O documento apresenta um agravo de instrumento interposto pelo Ministério Público contra decisão judicial que indeferiu pedido liminar em ação civil pública. A ação buscava suspender decreto municipal que permitiu acesso às praias para atividades físicas, contrariando decreto estadual sobre isolamento social durante a pandemia. O Ministério Público argumenta que a decisão e o decreto municipal flexibilizam indevidamente as normas de isolamento social em prejuízo da saúde pública.
Protocolo Pisc Protocolo de Rede Intersetorial de Atenção à Pessoa Idosa em S...
Agravo
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EXCELENTÍSSIMO SENHOR PRESIDENTE DO EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO
ESTADO DE SANTA CATARINA
URGENTE-COVID-19-PLANTÃO
Agravo de Instrumento
Origem: Vara da Fazenda Pública da Comarca de Balneário Camboriú
Autos na origem n.: 5005762-53.2020.824.0005 (Eproc)
Agravante: Ministério Público do Estado de Santa Catarina
Agravado: Município de Balneário Camboriú
O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA, por
seu Promotor de Justiça, no uso de suas atribuições legais, não se conformando com a
decisão proferida nos autos da Ação Civil Pública n.5009550-12.2019.8.24.0005 (Eproc),
em trâmite perante a Vara da Fazenda Pública da Comarca de Balneário Camboriú,
vem, perante Vossa Excelência, com fundamento no art. 12 da Lei n. 7.347/85 c/c art.
1.015, inciso I, e seguintes do Código de Processo Civil, interpor AGRAVO DE
INSTRUMENTO, requerendo seja recebido e devidamente processado até final
julgamento, com a reforma da decisão recorrida, bem como seja deferida,
liminarmente, a pretensão recursal, nos termos do art. 1.019, inciso I, do Código de
Processo Civil.
O presente recurso, em atenção ao art. 1.016, IV, do CPC, é manejado
em face do MUNICÍPIO DE BALNEÁRIO CAMBORIÚ, pessoa jurídica de direito público,
inscrita no CNPJ sob o n. 83.102.285/0001-07, com sede na Rua Dinamarca, 320, Praça
Papa João Paulo I, Balneário Camboriú/SC, devidamente representado pelo Prefeito
Municipal, Fabrício José Satiro de Oliveira.
Distribui-se o presente recurso em regime de plantão diante do
potencial risco gerado a saúde pública e a possibilidade concreta de outros
municípios replicarem a flexibilização que permitirá uma propagação maior da
COVID-19.
Balneário Camboriú, 17 de abril de 2020.
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ALVARO PEREIRA OLIVEIRA MELO
Promotor de Justiça
EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SANTA CATARINA
Agravo de Instrumento
Origem: Vara da Fazenda Pública da Comarca de Balneário Camboriú
Autos na origem n.: 5005762-53.2020.824.0005 (Eproc)
Agravante: Ministério Público do Estado de Santa Catarina
Agravado: Município de Balneário Camboriú
COLENDA CÂMARA,
EMINENTE RELATOR(A),
EMINENTE PROCURADOR(A) DE JUSTIÇA,
1.Síntese da Razões Recursais.
Busca o presente agravo a reforma da decisão de primeiro grau que
indeferiu o pleito liminar em ação civil pública a qual buscava a suspensão dos efeitos
do Decreto Municipal N. 9876/20 que, em suma, liberou o acesso às praias de Balneário
Camboriú, a moradores, turistas e visitantes, para a realização de atividades físicas
individuais permitindo, a seu modo, a permanência de pessoas nas praias em plena
Pandemia da COVID-19 e em contrariedade ao Decreto Estadual.
A decisão ora objeto de recurso fundamentou-se, basicamente, nos
seguintes pontos: a) cabe ao Poder Executivo Municipal gerir a crise bem como que
"Prefeitos não precisam acolher determinações de Governadores Estaduais e do
Presidente da República, mas sim, devem agir em conjunto em razão da competência
concorrente para legislar sobre o tema." e que "A afirmação do autor, de que os
prefeitos apenas podem determinar formas mais restritivas de isolamento do que os
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determinados pelos governadores, não me parece plausível, inexistindo qualquer
determinação legal neste sentido." b) que o decreto municipal "está de acordo com o
que decidiu a Suprema Corte, não havendo falar-se em ilegalidade e/ou desrespeito a
determinações sanitárias, eis que não se trata de uma abertura horizontal da prática de
atividades nas praias que banham este município." e que apenas "Permitiu a prática
INDIVIDUAL das modalidades esportivas, desde que garantido o distanciamento entre
seus praticantes, e mediante o uso de máscaras." e, finalmente c) que "Como isso será
possível e como se dará o controle não explica, o decreto. Entretanto, a medida poderá
futuramente ser mantida ou o decreto ser revogado pela própria autoridade pública,
conforme comportamento dos usuários e evolução da própria pandemia".
Não obstante, como se verá a seguir não se trata, nem de longe, de se
estabelecer uma espécie de "protagonismo" do Poder Judiciário no enfrentamento da
COVID-19 mas, sim, de se resgatar as normas e interpretação do direito, garantindo a
legalidade e o sentido das restrições para se evitar a propagação de uma pandemia que
ganhou a atenção funcional de todos os poderes da república, da atividade econômica,
da população, e, logicamente, do mundo, mas que, no caso em concreto, pareceu não
sensibilizar o juízo ao propor indagações que nos causam, no mínimo, extrema
preocupação diante da realidade dos fatos e suas consequências tal qual a de que o
Município não aduz como controlará a circulação e que, certamente, deve estar
preparado para uma piora no número de infectados devendo arcar com a sua
responsabilidade.
Os efeitos e o precedente do decreto municipal e da decisão são bastante
danosos nesse momento de combate a COVID-19 pois, a pretexto de complementar o
decreto estadual, se flexibiliza as normas a critério do município permitindo a
concentração e permanência de pessoas na praia em detrimento da legislação vigente e
da própria saúde pública. E já há notícia que Itapema o fez em igual sentido tendo em
vista o precedente de Balneário Camboriú.
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A se permitir tal entendimento não se poderá exigir de qualquer outro ente
municipal que não o faça através de um singelo processo interpretativo que subverte o
sentido das normas de isolamento social. Contudo, no caso em concreto, não se tem um
mero prejuízo financeiro mas, sim, os efeitos de uma pandemia global que por onde
passa gera um caos na saúde pública.
Com o decreto municipal, o Município de Balneário Camboriú gerou
direitos -de habitantes, turistas e visitantes- e obrigações, suas e as quais não tem
como ser resguardadas, conforme declinado pelo próprio juízo, em absoluto desacordo
com a legislação vigente.
O decreto e a decisão quebram o pacto federativo e permitem, por
exemplo, que a Polícia Militar faça valer a competência sanitária do Estado de Santa
Catarina na praia brava, a um quilometro da praia de Balneário Camboriú, mas não o
faça, indevidamente, nessa comarca.
Nesse passo, o Decreto Municipal Nº 9.876, de 16 de abril de 2020,
editado pelo Prefeito Municipal Sr. Fabrício José Satiro de Oliveira, prescreve o
seguinte:
Art. 1º Fica autorizado o acesso às praias do Município de Balneário
Camboriú, somente para a prática esportiva de surf, e demais
exercícios individuais como caminhada e corrida com uso de
máscara desde que respeitando o distanciamento social.
Art. 2º Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação.
Como se verá a seguir, a não ser que se faça um exercício de
interpretação exacerbado, a norma municipal é evidentemente mais ampla, permitindo
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uma flexibilização indevida das normas de isolamento social determinadas pelo Governo
do Estado de Santa Catarina no exercício da sua competência concorrente, diante da
expansão dos casos de infecção por coronavírus (Covid-19).
As praias de todo Estado, e do país, estão vazias por uma razão de
saúde pública e respeito as normas sanitárias tendentes a prevenir a propagação da
COVID-19.
Há consenso na comunidade científica, bem como nas práticas adotadas
ao redor do globo para a contenção e a amortização do ritmo de espalhamento da
COVID-19, que as medidas mais eficazes para o alcance de tais finalidades são aquelas
voltadas a garantir o chamado distanciamento social necessário a retardar a
transmissão.
O Estado de Santa Catarina, reconhecendo a situação de emergência
presente em todo o território catarinense e diante da expansão dos casos de infecção
por transmissão comunitária, em consonância com a Lei n. 13.979/20, que dispõe sobre
as medidas para enfrentamento da emergência de saúde pública decorrente do
coronavírus, publicou as medidas preventivas compulsórias consubstanciadas nos
Decretos Estaduais n. 509/2020, 515/2020, 521/2020, 525/2020, 535/2020 e 554/2020,
que estabeleceram as medidas específicas para o controle da pandemia em Santa
Catarina.
