O documento trata de uma ação civil pública proposta pelo Ministério Público contra o Município de Itajaí devido à pandemia de COVID-19. Ele descreve a situação da pandemia no Brasil e em Santa Catarina, com a adoção de medidas de distanciamento social. Também menciona decretos estaduais que suspenderam as aulas presenciais e estabeleceram políticas de enfrentamento da pandemia de forma regionalizada.
Protocolo Pisc Protocolo de Rede Intersetorial de Atenção à Pessoa Idosa em S...
Decreto estadual suspende aulas presenciais em SC
1. Este documento é cópia do original assinado digitalmente por CESAR AUGUSTO ENGEL. Para conferir o original, acesse o site http://www.mpsc.mp.br, informe o processo 08.2019.00391929-0 e o código
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4ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE ITAJAÍ
INFÂNCIA E JUVENTUDE
EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ DE DIREITO DA VARA DA INFÂNCIA,
JUVENTUDE E ANEXOS DA COMARCA DE ITAJAÍ
URGENTE (COVID-19)
O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA
CATARINA, por sua representante em exercício na 3ª
Promotoria de Justiça desta Comarca de Itajaí/SC, no
exercício de suas atribuições legais e com fundamento nos
arts. 127, caput, 129, incisos II e III; art. 1º, incisos I e IV,
da Lei 7.347/85; art. 90, inciso VI, letras "a", "b" e "c", da
Lei Complementar Estadual n. 738/19 e art. 319 e
seguintes do Código de Processo Civil (CPC), vem,
respeitosamente, perante Vossa Excelência, propor
AÇÃO CIVIL PÚBLICA COM PEDIDO LIMINAR DE
ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA, em face de:
Município de Itajaí, pessoa jurídica de direito público
interno, inscrito no CNPJ nº 83.102.277/0001-52, com sede
administrativa na Rua Alberto Werner, nº 100, Vila
Operária, Itajaí/SC, representado por seu Prefeito
Municipal, VOLNEI JOSÉ MORASTONI, e-mail:
volnei@volneimorastoni.com.br, tendo por substrato os
fundamentos fáticos e jurídicos a seguir delineados:
1) SÍNTESE FÁTICA:
Inicialmente, impende ressaltar ser fato público e notório a
declaração da Organização Mundial de Saúde (OMS), quanto à pandemia da
COVID-19, doença causada pelo coronavírus (Sars-Cov-2). O termo “pandemia”
foi adotado para denominar uma enfermidade epidêmica amplamente
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disseminada para além das fronteiras de um país.
Também é fato notório, que o contágio por coronavírus tem
se expandido de maneira vertiginosa no Brasil e no mundo. Nesse viés, cumpre
frisar que há consenso na comunidade científica, bem como nas práticas
adotadas ao redor do globo, que para a contenção e a amortização do ritmo de
espalhamento da COVID-19, as medidas mais eficazes são aquelas voltadas ao
distanciamento social.
Diante desse panorama, foi promulgada, em âmbito
nacional, a Lei Federal n. 13.979/2020, norma que instituiu as principais
medidas sanitárias e sociais de combate ao novo coronavírus. A iniciativa
federal contemplou, ainda, a edição da Portaria n. 356/2020/GM/MS, que
regulamentou a Lei n. 13.979/2020, disciplinando a adoção e a aplicação das
medidas previstas; a Portaria Interministerial n. 5/2020/MS/MJSP (recentemente
revogada), que dispunha sobre o caráter compulsório das medidas previstas na
Lei n. 13.979/2020; e a Medida Provisória n. 926/2020, que permite a restrição
excepcional e temporária, conforme recomendação técnica e fundamentada, por
rodovias, portos ou aeroportos, de entrada e saída do País, bem como de
locomoção interestadual e intermunicipal.
O Estado de Santa Catarina, reconhecendo a situação de
emergência presente em todo o território catarinense, diante da expansão dos
casos de infecção por coronavírus e, desde a data de 17 de março de 2020,
registro do primeiro caso de transmissão comunitária quando não é mais
possível detectar a origem da transmissão , publicou, na trilha da legislação
federal, para fins de prevenção e enfrentamento da COVID-19, os Decretos
Estaduais n. 509/2020, 515/2020, 521/2020, 525/2020 e 535/2020 e 550/2020,
estabelecendo as medidas específicas para o controle da pandemia em Santa
Catarina (restrições de atividades, serviços, circulação, entre outros).
O ato normativo do Governo do Estado que está
vigente é o Decreto n. 562/2020, editado em 17 de abril de 2020, que
1compila as regras contidas nos decretos antes referidos .
A redação original, porém, sofreu sucessivas alterações,
1 Decreto 525/2020, atualizado, disponível em: https://leisestaduais.com.br/sc/decreto-n-525-2020-
santa-catarinadispoe-sobre-novas-medidas-para-enfrentamento-da-emergencia-de-saude-publica-de-
importância-internacional-decorrente-docoronavirus-e-estabelece-outras-providencias
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promovidas pelos Decretos ns. 587/2020, 630/2020, 651/2020, 719/2020,
724/2020 e 740/2020, os quais, em especial o de n. 630/2020, para além de
preverem novas medidas de enfrentamento, impuseram mudança significativa
na condução da política pública até então coordenada pelo Governo Estadual.
Com a edição do Decreto n. 630/2020, em 1º de junho de
2020, o Estado de Santa Catarina estabeleceu que as ações de enfrentamento
da pandemia seriam conduzidas de forma regionalizada, mediante
compartilhamento das decisões e responsabilidades entre o Estado e os
Municípios, o que permitiria adaptar as medidas à realidade local, a partir de
critérios técnicos e científicos que garantam a segurança da retomada das
atividades de circulação de pessoas até então suspensas.
A regionalização da política pública de saúde foi, de fato,
oportuna, seja porque possibilita o diálogo e o compartilhamento de
responsabilidades entre as diferentes esferas de gestão do SUS, seja porque
adapta as medidas de distanciamento social à realidade de transmissão do vírus
de cada região do Estado.
Como é de conhecimento notório, os serviços de saúde
funcionam de forma regionalizada. Conforme informações disponíveis no site da
Secretaria de Estado da Saúde, o Estado está dividido em Regiões e
2Macrorregiões de Saúde. São, ao todo, 16 Regiões de Saúde tomadas como
referência para essa análise das peculiaridades epidemiológicas locais e
adequação das medidas. Dada essa divisão administrativa em regiões, para as
quais é realizado o dimensionamento dos serviços públicos de saúde, é, de
fato, inviável o planejamento da política pública de saúde de forma isolada por
cada Município.
Em relação à educação, que é o objeto da presente ação
civil pública, consoante será demonstrado adiante, inúmeros Decretos também
foram editados pelo Estado de Santa Catarina, o qual, baseado em critérios
técnicos e cientificos, sempre refutou a possibilidade de retorno das aulas
presenciais.
Nesse sentido, é a seguinte, a linha sucessória e temporal
dos decretos editados pelo governo do estado, que determinaram a suspensão
2 Disponível em http://www.saude.sc.gov.br/index.php/documentos/informacoes-gerais/12882-
regionais-da-saudesc/file. Acesso em 13/04/2020.
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médio, educação de jovens e adultos (EJA) e ensino técnico, sem
prejuízo do cumprimento do calendário letivo, o qual deverá ser objeto
de reposição oportunamente;
Por fim, no último dia 17 de agosto de 2020, as Secretarias
Estaduais de Saúde e de Educação editaram a Portaria Conjunta nº 612/2020,
prevendo:
Art. 1º Prorrogar, até 12 de outubro de 2020, a suspensão das aulas
presenciais nas unidades das redes pública e privada de ensino,
municipal, estadual e federal, relacionadas a educação infantil, ensino
fundamental, ensino médico, educação de jovens e adultos (EJA) e
ensino profissional em todos os níveis e modalidades, sem prejuízo do
cumprimento do calendário letivo, em todo território catarinense
Apesar da edição de tais atos, o que se deu em face do
aumento exponencial de casos de COVID-19 no território catarinense, que,
certamente, multiplicaria pela aglomeração de crianças e adolescentes nas
instituições de ensino, caso liberadas as atividades pedagógicas presenciais,
para surpresa deste Órgão do Ministério Público, após consulta ao sítio da
Prefeitura de Itajaí (www.Itajai.sc.gov.br), constatou-se que o Município de Itajaí,
3no dia 20 de agosto de 2020, editou o Decreto nº 11.982 (Anexo 1 )para
atuarem como locais de entretenimento”.
