Cenários de Aprendizagem - Estratégia para implementação de práticas pedagógicas
Revista literatas edição 2
1. Literatas
Não conhecemos o preço da palavra. Envie esta revista à um amigo COMUNICADO
Abertas as inscrições (sem custos)
Sai às Terças-feiras
para Oficina Literária a ter lugar nos
dias 1 e 2 de Agosto com escritora
brasileira Ana Rusche que estará
em Maputo. Informações no Centro
Cultural Brasil-Moçambique ou
pelo email: kuphaluxa@gmail.com
Movimento Literário Kuphaluxa
Revista de Literatura Moçambicana e Lusófona
Director Editorial: Eduardo Quive * Maputo * 19 de Julho de 2011 * Ano 01 * Nº 02 * E-Mail: kuphaluxa@gmail.com
Homem que
respira
poesia
Rubervam Du Nascimento, poeta de Santa
Teresinha - Brasil
“África viu o que não devia ver
– seu pai nú e sem sexo” pg. 2
Felicitações a partir da Guiné-Bissau
Caros amigos da revista “Literatas” – Revista de Literatura Moçambicana e Lusófona
Muito obrigado pelo início do envio da revista em formato pdf: assim poderemos partilhar com amigos via e-mail.
As nossa felicitações pela diversificada qualidade do seu conteúdo, das notícias à poesia, passando pelas crónicas. Parabéns aos
autores. Esperamos que um dia este recanto guineense produza autores em Língua Portuguesa com a qualidade digna de poderem
participar na revista.
Bem-hajam
--
Andorinha |Caixa Postal nº 1 | Canchungo |Guiné-Bissau
www.andorinhaemcanchungo.blogspot.com
2. 2 BLA BLA BLA Exero 01, 5555
Terça-feira, 19 de Julho de 2011 https://revistaliteratas.blogspot.com 2
Em primEira
Alegoria do Negro
HéLIO JOSé MENDOSO - NAMpULA
Deus tinha cinco filhos no
paraíso: Ásia, América,
Europa, Oceânia, e África.
Cuidava e amava-os sem
distinção. O supremo
olhando para as suas
idades e a sua ruína vital,
decidiu reuni-los para lhes
ensinar, educar e mostrar
algumas doutrinas do
paraíso. não concluiu o fecho da porta. Foi quando África viu o que não merecerás confiança a ninguém, lutarás muito e pouco
não devia ver – seu pai nú e sem sexo. ganharás.
Levou-os Até a sombra de uma árvore. E uma das doutrinas ÁFricA BAstAnte admirado com o que vera, pegou na
que o supremo deixou era de que nenhum deles devia cabeça e questionou-se: Então gritou deus: - Maldito, sucA dAqui,
abrir uma das portas de cor preta que ali havia. Era lá onde sucA…., não te quero ver mAis em
o supremo continha os segredos da criação do mundo e - eu que sou seu filho tenho isto e ele?
humana. E sempre que o criador entrava lá ficava nú.
minhA Frente. sAiBA que pArA onde
repArou estA diferença entre eles um defeito, não supor- Fores FArei dessA terrA, um Autên-
um diA, o filho África, um filho sempre desconfiado pelo pai, tando riu-se e riu mesmo como não se pode imaginar. E tico inFerno cLimÁtico. depois
criou uma exagerada curiosidade, ignorou as palavras do o supremo porque nunca duvidara que um dia e aquelas dAí, umA trovoAdA ABriu o céu e
seu pai e quis saber os porquês da proibição e da abertura hora alguém poisá-se até ali. Assustou-se. Logo que se AmALdiçoAdo Foi empurrAdo pArA
daquela porta e da chegada à aquele lugar. levantou impôs as mãos sobre a cabeça do seu filho África os conFins, mAs os Anjos dA corte
e amaldiçoo-o dizendo: a partir de hoje terás uma cor de
Foi numA noite em que o supremo ausentou-se da lareira pecado, esta ninguém votará, o ódio te dominará, um
tiverAm compAixão e AcoLherAm-
quando conversava com os seus filhos. África secretamente dia não comerás enquanto o outro não, desprezarei as no Até A terrA
seguiu-o atrás e o supremo que alguém viesse ao seu redor, tuas preces e orações, vários momentos de crise passarás,
Jornalista brasileira fala de
literatura feminina em Maputo
FONTE: JORNAL NOTíCIAS a participação de docentes universitários moçambicanos
e brasileiros.