Este último Decreto Estadual, publicado em 11 de abril de 2020, é
explícito no seguinte sentido:
Art. 1º O art. 7º do Decreto nº 525, de 23 de março de 2020, passa a
vigorar com a seguinte redação:
[...]
II - até 31 de maio de 2020:
a) os eventos e as reuniões de qualquer natureza, de caráter
público ou privado, incluídas excursões, cursos presenciais,
missas e cultos religiosos;
b) a concentração e a permanência de pessoas em espaços
públicos de uso coletivo, como parques, praças e praias [...]
Já o art. 7 do Decreto Estadual n. 525/2020 prescreve o seguinte:
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Art. 7º Ficam suspensas, em todo o território catarinense, sob
regime de quarentena, nos termos do inciso II do art. 2º da Lei
federal nº 13.979, de 6 de fevereiro de 2020:[...]
b) a concentração e a permanência de pessoas em espaços
públicos de uso coletivo, como parques, praças e praias;
As mesmas normas foram mantidas no Decreto n. 562, publicado na data de
hoje:
Das Medidas de Autoridade Sanitária
Art. 8º Ficam suspensas, em todo o território catarinense, sob
regime de quarentena, nos termos do inciso II do art. 2º da Lei
federal nº 13.979, de 6 de fevereiro de 2020:
[...]
II até 31 de maio de 2020:
a) os eventos e as reuniões de qualquer natureza, de caráter público
ou privado, incluídas excursões, cursos presenciais, missas e cultos
religiosos;
b) a concentração e a permanência de pessoas em espaços
públicos de uso coletivo, como parques, praças e praias;
E o novo Decreto reforça:
Art. 2º Enquanto perdurar o estado de calamidade pública, tornam-
se obrigatórias as medidas de combate e enfrentamento à pandemia
da COVID-19 previstas neste Decreto.
[...]
Art. 36. Os Municípios do Estado, por meio dos respectivos
Prefeitos, poderão estabelecer medidas específicas de
enfrentamento mais restritivas do que as previstas neste Decreto ou
em Portarias do Secretário de Estado da Saúde, observadas as
informações técnicas do COES e de acordo com a necessidade
apresentada, a fim de conter a contaminação e a propagação do
coronavírus em seus territórios.
1.1. Quarentena e competências estadual e municipal
Em 6 de fevereiro de 2020, foi editada a Lei Federal n. 13.979, que dispõe “sobre as
medidas para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância
internacional decorrente do coronavírus responsável pelo surto de 2019”.
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O art. 3º da Lei n. 13.979/2020 previu as medidas concretas a serem
adotadas pelos entes federados, deixando claro que “somente poderão ser
determinadas com base em evidências científicas e em análises sobre as informações
estratégicas em saúde e deverão ser limitadas no tempo e no espaço ao mínimo
indispensável à promoção e à preservação da saúde pública”.
Dentre as restrições possíveis, encontra-se aquela que possui
pertinência com o presente caso: a quarentena. Para fins da emergência de saúde
pública atualmente declarada, entende-se por quarentena a restrição de atividades
ou a separação de pessoas suspeitas de contaminação das pessoas que não
estejam doentes, ou de bagagens, contêineres, animais, meios de transporte ou
mercadorias suspeitos de contaminação, de maneira a evitar a possível
contaminação ou a propagação do coronavírus (art. 2º, II, da Lei n. 13.979/2020).
A quarentena pode ser adotada pelos gestores locais de saúde,
quando autorizados pelo Ministério da Saúde, aí incluídos os Estados (art. 3º, II e § 7º,
Lei n. 13.979/2020):
Art. 3º Para enfrentamento da emergência de saúde pública de
importância internacional decorrente do coronavírus, as autoridades
poderão adotar, no âmbito de suas competências, dentre outras, as
seguintes medidas:
[...]
II - quarentena;
§ 7º As medidas previstas neste artigo poderão ser adotadas:
[...]
II - pelos gestores locais de saúde, desde que autorizados pelo
Ministério da Saúde, nas hipóteses dos incisos I, II, V, VI e VIII
do caput deste artigo;
Tal autorização já ocorreu por meio da Portaria MS/GM n. 356/2020, ao
prever e delimitar a forma de definição das medidas sob regime de quarentena:
Art. 4º A medida de quarentena tem como objetivo garantir a manutenção
dos serviços de saúde em local certo e determinado.
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§ 1º A medida de quarentena será determinada mediante ato
administrativo formal e devidamente motivado e deverá ser editada
por Secretário de Saúde do Estado, do Município, do Distrito Federal
ou Ministro de Estado da Saúde ou superiores em cada nível de
gestão, publicada no Diário Oficial e amplamente divulgada pelos meios
de comunicação.
§ 2º A medida de quarentena será adotada pelo prazo de até 40
(quarenta) dias, podendo se estender pelo tempo necessário para reduzir
a transmissão comunitária e garantir a manutenção dos serviços de
saúde no território.
§ 3º A extensão do prazo da quarentena de que trata o § 2º dependerá de
prévia avaliação do Centro de Operações de Emergências em Saúde
Pública (COE-nCoV) previsto na Portaria nº 188/GM/MS, de 3 de
fevereiro de 2020.
§ 4º A medida de quarentena não poderá ser determinada ou mantida
após o encerramento da Declaração de Emergência em Saúde Pública
de Importância Nacional.
Como se pode observar, são possíveis as medidas de restrição pelo
Estado que visem a reduzir a transmissão comunitária e a garantir a manutenção dos
serviços de saúde no território, uma vez previstas em instrumentos normativos legítimos
e sem ofensa abstrata ao texto constitucional.
As referidas normas se coadunam com a disposição constitucional sobre
a competência legislativa concorrente, na medida em que o art. 24 da Constituição da
República estabelece, como competência concorrente da União, dos Estados e do
Distrito Federal, legislar sobre “previdência social, proteção e defesa da saúde” (inc. XII).
Ainda sobre a competência legislativa concorrente, o art. 24, §§ 1º ao 3º,
da Constituição da República dispõe que:
§ 1º. No âmbito da legislação concorrente, a competência da União limitar-
se-á a estabelecer normas gerais”.
§ 2º A competência da União para legislar sobre normas gerais não exclui
a competência suplementar dos Estados.
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§ 3º Inexistindo lei federal sobre normas gerais, os Estados exercerão a
competência legislativa plena, para atender a suas peculiaridades.
A competência concorrente dos Estados foi reconhecida recentemente
pelo Supremo Tribunal Federal em decisão monocrática do Min. Marco Aurélio ao
analisar as medidas liminares requeridas nos Autos da Ação Direta de
Inconstitucionalidade n. 6.341, tendo por objeto a constitucionalidade da MP 926/2020 e
do Decreto n. 10.282/2020. Colhe-se da fundamentação:
SAÚDE CRISE CORONAVÍRUS MEDIDA PROVISÓRIA
PROVIDÊNCIAS LEGITIMAÇÃO CONCORRENTE. Surgem atendidos
os requisitos de urgência e necessidade, no que medida provisória dispõe
sobre providências no campo da saúde pública nacional, sem prejuízo da
legitimação concorrente dos Estados, do Distrito Federal e dos
Municípios.
[...] Há de ter-se a visão voltada ao coletivo, ou seja, à saúde pública,
mostrando-se interessados todos os cidadãos. O artigo 3º, cabeça,
remete às atribuições, das autoridades, quanto às medidas a serem
implementadas. Não se pode ver transgressão a preceito da
Constituição Federal. As providências não afastam atos a serem
praticados por Estado, o Distrito Federal e Município considerada a
competência concorrente [...].
[...] O que nela se contém [MP 926/2020] repita-se à exaustão não
afasta a competência concorrente, em termos de saúde, dos
Estados e Municípios. Surge acolhível o que pretendido, sob o ângulo
acautelador, no item a.2 da peça inicial, assentando-se, no campo, há de
ser reconhecido, simplesmente formal, que a disciplina decorrente da
Medida Provisória nº 926/2020, no que imprimiu nova redação ao artigo
3º da Lei federal nº 9.868/1999, não afasta a tomada de providências
normativas e administrativas pelos Estados, Distrito Federal e
Municípios.
A medida cautelar foi referendada pelo Supremo Tribunal Federal, com
um pequeno acréscimo, conforme será abordado mais adiante.
No caso, considerando o reconhecimento da contaminação comunitária
pelo Sars-Cov-2 no território brasileiro, a restrição de atividades na modalidade de
quarentena determinada pela autoridade sanitária estadual guarda pertinência com a
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finalidade de conter a proliferação da doença e deve estar amparada em critérios
sanitários de contenção da pandemia.
Nessa lógica, não se admite que os municípios estabeleçam regras de
quarentena mais permissivas que aquelas já determinadas pela União e pelo Estado,
pois seria incongruente que a política pública municipal de defesa da saúde, que
considera o “interesse local”, seja mais flexível em relação aos critérios para a
prevenção e o combate à disseminação do novo coronavírus relacionados conforme o
“interesse regional” (Estado) e o “interesse geral” (União).