De plano, da análise da citada norma, constatou-se que o
Município não apresentou qualquer estudo técnico-cientifico, apto a justificar a
edição daquele, se limitando a referir que escolas privadas estariam adaptando
as suas estruturas para funcionar como "atividades recreativas" e, portanto,
estariam autorizadas a funcionarem desde que cumpridas as medidas sanitárias
em Portaria a ser editada pela Secretaria Municipal de Saúde.Vejamos:
Art. 1º Ficam liberadas, a partir de 01 de setembro de 2020, as
atividades recreativas a serem desenvolvidas nos Centros de
Educação Infantil, desde que adaptados para atuarem como
locais de entretenimento, para crianças de 0 à 06 anos, em todo
o território do Município de Itajaí.
Art. 2º O funcionamento dos Centros de Educação Infantil como
locais de entretenimento condiciona-se à adaptação de suas
estruturas, à solicitação de inclusão das atividades recreativas
no Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas - CNPJ e ao
cumprimento das medidas sanitárias prescritas por Portaria a ser
editada pela Secretaria Municipal de Saúde.
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https://www.itajai.sc.gov.br/download_noticia.php?id=969, acesso em 28/08/2020.
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Com base nas justificativas supracitadas, o Decreto
Municipal dispôs o seguinte:
Art. 2º O funcionamento dos Centros de Educação Infantil como
locais de entretenimento condiciona-se à adaptação de suas
estruturas, à solicitação de inclusão das atividades recreativas
no Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas - CNPJ e ao
cumprimento das medidas sanitárias prescritas por Portaria a ser
editada pela Secretaria Municipal de Saúde.
§ 1º A participação de crianças em atividades recreativas, no
âmbito dos Centros de Educação Infantil, adaptados para
atuarem como locais de entretenimento, deverá ser precedida da
assinatura de termo de responsabilidade pelos pais ou
responsáveis.
§ 2º As atividades recreativas serão desenvolvidas em grupos de
no máximo 05 (cinco) crianças para um recreador.
§ 3º Os Centros de Educação Infantil, como locais de
entretenimento, poderão funcionar de segunda-feira à sábado,
das 07h às 19h.
Art. 3º Entende-se por “atividades recreativas” aquelas
desenvolvidas pelos Centro de Educação Infantil buscando
promover o lazer e a diversão das crianças de 0 à 06 anos, de
modo a potencializar o desenvolvimento emocional e psíquico
das mesmas face ao isolamento em virtude da pandemia
decorrente do coronavírus (COVID-19).
Art. 4º Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação.
Diante da publicação do apontado Decreto, a Secretaria
Municipal de Saúde editou a Portaria SMS/DVS 32, de 26 de agosto de 2020,
instituindo o regulamento técnico de funcionamento dos centros de educação
infantil particulares, adaptadas como centros de entretenimento no município de
Itajaí, a qual dispõe:
Art. 1º A presente Portaria se aplica aos estabelecimentos de
educação infantil no município de Itajaí que possuírem atividade
recreativa no Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas CNPJ,
nos termos do Decreto Municipal n. 11.982, de 20 de agosto de
2020, em seu art. 2º, caput.
Art. 2º O funcionamento das atividades recreativas são
condicionadas ao cumprimento, implementação e aplicação das
normas e medidas de mitigação e prevenção da transmissão do
Covid-19.
[...]
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Os órgãos de controle serão acionados a fim de que a medida seja
revista pelo município, primando pela manutenção da saúde pública
de toda a população.
(Disponível em:
http://www.sed.sc.gov.br/secretaria/imprensa/noticias/30752-nota-oficial-3,
acesso em 20 de agosto de 2020, às 17h51min)
Desta feita, tais fatos justificam a adoção de providências
por parte do Ministério Público de Santa Catarina, visando a revogação de tais
disposições contidas no Decreto nº 11.982 do Município de Itajaí, bem como da
Portaria da Secretaria Municipal de Saúde n. 32.
2) DO DIREITO:
2.1) COMPULSORIEDADE DA OBEDIÊNCIA ÀS
MEDIDAS PREVISTAS NO DECRETO N. 562/2020
Desde logo, é preciso ressaltar que todas as providências
traduzidas no Decreto Estadual n. 562/2020 são compulsórias aos agentes
públicos e/ou privados a quem seu cumprimento incumba.
O fundamento de tal obrigatoriedade se encontra na
Portaria Interministerial n. 5, de 17 de março de 2020, editada pelos Ministros de
Estado da Justiça e Segurança Pública e da Saúde, que “dispõe sobre a
compulsoriedade das medidas de enfrentamento da emergência de saúde
pública previstas na Lei n. 13.979, de 6 de fevereiro de 2020”.
Nessa linha, o ato administrativo em questão, com suporte
constitucional e infraconstitucional, estabelece, entre outros, que:
I) O descumprimento das medidas adotadas pela autoridade sanitária,
conforme previstas no art. 3ª da Lei nº 13.979, de 2020, acarretará a
responsabilização civil, administrativa e penal dos agentes infratores,
inclusive do servidor público que concorrer para o descumprimento (art.
3º, caput e § 1º, da Portaria Interministerial MS/MJSP n. 5/2020);
II) O descumprimento da medida de quarentena poderá sujeitar os
infratores às sanções penais previstas nos arts. 268 e 330 do Decreto-
lei n. 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal, se o fato não
constituir crime mais grave; (art. 5º da Portaria Interministerial MS/MJSP
n. 5/2020);
III) Os gestores locais do Sistema Único de Saúde - SUS, os
profissionais de saúde, os dirigentes da administração hospitalar e os
agentes de vigilância epidemiológica poderão solicitar o auxílio de força
policial nos casos de recusa ou desobediência por parte de pessoa
submetida às medidas de quarentena e isolamento social. (art. 6º da
Portaria Interministerial MS/MJSP n. 5/2020);
IV) A autoridade policial poderá lavrar termo circunstanciado por
infração de menor potencial ofensivo em face do agente que for
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surpreendido na prática dos crimes mencionados nos art. 4º e art. 5º, na
forma da legislação processual vigente, a quem, porém, não se imporá
prisão caso assine o Termo Circunstanciado; (art. 7º da Portaria
Interministerial MS/MJSP n. 5/2020); V) Visando a evitar a propagação
da COVID-19 e no exercício do poder de polícia administrativa, a
autoridade policial poderá encaminhar o agente à sua residência ou
estabelecimento hospitalar para cumprimento das medidas de
isolamento social, exame ou tratamento compulsório (art. 3º da Lei n.
13.979/2020, conforme determinação das autoridades sanitárias. (art. 8º
da Portaria Interministerial MS/MJSP n. 5/2020).
O Decreto nº 562/2020, portanto, possui garantidas as vias
coercitivas para sua execução, na forma dada pela Portaria Interministerial n.
5/2020.
2.2) O LIVRE COMÉRCIO EM SITUAÇÃO DE
EMERGÊNCIA DE SAÚDE PÚBLICA
O artigo 1º da Constituição Federal eleva à condição de
princípio fundamental, a livre iniciativa, ao prever que “a República Federativa do
Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito
Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como
fundamentos: [...] IV os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa”.
(grifou-se)
A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988,
em seu artigo 170, dispõe que “a ordem econômica, fundada na valorização do
trabalho humano e na livre iniciativa", tem por fim assegurar a todos existência
digna, conforme os ditames da justiça social.
O Princípio da Livre Iniciativa é considerado fundamento da
ordem econômica e atribui à iniciativa privada, o papel primordial na produção
ou circulação de bens ou serviços, constituindo a base sobre a qual se constrói
a ordem econômica (CRFB/88, art. 173).
No entanto, a CRFB não coíbe a intervenção estatal na
produção ou circulação de bens ou serviços, prevendo em seu art. 174 que o
Estado tem papel primordial como agente normativo e regulador da atividade
econômica, exercendo as funções de fiscalização, incentivo e planejamento, de
acordo com a lei, no sentido de evitar irregularidades.
Nesse aspecto, como qualquer princípio, a livre iniciativa
não pode ser considerada absoluta.
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Doutro norte, a Constituição da República contempla a
saúde como direito social do cidadão, atribuindo ao Estado o dever de garantir-
lhe, in verbis:
Art. 6º. São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, o lazer, a
segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância,
a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.
Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido
mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco
de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às
ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.
Visando concretizar os mandamentos constitucionais, o
legislador estabeleceu preceitos que tutelam e garantem o direito à saúde.
Neste sentido, o art. 2º da Lei n. 8.080/1990 dispõe:
Art. 2º. A saúde é um direito fundamental do ser humano, devendo o
Estado prover as condições indispensáveis ao seu pleno exercício.
§1º. O dever do Estado de garantir a saúde consiste na formulação e
execução de políticas econômicas e sociais que visem à redução de
riscos de doenças e de outros agravos e no estabelecimento de
condições que assegurem o acesso universal e igualitário às ações e
aos serviços para a sua promoção, proteção e recuperação.
A dignidade da pessoa humana foi inserida na Constituição
Federal vigente, com status de fundamento do Estado Democrático de Direito
(art. 1º, III), a impor-se como vetor do ordenamento jurídico e valor orientador da
interpretação do sistema constitucional.
Está-se diante de uma pandemia, e a atividade econômica,
sem descurar de sua importância, não pode sobressair sobre a vida humana.
Não há economia sem a vida humana.
Não se desconsidera o caos econômico vivenciado pela
iniciativa privada, inclusive as instituições de ensinos privadas, as quais, com a
suspensão das atividades escolares presenciais, viram o número de seus alunos
reduzirem significativamente, tendo ocorrido inúmeras transferências para
escolas da rede pública de educação. Ao contrário, muito se considera e se
solidariza com a situação do empresariado e dos empregados do país nesse
momento. Entretanto, no caso concreto, estamos diante de um estado de
calamidade pública, não sendo outra a razão pela qual a União e o Estado de
Santa Catarina já providenciaram, na esfera legislativa, sérias medidas
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restritivas.
Assim, na esteira da situação enfrentada mundialmente, o
exercício do livre comércio incluindo a modificação do objeto social das
escolas particulares, para empresas que desenvolvem atividades
recreativas, como defende o Decreto nº 11.98/2020 deve ceder em face da
preservação da saúde pública e da vida, tomando-se como vetor de
concretização da norma constitucional, o princípio da dignidade da pessoa
humana e a garantia do direito à saúde.
2.3) DA COMPETÊNCIA ESTADUAL E MUNICIPAL
O art. 3º da Lei n. 13.979/2020 previu as medidas
concretas a serem adotadas pelos entes federados, deixando claro que
“somente poderão ser determinadas com base em evidências científicas e em
análises sobre as informações estratégicas em saúde e deverão ser limitadas no
tempo e no espaço ao mínimo indispensável à promoção e à preservação da
saúde pública”.
Assim, são possíveis as medidas de restrição pelo Estado
que visem reduzir a transmissão comunitária e garantir a manutenção dos
serviços de saúde no território, uma vez previstas em instrumentos normativos
legítimos e sem ofensa abstrata ao texto constitucional.
Referidas normas se coadunam com a disposição
constitucional sobre a competência legislativa concorrente, na medida em que o
art. 24 da Constituição da República estabelece, como competência concorrente
da União, dos Estados e do Distrito Federal, legislar sobre “previdência social,
proteção e defesa da saúde” (inc. XII).
Ainda sobre a competência legislativa concorrente, o art.
24, §§ 1º ao 3º, da Constituição da República dispõe que:
§ 1º. No âmbito da legislação concorrente, a competência da União
limitar-se-á a estabelecer normas gerais”.
§ 2º A competência da União para legislar sobre normas gerais não
exclui a competência suplementar dos Estados.
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§ 3º Inexistindo lei federal sobre normas gerais, os Estados exercerão a
competência legislativa plena, para atender a suas peculiaridades.
A competência concorrente dos Estados foi reconhecida
recentemente pelo Supremo Tribunal Federal em decisão monocrática do Min.
Marco Aurélio, ao analisar as medidas liminares requeridas nos Autos da Ação
Direta de Inconstitucionalidade n. 6.341, tendo por objeto a constitucionalidade
da MP 926/2020 e do Decreto n. 10.282/2020. Colhe-se da fundamentação:
SAÚDE CRISE CORONAVÍRUS MEDIDA PROVISÓRIA
PROVIDÊNCIAS LEGITIMAÇÃO CONCORRENTE. Surgem
atendidos os requisitos de urgência e necessidade, no que medida
provisória dispõe sobre providências no campo da saúde pública
nacional, sem prejuízo da legitimação concorrente dos Estados, do
Distrito Federal e dos Municípios.
[...] Há de ter-se a visão voltada ao coletivo, ou seja, à saúde pública,
mostrando-se interessados todos os cidadãos. O artigo 3º, cabeça,
remete às atribuições, das autoridades, quanto às medidas a serem
implementadas. Não se pode ver transgressão a preceito da
Constituição Federal. As providências não afastam atos a serem
praticados por Estado, o Distrito Federal e Município considerada
a competência concorrente [...].
[...] O que nela se contém [MP 926/2020] repita-se à exaustão não
afasta a competência concorrente, em termos de saúde, dos
Estados e Municípios. Surge acolhível o que pretendido, sob o ângulo
acautelador, no item a.2 da peça inicial, assentando-se, no campo, há
de ser reconhecido, simplesmente formal, que a disciplina decorrente
da Medida Provisória nº 926/2020, no que imprimiu nova redação ao
artigo 3º da Lei federal nº 9.868/1999, não afasta a tomada de
providências normativas e administrativas pelos Estados, Distrito
Federal e Municípios.
Considerando o reconhecimento da contaminação
comunitária pelo Sars-Cov-2 no território brasileiro, a restrição de atividades
determinada pela autoridade sanitária estadual guarda pertinência com a
finalidade de conter a proliferação da doença e deve estar amparada em
critérios sanitários de contenção da pandemia.
Nessa lógica, não se admite que os municípios
estabeleçam regras mais permissivas que aquelas já determinadas pela União e
pelo Estado, pois seria incongruente que a política pública municipal de defesa
da saúde, que considera o “interesse local”, seja mais flexível em relação aos
critérios para a prevenção e o combate à disseminação do novo coronavírus
relacionados conforme o “interesse regional” (Estado) e o “interesse geral”
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(União).
O Supremo Tribunal Federal já destacou a possibilidade de
a legislação municipal suplementar, em assuntos de interesse local, a norma
geral, o que não significa que o Município poderá ignorá-la. Eis o julgado do
Supremo Tribunal Federal:
ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL.
DIREITO CONSTITUCIONAL. LEI 13.113/2001 E DECRETO
41.788/2002, QUE DISPÕE SOBRE A PROIBIÇÃO DO USO DE
MATERIAIS, ELEMENTOS CONSTRUTIVOS E EQUIPAMENTOS DA
CONSTRUÇÃO CIVIL CONSTITUÍDOS DE AMIANTO NO MUNICÍPIO
DE SÃO PAULO. EXERCÍCIO LEGÍTIMO DA COMPETÊNCIA DOS
MUNICÍPIOS PARA SUPLEMENTAREM A LEGISLAÇÃO FEDERAL.
ARGUIÇÃO JULGADA IMPROCEDENTE.
1. Ante a declaração incidental de inconstitucionalidade do art. 2º
da Lei 9.055/95, não invade a competência da União prevista nos
arts. 24, V, VI e XII, da Constituição da República, a legislação
municipal que, suplementando a lei federal, impõe regra restritiva
de comercialização do amianto.
2. Trata-se de competência concorrente atribuída à União, aos
Estados e Distrito Federal para legislar sobre produção, consumo,
proteção do meio ambiente e proteção e defesa da saúde, tendo os
Municípios competência para suplementar a legislação federal e
estadual no que couber.
3. Espaço constitucional deferido ao sentido do federalismo
cooperativo inaugurado pela Constituição Federal de 1988. É
possível que Estados-membros, Distrito Federal e Municípios, no
exercício da competência que lhes são próprias, legislem com o
fito de expungirem vácuos normativos para atender a interesses
que lhe são peculiares, haja vista que à União cabe editar apenas
normas gerais na espécie. 4. Arguição de Descumprimento de
Preceito Fundamental julgada improcedente, com a declaração
incidental da inconstitucionalidade do art. 2º da Lei 9.055/95. (ADPF
109, Relator(a): Min. EDSON FACHIN, Tribunal Pleno, julgado em
30/11/2017, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-019 DIVULG 31-01-2019
PUBLIC 01-02-2019)
Da síntese e conclusão do voto do Min. Edson Fachin
(relator), extrai-se o seguinte: “Revela-se constitucional a legislação
municipal que, em matéria de competência local, comum e suplementar,
regulamenta de forma mais restritiva a norma geral, dentro do âmbito de
atuação permitido por ela”.