rosÁLiA diogo é uma jornalista conhecida no meio aca-
démico moçambicano por ter desenvolvido um estudo
sobre a influência das telenovelas brasileiras na sociedade
A jornalista e professora
moçambicana, o qual foi já apresentado no Maputo e nas
regiões centro e norte do país.
brasileira Rosália Diogo
com vÁrios textos publicados no Brasil e outras paragens
do mundo, Rosália Diogo possui uma escrita “contaminada”
traçou, a dias, um olhar sobre
pelos discursos do Movimento Negro Brasileiro que influen-
ciou vários intelectuais daquele país latino-americano.
a literatura feminina na
pArA ALém de jornalismo, esta pesquisadora de literartura
e de arte é membro do Conselho Municipal de Educação
diáspora no Centro Cultural
do Belo Horizonte.
Brasil-Moçambique, em
A jornAListA brasileira, que por sinal é uma grande comu-
nicadora, apresentou este tema tão actual e que tem apa-
Maputo.
ixonado os amantes da literatura no geral.
rosÁLiA diogo, que tambem é admiradora e pesquisa-
dora da literatura africana, tem o foco voltado para autores
moçambicanos consagrados, como são os casos de Paulina
Chiziane, Ungulane Ba Ka Khossa, Mia Couto, Nelson Saute
e outros.
A jornAListA afro-brasileira, natural do Belo Horizonte, fala A dissertAção da comunicadora brasileira, foi recebida as cidades costeiras de Inhambane, Beira, Quelimane, Nam-
hoje no contexto do VI Curso de Literatura Brasileira que com muita expectativa, uma vez que marcava o fim da visita pula e Pemba
teve lugar a dias na capital moçambicana e que envolvia de trabalho (pesquisas) de Rosália Diogo a este pedaço da
“Pérola do Índico”, tendo escalado, para além do Maputo,
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Em primEira
Aulas de Filosofia no Camões
Refila o Sebastião:
- Não sei se gosto do
nome que me deste…
Sebastião.
- Sebastião era o nome
dum jovem rei portu-
guês que perdeu uma
batalha tendo com isso
levado a que Portugal
perdesse a independên-
cia durante 60 anos. Mas
como o seu corpo nunca
apareceu pensava-se
que esse rei voltaria
para libertar Portugal
ANTóNIO CRABRITA - MApUTO num dia de nevoeiro.
Ora, como a ti,
meu gatão, também
O Curso Livre de Filosofia e Arte tem como objectivo uma ninguém te ouve chegar
divulgação de forma sistemática, cronológica e atractiva parece que chegas
(isto é de forma clara e bem humorada) das convergências sempre envolto em
que a arte e o pensamento têm desenhado ao longo dos nevoeiro.
séculos, dos gregos até à actualidade. - Então porque não me
serÁ dAdo em seis módulos de 4/6 aulas, uma vez por deste o nome de Bruma?
semana. As aulas serão expositivas, sempre ilustradas Sempre era mais inven-
com imagens, power-point e cada módulo acabará com o tivo.
visionamento de um filme. - Tens toda a razão, é
o primeiro módulo, a começar em 26 de Julho, incidirá na esta mania da antro-
Filosofia e Arte Antigas. pomorfização, chegou-
Ao longo dos séculos o pensamento filosófico discriminou me com os gregos.
três tipos supremos de valor: o bem, a beleza e a verdade. Os gregos davam a
Platão classificou-os de forma complementar e persistiram tudo as características
desde então no pensamento europeu. do homem, até aos
concomitAntemente, distinguirAm-se três tipos de fun- deuses…
ções e de estilos de vida: a teoria, a acção e a criatividade. - Só me falta dizeres que eles inventaram os seus próprios coordenar com a ocasião… esta sincronia é também uma
Esta classificação, que já se encontra em Aristóteles, serviu deuses? chave filosófica, só que tu não sabias.
de base para que uns séculos depois, Quintiliano fizesse - Ah, já sabias? - Hum. É isso que vais ensinar?