O Supremo Tribunal Federal já destacou a possibilidade de a legislação
municipal suplementar, em assuntos de interesse local, a norma geral, o que não
significa que o Município poderá ignorá-la. Eis o julgado do Supremo Tribunal Federal:
ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL.
DIREITO CONSTITUCIONAL. LEI 13.113/2001 E DECRETO
41.788/2002, QUE DISPÕE SOBRE A PROIBIÇÃO DO USO DE
MATERIAIS, ELEMENTOS CONSTRUTIVOS E EQUIPAMENTOS DA
CONSTRUÇÃO CIVIL CONSTITUÍDOS DE AMIANTO NO MUNICÍPIO
DE SÃO PAULO. EXERCÍCIO LEGÍTIMO DA COMPETÊNCIA DOS
MUNICÍPIOS PARA SUPLEMENTAREM A LEGISLAÇÃO FEDERAL.
ARGUIÇÃO JULGADA IMPROCEDENTE.
1. Ante a declaração incidental de inconstitucionalidade do art. 2º da
Lei 9.055/95, não invade a competência da União prevista nos arts.
24, V, VI e XII, da Constituição da República, a legislação municipal
que, suplementando a lei federal, impõe regra restritiva de
comercialização do amianto.
2. Trata-se de competência concorrente atribuída à União, aos
Estados e Distrito Federal para legislar sobre produção, consumo,
proteção do meio ambiente e proteção e defesa da saúde, tendo os
Municípios competência para suplementar a legislação federal e
estadual no que couber.
3. Espaço constitucional deferido ao sentido do federalismo
cooperativo inaugurado pela Constituição Federal de 1988. É
possível que Estados-membros, Distrito Federal e Municípios, no
exercício da competência que lhes são próprias, legislem com o fito
de expungirem vácuos normativos para atender a interesses que lhe
são peculiares, haja vista que à União cabe editar apenas normas
gerais na espécie. 4. Arguição de Descumprimento de Preceito
Fundamental julgada improcedente, com a declaração incidental da
inconstitucionalidade do art. 2º da Lei 9.055/95. (ADPF 109, Relator(a):
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Min. EDSON FACHIN, Tribunal Pleno, julgado em 30/11/2017,
ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-019 DIVULG 31-01-2019 PUBLIC
01-02-2019)
Da síntese e conclusão do voto do Min. Edson Fachin (relator), extrai-se o
seguinte: “Revela-se constitucional a legislação municipal que, em matéria de
competência local, comum e suplementar, regulamenta de forma mais restritiva a norma
geral, dentro do âmbito de atuação permitido por ela”.
A prevalência das normativas mais restritivas também é percebida em outras
áreas que envolvem direitos sensíveis, como é o caso do meio ambiente equilibrado. A
esse respeito, já decidiu o Supremo Tribunal Federal:
Os Municípios podem legislar sobre direito ambiental, desde que o façam
fundamentadamente. (...) A Turma afirmou que os Municípios podem
adotar legislação ambiental mais restritiva em relação aos Estados-
membros e à União. No entanto, é necessário que a norma tenha a
devida motivação.
[ARE 748.206 AgR, rel. min. Celso de Mello, j. 14-3-2017, 2ª T,
Informativo 857.]
O município é competente para legislar sobre meio ambiente com União
e Estado, no limite de seu interesse local e desde que tal regramento seja
e harmônico com a disciplina estabelecida pelos demais entes federados
(art. 24, VI, c/c o art. 30, I e II, da CRFB)” (RE 586.224, rel. min. Luiz Fux,
j. 05.03.2015, P, DJE 08.05.2015, Tema 145).
Também sobre horário de comércio local:
Os Municípios têm autonomia para regular o horário do comércio local,
desde que não infrinjam leis estaduais ou federais válidas, pois a
Constituição lhes confere competência para legislar sobre assuntos de
interesse local.
[AI 622.405 AgR, rel. min. Eros Grau, j. 22-5-2007, 2ª T, DJ de
15-6-2007.]
A respeito dos art. Art. 30, I e II, da Constituição da República, preleciona a
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doutrina:
I Legislar sobre assuntos de interesse local substituiu a locução peculiar
interesse local, presente nas Constituições anteriores. Interesse local não
implica exclusivo interesse municipal, tampouco se expressa em todos os
municípios do mesmo modo, pois os municípios são diferentes. No Brasil
temos municípios com territórios maiores que Estados da Federação
Altamira (PA), por exemplo, é maior que Sergipe , ao mesmo tempo que
há municípios com orçamento maior que Estados São Paulo capital,
maior que muitos Estados. Temos municípios com forte característica
industrial, outros, com recursos ambientais relevantes, que vivem do
turismo etc. Estas características é que identificam o seu interesse local.
O que identifica o interesse local é a circunstância do direito a ser
protegido no universo do município. A característica cultural, demográfica,
geográfica, topográfica, climática, geológica, econômica, política entre
outros é que indicará o interesse local a ser protegido. Entendemos,
como TABORDA (2015), que o interesse local é a cláusula geral de
competência municipal. As cláusulas gerais constituem o meio
legislativamente hábil para permitir o ingresso, no ordenamento jurídico,
de princípios valorativos (expressos ou não expressos), standards,
máximas de conduta, arquétipos exemplares de comportamento,
normativas constitucionais e assim por diante. O intérprete, além de
averiguar a possibilidade de subsunção de uma série de casos-limite na
fattispecie (suporte fático), verifica a exata individuação das mutáveis
regras sociais às quais o envia a metanorma jurídica. Deverá determinar
quais são os efeitos incidentes no caso concreto, ou, se estes já vieram
indicados, qual a graduação que lhes será conferida no caso concreto, à
vista das possíveis soluções existentes no sistema. As cláusulas gerais
têm por função permitir a abertura e a mobilidade do sistema jurídico,
tanto que abrem o sistema para elementos extrajurídicos, viabilizando a
adequação, ao mesmo tempo que asseguram a mobilidade interna. É o
caso do interesse local.
II A suplementação de legislação estadual ou federal, no que
couber, exige que o conteúdo legislado seja de atribuição municipal,
não podendo o município, por exemplo, legislar sobre direito civil,
cuja competência é da União. A suplementação ocorre por meio de
complementação ou legislar na ausência da norma. A jurisprudência vem
entendendo que, para legislar na ausência de normas, o Município
precisa ter competência constitucional sobre a matéria. Já a
complementação não pode implicar regrar em sentido oposto à
norma geral existente. Este foi o entendimento no Recurso
Extraodrinário n. 313060/SP, rel. Min. Ellen Gracie Nothfleet (Diário
da Justiça de 24 de fevereiro de 2006): “A competência
constitucional dos Municípios de legislar sobre assunto de interesse
local não tem o alcance de estabelecer normas que a própria
Constituição, na repartição de competências, atribui à União e aos
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Estados”.
(CANOTILHO, J. J. Gomes [et al.] ; Comentários à Constituição do Brasil.
2. ed. São Paulo : Saraiva Educação, 2018. (Série IDP), p. 847-848)
É certo, portanto, que os municípios podem prever restrições
adicionais se forem necessárias para a proteção e a defesa da saúde pública, como
forma de colocar em prática as suas estratégias de contenção da pandemia, o que deve
estar devidamente fundamentado pela autoridade sanitária em conformidade com o
interesse local.
1.2. Das decisões do STF sobre a competência em relação à pandemia do
Coronavírus e sua aplicação ao caso concreto
A esse respeito, merece ser destacada a recente decisão proferida pelo
Supremo Tribunal Federal na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental n.
672/DF, de relatoria do Min. Alexandre de Moraes, em 8 de abril de 2020:
A Constituição Federal, em diversos dispositivos, prevê princípios
informadores e regras de competência no tocante à proteção da saúde
pública, destacando, desde logo, no próprio preâmbulo a necessidade de
o Estado Democrático assegurar o bem-estar da sociedade.
Logicamente, dentro da ideia de bem-estar, deve ser destacada como
uma das principais finalidades do Estado a efetividade de políticas
públicas destinadas à saúde. O direito à vida e à saúde aparecem como
consequência imediata da consagração da dignidade da pessoa humana
como fundamento da República Federativa do Brasil. Nesse sentido, a
Constituição Federal consagrou, nos artigos 196 e 197, a saúde como
direito de todos e dever do Estado, garantindo sua universalidade e
igualdade no acesso às ações e serviços de saúde. No presente
momento, existe uma ameaça séria, iminente e incontestável ao
funcionamento de todas as políticas públicas que visam a proteger a vida,
saúde e bem estar da população. A gravidade da emergência causada
pela pandemia do coronavírus (COVID-19) exige das autoridades
brasileiras, em todos os níveis de governo, a efetivação concreta da
proteção à saúde pública, com a adoção de todas as medidas
possíveis e tecnicamente sustentáveis para o apoio e manutenção
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das atividades do Sistema Único de Saúde. [...]
