza cres-
cente. A atual crise financeira deve im-
plicar em uma queda acentuada nos
preços dos ativos de bancos e outras
instituições financeiras, o que deve le-
var a restrições relevantes na oferta de
crédito doméstica e, talvez, internacio-
nal. Assim, o ano de 2008 deve carre-
gar o efeito inercial do ano passado,
na melhor hipótese, ou ser o início de
um ciclo de desaceleração econômica.
Os efeitos no mercado internacional e
no Brasil, em particular, irão depender
da severidade das perdas do sistema
financeiro e da capacidade do Federal
Reserve Bank em assegurar a liquidez
do sistema e reduzir as taxas de juros."
1. O nível de emprego dá uma ideia da intensidade
da crise no Brasil: dados preliminares sugerem que em
dezembro de 2008 o mercado de trabalho perdeu
A crise financeira mundial se mostrou – para
todas as economias – de uma gravidade
muito superior àquela esperada de uma sim-
ples "marolinha". De fato, a chamada "crise
do mercado hipotecário secundário" é um
dos eventos econômicos mais sérios desde a
Grande Depressão do início do século pas-
sado. Os dados parciais já permitem afirmar,
sem receio de exageros, que a economia
mundial está se deparando com uma rever-
são importante do nível de atividade em fun-
ção do mais perigoso choque financeiro em
mercados desenvolvidos desde os anos 30.1
O que se iniciou com um problema isolado
em um subsetor do mercado hipotecário
norte-americano se alastrou rapidamente.
Com a execução, por instituições financeiras,
de hipotecas problemáticas, o crédito foi li-
mitado e os preços dos imóveis caíram de
forma generalizada o que, por sua vez, criou
problemas adicionais e levou os Estados Uni-
dos a uma recessão. O contágio posterior
cuidou de globalizar e aprofundar ainda mais
crise local.
O tumulto financeiro que se tornou evidente
a partir do segundo semestre de 2007, con-
tinua sendo uma ameaça à estabilidade do
sistema financeiro mundial e levou a um ní-
vel sem precedentes de intervenção por ban-
cos centrais e outras instituições: uma das
características mais importantes da atual
crise é a extensão da queda da liquidez nos
mercados financeiros globais, com implica-
ções preocupantes sobre o risco sistêmico.
Agora, é importante lembrar que, apesar da
sua importância e gravidade, ao menos
desde 1825 a economia de diversos países
– mais e menos desenvolvidos – se sujeitou
cerca de 600 mil vagas, o dobro do normalmente re-
gistrado pelo Ministério do Trabalho neste período do
ano.
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a crises financeiras periódicas em pratica-
mente todas as décadas. A análise histórica
mostra que as principais crises antes da Se-
gunda Grande Guerra Mundial aconteceram
em: 1825, 1837-38, 1847, 1857, 1866,
1873, 1890-93, 1907-1908, 1914, 1920-
21 e 1929-33. No período pós Bretton Wo-
ods, apesar de muitas economias desenvol-
vidas terem sofrido crises monetárias, não
foram observadas crises bancárias relevan-
tes e, em todos os casos, os impactos
econômicos não foram significativos (talvez,
com exceção, da crise sueca de 1992).
No período mais recente foram observadas
crises financeiras importantes em várias eco-
nomias em desenvolvimento, em particular,
a crise mexicana de 1994-1995, a crise asi-
ática de 1997-1998 (principalmente na Tai-
lândia, Indonésia e Coréia), a crise russa de
1998, a crise brasileira de 1998-1999, a
crise turca de 2001 e a crise argentina de
2001-2002 (a datação, neste caso, é parti-
cularmente difícil, já que esta economia apa-
rentemente se encontra sob uma crise endê-
mica).
Nossa avaliação e conclusão sobre estes
dois temas – política econômica e crise mun-
dial – podem ser resumidas da seguinte ma-
neira. Primeiro, a continuidade da política
econômica deve ser assegurada pelo execu-
tivo federal.2
É óbvio que intervenções pon-
tuais em determinados setores de atividade
e o uso de políticas anticíclicas inteligentes
devem ser defendidas. No entanto, isto não
implica na generalização de medidas de
ajustes descontínuas, populistas e de baixa
eficiência e eficácia – apesar de todas as
pressões políticas em sentido contrário.