dela um modelo tripartido para as artes. Paralelamente, o - Não posso, é verdade isso? - Transmitir, ou antes: insinuar. Ensinar não é possível. Não é
desenvolvimento destas três divisões potenciou uma série - Para muitos estudiosos sim, os deuses gregos eram possível transmitir a experiência do sarampo pelo telefone.
de seis ideias a partir do qual se pode traçar um percurso projecções das qualidades ideais dos homens, formas de É preciso estar infectado com o sarampo para compreender.
paralelo na cultura e no pensamento: interpelação de cada um de nós com o melhor de si rep- Mas enfim, tenta-se…
- A arte, a beleza, a forma, a criatividade, a mimésis, a resentado numa figura, mas os africanos também fizeram - E porquê a arte?
experiência estética isso… - A Arte é o que FAz A um gAto pAre-
começAremos, no módulo 1, por nos centrarmos em cinco - Aldra… cer um tigre nA somBrA.
figuras da Antiguidade: - Estás-me a chamar aldrabão? O animismo africano é
orFeu, pitÁgorAs, Platão, Aristóteles, Séneca, Plotino uma forma de antropomorfização, vê como nas histórias
- queres tu dizer que sou um
Elucidaremos assim o arco que vai do mito ao neo-platonis- tradicionais africanas o coelho, o leão e o elefante falam e tigre?
mo, que tanta influência terá no cristianismo vindouro. reflectem os problemas dos homens… - eu Acho que és um tigre que
cAdA um dos autores será apresentado de forma sucinta, - Eu não tenho nada a ver com gregos. sonhA que é um gAto.
tendo em conta sobretudo o que explanaram sobre os seis - Estás enganado. Muitas das histórias orais de Cabo - jÁ me estÁs A conFundir.
temas que servirão de eixo a todo o curso. Neste primeiro deLgAdo são iguais às fábulas de Fedro. Ora, os macondes - é Bom estAres conFuso, é dessA
módulo, a filosofia será o pretexto para mostrar a escultura, não lêem grego. Nem os gregos a língua dos macondes. Ou
a arquitectura, falar do teatro e da tragédia gregas, e da essas histórias chegaram aqui por contágio, ou os homens
nuvem que sAem As Luzes.
poesia greco-romana. em qualquer lugar, face aos mesmos problemas, oferecem - eu cÁ quero ver tudo cLAro.
este móduLo terminará com a apresentação do filme respostas semelhantes com uma variação mínima. Na ver- - erro, ver cLAro vêem os cegos,
«Satiricon», de Fellini. dade temos todos os mesmos números de ossos. E por isso os outros Aprendem A
Em cada módulo será distribuída uma pequena sebenta cada ateniense é um maconde potencial e vice-versa. discernir… é Aí que tudo
com textos seleccionados pelo orientador do Curso. - Mas porquê um curso de filosofia? começA.
- Se, contra qualquer bom senso, eu me ponho a atraves-
INFORME-SE NO INSTITUTO CAMÕES E INSCREVA-SE. sar a estrada num momento de grande fluxo de trânsito é
- é cAro o teu curso, no cAmões?
porque decidi primeiro que a vida não vale a pena sem o - É quase ao preço da chuva, é um Curso Livre. Esse quase
CONVERSA DE ANTóNIO CABRITA
risco, e resolvi enfrentar o destino, o que os antigos chama- que se paga é o que dá dignidade à chuva. Mas é barato,
vam Fatum. É um jogo, onde enfrento o inevitável. Sem para poder ir quem quer ser infectado.
COM O SEU GATO
saber estou a encenar o começo da Tragédia. - E qual vai ser o prato?
em todAs os nossos gestos do quotidiano, em todas as - Cem gramas de Pitágoras, duzentas de Platão, uma pitada
SOBRE O CURSO DE FILOSOFIA E
nossas acções existe uma escolha onde damos um signifi- de Aristóteles e para a sobremesa Plotino com banana frita.
cado à nossa narrativa, e nisso, sem o sabermos estamos E tem imagens e filmes à mistura.
ARTE
a questionar o que está para a trás, as causas, e a abrir um - E africanos, não falas de africanos?
novo espaço de virtualidades no futuro. Isso é filosofia… - No quinto módulo, aí é só África. Do Egipto até ao Achille
NO INSTITUTO CAMÕES, DE TANTOS
- Balelas, se quero atravessar a estrada nessas condições é Mbembe.
apenas porque estou com pressa. - Hum, não sei se vou.