Por outro lado, em respeito ao Federalismo e suas
regras constitucionais de distribuição de competência consagradas
constitucionalmente, assiste razão à requerente no tocante ao pedido
de concessão de medida liminar, “para que seja determinado o
respeito às determinação dos governadores e prefeitos quanto ao
funcionamento das atividades econômicas e as regras de
aglomeração”. A adoção constitucional do Estado Federal gravita em
torno do princípio da autonomia das entidades federativas, que
pressupõe repartição de competências legislativas, administrativas e
tributárias. Em relação à saúde e assistência pública, inclusive no
tocante à organização do abastecimento alimentar, a Constituição
Federal consagra, nos termos dos incisos II e IX, do artigo 23, a
existência de competência administrativa comum entre União,
Estados, Distrito Federal e Municípios. Igualmente, nos termos do
artigo 24, XII, o texto constitucional prevê competência concorrente
entre União e Estados/Distrito Federal para legislar sobre proteção e
defesa da saúde; permitindo, ainda, aos Municípios, nos termos do
artigo 30, inciso II, a possibilidade de suplementar a legislação
federal e a estadual no que couber, desde que haja interesse local;
devendo, ainda, ser considerada a descentralização político-
administrativa do Sistema de Saúde (art. 198, CF, e art. 7º da Lei
8.080/1990), com a consequente descentralização da execução de
serviços e distribuição dos encargos financeiros entre os entes
federativos, inclusive no que diz respeito às atividades de vigilância
sanitária e epidemiológica (art. 6º, I, da Lei 8.080/1990). As regras de
repartição de competências administrativas e legislativas deverão ser
respeitadas na interpretação e aplicação da Lei 13.979/20, do Decreto
Legislativo 6/20 e dos Decretos presidenciais 10.282 e 10.292, ambos de
2020, observando-se, de “maneira explícita”, como bem ressaltado
pelo eminente Ministro MARCO AURÉLIO, ao conceder medida
acauteladora na ADI 6341, “no campo pedagógico e na dicção do
Supremo, a competência concorrente”. Dessa maneira, não compete
ao Poder Executivo federal afastar, unilateralmente, as decisões dos
governos estaduais, distrital e municipais que, no exercício de suas
competências constitucionais, adotaram ou venham a adotar, no
âmbito de seus respectivos territórios, importantes medidas
restritivas como a imposição de distanciamento/isolamento social,
quarentena, suspensão de atividades de ensino, restrições de
comércio, atividades culturais e à circulação de pessoas, entre
outros mecanismos reconhecidamente eficazes para a redução do
número de infectados e de óbitos, como demonstram a
recomendação da OMS (Organização Mundial de Saúde) e vários
estudos técnicos científicos, como por exemplo, os estudos
realizados pelo Imperial College of London, a partir de modelos
matemáticos (The Global Impact of COVID-19 and Strategies for
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Mitigation and Suppression, vários autores; Impact of non-
pharmaceutical interventions (NPIs) to reduce COVID19 mortality
and healthcare demand, vários autores).
Presentes, portanto, a plausibilidade inequívoca de
eventual conflito federativo e os evidentes riscos sociais e à saúde
pública com perigo de lesão irreparável, CONCEDO PARCIALMENTE A
MEDIDA CAUTELAR na arguição de descumprimento de preceito
fundamental, ad referendum do Plenário desta SUPREMA CORTE, com
base no art. 21, V, do RISTF, para DETERMINAR a efetiva observância
dos artigos 23, II e IX; 24, XII; 30, II e 198, todos da Constituição
Federal na aplicação da Lei 13.979/20 e dispositivos conexos,
RECONHENDO E ASSEGURANDO O EXERCÍCIO DA COMPETÊNCIA
CONCORRENTE DOS GOVERNOS ESTADUAIS E DISTRITAL E
SUPLEMENTAR DOS GOVERNOS MUNICIPAIS, cada qual no
exercício de suas atribuições e no âmbito de seus respectivos
territórios, para a adoção ou manutenção de medidas restritivas
legalmente permitidas durante a pandemia, tais como, a imposição
de distanciamento/isolamento social, quarentena, suspensão de
atividades de ensino, restrições de comércio, atividades culturais e
à circulação de pessoas, entre outras; INDEPENDENTEMENTE DE
SUPERVENIENCIA DE ATO FEDERAL EM SENTIDO CONTRÁRIO,
sem prejuízo da COMPETÊNCIA GERAL DA UNIÃO para estabelecer
medidas restritivas em todo o território nacional, caso entenda
necessário.
Dessa decisão, é possível extrair algumas conclusões:
(1) As medidas restritivas no contexto da pandemia do Coronavírus
dizem respeito primordialmente ao direito fundamental à saúde. Vale dizer, ao contrário
do teor da decisão ora vergastada, o que prevalece não é a competência
regulamentar de determinado serviço, mas, sim, medidas sanitárias e
epidemiológicas para fins de prevenção da COVID-19.
(2) Tais medidas sanitárias e epidemiológicas para fins de prevenção
da COVID-19 devem ser interpretadas à luz da competência concorrente dos Estados
e, quanto aos Municípios, à luz de sua competência suplementar (art. 30, II, CRFB).
Logo, apenas compete aos Municípios complementar a legislação federal e
estadual. Em se tratando de saúde, conforme já exposto, deve prevalecer a
precaução, de modo que apenas medidas mais protetivas à saúde podem ser
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adotadas pelo Município.
(3) A competência de cada um dos entes para adotar medidas restritivas
no respectivo território fica preservada, cabendo ao Estado impor medidas restritivas
necessárias ao seu âmbito territorial (Estado de Santa Catarina), o que deve ser
observado pelos Municípios.
O mesmo entendimento pode ser extraído da decisão do Pleno do STF
na ADI 6341, antes mencionada.
Ao analisar a cautelar proferida pelo Min. Marco Aurélio, o Pleno do
Supremo Tribunal Federal deixou ainda mais clara a competência concorrente, mas
sempre tendo como norte a saúde (direito fundamental que se visa a proteger no
presente caso).
O dispositivo do julgamento foi publicado nos seguintes termos:
O Tribunal, por maioria, referendou a medida cautelar
deferida pelo Ministro Marco Aurélio (Relator), acrescida de interpretação
conforme à Constituição ao § 9º do art. 3º da Lei nº 13.979, a fim de
explicitar que, preservada a atribuição de cada esfera de governo, nos
termos do inciso I do art. 198 da Constituição, o Presidente da República
poderá dispor, mediante decreto, sobre os serviços públicos e atividades
essenciais, vencidos, neste ponto, o Ministro Relator e o Ministro Dias Toffoli
(Presidente), e, em parte, quanto à interpretação conforme à letra b do inciso VI
do art. 3º, os Ministros Alexandre de Moraes e Luiz Fux.
Embora o acórdão ou os votos ainda não tenham sido publicados (com
exceção do voto do Relator, já mencionado, que se limitou a fixar a competência
concorrente e ficou vencido em parte do julgamento), a imprensa especializada
acompanhou e registrou o sentido dos votos:
O Supremo Tribunal Federal (STF) referendou, nesta quarta-feira (15/4),
a liminar do ministro Marco Aurélio para explicitar a competência de
estados e municípios de tomar medidas com o objetivo de conter a
pandemia do coronavírus. Desta forma, estes entes da federação
podem determinar quarentenas, isolamento, restrição de atividades,
sem que a União possa interferir no assunto. A ação em julgamento
questiona a Medida Provisória 926, sobre procedimentos para aquisição
de bens, serviços e insumos. Foi o primeiro caso apreciado pelo plenário
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da Corte no formato de julgamento por videoconferência.
A decisão, unânime, foi proferida no âmbito da Ação Direta de
Inconstitucionalidade (ADI) 6.341. Na ação, o PDT pede a declaração de
inconstitucionalidade da MP 926, editada pelo presidente Jair Bolsonaro
em 20 de março, por entender que a norma desrespeita o preceito
constitucional da autonomia dos entes federativos e foi editada com a
finalidade política de atingir os governadores.
Assim, embora não tenham julgado o mérito, os ministros não
observaram inconstitucionalidade no texto da MP 926. Ao mesmo tempo,
no entanto, ela também não anula as providências em vigilância sanitária
e saúde tomadas por estados e municípios.
Os ministros também ressaltaram que o trecho da MP em que se lê
que “o presidente da República disporá, mediante decreto, sobre os
serviços públicos e atividades essenciais” terá interpretação
conforme a Constituição para preservar as atribuições de cada
esfera de governo. Dessa forma, têm validade os decretos de
governadores e prefeitos que forem mais restritivos que as medidas
do governo federal.
