(1) O recurso trata de uma ação anulatória movida por um servidor público aposentado contra a cassação de sua aposentadoria por meio de decreto estadual. (2) Foi condenado criminalmente por peculato doloso pelos mesmos fatos que levaram ao processo administrativo disciplinar. (3) A condenação criminal teve repercussão no âmbito administrativo, tornando comprovados os fatos do processo disciplinar.
PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS - LAÇOS FAMILIARES - RELAÇÃO DE EMPREGO
Apelação cível. ação anulatória. processo
1. APELAÇÃO CÍVEL N.º 661.877-5 DA 5.ª VARA CÍVEL
DA COMARCA DE MARINGÁ.
APELANTE : Antônio Fávaro Neto.
APELADOS : Estado do Paraná e Paranaprevidência.
RELATOR : Des. Xisto Pereira.
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ANULATÓRIA. PROCESSO
ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. PENA DE CASSAÇÃO DA
APOSENTADORIA. DECISÃO PENAL CONDENATÓRIA,
PELOS MESMOS FATOS, TRANSITADA EM JULGADO.
COMETIMENTO DO CRIME DE PECULATO DOLOSO (CP,
ART. 312, “CAPUT”). REPERCUSSÃO DIRETA NO ÂMBITO
ADMINISTRATIVO. INOCORRÊNCIA DE VIOLAÇÃO A
PRINCÍPIOS PREVIDENCIÁRIOS, DA RAZOABILIDADE OU
DA PROPORCIONALIDADE. SENTENÇA ESCORREITA.
RECURSO DESPROVIDO.
(1) “É nula a aplicação de sanção demissória a Servidor
Público, quando a Comissão do PAD não logra reunir elementos probatórios densos,
sérios e coerentes da prática do ato infracional punível com a demissão e da sua autoria,
mas se esses elementos já foram devidamente apurados na instância criminal, com a
emissão de sentença condenatória, tem-se os fatos do PAD como igualmente
comprovados, eis que são os mesmos que serviram de supedâneo ao Juízo Penal”
(STJ, 3.ª Seção, MandSeg. n.º 13.599/DF, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, j. em
12.05.2010).
(2) A pena de cassação da aposentadoria está prevista no art.
300, inciso I, do Estatuto dos Funcionários Públicos Civis do Estado do Paraná (Lei
Estadual n.º 6.174/1970), tendo aplicação quando o servidor inativo “praticou falta grave
no exercício do cargo ou função”. Essa sanção disciplinar não está, por óbvio, sujeita à
aprovação ou a qualquer outra deliberação do Tribunal de Contas, visto que se trata
Documento assinado digitalmente, conforme MP n.° 2.200-2/2001, Lei n.° 11.419/2006 e Resolução n.° 09/2008, do TJPR/OE
O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.tjpr.jus.br
Página 1 de 8
2. Apelação Cível n.º 661.877-5 fl. 2
de um ato interna corporis do Executivo no exercício do seu poder administrativo
sancionador.
(3) “Com efeito, a finalidade da norma é conferir à
Administração o poder-dever de punir quando, após a inativação, tiver ciência de que
houve infração disciplinar cometida pelo servidor na ativa. Ocorre que, não existindo
distinção quanto aos ilícitos que ensejam a imposição da pena máxima, sua aplicação
dependerá, na verdade, da situação do servidor: se ativo, demissão; se inativo, cassação
de aposentadoria” (STJ, 3.ª Seção, MandSeg. N.º 12.269/DF, excerto do voto do
eminente Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, j. em 11.04.2007).
VISTOS, relatados e discutidos estes autos de
APELAÇÃO CÍVEL N.º 661.877-5, da 5.ª Vara Cível da Comarca de Maringá, em
que figuram como apelante ANTÔNIO FÁVARO NETO e apelados ESTADO DO
PARANÁ E PARANAPREVIDÊNCIA.
I – RELATÓRIO
Antônio Fávaro Neto, adiante identificado como
“apelante”, ajuizou ação anulatória de ato administrativo cumulada com
indenização em face do Estado do Paraná, identificado como “primeiro
apelado”, e da Paranaprevidência, identificada como “segunda apelada”.