Os sacrifícios impostos sobre a população
brasileira nas últimas décadas, em termos de
2. Não que as demais esferas de governo não se-
jam relevantes. Apenas que, neste momento particular
renúncia a bem-estar econômico, foi
imenso. A adoção do Plano Real, em agosto
de 1994, e a continuidade da política desde
então mitigaram, em parte, as gigantescas
perdas imputadas aos brasileiros. Essa con-
quista não deve ser subestimada. Mais
ainda, ela implica no reconhecimento de que
a estabilidade macroeconômica é condição
fundamental para o desenvolvimento e a in-
serção social de milhões de brasileiros. E es-
tabilidade se resume a controle da inflação,
disciplina fiscal e monetária, gestão pública
eficiente e programas sociais focalizados na
população mais carente.
Segundo, a crise financeira é mais profunda
e generalizada e seus efeitos serão mais du-
radouros do que se imaginava. No entanto,
ao contrário das bobagens verbalizadas pelos
mais afoitos e inconsequentes (cuja expres-
são máxima é a previsão do fim do sistema
capitalista ou da derrocada do império norte-
americano) esperamos o início da retomada
econômica – geográfica e setorialmente limi-
tada, é claro – já ao final de 2009.
A crise mundial continua a se desenrolar e
as suas causas e intervenções serão, sem
dúvida, objeto de debate por muitos anos.
Ainda não temos respostas para todos os
problemas e, em muitos casos, não sabe-
mos sequer quais são as perguntas pertinen-
tes. No entanto, já temos certeza sobre um
número relevante de indagações: Qual deve
ser a resposta dos formuladores de política
econômica quando os preços dos ativos se
elevam sobremaneira? Como os bancos cen-
trais devem reagir quando os preços dos ati-
vos de maior risco caem e o prêmio de risco
correspondente aumenta? Os formuladores
da política monetária devem responder à ili-
quidez de mercados específicos, e de que
maneira? Quando uma grande e complexa
e dado o regime federativo que se pratica no Brasil, o
papel do executivo federal é preponderante.
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instituição financeira sofre perdas, qual deve
ser a responsabilidade do banco central? O
banco central deve aceitar risco de crédito
em suas operações de empréstimo ou esta
função deve ser de responsabilidade do te-
souro nacional?
Economia Mundial
Os mercados financeiros internacionais es-
tão em tumulto há 18 meses. A crise avolu-
mou-se com notícias adversas sobre o mer-
cado hipotecário secundário nos EUA e ga-
nhou proeminência global a partir de agosto
de 2007: em meados daquele mês os pro-
blemas nos mercados de crédito se genera-
lizaram e os spreads interbancários aumen-
taram significativamente.
Um ano e meio depois o funcionamento dos
mercados financeiros ainda é bastante limi-
tado e as restrições aos fluxos de crédito es-
tão impedindo a capacidade das famílias e
empresas tomarem emprestado e consumi-
rem. Em consequência, a economia mundial
e, em particular, a americana, estão so-
frendo uma forte contração (apenas nos EUA
já foram perdidos mais de 2 milhões de em-
pregos e a expectativa é de um aumento
ainda maior do desemprego ao longo de
2009). Os efeitos adversos criaram um ver-
dadeiro círculo vicioso de deterioração da si-
tuação econômica que, por sua vez, intensi-
fica os problemas no setor financeiro.
Com relação à estabilidade do patamar infla-
cionário, as pressões associadas ao compor-
tamento dos preços das commodities foram
mitigadas – em parte, pelo próprio desenro-
lar da crise – e os indicadores da taxa de in-
flação apontam para uma trajetória decli-
nante. De fato, com o afrouxamento da ati-
vidade econômica essas taxas devem dimi-
nuir, ao menos por um período, abaixo do ní-
vel que promove o duplo objetivo de pleno
emprego e estabilidade inflacionária.
Desde o início da crise o Federal Reserve
Bank (FED) expandiu maciçamente a liquidez
do sistema financeiro, suavizando o aperto
de crédito. Sua atuação como emprestador
de última instância contribuiu para mitigar o
risco sistêmico, não apenas nos Estados Uni-
dos como também em outros grandes cen-
tros financeiros. Desde setembro de 2007, o
Federal Open Market Committee (FOMC) já
reduziu a chamada federal funds rate em
500 basis points. Em dezembro de 2008, o
Comitê tomou uma decisão histórica e redu-
ziu a taxa ao seu zero bound, definindo uma
meta para o intervalo de zero a 0,25% e
anunciando a sua expectativa de que a frágil
situação econômica manteria a meta a níveis
historicamente baixos por algum tempo. É
importante ressaltar que apesar desta deci-
são exaurir a capacidade do FED em induzir
estímulos econômicos através dos canais
convencionais de política monetária, ela não
exaure, de maneira alguma, a capacidade de
estímulo através de outras medidas.