A prevalência das normativas mais restritivas também é
percebida em outras áreas que envolvem direitos sensíveis, como é o caso do
14. Este documento é cópia do original assinado digitalmente por CESAR AUGUSTO ENGEL. Para conferir o original, acesse o site http://www.mpsc.mp.br, informe o processo 08.2019.00391929-0 e o código
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4ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE ITAJAÍ
INFÂNCIA E JUVENTUDE
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meio ambiente equilibrado. A esse respeito, já decidiu o Supremo Tribunal
Federal:
Os Municípios podem legislar sobre direito ambiental, desde que o
façam fundamentadamente. (...) A Turma afirmou que os Municípios
podem adotar legislação ambiental mais restritiva em relação aos
Estados-membros e à União. No entanto, é necessário que a norma
tenha a devida motivação.
[ARE 748.206 AgR, rel. min. Celso de Mello, j. 14-3-2017, 2ª T,
Informativo 857.]
O município é competente para legislar sobre meio ambiente com União
e Estado, no limite de seu interesse local e desde que tal regramento
seja e harmônico com a disciplina estabelecida pelos demais entes
federados (art. 24, VI, c/c o art. 30, I e II, da CRFB)” (RE 586.224, rel.
min. Luiz Fux, j. 05.03.2015, P, DJE 08.05.2015, Tema 145).
A respeito do art. Art. 30, I e II, da Constituição da
República, preleciona a doutrina:
I Legislar sobre assuntos de interesse local substituiu a locução
peculiar interesse local, presente nas Constituições anteriores.
Interesse local não implica exclusivo interesse municipal, tampouco se
expressa em todos os municípios do mesmo modo, pois os municípios
são diferentes. No Brasil temos municípios com territórios maiores que
Estados da Federação Altamira (PA), por exemplo, é maior que
Sergipe , ao mesmo tempo que há municípios com orçamento maior
que Estados São Paulo capital, maior que muitos Estados. Temos
municípios com forte característica industrial, outros, com recursos
ambientais relevantes, que vivem do turismo etc. Estas características é
que identificam o seu interesse local. O que identifica o interesse local é
a circunstância do direito a ser protegido no universo do município. A
característica cultural, demográfica, geográfica, topográfica, climática,
geológica, econômica, política entre outros é que indicará o
interesse local a ser protegido. Entendemos, como TABORDA (2015),
que o interesse local é a cláusula geral de competência municipal. As
cláusulas gerais constituem o meio legislativamente hábil para permitir o
ingresso, no ordenamento jurídico, de princípios valorativos (expressos
ou não expressos), standards, máximas de conduta, arquétipos
exemplares de comportamento, normativas constitucionais e assim por
diante. O intérprete, além de averiguar a possibilidade de subsunção de
uma série de casos-limite na fattispecie (suporte fático), verifica a exata
individuação das mutáveis regras sociais às quais o envia a metanorma
jurídica. Deverá determinar quais são os efeitos incidentes no caso
concreto, ou, se estes já vieram indicados, qual a graduação que lhes
será conferida no caso concreto, à vista das possíveis soluções
existentes no sistema. As cláusulas gerais têm por função permitir a
abertura e a mobilidade do sistema jurídico, tanto que abrem o sistema
para elementos extrajurídicos, viabilizando a adequação, ao mesmo
tempo que asseguram a mobilidade interna. É o caso do interesse local.
II A suplementação de legislação estadual ou federal, no que
couber, exige que o conteúdo legislado seja de atribuição
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4ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE ITAJAÍ
INFÂNCIA E JUVENTUDE
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municipal, não podendo o município, por exemplo, legislar sobre
direito civil, cuja competência é da União. A suplementação ocorre
por meio de complementação ou legislar na ausência da norma. A
jurisprudência vem entendendo que, para legislar na ausência de
normas, o Município precisa ter competência constitucional sobre a
matéria. Já a complementação não pode implicar regrar em sentido
oposto à norma geral existente. Este foi o entendimento no
Recurso Extraodrinário n. 313060/SP, rel. Min. Ellen Gracie
Nothfleet (Diário da Justiça de 24 de fevereiro de 2006): “A
competência constitucional dos Municípios de legislar sobre
assunto de interesse local não tem o alcance de estabelecer
normas que a própria Constituição, na repartição de competências,
atribui à União e aos Estados”.
(CANOTILHO, J. J. Gomes [et al.] ; Comentários à Constituição do
Brasil. 2. ed. São Paulo : Saraiva Educação, 2018. (Série IDP), p.
847-848)
É certo, portanto, que os municípios podem prever
restrições adicionais se forem necessárias para a proteção e a defesa da
saúde pública, como forma de colocar em prática as suas estratégias de
contenção da pandemia, o que deve estar devidamente fundamentado pela
autoridade sanitária em conformidade com o interesse local.
Mais especificamente sobre a competência em relação à
pandemia do coronavírus, merece ser destacada recente decisão proferida pelo
Supremo Tribunal Federal na Arguição de Descumprimento de Preceito
Fundamental n. 672/DF, de relatoria do Min. Alexandre de Moraes, em 8 de abril
de 2020:
A Constituição Federal, em diversos dispositivos, prevê princípios
informadores e regras de competência no tocante à proteção da saúde
pública, destacando, desde logo, no próprio preâmbulo a necessidade
de o Estado Democrático assegurar o bem-estar da sociedade.
Logicamente, dentro da ideia de bem-estar, deve ser destacada como
uma das principais finalidades do Estado a efetividade de políticas
públicas destinadas à saúde. O direito à vida e à saúde aparecem como
consequência imediata da consagração da dignidade da pessoa
humana como fundamento da República Federativa do Brasil. Nesse
sentido, a Constituição Federal consagrou, nos artigos 196 e 197, a
saúde como direito de todos e dever do Estado, garantindo sua
universalidade e igualdade no acesso às ações e serviços de saúde. No
presente momento, existe uma ameaça séria, iminente e incontestável
ao funcionamento de todas as políticas públicas que visam a proteger a
vida, saúde e bem estar da população. A gravidade da emergência
causada pela pandemia do coronavírus (COVID-19) exige das
autoridades brasileiras, em todos os níveis de governo, a
efetivação concreta da proteção à saúde pública, com a adoção de
todas as medidas possíveis e tecnicamente sustentáveis para o
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4ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE ITAJAÍ
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apoio e manutenção das atividades do Sistema Único de Saúde.
[...]
Por outro lado, em respeito ao Federalismo e suas regras
constitucionais de distribuição de competência consagradas
constitucionalmente, assiste razão à requerente no tocante ao
pedido de concessão de medida liminar, “para que seja
determinado o respeito às determinação dos governadores e
prefeitos quanto ao funcionamento das atividades econômicas e
as regras de aglomeração”. A adoção constitucional do Estado
Federal gravita em torno do princípio da autonomia das entidades
federativas, que pressupõe repartição de competências legislativas,
administrativas e tributárias. Em relação à saúde e assistência
pública, inclusive no tocante à organização do abastecimento
alimentar, a Constituição Federal consagra, nos termos dos
incisos II e IX, do artigo 23, a existência de competência
administrativa comum entre União, Estados, Distrito Federal e
Municípios. Igualmente, nos termos do artigo 24, XII, o texto
constitucional prevê competência concorrente entre União e
Estados/Distrito Federal para legislar sobre proteção e defesa da
saúde; permitindo, ainda, aos Municípios, nos termos do artigo 30,
inciso II, a possibilidade de suplementar a legislação federal e a
estadual no que couber, desde que haja interesse local; devendo,
ainda, ser considerada a descentralização político-administrativa do
Sistema de Saúde (art. 198, CF, e art. 7º da Lei 8.080/1990), com a
consequente descentralização da execução de serviços e distribuição
dos encargos financeiros entre os entes federativos, inclusive no que
diz respeito às atividades de vigilância sanitária e epidemiológica (art.
