Este documento propõe uma Ação Direta de Inconstitucionalidade contra uma lei estadual que versa sobre critérios para aplicação de penalidades de trânsito. A lei estadual é inconstitucional porque a Constituição Federal atribui competência privativa à União para legislar sobre trânsito e transporte, por se tratar de matéria de interesse nacional. Precedentes do STF confirmam a competência exclusiva da União sobre a matéria.
Protocolo Pisc Protocolo de Rede Intersetorial de Atenção à Pessoa Idosa em S...
Ação Direta de Inconstitucionalidade
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EXCELENTÍSSIMOS DESEMBARGADORES DO ÓRGÃO ESPECIAL DO
EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SANTA CATARINA
Número do SIG n. 08.2018.00154928-9
O PROCURADOR-GERAL DE JUSTIÇA e o COORDENADOR DO
CENTRO DE APOIO OPERACIONAL DO CONTROLE DE
CONSTITUCIONALIDADE – CECCON, a quem foram delegadas atribuições por
meio da Portaria n. 2.899/2016/PGJ, vem perante o ÓRGÃO ESPECIAL DESTE
EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA, com fulcro no art. 85, III e VII, da
Constituição Estadual, e na Lei Estadual n. 12.069/2001, propor
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE
em face da Lei n. 17.403, de 21 de dezembro de 2017, do Estado de
Santa Catarina, por violação ao artigo 22, inciso XI, da Constituição da República,
norma de reprodução obrigatória pela Constituição do Estado de Santa Catarina.
I. Da competência da União para legislar sobre trânsito e transporte
Com o propósito de restringir o objeto desta ação direta, transcreve-se o
dispositivo que suscitou a presente ação:
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Art. 1º O Departamento Estadual de Trânsito do Estado de Santa
Catarina (DETRAN/SC), nos casos de aplicação da penalidade de
suspensão do direito de dirigir, deverá instaurar os processos
administrativos respectivos dentro do mesmo exercício civil em que
ocorrer a notificação da imposição da penalidade.
Parágrafo único. Não efetuada a instauração do processo
administrativo no prazo previsto no caput deste artigo, a autoridade de
trânsito promoverá o arquivamento com a baixa do registro da
penalidade.
Art. 2º O Departamento Estadual de Trânsito do Estado de Santa
Catarina (DETRAN/SC) deverá disponibilizar sistema de cadastro de
usuários em seu site, onde o usuário cadastrado detentor de
Carteira Nacional de Habilitação definitiva, poderá optar por receber
notificação via e-mail, caso atinja ao limite prudencial de 15 (quinze)
pontos de infrações de trânsito em período de 12 (doze) meses.
Trata-se de lei do Estado de Santa Catarina que versa sobre
critérios para aplicação da penalidade de suspensão do direito de dirigir,
com previsão específica de limitação temporal que ensejará o
arquivamento do procedimento administrativo em caso de descumprimento,
além de impor à autoridade de trânsito a obrigação de notificar o condutor
acerca da aproximação da possibilidade de imposição da referida
penalidade, em razão do número de infrações que já lhe foram atribuídas.
Olvida-se o legislador, entretanto, que não pode haver
diferenciação entre as normas de trânsito aplicadas no Estado de Santa
Catarina e nos demais Entes Federativos, razão pela qual a Constituição
da República acertadamente incluiu o trânsito entre as matérias sobre as
quais compete privativamente à União legislar.
Afinal, decorre da forma de Estado federal adotada pela República
brasileira, que compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os
Municípios, todos autônomos, nos termos da Constituição1, a repartição de
competência entre si, que consiste “na atribuição, pela Constituição Federal, a
1 CF. Art. 18. A organização político-administrativa da República Federativa do Brasil compreende
a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, todos autônomos, nos termos desta
Constituição.
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cada ordenamento de uma matéria que lhe seja própria”2.
Nessa linha, à União foi atribuída a competência privativa para legislar
sobre trânsito e transporte, nos termos do artigo 22, inciso XI, da Constituição da
República: "Compete privativamente à União legislar sobre: XI - trânsito e
transporte".
Isso porque a matéria referida é de inegável interesse nacional, como
também o direito penal ou o direito civil. O modelo federativo adotado pelo Brasil
não admite que uma conduta seja autuada como transgressão de trânsito no
Amazonas e não o seja em São Paulo, como não aceita que um contrato seja
válido na Bahia e não seja no Rio de Janeiro, ou que uma pessoa seja presa em
Santa Catarina por um crime que não existe no Rio Grande do Sul.