Os efeitos da desaceleração do crescimento
da economia americana devem continuar a
deteriorar as perspectivas de crescimento
global, sendo que a evolução econômica dos
Brics não será capaz de suprir o hiato de de-
manda derivado dos Estados Unidos e das
economias da União Europeia. Pior ainda, os
indicadores parciais até este momento suge-
rem que em duas destas economias, a russa
e a indiana, os efeitos da crise devem ser
particularmente danosos, em função das
suas respectivas matrizes econômicas.
A certeza da deterioração do crescimento
global já levou, inclusive, o Fundo Monetário
Internacional - FMI a revisar a sua projeção
de crescimento mundial para 3% em 2009,
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conforme os dados divulgados em outubro
no World Economic Outlook - WEO. Sintomá-
tico que, apenas um mês após esta divulga-
ção o FMI revisou novamente as projeções,
reduzindo-as ainda mais.
Por fim, é importante ressaltar que com a
globalização da crise financeira os bancos
centrais e o tesouro dos países emergentes
devem estar ainda mais atentos. A experiên-
cia recente da América Latina sugere cautela
na expansão monetária e na adoção de polí-
ticas fiscais expansionistas como resposta à
crise. Os países que adotaram medidas cor-
retivas tempestivas administram melhor as
crises, enquanto que aqueles que se apoia-
ram na oferta generalizada de liquidez e no
descontrole dos gastos públicos sofreram
maior instabilidade.
Crescimento
Dados preliminares sugerem que em 2008 o
PIB real brasileiro cresceu cerca de 5,5%,
mantendo elevada a média observada nos
últimos anos. Para 2009, as expectativas
continuam positivas, com um crescimento
esperado entre 2,0% e 3,5%. Este intervalo,
grande, decorre de incertezas de origem ex-
ternas e internas. Externamente, a maior in-
certeza decorre, principalmente, da dinâmica
da crise mundial. Ainda não se sabe se os
efeitos associados às restrições de crédito, à
queda da demanda agregada e dos investi-
mentos chegaram ao seu limite inferior nas
economias desenvolvidas e, em consequên-
cia, se os efeitos nas economias emergentes
já se manifestaram na sua totalidade. Inter-
namente, a incerteza decorre dos limites co-
locados pelas medidas de ajuste à crise fi-
nanceira, pela infraestrutura física, pela ele-
vada e regressiva carga tributária, pela pés-
sima distribuição da renda e pelo baixo nível
de escolaridade da população (especial-
mente aquela de baixa renda e das regiões
menos desenvolvidas do País).
Dentre as principais medidas adotadas pelo
executivo federal no enfrentamento da crise
financeira temos as seguintes: (i) emprés-
timo ao setor automobilístico de até R$ 4 bi-
lhões, através dos bancos de montadoras e
financiamento de motocicletas; (ii) garantia
de capital de giro às empresas da construção
civil mediante a liberação de R$ 3 bilhões;
(iii) reforço de R$ 46,05 bilhões no BNDES
para empréstimos ao setor produtivo; (iv) au-
mento da oferta de crédito de R$ 94 bilhões
em recursos dos depósitos compulsórios; (v)
apoio ao setor exportador com a concessão,
pelo Banco Central, de até US$ 57 bilhões
em moeda estrangeira às empresas e (vi) de-
soneração fiscal de R$ 8,4 bilhões no Im-
posto de Renda à Pessoa Física (IRPJ) e re-
dução da alíquota do Imposto sobre Opera-
ções Financeiras (IOF). Nota-se que todas
estas medidas são de caráter estritamente
conjuntural e buscam responder à necessi-
dades e/ou pressões pontuais. O Brasil ainda
carece da continuidade de ajustes estrutu-
rais, que só podem ser materializados com a
conclusão das reformas tributária, traba-
lhista, regulatória e política e uma formula-
ção política que entende a magnitude da
crise atual.
Os principais gargalos da infraestrutura ainda
continuam no setor energético e de trans-
porte que, ironicamente, devem ser, por um
lado, mitigados em decorrência da queda da
demanda e, por outro, exacerbados pela
queda dos investimentos. No entanto, esta
situação de maneira alguma deveria contri-
buir para arrefecer os esforços no sentido de
garantir a expansão da infraestrutura neces-
sária ao desenvolvimento nacional.