6º, I, da Lei 8.080/1990). As regras de repartição de competências
administrativas e legislativas deverão ser respeitadas na interpretação e
aplicação da Lei 13.979/20, do Decreto Legislativo 6/20 e dos Decretos
presidenciais 10.282 e 10.292, ambos de 2020, observando-se, de
“maneira explícita”, como bem ressaltado pelo eminente Ministro
MARCO AURÉLIO, ao conceder medida acauteladora na ADI 6341,
“no campo pedagógico e na dicção do Supremo, a competência
concorrente”. Dessa maneira, não compete ao Poder Executivo
federal afastar, unilateralmente, as decisões dos governos
estaduais, distrital e municipais que, no exercício de suas
competências constitucionais, adotaram ou venham a adotar, no
âmbito de seus respectivos territórios, importantes medidas
restritivas como a imposição de distanciamento/isolamento social,
quarentena, suspensão de atividades de ensino, restrições de
comércio, atividades culturais e à circulação de pessoas, entre
outros mecanismos reconhecidamente eficazes para a redução do
número de infectados e de óbitos, como demonstram a
recomendação da OMS (Organização Mundial de Saúde) e vários
estudos técnicos científicos, como por exemplo, os estudos
realizados pelo Imperial College of London, a partir de modelos
matemáticos (The Global Impact of COVID-19 and Strategies for
Mitigation and Suppression, vários autores; Impact of non-
pharmaceutical interventions (NPIs) to reduce COVID19 mortality
and healthcare demand, vários autores).
Presentes, portanto, a plausibilidade inequívoca de eventual conflito
federativo e os evidentes riscos sociais e à saúde pública com perigo de
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lesão irreparável, CONCEDO PARCIALMENTE A MEDIDA CAUTELAR
na arguição de descumprimento de preceito fundamental, ad
referendum do Plenário desta SUPREMA CORTE, com base no art. 21,
V, do RISTF, para DETERMINAR a efetiva observância dos artigos
23, II e IX; 24, XII; 30, II e 198, todos da Constituição Federal na
aplicação da Lei 13.979/20 e dispositivos conexos, RECONHENDO
E ASSEGURANDO O EXERCÍCIO DA COMPETÊNCIA
CONCORRENTE DOS GOVERNOS ESTADUAIS E DISTRITAL E
SUPLEMENTAR DOS GOVERNOS MUNICIPAIS, cada qual no
exercício de suas atribuições e no âmbito de seus respectivos
territórios, para a adoção ou manutenção de medidas restritivas
legalmente permitidas durante a pandemia, tais como, a imposição
de distanciamento/isolamento social, quarentena, suspensão de
atividades de ensino, restrições de comércio, atividades culturais e
à circulação de pessoas, entre outras; INDEPENDENTEMENTE DE
SUPERVENIENCIA DE ATO FEDERAL EM SENTIDO CONTRÁRIO,
sem prejuízo da COMPETÊNCIA GERAL DA UNIÃO para
estabelecer medidas restritivas em todo o território nacional, caso
entenda necessário.
Dessa decisão, é possível extrair algumas conclusões:
(1) As medidas restritivas no contexto da pandemia do
Coronavírus dizem respeito primordialmente ao direito fundamental à saúde.
Vale dizer, ao contrário do teor da decisão ora vergastada, o que prevalece não
é a competência regulamentar de determinado serviço, mas, sim, medidas
sanitárias e epidemiológicas para fins de prevenção da COVID-19.
(2) Tais medidas devem ser interpretadas à luz da
competência concorrente dos Estados e, quanto aos Municípios, à luz de sua
competência suplementar (art. 30, II, CRFB). Logo, apenas compete aos
Municípios complementar a legislação federal e estadual. Em se tratando
de saúde, conforme já exposto, deve prevalecer a precaução, de modo que
apenas medidas mais protetivas à saúde podem ser adotadas pelo
Município.
(3) A competência de cada um dos entes para adotar
medidas restritivas no respectivo território fica preservada, cabendo ao Estado
impor medidas restritivas necessárias ao seu âmbito territorial (Estado de Santa
Catarina), o que deve ser observado pelos Municípios.
O mesmo entendimento pode ser extraído da decisão do
Pleno do STF na ADI 6341, antes mencionada.
18. Este documento é cópia do original assinado digitalmente por CESAR AUGUSTO ENGEL. Para conferir o original, acesse o site http://www.mpsc.mp.br, informe o processo 08.2019.00391929-0 e o código
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Ao analisar a cautelar proferida pelo Min. Marco Aurélio, o
Pleno do Supremo Tribunal Federal deixou ainda mais clara a competência
concorrente, mas sempre tendo como norte a saúde (direito fundamental que se
visa a proteger no presente caso).
O dispositivo do julgamento foi publicado nos seguintes
termos:
O Tribunal, por maioria, referendou a medida cautelar deferida pelo
Ministro Marco Aurélio (Relator), acrescida de interpretação
conforme à Constituição ao § 9º do art. 3º da Lei nº 13.979, a fim de
explicitar que, preservada a atribuição de cada esfera de governo,
nos termos do inciso I do art. 198 da Constituição, o Presidente da
República poderá dispor, mediante decreto, sobre os serviços
públicos e atividades essenciais, vencidos, neste ponto, o Ministro
Relator e o Ministro Dias Toffoli (Presidente), e, em parte, quanto à
interpretação conforme à letra b do inciso VI do art. 3º, os Ministros
Alexandre de Moraes e Luiz Fux.
A competência concorrente, como indica o próprio relato do
julgamento acima transcrito, permite que os Municípios possam editar normas
em assuntos de interesse local, desde que visem a proteger mais a saúde,
ou seja, desde que sejam mais restritivas do que as do Estado (respeitados,
por óbvio, os direitos fundamentais e com base em evidências da autoridade
sanitária).
A questão não é nova, e já foi objeto de decisões dos Tribunais
Estaduais.
Em relação a medidas mais flexíveis no âmbito do comércio
local, o Poder Judiciário de Santa Catarina tem se posicionado no sentido de
que o Estado tem competência para adotar as medidas restritivas de proteção à
saúde, não cabendo ao Município adotar regras mais flexíveis do que aquelas
legitimamente impostas pelo ente de maior amplitude. Esse é o entendimento
adotado em decisão liminar proferida nos Autos da Ação Civil Pública n.
5001058-60.2020.8.24.0081/SC, da Comarca de Xaxim/SC, em 2 de abril de
2020; e na Ação Civil Pública 5003724-50.2020.8.24.0011/SC, da Comarca de
Brusque/SC, em 7 de abril de 2020.
19. Este documento é cópia do original assinado digitalmente por CESAR AUGUSTO ENGEL. Para conferir o original, acesse o site http://www.mpsc.mp.br, informe o processo 08.2019.00391929-0 e o código
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Ainda, ressalte-se que o TJSC, em recentes decisões
proferidas pelo Des. Luiz Zanelato em agravos de instrumento interpostos pelo
Estado de Santa Catarina e pelo Ministério Público do Estado de Santa Catarina
(n. 5008308-96.2020.8.24.0000 e n. 5008310-66.2020.8.24.0000/SC,
respectivamente) decidiu também nesse sentido:
Salienta-se, num primeiro momento, que o Decreto n. 515, de 17 de
março de 2020, ao declarar a situação de emergência em todo o
território catarinense, não visa, em seu art. 2º, I, invadir a competência
municipal para regulamentação de interesses locais, pois não tem por
objetivo normatizar/regulamentar a atividade de transporte municipal de
passageiros em si, e tampouco a concessão da atividade pelo
Município. Mas, ao suspender, no âmbito do Estado de Santa Catarina
"a circulação de veículos de transporte coletivo urbano municipal,
intermunicipal e interestadual de passageiros", o faz expedindo norma
de caráter sanitário e epidemiológico com o fim superior de
combater o acentuado avanço da epidemia de COVID19 em solo
estadual.
Na mesma linha do Decreto n. 515/2020, encontram-se aqueles que
lhes sucederam, - os Decretos n. 525/2020, n. 535/2020, n. 550/2020 -,
todos eles mantendo a restrição mencionada, e, por fim, o Decreto n.
554, este datado de 11-4-2020, que, dentre outras medidas, prorroga,
até 30-4-2020, a suspensão da circulação de veículos de transporte
coletivo urbano municipal e intermunicipal de passageiros.