Neste ponto, Marco Aurélio e o presidente da Corte, ministro Dias Toffoli,
ficaram vencidos. Eles, no entanto, concordam com a posição, mas
entenderam que ela estava implícita no voto do relator, não precisando
de explicitação. Mas como oito ministros votaram neste sentido, o
ministro Luiz Edson Fachin, primeiro a apontar o detalhamento, será o
redator do acórdão. O ministro Luís Roberto Barroso se declarou suspeito
por razões de foro íntimo e não participou do julgamento.
Para o relator do caso, é competência da União, estados e
municípios cuidar da saúde pública. Como está na cautelar por ele
concedida, a redistribuição de atribuições feita pela MP não afasta a
“competência concorrente dos entes federativos, nem a tomada de
providências normativas e administrativas pelos estados, pelo Distrito
Federal e pelos municípios”. Marco Aurélio ressaltou que o contexto
da Covid-19 é o de uma emergência de saúde pública de importância
internacional e que a quarentena e outras medidas foram
recomendadas pelas agências de vigilância sanitária.
“A MP foi editada para mitigar problema de repercussão mundial. Não há
que se falar em reserva de lei complementar. É caso de urgência de
repercussão nacional. O presidente editou MP que não afasta a
competência concorrente em termos de saúde de estados e municípios”,
disse.
Na sequência, o ministro Alexandre de Moraes enfatizou que, se há
excessos por parte dos estados e municípios é porque não há, até o
momento, uma coordenação geral da União sobre o combate à
pandemia, como por exemplo quanto ao isolamento social. Para ele, o
julgamento não se refere a questões meramente burocráticas,
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administrativas, mas a um dos alicerces do Estado Democrático de
Direito, o federalismo e suas regras de distribuição.
“A própria norma impugnada preza pela cooperação, a articulação prévia
entre os órgãos de poder. Não significa que um possa avançar na
competência do outro, mas que haja coordenação. É lamentável que na
condução dessa crise sem precedentes recentes no Brasil e no mundo,
mesmo em assuntos essencialmente técnicos de tratamento uniforme
internacionalmente, haja discrepâncias políticas entre unidades da
federação e falte cooperação. Se houve excessos nas regulamentações
estaduais e municipais isso deve ser analisado, mas ocorreu é porque
não há até agora uma regulamentação geral da União sobre a questão do
isolamento, sobre o necessário técnico científico sobre a pandemia”,
disse.
A regra no Brasil, continua ele, é a autonomia dos entes locais. Essa
regra deve ser interpretada a partir de uma matéria principal neste
momento: a saúde pública. “Não há dúvidas de que, apesar da
multidisciplinaridade, as ações foram editadas com uma finalidade:
combater a Covid-19. Em que pese a multidisciplinariedade,
transporte, serviços, temos de focar ao que a Constituição
estabelece como divisão de competências para cuidar da saúde
pública”.
Moraes ressaltou que há peculiaridades locais que precisam ser
analisadas e que toda distribuição de competências administrativa ou
legislativa foi baseada no princípio da predominância do interesse. Dessa
forma, saúde pública é matéria de competência comum a todos os entes
federativos. E cabe à União o trabalho de coordenação que, segundo o
ministro, não é imposição, mas respeito à autonomia, liderança.
“Obviamente que a competência comum administrativa não significa que
todos podem fazer tudo. Isso gera bagunça. Significa que a partir da
predominância do interesse, a União deve editar normas de interesse
nacional, os estados, regional e os municípios visando o seu interesse
local. Não é possível que ao mesmo tempo a União queira ter monopólio
da condução normativa da pandemia sobre estados e municípios. Isso
não é razoável. Como não é possível que os municípios queiram se
tornar repúblicas autônomas dentro do Brasil”, pontuou Moraes.
Na mesma linha, seguiu o ministro Luiz Edson Fachin, que reafirmou
entendimento segundo o qual o exercício da competência da União em
nenhum momento diminuiu a competência própria dos demais entes da
federação sobre serviços da saúde. Ao contrário, a diretriz constitucional
é a de municipalizar esses serviços.
“O pior erro na formulação das políticas públicas é a omissão, sobretudo
para as ações essenciais exigidas pelo artigo 23 da Constituição Federal.
É grave que, sob o manto da competência exclusiva ou privativa,
premiem-se as inações do governo federal, impedindo que estados e
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municípios, no âmbito de suas respectivas competências, implementem
as políticas públicas essenciais. O Estado garantidor dos direitos
fundamentais não é apenas a União, mas também os estados e os
municípios”, afirmou.
Fachin ressaltou que a competência de um dos Poderes não pode
implicar na hierarquização dos poderes ou esferas. A competência para
definição, pelo presidente da República, de atividades essenciais está,
para ele, limitada diante da competência dos outros entes.
Para o ministro Gilmar Mendes, a decisão poderia ir mais além. Ele
defendeu que, para tomar medidas na área da saúde, estados e
municípios deveriam ser consultados. “Eu aventaria dizer que para ser
entendida como constitucional a cláusula do parágrafo 9° ter-se-ia que
ouvir estados e municípios. Do contrário vai acontecer aquilo que foi
claramente demonstrado no voto do ministro Fachin, o presidente poderá
decretar que estas ou aquelas atividades são ou não são essenciais e
eventualmente desrespeitando peculiaridades no âmbito dos estados e
até mesmo dos municípios. Estamos diante de situação extremamente
complexa”, defendeu.
Assim, Gilmar Mendes afirmou que o colegiado deveria, ainda, dar mais
detalhamento, estabelecendo um modelo institucional de participação
federativa nesta temática, sob pena de uma multiplicação de conflitos.
Como exemplo, ele afirmou que a atuação da União, em princípio, está
reduzida a 50 hospitais universitários federais, de modo que execução
efetiva de medidas de saúde de combate recai fundamentalmente sobre
estados e municípios e entidades conveniadas.
“O presidente da República dispõe de poderes inclusive para exonerar o
seu ministro da Saúde, mas não dispõe de poder para eventualmente
para uma política de caráter genocida. Isso a Constituição veda de
maneira cabal. Se algum decreto vier a colocar em risco a saúde
pública das pessoas, certamente precisaria ser contestado. É curioso
que se isso ocorresse no âmbito dos estados com política irresponsável
seria passível de intervenção federal. De modo com que esse assunto
precisa ser tratado”, disse.
O ministro Ricardo Lewandowski afirmou que há compartilhamento de
competências e de rendas exatamente para que se tenha
desenvolvimento nacional harmônico e integrado. De acordo com ele, há
dois vetores que fazem parte dos sistemas federativos. Em primeiro
lugar, a ausência de hierarquia entre os entes federados. Ou seja, a
União não prevalece sobre os estados, os estados não prevalecem sobre
os municípios naquilo que diz respeito às competências específicas. Em
segundo lugar, o princípio da subsidiariedade, que significa que tudo
aquilo que o ente menor pode fazer de forma mais rápida e eficaz não
deve ser feita pelo ente maior.
“Quando se fala nas competências se deve levar em consideração
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exatamente isso e em terceiro lugar o critério do predominante
interesse. Neste momento de crise de pandemia que vivemos, à União
cabe estabelecer regras gerais. No caso da doença que pretendemos
combater, existe dispositivo constitucional que me parece muito
pedagógico no sentido de apontar qual seria o papel da União neste
enfrentamento: cabe planejar e promover a defesa permanente em caso
de calamidade pública. Isso significa coordenar e oferecer apoio material.
Os entes federados não podem ser alijados dessa batalha, porque eles
têm o poder-dever de enfrentar a doença”, enfatizou. Para ele, dentro
dessas competências, qualquer ato governamental precisa balizar-se
1pelos critérios da razoabilidade e proporcionalidade .
Da análise dos votos, notam-se alguns aspectos que ficaram evidentes:
1 O contexto político do julgamento foi o de uma omissão da União em
relação à tomada de medidas mais restritivas de combate à pandemia, bem como de
Estados adotando medidas sanitárias nesse sentido;
2 - O sentido da garantia da competência concorrente no julgamento,
seja pelo contexto descrito no item 1, seja pelo teor dos votos, é o de proteger o direito
fundamental à saúde;
3 Portanto, a competência concorrente, como indica o próprio relato do
julgamento, acima transcrito, permite que os Municípios possam editar normas em
assuntos de interesse local, desde que visem a proteger mais a saúde, ou seja,
desde que sejam mais restritivas do que as do Estado (respeitados, por óbvio, os
direitos fundamentais e com base em evidências da autoridade sanitária).
Além disso, fica evidente pelos votos (e não poderia ser diferente, já que
está expresso na Constituição Federal art. 30, I e II) que a competência concorrente
dos Municípios é garantida apenas no limite dos assuntos de interesse local, enquanto
os temas de interesse regional devem ser regulados pelos Estados.