Afirmou o apelante que desde seu ingresso no serviço
público estadual, em 05.02.1980, nunca sofreu penalidade administrativa, salvo a
prolatada no processo administrativo ora impugnado; que é manifestamente ilegal
o Decreto Estadual n.° 1.484/2003 que cassou sua aposentadoria, vez que
inexistente seu pressuposto subjetivo de validade, haja vista a usurpação da
competência, pelo Chefe do Poder Executivo Estadual, para julgamento em casos
que tais de processos administrativos disciplinares, conferida por lei ao Conselho
Documento assinado digitalmente, conforme MP n.° 2.200-2/2001, Lei n.° 11.419/2006 e Resolução n.° 09/2008, do TJPR/OE
O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.tjpr.jus.br
Página 2 de 8
3. Apelação Cível n.º 661.877-5 fl. 3
Superior do Magistério; que o Conselho Superior do Magistério emitiu parecer
aduzindo serem insuficientes as provas apresentadas para ensejar qualquer tipo
de punição ao apelante; que restaram violados os pressupostos formalísticos
previstos no art. 71, inc. III, da CF e no art. 75, inc. III, da CE, pois a aprovação da
sua aposentadoria pelo Tribunal de Contas vincula a eficácia dos atos
administrativos de concessão, revogação ou cassação desse benefício; que o ato
administrativo de cassação de sua aposentadoria é ilegal porque viola os
princípios previdenciários, visto que desde 16.12.1998 já tinha adquirido esse
direito pelo tempo de contribuição e que houve ofensa a pressuposto lógico, pois a
aplicação da aludida pena não guarda pertinência entre a causa e o conteúdo do
ato administrativo-disciplinar, ocorrendo, ainda, ofensa ao princípio constitucional
da ampla defesa. Nesses termos, pugnou pela declaração de nulidade do Decreto
n.º 1.484/2003 e condenação dos apelados “ao pagamento dos proventos vencidos,
acrescidos de juros, esses no valor de 1% ao mês e correção monetária, bem como, juros
remuneratórios e vantagens concedidas aos aposentados no período em debate até o
efetivo restabelecimento desse benefício previdenciário” (fls. 02/35).
Pela sentença recorrida julgou-se improcedente a ação,
condenando-se o apelante “ao pagamento das custas e despesas processuais, bem
como em honorários advocatícios, estes arbitrados em R$ 1.200,00 (um mil e duzentos
reais – distribuídos na ordem de 50% para cada um dos réus), (...) em razão do grau
de zelo do profissional, do lugar de prestação do serviço, da natureza e importância; da
natureza e importância da causa, o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido
para o seu serviço, nos termos do art. 20, § 4.º, do CPC” (fls. 852/860-verso).
Foram interpostos, pelo apelante, os embargos de
declaração de fls. 865/871, que restaram rejeitados pela decisão de fls. 872/873.
O apelante, em suas razões recursais, repisa as seguintes
questões a serem apreciadas por este Tribunal: (a) o parecer do Conselho do
Magistério tem força vinculante; (b) cerceamento de defesa no processo
administrativo disciplinar; (c) aplicabilidade do art. 75, inc. III, da CE em simetria
com o art. 71, inc. III, da CF, (d) violação de pressuposto lógico do ato
Documento assinado digitalmente, conforme MP n.° 2.200-2/2001, Lei n.° 11.419/2006 e Resolução n.° 09/2008, do TJPR/OE
O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.tjpr.jus.br
Página 3 de 8
4. Apelação Cível n.º 661.877-5 fl. 4
administrativo; (e) violação de princípios previdenciários e a inaplicabilidade da
cassação de aposentadoria como pena disciplinar e (f) violação ao princípio da
razoabilidade e proporcionalidade (fls. 874/901).
Os apelados, em contrarrazões de fls. 906/916 (do Estado
do Paraná) e 920/927 (da Paranaprevidência), defendem o acerto da sentença
recorrida e pugnam pela sua confirmação.
A Procuradoria-Geral de Justiça sugere o desprovimento
do recurso (fls. 942/948).
A Seção Cível, por intermédio do Acórdão de fls. 992/995,
decidiu que a competência recursal no caso em exame é das Câmaras de Direito
Público, seguindo-se daí a distribuição dos autos a este Relator.
É o relatório.
II – VOTO E SUA FUNDAMENTAÇÃO
Segundo alega o apelante é nulo de pleno direito o
processo administrativo disciplinar a que foi submetido e que culminou com a
cassação de sua aposentadoria.