Não é demais lembrar que a Constituição Federal, em seu art. 23, II,
estabelece a competência comum da União, dos Estados, do
Distrito Federal e dos Municípios, para os cuidados de saúde e
assistência pública, sendo que no art. 24 define como concorrente
a competência da União, dos Estados e do Distrito Federal para
legislar sobre proteção e defesa da saúde (inciso XII).
Aos Municípios, portanto, neste caso, compete apenas
suplementar as diretrizes gerais traçadas pela União e pelos
Estados-membros, adequando-as ao interesse local, porém, sem
irem de encontro às normas federais e estaduais.
A respeito, impõe-se trazer à luz trecho de recente decisão do
Supremo Tribunal Federal, proferida em 8-4-2020 pelo Ministro
Alexandre de Moraes, em sede da Arguição de Descumprimento de
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4ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE ITAJAÍ
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Preceito Fundamental - ADPF n. 672, assim esclarecendo:
[...]
Como se vê, do cotejo entre a orientação da Suprema Corte e os atos
normativos que têm sido expedidos pelo Governador do Estado de
Santa Catarina no intuito de enfrentamento da emergência de saúde
pública de importância internacional, enquanto traça estratégias de
sobrevivência à pandemia de COVID-19, verifica-se que o Estado nada
mais tem feito do que exercer sua competência normativa de traçar
diretrizes gerais a serem seguidas em seu território, impondo as
medidas de isolamento/distanciamento social que, de acordo com seus
estudos técnicos e amparado em evidências científicas de organismos
inclusive internacionais, tem considerado como mínimas ao
enfrentamento dos riscos à saúde pública.
Aliás, é preciso ressaltar que o Estado, em que pese a existência,
inclusive, de críticas de algumas entidades de saúde e de
representação da sociedade no que tange à flexibilização prematura
das medidas de isolamento social (cujo debate aqui não encontra
espaço) já vem, paulatinamente, autorizando a retomada das atividades
de diversos setores/ramos da economia, deixando a cargo dos
municípios a adoção de medidas mais restritivas naqueles em que
estas se mostrarem necessárias, ao mesmo tempo em que vem
monitorando o comportamento da curva de contágio e de mortalidade.
O Estado, portanto, já vem adotando medidas mais flexíveis, a fim de
que os municípios, suplementando as diretrizes estaduais de acordo
com o interesse local, adotem medidas mais restritivas conforme sua
necessidade e conveniência.
Inadmissível, no caso, é que os municípios adotem medidas mais
brandas que o ente estadual, indo na contramão da preservação da
saúde pública e proteção à vida das pessoas.
O contexto exige uma atuação coordenada entre Estado e Municípios,
mesmo porque não se pode considerar que o deferimento da medida
pretendida em primeiro grau restrinja-se à questão de mero interesse
local, porquanto, vindo a ocorrer uma superlotação dos leitos
hospitalares existentes em Joinville, certamente haverá o
remanejamento de pacientes para unidades hospitalares de outros
municípios do Estado e, a depender da situação futura, colocando em
colapso todo o sistema de saúde estadual, cujas consequências serão
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gravíssimas e, quiçá, incontornáveis.
[...]
A par de todas as considerações já traçadas, fato é que definir as
atividades que devem continuar operando e quais ainda devem
permanecer suspensas, salvo eventuais excessos e arbitrariedades
cometidas pela administração, que eventualmente transpusessem os
parâmetros da conveniência e oportunidade, é tarefa do Administrador
Público, de acordo com os estudos técnicos que lhe servem para
avaliar os riscos à saúde decorrentes do retorno de cada atividade,
traçando as estratégias do Poder Público para o combate à epidemia,
mormente quando pautado pelo princípio da precaução e da
preservação da saúde e da vida, não cabendo ao Judiciário, no caso,
substituir-se ao administrador, para, desprovido de bases técnicas e
científicas específicas, afrouxar as medidas de isolamento e de
restrição à circulação de pessoas, o que pode, em médio prazo,
acarretar um risco à estrutura de acesso à saúde disponibilizada pelo
Estado e à própria saúde da população, colocando a perder todas as
medidas já adotadas, o trabalho empreendido e os sacrifícios já
suportados pelo povo catarinense para sobreviver à epidemia.
Também destaca-se nesse mesmo sentido, os autos do
Mandado de Segurança n. 5008900-43.2020.8.24.0000, em que a Des. Denise
Volpato suspendeu Decreto Municipal com base na vedação da adoção de
medidas mais flexíveis do que as do Decreto Estadual (no caso, o Decreto
Municipal permitia a circulação de pessoas nas praias):
No caso em apreço o Ministério Público ataca a legalidade do Decreto
n. 9.876/2020, do Município de Balneário Camboriú/SC, por contrariar
diretrizes sanitárias estabelecidas pelo Estado de Santa Catarina no
Decreto n. 562/2020.
[...]
Como se observa, há evidente confronto entre os diplomas normativos
estadual e municipal.
Linhas gerais, a Constituição da República Federativa do Brasil
(Constituição Federal) distribui competência regulamentares aos entes
municipais, estadual e federal. Com respeito à saúde, o artigo 23,
estabelece ser comum a União, Estados e Municípios a competência
para legislar sobre cuidados e assistência à saúde.
No mesmo sentido, o artigo 30 esclarece competir aos municípios
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"legislar sobre assuntos de interesse local" (inciso I) e "suplementar a
legislação federal e a estadual no que couber" (inciso II).
Assim, compete tanto ao estado, como aos municípios, legislar acerca
da forma como será alcançado o direito à saúde (artigo 23, II, da
Constituição Federal), respeitado o interesse local ou regional, e o
caráter suplementar (artigo 30, II, da Constituição Federal).
No aspecto, convém destacar que adotadas medidas restritivas
pelo gestor regional, qual seja, o Estado de Santa Catarina, é de
todo impertinente seu afrouxamento em âmbito local, sob pena de
malferir-se não só a necessária harmonia na condução dos
interesses público, mas principalmente de restringir a eficácia da
medida em seu espectro regional.
Nesse sentido imperioso reconhecer que a aplicação de medidas
contrárias ao Decreto Estadual por gestores locais acaba por
espraiar deletérios efeitos regionais, podendo criar focos internos
de contágio a refletir em ataque a incolumidade pública do estado
como um todo.
Conforme a Constituição da República Federativa do Brasil,
portanto, normas regulamentares municipais devem unicamente
completar lacunas, jamais contrariar os ditames estabelecidos
pelo ente estadual, sempre visando ampliar medidas de promoção
da saúde.
No âmbito da saúde, portanto, observadas as diretrizes federais e
estaduais, pode o gestor do município tomar unicamente medidas
que ampliem o acesso a saúde, sem atacar direta ou indiretamente
a eficácia das disposições exaradas pelo Estado ou União.
Deve sempre prevalecer a norma que melhor defenda o direito
tutelado, in casu, o direito à saúde. Pode, por exemplo, o poder
público local incluir determinada vacina no calendário de vacinação,
observadas as especificidades e o interesse local.
Isso significa, no caso vertente, que os municípios não podem autorizar
atividades restringidas pelo Estado, vez que não ampliam medidas de
cuidado sanitário.
A preservação do interesse público exige a atuação harmônica entre os
poderes e entes federados, com vistas a garantir a efetividade das
políticas públicas no combate à propagação do vírus.
Esse é o entendimento perfilado pelo Supremo Tribunal Federal ao
apreciar a ADI 6.341 e a ADPF 672.
Logo, sob o aspecto formal, descabida a edição do decreto
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atacado.
[...]
Ante o exposto, defiro a liminar postulada para sustar imediatamente os
efeitos do Decreto n. 9.876/2020, do Municício de Balneário
Camboriú/SC, por contrariar diretrizes sanitárias estabecidas pelo
Estado de Santa Catarina no Decreto n. 562/2020.
Apesar disso, o que se vê no presente caso, é a edição de
um decreto municipal que, não só vai de encontro às normas estaduais
pertinentes, como, ainda, é mais permissivo do que aquelas, e sem qualquer
amparo em dados científicos, assim como em total contraponto à realidade
vivenciada, não só pelo Município de Itajaí, no que diz respeito aos níveis de
contaminação e óbitos decorrentes da Covid 19, mas de todo o estado de Santa
Catarina.