Dito isso, não há qualquer dúvida de que a regulamentação de medidas
acerca das praias não são de interesse unicamente local. Pelo contrário, o litoral
catarinense abrange boa parte de seu território, uma região muito importante em termos
econômicos e sociais no Estado de Santa Catarina. Mais do que isso, é a região com
maior adensamento populacional no Estado (fator que, segundo algumas considerações
1 Portal JOTA. 15/4/2020. https://www.jota.info/stf/do-supremo/stf-reafirma-competencia-de-estados-e-municipios-
para-tomar-medidas-contra-covid-19-15042020
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2até agora realizadas, é determinante para a proliferação do coronavírus ) e, não por
coincidência, é a mais atingida pela COVID-19 no Estado.
3Note-se do mapa elaborado pela Secretaria de Estado da Saúde :
2
https://exame.abril.com.br/blog/paul-krugman/a-densidade-se-tornou-fatal/
3 Disponível em:
https://app.powerbi.com/view?r=eyJrIjoiOGRlNTk0MjgtY2MxNi00N2UzLWFmNmQtOTE3MmYwMGQyZTY1IiwidCI6I
mExN2QwM2ZjLTRiYWMtNGI2OC1iZDY4LWUzOTYzYTJlYzRlNiJ9
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Daí que a regulação dos espaços de uso coletivo no litoral do estado,
especificamente as praias, é assunto de interesse regional, que, conforme ficou claro da
decisão do Supremo Tribunal Federal, deve ser tratada pelo Estado, a fim de manter sua
uniformidade.
O interesse regional fica ainda mais evidente quando se trata do
Município de Balneário Camboriú, que sabidamente está inserido em uma verdadeira
conurbação com diversos outros Municípios litorâneos (Porto Belo, Itapema, Itajaí,
Navegantes, etc.). Ou seja, não faz sentido que, em praias com limites tão tênues entre
Municípios, as medidas sejam mais flexíveis em um deles e, a partir de uma “linha
imaginária” de divisa territorial, sejam mais restritivas.
Em outras palavras, todos os aspectos da questão (de competência
constitucional, de precedentes do Judiciário, de situação fática) reforçam que o
Município não poderia ter tomado medidas mais flexíveis que o Estado no caso
concreto.
1.3. Das decisões dos Tribunais Estaduais sobre a competência em relação à
pandemia do Coronavírus e sua aplicação ao caso concreto
Em relação a medidas mais flexíveis no âmbito do comércio local, o
Poder Judiciário de Santa Catarina tem se posicionado no sentido de que o Estado tem
competência para adotar as medidas restritivas de proteção à saúde, não cabendo ao
Município adotar regras mais flexíveis do que aquelas legitimamente impostas pelo ente
de maior amplitude. Esse é o entendimento adotado em decisão liminar proferida nos
Autos da Ação Civil Pública n. 5001058-60.2020.8.24.0081/SC, da Comarca de
Xaxim/SC, em 2 de abril de 2020:
Com efeito, a Constituição da República estabelece as competências
materiais e legislativas da União, dos Estados, do Município e do Distrito
Federal para organizar e concretizar fundamentos, princípios e objetivos
do Estado. Destarte, este federalismo cooperativo adotado pela
Constituição revela a competência comum dos entes federativos em
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determinadas matérias, definidas no art. 23, dentre as quais consta a
saúde. O art. 24, a seu turno, estabelece a atuação conjunta entre a
União e Estados-Membros na proteção e defesa da saúde no âmbito da
competência legislativa concorrente. Imperioso considerar, ainda, as
competências locais e suplementares dos municípios (art. 30, I e II, CF)
sobre assuntos de interesse local, que compreende a predominância do
interesse do Município sobre o do Estado ou da União. Assim, é verdade
que tanto Estados quanto Municípios possuem autonomia para editar
decretos a respeito da adoção de restrições epidemiológicas e sanitárias,
dentro da sua esfera de atuação. Todavia, os decretos municipais devem
se balizar nas orientações do decreto estadual, podendo tomar medidas
apenas mais restritivas. Ou seja, os municípios não podem autorizar
atividades proibidas pelo Estado. É imprescindível, portanto, a
coordenada ação entre os entes federados a fim de conjuntamente
construir soluções e garantir a efetividade das políticas políticas públicas
no combate àpropagação do vírus, de modo a conciliar e enrijecer pontos
coincidentes, e evitar o estado de incerteza e insegurança jurídica.
Outrossim, ressalta-se que em se tratando de competência concorrente,
deve prevalecer a norma de maior abrangência perante os interesses
públicos, isto é, aquela que melhor defenda o direito tutelado, in casu, o
direito à saúde. Nessa tessitura, o art. 196 da Constituição da República
estabelece que “A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido
mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de
doença e de outros agravos (...)”. No mesmo sentido, o art. 2 o da Lei n.
8.080/1990 dispõe que "A saúde é um direito fundamental do ser
humano, devendo o Estado prover as condições indispensáveis ao seu
pleno exercício". Logo, sendo o direito à saúde prerrogativa constitucional
indisponível, é dever do Estado garanti-lo através da formulação e
execução de políticas públicas que visem à redução de riscos de
doenças. Ora, é notório que a pandemia causada pela Covid-19 exige a
adoção de drásticas medidas que envolvem uma série de restrições a
direitos previstos na Constituição Federal. Contudo, ao confrontar
diferentes princípios é necessário dimensionar importância, peso e valor,
e ponderá-los à luz do caso concreto, de modo que, inevitavelmente, um
princípio prevalecerá sobre o outro. A Organização Mundial da Saúde
(OMS) já posicionou-se no sentido de que o isolamento social é
atualmente a medida eficaz a ser adotada. Igualmente a nota informativa
expedida pela Sociedade Brasileira de Ifectologia (SBI) em 24/03/2020
[...]
Ante o exposto, com fundamento no art. 300 do CPC e art. 12 da Lei n.
7.437/1985, defiro a liminar para determinar: a) A imediata suspensão
dos efeitos do Decreto Municipal n. 235, de 1º de abril de 2020, devendo
a parte requerida proceder a devida fiscalização do comércio local,
impedindo a abertura e ou efetuando o fechamento das lojas e
estabelecimentos considerados não essenciais deste Município que
estejam em contrariedade com os Decretos 525/2020 e 535/2020, e
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Portaria n. 214/2020; [..]
Esse também foi o entendimento exarado na Ação Civil Pública de Autos
n. 5003724-50.2020.8.24.0011/SC, da Comarca de Brusque/SC, em 7 de abril de 2020:
A Constituição da República, em seu art. 23, estabelece a competência
comum dos entes federativos (União, Estados, Distrito Federal e
Municípios) em determinadas matérias, dentre as quais a saúde (II). Em
seu art. 24, prevê a competência legislativa concorrente entre a União,
Estados e Distrito Federal na proteção e defesa da saúde (XII). Dentro
desta previsão, a competência legislativa da União é limitada a
estabelecer normas gerais, e não exclui a competência suplementar dos
Estados. Ainda, em seu art. 30, I e II, a Constituição Federal dispõe sobre
a competência legislativa dos Municípios para tratar de assuntos de
interesse local e suplementar a legislação federal e estadual no que
couber. Assim sendo, tanto Estados quanto Municípios possuem
competência para editar decretos a respeito da adoção de restrições
epidemiológicas e sanitárias, dentro das suas esferas de atuação.
Todavia, é evidente que os decretos municipais não podem violar as
determinações constantes dos decretos estaduais, sobretudo autorizando
atividades proibidas pelo Estado. Fixadas essas premissas e tendo em
vista que “A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido
mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de
doença e de outros agravos” (CF, art.196), é certo que, dentro da
competência legislativa concorrente, deve prevalecer a norma de maior
abrangência em relação ao interesse público, isto é, aquela que melhor
atenda ao direito à saúde.
[...]
Em afronta às normativas estaduais, o Prefeito Municipal de Brusque
anunciou hoje (https://portal.brusque.sc.gov.br), a edição do Decreto n.
8.580/2020, que autoriza a abertura de todo o comércio e atividades de
prestação de serviços, a partir das 8h de amanhã, 8 de abril de 2020, em
total desacordo com as orientações de saúde e regramentos emitidos
pela autoridade sanitária estadual. Extrai-se do portal oficial de notícias
que a medida foi tomada pelo Prefeito Municipal, APÓS o Governador
divulgar a prorrogação da suspensão das atividades por mais 5 dias.
Deste modo, evidenciada nos autos a presença do requisito legal
consistente na relevância do fundamento da demanda.
[...]
Ante o exposto, com fundamento no art. 300 do CPC e art. 12 da Lei n.