A uma, porque o parecer do Conselho do Magistério,
opinando pela sua absolvição, tem força vinculante. A duas, porque foi cerceado
seu direito de defesa no curso do referido processo administrativo disciplinar.
Essas teses não vingam.
Na esfera criminal o apelante, por alguns dos mesmos
fatos que ensejaram a instauração do aludido processo administrativo disciplinar,
restou por decisão judicial transitada em julgado condenado à pena de 2 anos e 6
meses de reclusão pela prática do crime de peculato doloso (CP, art. 312, caput)
(fls. 312/313 e 620/638).
Documento assinado digitalmente, conforme MP n.° 2.200-2/2001, Lei n.° 11.419/2006 e Resolução n.° 09/2008, do TJPR/OE
O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.tjpr.jus.br
Página 4 de 8
5. Apelação Cível n.º 661.877-5 fl. 5
Essa decisão judicial tem repercussão direta no âmbito
administrativo por força do que dispõe a alínea “a” do inciso I do art. 92 do Código
Penal, verbis:
“Art. 92 – São também efeitos da condenação:
I – a perda de cargo, função pública ou mandado eletivo:
a) quando aplicada pena privativa de liberdade por tempo igual
ou superior a um ano, nos crimes praticados com abuso de poder ou violação de dever
para com a Administração Pública” (destacou-se).
Do Superior Tribunal de Justiça, nesse sentido, o seguinte
julgado:
“ADMINISTRATIVO. PROCESSO DISCIPLINAR
SEQUENCIADO POR REGULAR PROCESSO CRIMINAL. SUPERVENIÊNCIA DE
SENTENÇA PENAL CONDENATÓRIA. EFEITOS QUE SE PROJETAM NA SEARA
ADMINISTRATIVA. PEDIDO DE SEGURANÇA DENEGADO. 1. O Poder Judiciário pode
sindicar amplamente, em mandado de segurança, o ato administrativo que aplica a
sanção de demissão a Servidor Público, para mensurar a sua adequação à gravidade
da infração disciplinar, não ficando a análise jurisdicional limitada aos aspectos formais do
ato administrativo. 2. O Processo Administrativo Disciplinar não é dependente da
instância penal, não se exigindo, destarte, para a aplicação da sanção administrativa de
demissão, a prévia condenação, com trânsito em julgado, do Servidor no juízo criminal,
em Ação Penal relativa aos mesmos fatos; porém, quando o Juízo Penal já se
pronunciou definitivamente sobre esses fatos, que constituem, ao mesmo tempo,
o objeto do PAD, exarando sentença condenatória, não há como negar a sua
inevitável repercussão no âmbito administrativo sancionador. 3. É nula a aplicação
de sanção demissória a Servidor Público, quando a Comissão do PAD não logra reunir
elementos probatórios densos, sérios e coerentes da prática do ato infracional punível
com a demissão e da sua autoria, mas se esses elementos já foram devidamente
apurados na instância criminal, com a emissão de sentença condenatória, tem-se
os fatos do PAD como igualmente comprovados, eis que são os mesmos que
serviram de supedâneo ao Juízo Penal. 4. O exercício do poder administrativo
disciplinar não está subordinado ao trânsito em julgado da sentença penal condenatória
Documento assinado digitalmente, conforme MP n.° 2.200-2/2001, Lei n.° 11.419/2006 e Resolução n.° 09/2008, do TJPR/OE
O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.tjpr.jus.br
Página 5 de 8
6. Apelação Cível n.º 661.877-5 fl. 6
exarada contra Servidor Público, embora a sua eventual absolvição criminal futura possa
justificar a revisão da sanção administrativa, se não houver falta residual sancionável
(Súmula 18 do STF). 5. Ordem de segurança que se denega, de acordo com o parecer do
douto MPF” (3.ª Seção, MandSeg. n.º 13.599/DF, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, j.
em 12.05.2010, destacou-se).
Por outro lado, a pena de cassação da aposentadoria
está prevista no art. 300, inciso I, do Estatuto dos Funcionários Públicos Civis do
Estado do Paraná (Lei Estadual n.º 6.174/1970), tendo aplicação quando o
servidor inativo “praticou falta grave no exercício do cargo ou função”.