2.4) REGIONALIZAÇÃO E DESCENTRALIZAÇÃO DAS
AÇÕES DE ENFRENTAMENTO À PANDEMIA NO ESTADO DE SANTA
CATARINA
O Estado de Santa Catarina, reconhecendo a situação de
emergência presente em todo o território catarinense, diante da expansão dos
casos de infecção por coronavírus, publicou, na trilha da legislação federal,
consoante já referido, os Decretos Estaduais n. 509/2020, 515/2020, 521/2020,
525/2020, 535/2020 e 550/2020, estabelecendo as medidas para o controle da
pandemia em Santa Catarina (restrições de atividades, serviços, circulação,
entre outros).
O ato do Governo do Estado atualmente em vigor, é o
Decreto n. 562/2020, editado na data de 17 de abril de 2020, que compila as
5regras contidas nos Decretos antes referidos .
A redação original, porém, sofreu sucessivas alterações
promovidas pelos Decretos ns. 587/2020, 630/2020, 651/2020, 719/2020,
724/2020 e 740/2020, os quais, em especial o Decreto n. 630/2020, que, além
de prever novas medida de enfrentamento, impõe mudança significativa na
5
Decreto 525/2020, atualizado, disponível em: https://leisestaduais.com.br/sc/decreto-n-525-2020-santa-
catarinadispoe-sobre-novas-medidas-para-enfrentamento-da-emergencia-de-saude-publica-de-importancia-
internacional-decorrente-docoronavirus-e-estabelece-outras-providencias
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condução da política pública até então coordenada pelo Governo Estadual,
destacando-se, nesse aspecto, consoante também referido acima, a
regionalização das ações de enfrentamento da pandemia, mediante
compartilhamento das decisões e responsabilidades entre o Estado e os
Municípios, adaptando as medidas a serem adotadas, à realidade de cada
região, a partir de critérios técnicos e científicos.
Tal se deve, até mesmo porque os serviços de saúde
funcionam de forma regionalizada.
Sobre as Regiões de Saúde, o art. 7º do Decreto n.
7.508/2011, que “Regulamenta a Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990, para
dispor sobre a organização do Sistema Único de Saúde - SUS, o planejamento
da saúde, a assistência à saúde e a articulação interfederativa”, prevê que “As
Redes de Atenção à Saúde estarão compreendidas no âmbito de uma Região
de Saúde, ou de várias delas, em consonância com diretrizes pactuadas nas
Comissões Intergestores”.
A regionalização e hierarquização do SUS é forma de
garantir “o acesso universal, igualitário e ordenado às ações e serviços de
saúde” (art. 8º do Decreto n. 7.508/2011) e cabe às Comissões Intergestores
pactuar “a organização e o funcionamento das ações e serviços de saúde
integrados em redes de atenção à saúde” (art. 30 do Decreto n. 7.508/2011),
especificamente à Comissão Intergestores Regional CIR no âmbito das
regiões de saúde, estrutura que está vinculada à Secretaria de Estado da Saúde
administrativa e operacionalmente (inc. III do art. 30 do Decreto n. 7.508/2011).
As redes de atenção organizam-se, portanto, de forma
regionalizada, o que permite afirmar que boa parte dos Municípios que integram
a região, não dispõe de prestador local de serviços de média e alta
complexidade junto ao SUS, bem como que os Municípios que fazem a gestão
desse serviço não atendem exclusivamente os próprios munícipes, mas,
também a população dos demais Municípios da região de saúde. Essa realidade
precisa ser considerada no planejamento das ações.
Ademais, conforme estudo elaborado pelo Núcleo de
Inovação, Estudos Territoriais e Inteligência Analítica NIETTA da Defesa Civil
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6de Santa Catarina , as cidades são organizadas a partir de uma metodologia de
hierarquia de redes urbanas, o que gera interdependência em relações
econômicas, sociais, políticas, etc., que levam a deslocamentos diários de
grande número de pessoas dentro das regiões, seja para trabalhar, fazer
compras, utilizar serviços, etc., em especial considerando os Municípios de
referência em determinado território. Essa realidade também impõe considerar,
no mínimo, a região como módulo territorial de organização da política pública,
dado que a transmissão do novo coronavírus decorre, grosso modo, do contato
entre as pessoas.
Como forma de subsidiar essa regionalização da política
pública e descentralização das ações, prevista através do Decreto Estadual nº
630/2020, o Estado disponibilizou ferramentas de apoio à tomada de decisão
7para acesso público . A principal delas consiste em matriz de avaliação de
indicadores de risco potencial na gestão da saúde, que entrega análises das
regiões de saúde. Para tanto, utiliza indicadores que medem, em resumo, a
propagação da doença e o impacto dela sobre o sistema de saúde. Como
resultado, as regiões são classificadas em quatro diferentes níveis de risco
potencial, e para cada um deles são indicadas orientações e medidas a serem
tomadas pela sociedade em geral, pelo setor privado, pela gestão pública e pela
gestão da saúde.
É preciso pontuar que a previsão do caput do art. 9º do
Decreto Estadual n. 630/20203, no sentido de que cabe “aos entes municipais a
deliberação a respeito do funcionamento de atividades públicas ou privadas em
seus territórios”, não tem o condão de afastar a corresponsabilidade e a
competência do Estado, em especial pelas medidas necessárias em âmbito
regional, que decorre dos arts. 23, II, e 24, XII, da CRFB, dos arts. 17, incs. II e
IX, e 18, inc. II, da Lei n. 8.080/1990, do Decreto n. 7.508/2011 e do art. 3º da lei
n. 13.979/2020.
A responsabilidade pelas ações de saúde, consoante
amplo entendimento jurisprudencial que já foi trazido à baila, é solidária entre o
Estado e os municípios, sempre que desborda o interesse local. Se as ações e
6
Disponível em: http://www.coronavirus.sc.gov.br/dinamica-de-propagacao/. Acesso em 20.8.2020
7
Disponível em: http://www.coronavirus.sc.gov.br/apoio-a-decisao/. Acesso em 20.8.2020.
26. Este documento é cópia do original assinado digitalmente por CESAR AUGUSTO ENGEL. Para conferir o original, acesse o site http://www.mpsc.mp.br, informe o processo 08.2019.00391929-0 e o código
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serviços de saúde compõem uma rede regionalizada e hierarquizada, nos
termos do art. 198 da Constituição da República e do art. 8º da Lei n.
8.080/1990, como visto acima e reconhecido pela autoridade sanitária estadual,
a partir da matriz que avalia regionalmente o nível de risco potencial causado
pela epidemia, não é lógico ou eficaz que as medidas de enfrentamento sejam
adotadas isoladamente pelos municípios, desconsiderando-se essa
regionalização dos serviços e ações de saúde.
Veja-se que a competência dos municípios para legislar
sobre matéria de saúde pública é apenas suplementar “sobre assuntos de
interesse local” (art. 30, inc. I, da CRFB). Por sua vez, o art. 24, inc. XII, dispõe
que compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar
concorrentemente sobre “previdência social, proteção e defesa da saúde”. O
interesse regional, portanto, extrapola o interesse local e desloca a competência
legislativa para o âmbito estadual.
Também no plano material, de implementação da política
pública, o interesse regional atrai a responsabilidade estadual, nesse caso
compartilhada de forma solidária com os municípios.
A organização da política pública de saúde é ditada pela
Lei n. 8.080/1990, que prevê, como responsabilidade dos Estados, dentre
outras, “acompanhar, controlar e avaliar as redes hierarquizadas do Sistema
Único de Saúde (SUS)” (art. 17, inc. II) e “identificar estabelecimentos
hospitalares de referência e gerir sistemas públicos de alta complexidade, de
referência estadual e regional” (art. 17, inc. IX), o que ganha relevo no
enfrentamento à COVID-19, se considerado que o principal recurso demandado
pelos doentes é o leito de internação, em especial de UTI.
No contexto da regionalização das ações e dos serviços de
saúde, ao município compete “participar do planejamento, programação e
organização da rede regionalizada e hierarquizada do Sistema Único de Saúde
(SUS), em articulação com sua direção estadual” (art. 18, inc. II), o que deixa
claro que o planejamento, programação e organização da rede regionalizada é
atribuição da direção estadual do SUS, com a participação dos municípios. E
essa articulação das ações, nos termos do art. 14-a da Lei n. 8.080/1990, deve
ocorrer por meio das Comissões Intergestores.
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Por fim, a Lei n. 13.979/2020 reforça essa
corresponsabilidade ao prever, no caput do art. 3º, que as medidas de
enfrentamento da epidemia deverão ser adotadas pelas diversas esferas de
gestão, “no âmbito de suas competências”, não delegando essa atribuição
exclusivamente aos municípios.