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7.437/1985, defiro a tutela de urgência para determinar: a) a imediata
suspensão dos efeitos do Decreto Municipal n. 8.580, de 7 de abril de
2020, devendo a parte requerida proceder a devida fiscalização quanto
ao estrito cumprimento dos Decretos 525/2020, 535/2020 e 550/2020, e
Portaria n. 214/2020;
Ainda, ressalte-se que o TJSC, em recentes decisões proferidas pelo
Des. Luiz Zanelato em agravos de instrumento interpostos pelo Estado de Santa
Catarina e pelo Ministério Público do Estado de Santa Catarina (n. 5008308-
96.2020.8.24.0000 e n. 5008310-66.2020.8.24.0000/SC, respectivamente) decidiu
também nesse sentido:
Salienta-se, num primeiro momento, que o Decreto n. 515, de 17 de março de
2020, ao declarar a situação de emergência em todo o território catarinense, não
visa, em seu art. 2º, I, invadir a competência municipal para regulamentação de
interesses locais, pois não tem por objetivo normatizar/regulamentar a atividade
de transporte municipal de passageiros em si, e tampouco a concessão da
atividade pelo Município. Mas, ao suspender, no âmbito do Estado de Santa
Catarina "a circulação de veículos de transporte coletivo urbano municipal,
intermunicipal e interestadual de passageiros", o faz expedindo norma de
caráter sanitário e epidemiológico com o fim superior de combater o
acentuado avanço da epidemia de COVID19 em solo estadual.
Na mesma linha do Decreto n. 515/2020, encontram-se aqueles que lhes
sucederam, - os Decretos n. 525/2020, n. 535/2020, n. 550/2020 -, todos eles
mantendo a restrição mencionada, e, por fim, o Decreto n. 554, este datado de
11-4-2020, que, dentre outras medidas, prorroga, até 30-4-2020, a suspensão da
circulação de veículos de transporte coletivo urbano municipal e intermunicipal de
passageiros.
Não é demais lembrar que a Constituição Federal, em seu art. 23, II,
estabelece a competência comum da União, dos Estados, do Distrito
Federal e dos Municípios, para os cuidados de saúde e assistência pública,
sendo que no art. 24 define como concorrente a competência da União, dos
Estados e do Distrito Federal para legislar sobre proteção e defesa da saúde
(inciso XII).
Aos Municípios, portanto, neste caso, compete apenas suplementar as
diretrizes gerais traçadas pela União e pelos Estados-membros, adequando-
as ao interesse local, porém, sem irem de encontro às normas federais e
estaduais.
A respeito, impõe-se trazer à luz trecho de recente decisão do Supremo
Tribunal Federal, proferida em 8-4-2020 pelo Ministro Alexandre de Moraes,
em sede da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental - ADPF
n. 672, assim esclarecendo:
[...]
Como se vê, do cotejo entre a orientação da Suprema Corte e os atos normativos
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que têm sido expedidos pelo Governador do Estado de Santa Catarina no intuito
de enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional,
enquanto traça estratégias de sobrevivência à pandemia de COVID-19, verifica-
se que o Estado nada mais tem feito do que exercer sua competência
normativa de traçar diretrizes gerais a serem seguidas em seu território,
impondo as medidas de isolamento/distanciamento social que, de acordo
com seus estudos técnicos e amparado em evidências científicas de
organismos inclusive internacionais, tem considerado como mínimas ao
enfrentamento dos riscos à saúde pública.
Aliás, é preciso ressaltar que o Estado, em que pese a existência, inclusive, de
críticas de algumas entidades de saúde e de representação da sociedade no que
tange à flexibilização prematura das medidas de isolamento social (cujo debate
aqui não encontra espaço) já vem, paulatinamente, autorizando a retomada das
atividades de diversos setores/ramos da economia, deixando a cargo dos
municípios a adoção de medidas mais restritivas naqueles em que estas se
mostrarem necessárias, ao mesmo tempo em que vem monitorando o
comportamento da curva de contágio e de mortalidade.
O Estado, portanto, já vem adotando medidas mais flexíveis, a fim de que os
municípios, suplementando as diretrizes estaduais de acordo com o
interesse local, adotem medidas mais restritivas conforme sua necessidade
e conveniência.
Inadmissível, no caso, é que os municípios adotem medidas mais brandas
que o ente estadual, indo na contramão da preservação da saúde pública e
proteção à vida das pessoas.
O contexto exige uma atuação coordenada entre Estado e Municípios, mesmo
porque não se pode considerar que o deferimento da medida pretendida em
primeiro grau restrinja-se à questão de mero interesse local, porquanto, vindo a
ocorrer uma superlotação dos leitos hospitalares existentes em Joinville,
certamente haverá o remanejamento de pacientes para unidades hospitalares de
outros municípios do Estado e, a depender da situação futura, colocando em
colapso todo o sistema de saúde estadual, cujas consequências serão
gravíssimas e, quiçá, incontornáveis.
[...]
Se o remédio prescrito pelo Poder Público é amargo, é preciso salientar que,
quanto maior consciência, respeito e disciplina demonstrar a população em
relação às medidas sanitárias adotadas, mais rápida será a superação do cenário
que se apresenta, sem que tenhamos que experimentar a tormentosa realidade
de outras nações que preferiram empregar medidas brandas e menos prudentes
no início, e, no presente, passam por restrições ainda maiores e mais
duradouradas que as determinadas em nosso território, por terem se deparado
com um cenário antes só concebido na ficção.
Quem, de sã consciência, imaginaria estar assistindo a viaturas policiais
transportando cadáveres para cremação em outros lugares, face à exaustão do
serviço funerário local, a exemplo da Itália, apenas para ficar em um país
desenvolvido e de primeiro mundo? Ou a cenas como as proporcionadas
recentemente em cidades do Equador?
A par de todas as considerações já traçadas, fato é que definir as atividades que
devem continuar operando e quais ainda devem permanecer suspensas, salvo
eventuais excessos e arbitrariedades cometidas pela administração, que
eventualmente transpusessem os parâmetros da conveniência e oportunidade, é
tarefa do Administrador Público, de acordo com os estudos técnicos que lhe
servem para avaliar os riscos à saúde decorrentes do retorno de cada atividade,
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traçando as estratégias do Poder Público para o combate à epidemia, mormente
quando pautado pelo princípio da precaução e da preservação da saúde e da
vida, não cabendo ao Judiciário, no caso, substituir-se ao administrador, para,
desprovido de bases técnicas e científicas específicas, afrouxar as medidas de
isolamento e de restrição à circulação de pessoas, o que pode, em médio prazo,
acarretar um risco à estrutura de acesso à saúde disponibilizada pelo Estado e à
própria saúde da população, colocando a perder todas as medidas já adotadas, o
trabalho empreendido e os sacrifícios já suportados pelo povo catarinense para
sobreviver à epidemia.
No mesmo sentido o TJRS, no julgamento do Agravo de Instrumento n.
5012921-95.2020.8.21.7000/RS, em 17 de abril de 2020, decidiu que os Municípios, no
âmbito de sua competência concorrente, só podem adotar normas de interesse local
quando forem mais restritivas que aquelas estaduais:
[...]
Não se tem dúvidas da gravidade e periculosidade do COVID19. A cada
minuto mais e mais pessoas no mundo todo vêm morrendo em
decorrência da infeção causada pelo CORONAVÍRUS. Os dados são
alarmantes e as previsões, catastróficas. Devido a gravidade do que
estamos enfrentando e as trágicas consequências de eventual agir
menos cauteloso, onde o que se deve ter em pauta é a preservação da
saúde e da vida humana, com razoabilidade e parcimônia, e sempre
amparados pela cientificidade, penso que o Poder Judiciário não pode
compactuar com intenções meramente políticas e econômicas, mas,
como se disse, amparado na ciência, no intuito de preservação da vida.
Considerando que até então muito pouco se sabe sobre o COVID-19,
mas, de outro lado, sabe-se sobre seu alto poder de contaminação e,
inclusive, de letalidade sobretudo a determinado grupo de pessoas
(idosos e pessoas com comorbidades), mas não somente a estes, o agir
cauteloso mostra-se ainda mais indicado. Trata-se, com efeito, de um
vírus muito agressivo, com índice de mutabilidade altíssimo, cuja
insegurança que desencadeia é proporcional à velocidade de seu poder
de contaminação e letalidade/gravidade. Tanto é que uma vacina
eventualmente descoberta, sobre a qual não se tem nenhum
conhecimento a nível de futuro próximo, lamentavelmente, poderá
rapidamente tornar-se obsoleta, em razão da velocidade das cepas virais.
É tempo, portanto, mais do que nunca, de um agir "low profile".
Sobretudo em se tratando de um vírus estranha e rapidamente surgido,
de consequências catastróficas, cuja certeza que se tem é a de que há
nisto tudo algo que nos escapa.
Com isto, entendo que os municípios, conhecedores de suas
realidades, têm competência para legislar sobre a matéria (e isto foi,
inclusive, decidido na data de ontem - 16/04/2020 pelo STF, cujo
inteiro teor do julgado ainda não foi publicado), desde que não o
façam de forma mais permissiva que Estado e União.