Os Entes Federados possuem, portanto, autonomia, o que não significa
independência. A República Federativa do Brasil é una e as normas que
interfiram no cotidiano do cidadão mediante a imposição de penalidades ou as
formalidades exigidas para sua aplicação não podem variar entre Estados ou
Municípios.
No caso em análise, afinal, o sistema de transporte rodoviário é o meio de
transporte por excelência da população brasileira, estendendo-se diretamente
entre municípios e Estados. Dentro deste contexto, aceitar a promulgação de
legislação local acerca dos critérios de autuação geraria a seguinte peculiaridade:
um cidadão que fosse submetido a processo administrativo para suspensão de
seu direito de dirigir em Santa Catarina no exercício civil seguinte ao da autuação
não seria mais responsabilizado pela transgressão eventualmente cometida,
enquanto um segundo cidadão na mesma situação, mas no Estado do Paraná,
não teria a mesma benesse, considerando a suposta inexistência de legislação a
dispor sobre o tema.
2 MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso
de direito constitucional. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 849.
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Ora, tal contingente não geraria apenas uma violação ao princípio da
isonomia, como colocaria todos os usuários do sistema em uma extrema situação
de insegurança jurídica, porquanto seria possível que existissem no Brasil uma
infinidade de regras de trânsito que seriam alteradas conforme fossem
transpostos os limites dos Estados ou municípios, razão pela qual a Constituição
da República estabeleceu a competência privativa da União para legislar sobre
trânsito.
Trata-se, portanto, de regra que visa a preservar as relações do Estado
com os particulares, razão pela qual o Supremo Tribunal Federal, em julgados
recentes, aplicou mais um vez o entendimento pacífico de que compete apenas à
União dispor sobre a matéria:
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI N. 3.469/2007 DE
MATO GROSSO DO SUL. REGRAS PARA A FISCALIZAÇÃO E
IMPOSIÇÃO DE NOTIFICAÇÕES POR AGENTES PÚBLICOS.
COMPETÊNCIA PRIVATIVA DA UNIÃO PARA LEGISLAR SOBRE
TRÂNSITO. EXIGÊNCIA DE REQUISITOS INEXISTENTES NA
LEGISLAÇÃO NACIONAL. AUSÊNCIA DA LEI COMPLEMENTAR
PREVISTA NO PARÁGRAFO ÚNICO DO ART. 22 DA CONSTITUIÇÃO
DA REPÚBLICA. AÇÃO JULGADA PROCEDENTE PARA DECLARAR A
INCONSTITUCIONALIDADE DA LEI N. 3.469/2007 DE MATO GROSSO
DO SUL.3
(grifou-se)
EMENTA AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI Nº
2.131/2000 do ESTADO DE MATO GROSSO DO SUL.
PARCELAMENTO DE MULTAS DE TRÂNSITO. INVASÃO DA
COMPETÊNCIA PRIVATIVA DA UNIÃO. ART. 22, XI, DA
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. INCONSTITUCIONALIDADE.
PRECEDENTES. Segundo a jurisprudência desta Casa, é
inconstitucional dispositivo de lei estadual que faculta o pagamento
parcelado de multas decorrentes de infrações de trânsito, por invadir a
competência privativa da União para legislar sobre a matéria (art. 22, XI,
da Constituição da República). Precedentes: ADI 4.734/AL, Relatora
Ministra Rosa Weber, julgamento em 16.5.2013, DJe-182 17.9.2013; ADI
3.708/MT, Relator Ministro Dias Toffoli, julgamento em 11.4.2013,
DJe-086 09.5.2013; ADI 3.196/ES, Relator Ministro Gilmar Mendes,
julgamento em 21.8.2008, DJe-211 07.11.2008; ADI 3.444/RS, Relatora
3
ADI 4879, Relator(a): Min. CÁRMEN LÚCIA, Tribunal Pleno, julgado em 30/06/2017, PROCESSO
ELETRÔNICO DJe-195 DIVULG 30-08-2017 PUBLIC 31-08-2017.