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Investimento
A formação bruta de capital fixo (investi-
mento bruto) é um dos principais componen-
tes da demanda. Um dos efeitos positivos do
investimento é aumentar a capacidade ins-
talada da economia, o que permite um cres-
cimento mais acelerado sem pressões infla-
cionárias. Desde 2003 a participação do in-
vestimento como proporção do PIB corrente
tem crescido e a expectativa é que em 2008
retornou ao valor observado em 2000
(18,25%).
A execução do Programa de Aceleração do
Crescimento (PAC), divulgado em 22/01/07,
não teve muito êxito neste ano: atrasos no
cronograma de importantes obras acabaram
por limitar os efeitos multiplicadores destes
investimentos. Estes atrasos são decorren-
tes, principalmente, de problemas de gestão
e da enxurrada de ações judiciais (desapro-
priação, licenciamento ambiental, leilões de
concessão, etc.) contra obras do Programa.
Apesar disto, as despesas no âmbito do Pro-
grama cresceram mais de 50% em compa-
ração com 2007, atingindo R$ 11,3 bilhões.
O montante aplicado representou apenas
60% do total autorizado para 2008 (compa-
rado a 44% em 2007). Dada a visão estra-
tégia de que o objetivo do PAC é promover a
aceleração do crescimento econômico, o au-
mento do emprego e a melhoria das condi-
ções de vida da população brasileira, o não
cumprimento das inicialmente metas divul-
gadas limitou a expansão da economia e a
inclusão social.
A queda da demanda e o aumento da capa-
cidade ociosa irão contribuir para a retração
dos investimentos no setor privado. Em par-
ticular, a redução dos investimentos deve ser
proporcionalmente maior no setor de máqui-
nas e equipamentos e, posteriormente, deve
atingir outros setores com maior intensidade.
O agente mais importante na manutenção de
níveis elevados de investimento é o BNDES.
Esta instituição tem um papel estratégico
cada vez mais relevante no financiamento da
infraestrutura nacional e deve continuar a tê-
lo em 2009, principalmente no caso das res-
trições ao crédito ainda permanecerem por
um período mais longo.
A percepção do investidor estrangeiro sobre
o estado da economia e as perspectivas de
crescimento continuam bastante positivas,
apesar do reposicionamento dos investimen-
tos e dos fluxos de capitais nos mercados
globais. Desde 2003 o fluxo de investimento
direto para o Brasil tem crescido sendo que
em 2008 atingiu o seu pico histórico. Para o
ano que se inicia espera-se uma redução re-
levante destas inversões, mas ainda é possí-
vel que o fluxo seja capaz de financiar o dé-
ficit esperado no balanço de pagamento em
transações correntes (que pode atingir US$
30 bilhões).
Por fim, vale ressaltar que, como antecipado,
o Brasil de fato atingiu o chamado "grau de
investimento", conferido pela mais impor-
tante agência de risco, a Standard & Poors.
Por outro lado, não se realizou a expectativa
de que esta classificação teria impacto posi-
tivo relevante sobre o custo financeiro das
empresas brasileiras, em função do exacer-
bamento da crise financeira e a consequente
queda abrupta e significativa da liquidez nos
mercados de capitais.
Inflação e Juros
Em 2008 as taxas de inflação medidas por
diversos índices e instituições continuaram
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DELTA ECONOMICS & FINANCE 7
sua trajetória de ascensão. O IPCA, que ba-
liza o regime de metas de inflação conduzido
com competência pelo Banco Central desde
1999, elevou-se de 3,1% em 2006, para
4,5% em 2007 e chegou a 5,9% em 2008.
O limite superior da meta é de 6,5% ao ano.
Já o IGP-M, que indexa os contratos de ser-
viços públicos (água, energia elétrica e tele-
fone), foi de 3,8% em 2006, 7,7%, em 2007
e 9,8% em 2008. Esta trajetória deve impli-
car em um resíduo inflacionário importante
nas tarifas públicas e aluguéis em 2009,
como aconteceu neste ano.
É importante enfatizar que todo processo de
desenvolvimento econômico sustentado
exige uma taxa de inflação baixa e pouco vo-
látil. A conjugação de produção, investi-
mento e geração de emprego com inflação
elevada só existe no mundo da fantasia. Não
existe, na moderna teoria e boa prática eco-
nômica, qualquer argumento plausível para
que a taxa de inflação seja elevada.