Essa sanção disciplinar não está, por óbvio, sujeita à
aprovação ou a qualquer outra deliberação do Tribunal de Contas, visto que se
trata de um ato interna corporis do Executivo no exercício do seu poder
administrativo sancionador.
É dizer, em outras palavras, que o Tribunal de Contas não
tem o poder de, em se tratando de punição disciplinar, rever o ato administrativo
do Poder Executivo.
Por fim, como muito bem enfatizado na sentença recorrida,
prolatada pelo brilhante magistrado Siladelfo Rodrigues da Silva, “O simples fato de
o autor poder exercer o direito de pleitear a aposentadoria não lhe exime do direito de
exercitar seu labor com esmero e lealdade, bem como não o isenta de sofrer sanções em
razão de infrações administrativas enquanto ainda em atividade.
Ressalte-se, também, que embora desde 16.12.1998 o autor
tivesse direito de se aposentar, este optou por deixar de exercer o referido direito, tendo
postergado o pleito de aposentadoria para período posterior, que, de fato, veio a se
concretizar através da Resolução n.º 6.087/02 (02.09.2002).
Ademais, uma vez consumada a prática de ato infracional na
condição de servidor público (em atividade), é manifestamente plausível a instauração de
processo administrativo disciplinar, ainda que por ocasião do julgamento o respectivo
servidor já tivesse sido agraciado com a aposentadoria.
Documento assinado digitalmente, conforme MP n.° 2.200-2/2001, Lei n.° 11.419/2006 e Resolução n.° 09/2008, do TJPR/OE
O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.tjpr.jus.br
Página 6 de 8
7. Apelação Cível n.º 661.877-5 fl. 7
‘ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. SERVIDOR
PÚBLICO INATIVO. DEMISSÃO. NÃO-CABIMENTO. CONVERSÃO DA PENA
DISCIPLINAR EM CASSAÇÃO DE APOSENTADORIA. CABIMENTO. SEGURANÇA
DENEGADA. AGRAVO REGIMENTAL PREJUDICADO. 1. O impetrante, enquanto
servidor da ativa, foi submetido a regular processo disciplinar, que culminou na aplicação
de pena de demissão que, posteriormente, foi anulada por incabível, pois, quando de sua
publicação, já se encontrava aposentado por invalidez. 2. Diante do fato de que, em tese,
já foi devidamente observado o devido processo legal e os princípios da ampla defesa
e do contraditório, considerando que as faltas praticadas foram apuradas em processo
disciplinar, não há óbice legal para que ocorra a simples conversão da pena de demissão
em cassação de aposentadoria. 3. Segurança denegada. Agravo regimental julgado
prejudicado’ (MS 12269/DF, 2006/0211908-7, Rel. Min. ARNALDO ESTEVES LIMA, DJ:
14.05.2007).
No julgado acima, o Ministro Relator observou que:
‘Com efeito, a finalidade da norma é conferir à Administração o
poder-dever de punir quando, após a inativação, tiver ciência de que houve infração
disciplinar cometida pelo servidor na ativa. Ocorre que, não existindo distinção quanto aos
ilícitos que ensejam a imposição da pena máxima, sua aplicação dependerá, na verdade,
da situação do servidor: se ativo, demissão; se inativo, cassação de aposentadoria” (fls.
858-verso?859-verso).
Não ocorreu, portanto, violação a nenhum princípio
previdenciário, nem mesmo aos princípios da razoabilidade e da
proporcionalidade.
Nessas condições, impõe-se negar provimento ao recurso.
É como voto.
III – DISPOSITIVO
ACORDAM os magistrados integrantes da Quinta
Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade
de votos, em negar provimento ao recurso.
Documento assinado digitalmente, conforme MP n.° 2.200-2/2001, Lei n.° 11.419/2006 e Resolução n.° 09/2008, do TJPR/OE
O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.tjpr.jus.br
Página 7 de 8
8. Apelação Cível n.º 661.877-5 fl. 8
Acompanharam o voto do Relator os Desembargadores
Paulo Roberto Hapner, que presidiu a sessão, e Leonel Cunha.
Curitiba, 01.11.2011.
Des. Xisto Pereira,
Relator.
Documento assinado digitalmente, conforme MP n.° 2.200-2/2001, Lei n.° 11.419/2006 e Resolução n.° 09/2008, do TJPR/OE
O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.tjpr.jus.br
Página 8 de 8