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Ministra Ellen Gracie, julgamento em 16.11.2005, DJ 03.02.2006; ADI
2.432/RN, Relator Ministro Eros Grau, julgamento em 09.3.2005, DJ
26.08.2005; ADI 2.814/SC, Relator Ministro Carlos Velloso, julgamento
em 15.10.2003, DJ 05.12.2003; ADI 2.644/PR, Relatora Ministra Ellen
Gracie, julgamento em 07.8.2003, DJ 29.08.2003. Ação direta de
inconstitucionalidade julgada procedente.4 (grifou-se)
Recorde-se, nesse ponto, o Ministro Joaquim Barbosa no julgamento da
Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 3.121, quando esclareceu que à União
“cabe regular, definir e delimitar a organização do trânsito, as infrações e as
penalidades. Aos estados e municípios somente caberia regulamentar
questões específicas de trânsito se existisse lei complementar autorizadora
da edição de leis estaduais e municipais sobre o tema, conforme determina o
parágrafo único do art. 22 da Constituição”5. (Grifou-se)
Inexiste, contudo, lei complementar nacional que autorize Estados e
municípios a disciplinarem critérios para a realização de fiscalização de trânsito,
tampouco autorizando a instituição de prazo diferenciado para aplicação de
penalidades de trânsito, de modo que esses entes estão submetidos às
disposições do Código de Trânsito Brasileiro6, não podendo dispor de forma
diversa.
Vê-se, portanto, que a Lei Estadual n. 17.403/2017, viola a competência
privativa da União para dispor sobre o trânsito quando institui critério diferenciado
daqueles previstos no Código de Trânsito Brasileiro acerca da aplicação da
penalidade de suspensão do direito de dirigir, em afronta ao artigo 22, inciso XI,
da Constituição da República.
4
ADI 5283, Relator(a): Min. ROSA WEBER, Tribunal Pleno, julgado em 18/05/2017, PROCESSO
ELETRÔNICO DJe-114 DIVULG 30-05-2017 PUBLIC 31-05-2017.
5 ADI 3121, Relator(a): Min. JOAQUIM BARBOSA, Tribunal Pleno, julgado em 17/03/2011,
DJe-072 DIVULG 14-04-2011 PUBLIC 15-04-2011 EMENT VOL-02504-01 PP-00019 RT v. 100, n.
909, 2011, p. 378-383.
6 Lei n. 9.053/1997.
6. EstedocumentoécópiadooriginalassinadodigitalmenteporSANDROJOSENEISEDURVALDASILVAAMORIM.Paraconferirooriginal,acesseositehttp://www.mpsc.mp.br,informeoprocesso
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II – Da possibilidade de realização do controle de constitucionalidade pelo
Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina
Ressalte-se, nesse ponto, que a ação direta de inconstitucionalidade
perante o Tribunal de Justiça de Santa Catarina é viável a despeito da
inexistência de norma expressa que delimite as competências privativas da União
na Constituição do Estado de Santa Catarina.
Isso porque as normas referentes à repartição de competências
constitucionais são normas de reprodução obrigatória, as quais são
"disposições da Carta da República que, por pré-ordenarem diretamente a
organização dos Estados-membros, do Distrito Federal e/ou dos Municípios,
ingressam automaticamente nas ordens jurídicas parciais editadas por esses
entes federativos. Essa entrada pode ocorrer, seja pela repetição textual do texto
federal, seja pelo silêncio dos constituintes locais – afinal, se sua absorção é
compulsória, não há qualquer discricionariedade na sua incorporação pelo
ordenamento local."7
Assim, a despeito das normas sobre repartição de competência
estabelecidas pela Constituição da República não estarem expressamente
reprisadas na Constituição do Estado de Santa Catarina, entende-se que
implicitamente a compõe, razão pela qual é possível o controle de
constitucionalidade de leis estaduais e municipais em face de sua transgressão
perante o Tribunal de Justiça.
III. Requerimentos
Em razão do exposto, requer-se:
7
STF. Ag. Reg. na Reclamação n. 17954, rel. Ministro Luis Roberto Barroso, Primeira Turma, j.
21-10-2016.
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a) a obtenção das informações das autoridades das quais emanou a lei
ora impugnada, a teor do previsto no art. 6º da Lei n. 12.069/01;
b) a citação do Procurador-Geral do Estado, conforme determina o art.
85, §4º, da Constituição Estadual e o art. 8º da Lei n. 12.069/01;
c) a abertura de vista dos autos à Procuradoria-Geral de Justiça, para
manifestação, nos termos do art. 85, §1º, da Constituição Estadual e do art. 8º da
Lei n. 12.069/01;
d) a procedência do pedido, a fim de se declarar a inconstitucionalidade
da Lei n. 17.403, de 21 de dezembro de 2017, do Estado de Santa Catarina, por
violação ao artigo 22, inciso XI, da Constituição da República, norma de
reprodução obrigatória pela Constituição do Estado de Santa Catarina; e
e) ao final, a determinação das comunicações previstas no art. 85, §2º, da
Constituição do Estado de Santa Catarina e do art. 16 da Lei n. 12.069/01.
Florianópolis,15/05/2018.
Sandro José Neis
Procurador-Geral de Justiça
Durval da Silva Amorim
Procurador de Justiça
Coordenador do CECCON