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No exercício de sua competência, portanto, de suplementar as
normas estaduais e federais, em se tratando do resguardo de
interesses locais, os municípios podem ser mais cautelosos e
rigorosos, permitindo o menos; de outro lado, não poderão editar
normas (Decretos, neste caso) mais permissivas que as Estaduais e
Federais. Obviamente, que o agir municipal deverá ser sempre
analisado caso a caso, pois, eventualmente, poderá restringir de tal
forma que torne a situação ainda mais temerária do que já está. E
com isto, da mesma forma, não poderá o Judiciário compactuar. Daí
a importância, reitero, de se analisar, sempre, caso a caso, com cautela,
prudência e responsabilidade. É que se uma vida for desnecessariamente
posta em risco, por falta de prudência, já teremos fracassado. E isto não
nos é permitido.
[...]
Portanto, considerando (1) o entendimento deste Julgador de que os
Municípios têm autonomia para editar normas próprias desde que
não sejam mais permissivas do que as normas Estaduais (apenas
normas mais restritivas); (2) que o recente julgado do STF ainda não
foi publicado, de sorte que não se conhece o seu inteiro teor; (3) que
posteriormente ao ingresso da presente demanda novos Decretos
Estaduais entraram em vigor, em especial os Decretos nº 55.177 e
55.184; (4) que o Decreto Estadual nº 55.184, ao conferir autonomia aos
municípios exige o cumprimento de regras técnicas a serem pré-
estabelecidas: estou em deferir parcialmete a tutela recursal, para o fim
de que sejam suspensas as diretrizes do Decreto Municipal nº 15.020,
naquilo que contraria o disposto no Decreto Estadual nº 55.154, com as
alterações dos Decretos Estaduais nº 55.177 e 55.184, devendo ser
especialmente considerada no que diz com a autonomia dos
Municípios para editar normas próprias, desde que obedeçam os
critérios a serem impostos pelo Estado do Rio Grande do Sul, nos
termos do disposto no DE nº 55.184/2020.
ISSO POSTO, recebo o recurso e DEFIRO O EFEITO SUSPENSIVO,
para suspender os efeitos do disposto item 'b' da decisão recorrida,
sobretudo no que diz com os itens b1', 'b3', 'b5', 'b6', 'b11' e 'b14' e
DEFIRO EM PARTE A ANTECIPAÇÃO DA TUTELA RECURSAL para o
fim de que sejam suspensas as diretrizes do Decreto Municipal nº 15.020,
naquilo que contraria o disposto no Decreto Estadual nº 55.154, com as
alterações dos Decretos Estaduais nº 55.177 e 55.184, devendo ser
especialmente considerada a autonomia dos Municípios para editar
normas próprias, desde que obedeçam os critérios a serem impostos pelo
Estado do Rio Grande do Sul, nos termos do disposto no DE nº
55.184/2020. [...]
1.4. Considerações fáticas complementares e pedido de urgência
Cabe registrar que mais do que uma opinião pessoal do mandatário ou
de quem quer que seja, é necessário resguardar a coerência e aplicabilidade das
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normas de direito que ainda vigem na República Federativa do Brasil, impedindo,
portanto, regras de quarentena mais permissivas que aquelas já determinadas pelo
Estado de Santa Catarina que, a toda evidência, no caso em concreto, visa impedir a
aglomeração e permanência desnecessária - não essencial - em praias e logradouros
públicos.
Especificamente quanto a este ponto, não há como deixar de se
destacar que a principal Praia desta cidade efetivamente é a Praia Central, adjacente a
Avenida Atlântica, donde nos seus quase 7 quilometros de extensão turistas, moradores
e visitantes, desde crianças até idosos, passeiam pela orla praticando atividade física e
caminhando rente ao mar, não só no verão como também no inverno, conforme a
matéria jornalística publicada em junho:
https://www.nsctotal.com.br/noticias/em-pleno-inverno-praias-do-litoral-ficam-movimentadas-neste-fim-de-
semana
Nessa cidade extremamente adensada é evidente que a "não
aglomeração e permanência de pessoas" e o "respeito ao distanciamento social"
destacado no Decreto Municipal n. 9876/20 soa de forma esdrúxula quando se sabe, por
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exemplo, que em qualquer dia de sol, ou mesmo sem vento, inúmeras pessoas descem
à praia para aproveitar justamente aquilo que fez este município crescer turística e
economicamente.
E mais, se em outras praias da Macrorregião da Foz do Rio Itajaí Açu e
até da grande Florianópolis não está permitida a concentração de pessoas para a prática
do surf, caminhadas ou exercícios físicos nos termos do Decreto Estadual, como impedir
que mais e mais turistas e visitantes venham até Balneário Camboriú curtir o "furo no
isolamento social" para tais práticas desportivas?
O distanciamento social é verdadeiramente utópico pois, em qualquer
caso, a aglomeração é absolutamente inevitável, e começa desde os elevadores e áreas
sociais dos inúmeros prédios desta cidade até as ruas para chegar na praia com seu
calçadão, tradicional ponto de encontro de inúmeros grupos, e, finalmente pela orla que,
nem sempre, conta com a maré baixa.
Se já está difícil manter o isolamento social mantendo as pessoas nas
suas residências sempre que desnecessário irem as ruas que dirá se permitido o acesso
e permanência na praia para "a caminhada e corrida com uso de máscara desde que
respeitando o distanciamento social."
De que adianta manter a saúde física e mental nesse momento se, daqui
a pouco, poderá estar ingressando em um sistema de saúde colapsado porque se
contaminou durante a sua caminhada, corrida e passeio? Qual a necessidade real disso
em termos de saúde pública?
Algumas pessoas, muitas vezes contando com o bom senso dos seus
governantes, apenas esperam um "aval" para que possam sair deste isolamento que
ocorre em escala mundial, menosprezando os efeitos e o perigo da Pandemia. O
Decreto ora questionado passa exatamente essa mensagem "oficial" de "falsa liberdade"
e não leva a outra situação que não a de risco à saúde pública local.
Decisões irrefletidas, que busquem mais agradar a opinião pública ou
senso comum, sobretudo em tempos em que redes sociais influenciam o comportamento
e atos administrativos, podem custar vidas e acentuar o principal problema da COVID-19
que é, justamente, a sobrecarga nos serviços de Saúde, os quais, como sabe bem o
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Município de Balneário Camboriú e o próprio Juízo da Vara da Fazenda, é objeto de
intensa e complexa discussão jurídica em tempos normais de prestação de serviços à
saúde, que dirá agora com a COVID-19.
Por isso é imprescindível ter em vista, em toda essa análise, que já
há falta de leitos de UTI e isolamento em toda região da Foz do Rio Itajaí, que,
segundo o último boletim epidemiológico do Ministério da Saúde, é colocada
como uma das regiões de saúde do país com maior número de mortes por
habitantes (boletim anexo).
Não se concebe, especificamente quanto a esse ponto, um
distanciamento do juízo a realidade local sob a sua própria jurisdição ao asseverar
que se espera que o Município de Balneário Camboriú, esteja preparado para o
"pior".
Hoje mesmo, o Ministério Público interpôs uma petição perante a mesma
autoridade judiciária, nos autos n. n. 5009550-12.2019.824.0005 que trata do
fechamento das portas de urgência e emergência do Hospital Municipal Ruth Cardoso
para a região, no seguinte sentido:
Nesse contexto, verifica-se que a Microrregião da Foz do Rio Itajaí conta
atualmente com apenas 5 leitos de isolamento semi-intensivo, 4 leitos de UTI e
1 leito de isolamento para estabilização de pacientes disponíveis.
Embora o Estado de Santa Catarina tenha anunciado a contratação de
empresa para a instalação de hospital de campanha na cidade de Itajaí, com
100 leitos para atendimento da população da região, e que se daria em 30
(trinta) dias, foi anunciado na data de ontem o cancelamento da medida para
realização de novo processo licitatório, ou seja, não há previsão para instalação
4do referido hospital e da ampliação do número de leitos por esta medida .
Assim, com base nos dados apresentados pelo Município de Balneário
Camboriú em relação ao número de leitos disponíveis, é inviável que o Estado
de Santa Catarina aguarde o esgotamento total das vagas de leitos e dos
próprios profissionais de saúde para que sejam estabelecidos planos concretos
de atuação, de execução imediata, para ampliação da estrutura de atendimento
disponível à população.
É imprescindível, nesse cenário, que o Ministério Público e o Poder Judiciário
intervenham a fim de impor ao requerido a obrigação de fazer consistente na
imediata tomada de providências a fim de que sejam estabelecidos planos de
atuação que possibilitem sua execução imediata caso verificado o
4 https://www.sc.gov.br/noticias/temas/coronavirus/coroanvirus-em-sc-governo-do-estado-lanca-
novo-edital-para-contratacao-de-hospitais-de-campanha