O comportamento dos índices em 2008 e a
crise nos mercados de crédito internacionais
irão exigir da autoridade monetária brasileira
atenção redobrada. O grande desafio que se
apresenta, de um lado, é a queda da liquidez
e a restrição do crédito e, de outro, o fim da
âncora cambial. O aumento da liquidez e da
sustentação dos volumes de crédito estão
sendo perseguidos com medidas pontuais
pelo Banco Central. Já o overshooting cam-
bial de quase 50% exige do Banco maior
cautela em suas análises (em particular, so-
bre a propagação das variações cambiais
para os preços em geral) e decisões sobre a
taxa Selic, e tem balizado suas ações de pro-
ver liquidez aos exportadores e retirar a dos
especuladores.
Em 2008, a taxa básica de juros aumentou
de 11,25% para 13,75%, em movimento
contrário ao observado nos dois anos anteri-
ores. Dado que a defasagem da política mo-
netária (período entre a redução da taxa e o
impacto final sobre os preços) é longa; que
o aumento da volatilidade do câmbio e dos
preços ainda é elevada e que o tamanho das
transferências das variações cambiais para
os preços ainda é incerto é de se esperar que
o Banco Central aguarde por maiores infor-
mações antes de alterar a trajetória da taxa
Selic. Ainda assim, espera-se que este mo-
vimento aconteça ao final do primeiro se-
mestre deste ano, com a taxa atingindo a
11,25% ao final de 2009.
Finanças Públicas
A revisão das contas nacionais contribuiu po-
sitivamente para diversos indicadores das fi-
nanças públicas, particularmente a razão "dí-
vida pública/PIB". Outros indicadores, como
a necessidade de financiamento primária (o
chamado superávit/déficit primário) e a ne-
cessidade de financiamento nominal tam-
bém foram positivas, mas com um desem-
penho inferior ao observado em 2007.
A carga tributária aumentou ainda mais
neste ano – apesar do discurso alarmista do
executivo federal quando da não prorrogação
da CPFM ao final de 2007 –, o que reduz a
renda disponível da população e a competi-
tividade das empresas. Neste ano, também
continuou a defesa generalizada da necessi-
dade de se reconstruir o sistema tributário
nacional, simplificando e consolidando os
impostos e contribuições, reduzindo as alí-
quotas e o custo das obrigações acessórias:
tudo sem qualquer efeito prático.
A mais recente tentativa de reforma assumiu
uma nova dinâmica a partir da apresentação
de duas novas propostas ao Congresso Na-
cional: (i) em 28/02/08, foi apresentada à
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DELTA ECONOMICS & FINANCE 8
Camara dos Deputados a PEC n° 233 de au-
toria do Poder Executivo e (ii) em
27/03/2008, foi apresentada outra proposta
ao Senado, de autoria da Subcomissão Tem-
porária da Reforma Tributária da Comissão
de Assuntos Econômicos. Em síntese, ambas
as propostas têm os mesmos objetivos: sim-
plificação para o contribuinte, fim da guerra
fiscal entre os Estados e desoneração das
exportações e investimentos.
A proposta elaborada pelo Executivo: (i)
funde alguns tributos federais - inclusive os
que já eram calculados de forma conjunta
(caso do PIS/Cofins) e amplia os recursos
compartilhados com Estados, Municípios e
Distrito Federal; (ii) estabelece regulação
única do ICMS em todo o território nacional
e aumenta a parcela dos Estados de destino
na sua arrecadação e (iii) cria novos fundos
para compensar os Estados perdedores du-
rante um período de transição. Já a proposta
da Subcomissão do Senado cria um imposto
sobre o valor adicionado, compartilhado en-
tre a União, os Estados e o Distrito Federal,
fruto da fusão dos mesmos tributos conside-
rados na proposta do Executivo, mais o ICMS
e o IPI, entre outros.
Comércio Exterior e Câmbio
As contas externas do Brasil continuam a
apresentar saldos positivos, mas decrescen-
tes. Desde o pós-guerra, o saldo do balanço
comercial é superavitário (as principais exce-
ções foram nos anos iniciais do Plano Real).
Em 2006, o saldo foi de US$ 46,5 bilhões,
caindo para US$ 40 bilhões em 2007 e US$
24,7 bilhões em 2008. Neste ano, as expor-
tações atingiram US$ 197,9 bilhões e impor-
tações US$ 173,2 bilhões. O crescimento
mais rápido das importações decorreu da va-
lorização cambial e do aumento da atividade
econômica doméstica, que demandou maio-
res gastos com aquisição de máquinas e
equipamentos estrangeiros.