Em suma, o Estado e os municípios devem atuar de forma
cooperativa e solidária na condução da política pública de enfrentamento à
epidemia no âmbito regional, pois se trata de competência de ambos adotar
todas as medidas que as evidências técnicas e científicas apontarem como
necessárias para a proteção da saúde pública de determinada região, a exemplo
daquelas ditadas pela matriz de risco potencial desenvolvida pelo próprio Estado
de Santa Catarina, sob pena de caracterização do erro grosseiro que pode
ensejar a responsabilização por omissão prevista nos arts. 1º e 2º da MP n.
966/2020.
Não se concebe, de outro lado, que cada município atue
isoladamente. As medidas sanitárias devem ser adotadas considerando, no
mínimo, o âmbito regional, em especial tendo em vista que um dos fatores que
impacta significativamente no enfrentamento da pandemia, é a capacidade do
suporte hospitalar aos doentes.
E o Município de Itajaí, indo na contramão, editou decreto
de forma isolada e mais permissiva, autorizando as escolas particulares a
utilizarem seu espaço físico para atividades recreativas. Ou seja, no momento
em que o Estado de Santa Catarina prorroga a suspensão das aulas presenciais
até 12 de outubro, o Município de Itajaí, muito embora mantenha a suspensão
das atividades pedagógicas presenciais, permite a aglomeração de crianças e
adolescentes no espaço físico de escolas particulares, para a realização de
"atividades recreativas".
2.5 ATUAL PANORAMA DA PANDEMIA NA REGIONAL
FOZ DO RIO ITAJAÍ, DA QUAL O MUNICÍPIO DE ITAPEMA É INTEGRANTE
Para deixar assente de dúvida o desacerto do Decreto
Municipal ora questionado, que vai de encontro a toda a lógica das normativas
estaduais editadas até o momento, assim como das normas regionais
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estabelecidas, é importante trazer a baila o atual panorama da infecção humana
pelo coronavírus na Regional da Foz do Rio Itajaí.
Da matriz de avaliação de indicadores de risco potencial na
gestão da saúde, vê-se que a Regional da Foz do Rio Itajaí, na última
atualização, divulgada em 18.8.2020, pela nona semana consecutiva, está
8classificada como RISCO POTENCIAL GRAVÍSSIMO .
Diante dessa realidade, o Alerta COES indica que "para a
região é necessário implementar e fiscalizar as ações propostas pelo Decreto
Estadual 785, de 07 de agosto de 2020, que suspende por 14 dias o acesso de
público às competições esportivas públicas ou privadas; cinemas, teatros, casas
noturnas, museus; a realização de eventos, shows ou espetáculos que
acarretem reunião de público; circulação de veículos de transporte coletivo
urbano municipal e intermunicipal; e a permanência de pessoas em espaços
públicos de uso coletivo como parques, praças e praias.
Sugere, ainda, aos Municípios desta região, que
considerem reduzir o tempo de funcionamento, adequação ou suspensão das
seguintes atividades:
• Bares e restaurantes de atendimento no local;
• Academias de ginástica e outros locais de realização de esportes
coletivos;
• Shopping centers, galerias, centros comerciais e comércio em geral;
• Supermercados e lojas de departamento;
• Serviços públicos e privados que podem ser realizados de forma
remota;
• Reuniões de qualquer natureza, de caráter público ou privado;
• Atividades relacionadas ao turismo;
• Cursos presenciais;
Tais sugestões são repassadas à Comissão Intergestora
Regional (CIR), a quem compete informar, posteriormente, ao COES, sobre as
medidas de contenção que serão tomadas pelos municípios que a compõem.
Já do Relatório Semanal COVID-19 - Período 3.8.2020 -
99.8.2020, produzido pelo CIGERD Itajaí em parceria com a REPEDfri , é
possível constatar que houve um crescimento de 9,8% dos casos confirmados e
8
Disponível em: http://www.coronavirus.sc.gov.br/gestao-da-saude/, acesso em 20.8.2020
9
Disponível em: http://libgeo.acad.univali.br/scosc/web/lista/getPDF/regiao/1/192, acesso em 20.8.2020
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O Município, infelizmente, atingiu a triste marca de 147
óbitos desde o início da pandemia. Ao todo, são 5.335 casos confirmados da
doença. Desses, 30 pacientes estão internados.
O aumento dos casos nesta cidade é diário. Mesmo assim,
o Prefeito Municipal optou por adotar medidas menos restritivas, que colocam
em risco a vida, não só das crianças e dos jovens, como da população de um
modo geral.
Não se pode deixar de mencionar que o "Modelo
Epidemiológico - Relatório 06 - COVID-19", elaborado pelo Governo do Estado,
datado de 18 de agosto de 2020 (que utilizou os dados do boletim do dia
16/08/2020), continua prevendo o crescimento acelerado do número de óbitos
no Estado ao longo das próximas 4 semanas.
Esse estudo é realizado semanalmente pelo Núcleo
Intersetorial de Inteligência de Dados COVID-19. O modelo epidemiológico vem
sendo um dos elementos de análise da condução da política pública. Desse
estudo são extraídos o Rt (velocidade de transmissão da doença) que embasa a
matriz de avaliação de risco por região.
Por meio desse estudo, são feitas projeções das
estimativas do número total de infecções diárias e do índice de
transmissibilidade a partir dos óbitos, bem como os cenários de projeção de
óbitos diários e semanais para até 4 (quatro) semanas.
Os resultados dos testes apontam estimativas de casos,
óbitos, e Rt (velocidade de transmissão da doença) em 3 possíveis cenários de
óbitos para até 4 semanas.
O modelo desta semana foi calibrado no dia 18.8.2020 com
dados fornecidos pelo Governo de Santa Catarina através da Plataforma
BoaVista, contabilizando um total de 1.797 óbitos até o fechamento do boletim
do dia 16.8.2020.
Considerando o tempo de incubação do vírus (~5 dias), e
que os óbitos acontecem 18,66 dias após os primeiros sintomas, a curva de
óbitos de hoje é reflexo dos contágios de 2-3 semanas atrás.
As projeções para o Estado de Santa Catarina indicam a
totalização de aproximadamente 3.200 óbitos até 6.9.2020, e,
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aproximadamente, 4.000 em 13.9.2020, em todo o estado
O índice de transmissibilidade pode ser encarado como
uma aritmética de velocidade de propagação da doença. Se o Rt estiver acima
de 1, isso indica uma tendência de aumento exponencial no número de
infectados e, consequentemente, de óbitos, nas próximas semanas. Quanto
maior o Rt, mais rápido o vírus irá se espalhar na população.
O Rt de todos os cenários indica a tendência de aceleração
exponencial da circulação do novo coronavírus no Estado.
A taxa de contágio calculada nesta semana para a Foz do
Rio Itajaí é de 1,13 (cenário 1 - melhor), 1,23 (cenário 2 - intermediário) e 1,32
(cenário 3 - pior). Na prática, isso significa o quão rápido a doença ainda está se
espalhando por aqui, o que fulmina a possibilidade de adotar-se medidas menos
restritivas, ainda mais por um único Município, de forma isolada,
desconsiderando toda a realidade municipal, regional e estadual.
Em resumo, as medidas implementadas pelo Decreto
Municipal nº 11.982/2020 não estão nem sequer próximas daquelas
recomendadas pelo COES, sem que se tenha explicitado os fundamentos
que sustentam essa tomada de decisão.
Ou seja, não se apresentou qualquer novo estudo ou
análise justificando a adoção da prefalada medida, em especial se, diante
do quadro evidenciado, é seguro permitir a aglomeração de crianças e
adolescentes dentro de unidades escolares particulares, ao argumento de
ali estarem sendo realizadas “atividades recreativas”. Sequer o impacto
dessa medida, decretada pelo município, foi estimada.
Muito embora o que se vai dizer agora seja óbvio, mas o
fato é que o que se está evitando, com a suspensão das atividades
pedagógicas presenciais, não são as atividades em si, mas o contato entre
os alunos, a aglomeração deles. Sendo assim, não faz nenhum sentido,
permitir-se a reabertura das escolas particulares, o que gerará a
aglomeração de crianças e adolescentes, para a realização de atividades
ditas recreativas.
3) ANTECIPAÇÃO DE TUTELA