A balança comercial deve crescer menos em
2009 com ajustes relevantes no saldo co-
mercial gerado pelo agronegócio e minera-
ção e pelo setor automobilístico. No primeiro
caso, espera-se uma redução das exporta-
ções de cerca de US$ 20 bilhões (levando-a
para apenas US$ 50 bilhões). Assim o saldo
comercial em 2009 deve continuar a cair de-
vido ao crescimento mais rápido das impor-
tações (principalmente volume) e da menor
expansão das exportações (preço e volume):
a expectativa é de um saldo entre zero e R$
10 bilhões.
A conta de serviços deve manter seu déficit
estrutural, dadas as despesas com o paga-
mento de empréstimos externos, as remes-
sas de lucros e dividendos, o turismo e os
fretes e seguros. A queda da atividade eco-
nômica e a elevação e maior volatilidade do
câmbio podem contribuir positivamente para
a redução do déficit observado em 2008.
O saldo em transações correntes (que cor-
responde ao excesso de investimento sobre
a poupança doméstica) continua positivo,
mas em queda. Para 2009, a expectativa é
que o saldo negativo piore ainda mais, po-
dendo atingir US$ 30 bilhões.
Com o acirramento da crise cambial, em se-
tembro de 2008, o real iniciou um processo
acelerado de valorização (juntamente com
uma maior volatilidade). Os resultados parci-
ais para 2008 mostram que o Real foi uma
das moedas que mais se desvalorizou no
mundo e a moeda mais volátil da América
Latina (considerando Argentina, Bolívia,
Chile, Colômbia, Estados Unidos, México,
Peru e Venezuela).
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O resultado do balanço de pagamentos e,
principalmente, da balança comercial deve
definir a taxa de câmbio em 2009. Em 2006,
a taxa média nominal (reais por dólares) foi
de 2,18, caindo para 1,95 em 2007 e 1,83
em 2008. Para 2009, espera-se uma taxa
média superior, em torno de 2,20. Caso a
deterioração da liquidez no mercado interna-
cional e o aprofundamento da crise nos mer-
cados desenvolvidos não sejam estancadas
pode-se esperar uma desvalorização ainda
mais acentuada do Real.
Desde 2002, com os saldos comerciais em
crescimento e a estabilidade nos mercados
internacionais, as reservas internacionais do
Brasil cresceram bastante: de US$ 32,8 bi-
lhões para US$ 205 bilhões ao final de
2008, seu pico histórico. Em 2009 a expec-
tativa é que este saldo se mantenha ao redor
de US$ 200 bilhões.
Desafios
A política adotada a partir de 1994 permitiu
ao País atingir a maioridade econômica: (i)
crescimento do PIB, (ii) aumento dos inves-
timentos públicos e privados, (iii) aumento
do nível de emprego, (iv) queda da taxa de
inflação e das taxas de juros, (v) redução do
déficit em conta corrente do balanço de pa-
gamentos, (vi) queda da dívida pública em
relação ao PIB, (vii) expansão do crédito e
(viii) melhoria da distribuição da renda. Em
consequência, o Brasil é uma das economias
mais importantes do mundo – sendo impor-
tante destinatário de investimentos interna-
cionais – e as perspectivas de galgarmos po-
sições são bastante positivas.
No entanto, ainda existem desafios estrutu-
rais fundamentais que devem ser realizados
como, por exemplo: (i) formulação e opera-
cionalização de uma reforma tributária com
o objetivo de aumentar a competitividade
das empresas brasileiras e contribuir para a
sua inserção no mercado internacional; (ii)
formulação e operacionalização de reforma
administrativa com o objetivo de aumentar a
eficiência e eficácia dos serviços públicos
(federal, estadual e municipal); (iii) formula-
ção e operacionalização de uma política in-
dustrial que, de fato, permita o aumento da
competitividade da empresa brasileira e a
geração de empregos (com foco na indústria
de ponta) e (iv) diminuição das desigualda-
des sociais, principalmente nas áreas de
educação e saúde, de modo a ser assegurar
a continuidade da inserção social de milhões
de brasileiros.
O cenário atual ainda é favorável aos negó-
cios, em praticamente todos os setores de
atividade. É claro que a crise financeira mun-
dial deve continuar impactando adversa-
mente a produção e o emprego. No entanto,
a economia brasileira atingiu uma maiori-
dade que lhe permite almejar voos mais al-
tos.