A TANTOS
- Ora enganas-te. Não existe a pressa, existe apenas a - É pena, vai ter gatas.
adequação do ritmo ao acontecimento, e isso chama-se o - Gatas?
(INFORME-SE HOMEM, A
Kairos, como na parábola da figueira no Novo Testamento. - Onde há filosofia há o Eros, o elo da atracção mútua. É o
A figueira não amadureceu a tempo e quando Cristo passou que o Platão ensina no «Banquete».
por ela não havia figos e por isso ela perdeu aí o encontro - Hum, isso não te dá fome?
CURIOSIDADE é O pRIMEIRO pRATO!)
com o numinoso, que era como os antigos chamavam ao - Vamos lá então ao nosso pequeno-almoço. E dou-te um
Sagrado, e perdeu a sua Salvação. Se tu atravessas a estrada brinde para meditares com a torrada, é do Heraclito: «aquele
com demasiada pressa, sem te ajeitares ao ritmo do fluxo que não espera pelo inesperado, não o verá chegar»
podes ser atropelado, mesmo que vás com pressa tens de
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Terça-feira, 19 de Julho de 2011 https://revistaliteratas.blogspot.com 4
Notícias / poEsia
Saudades ao amor pretextos Realizar
da rua NELSON LINEU - MApUTO
Acordo o galo
pEDRO DU BOIS - BRASIL
Órfão de juramentos
Herdeiros dos meus pensamentos Realizo o sonho ao destino
Se tem que ser feito algo ofertado. Retiro a irrealidade
MUKURRUzA - LICHINGA Que seja a minha vontade. e a contemplo em matéria
rio do segredo
Tenho na mente coisas por mim gravadas Não sendo escravo de ninguém descubro
Nem que sejam n-angustias tenho a deleitar. Muito menos de mim. avanço o tempo
à semeadura
Esta noite… Falsificando mentiras e retorno em colheitas
Não sei se me podes recompensar Para não abortar a verdade
Só por cobertor minha manta tenho algo a lembrar-te. Quero grades a casa serve ao senhor
E… Para me ver livre o estio ao crescimento da planta
Liberdade para me prender
Trepam os anseios depois do cultivo
Que só acabam por dobrar o cobertor em cópia do teu corpo Paz sobre a terra
Para o resto da noite pelo menos dormir! Como pretexto para a guerra em inundações lavo a sombra
Não como se tem feito da irrealidade. Deposito
Guerra diante do homem
Ser pretexto para a paz. a sobra na satisfação
do todo.
“Retornar com
os pássaros”
Na obra do escritor Pedro Maciel, “Retornar com os
Pássaros”, as palavras são exactas e precisas. Imersas em
puro sentimento, a sensibilidade do autor faz com que o
texto simplesmente flua, sem interrupções até mesmo
para a própria respiração.
No “Retornar com os Pássaros”, as palavras são exatas
e precisas. Imersas em puro sentimento, a sensibilidade
do autor faz com que o texto simplesmente flua, sem
interrupções até mesmo para a própria respiração.
A todo momento o pulsar da vida é rememorado de
forma vívida. Em tempos de padronização de gostos
em alta escala, o romance provoca a reflexão no leitor
desorientado e instiga à escuta dos próprios desejos.
“Retornar com os Pássaros”, ao longo de suas 176 páginas,
aborda temas atuais e recorrentes, sobre os quais nem
sempre se pode refletir. Por isso, ao discutir a beleza e o
preciosismo do “tempo”, o autor desconversa afirmando:
“Quando me apresso, apresso-me lentamente”. O tempo,
aliás, está muito presente ao longo de toda a prosa: o
assunto é desmembrado por Pedro Maciel em diversas
formas e pontuações.
Do mesmo modo que a complexa discussão a respeito
do passado, presente e futuro, as palavras do romance
são recheadas de questionamentos, sempre em busca da
noção da descoberta de si mesmo. O autor reflete: “O
espelho esconde quem realmente somos, reflete ou define
algo estranho a nós. Quem eu me vejo no espelho?”
FichA técnicA
Propriedade do Movimento Literário Kuphaluxa
Sede: Centro Cultural Brasil-Moçambique* AV. 25 de Setembro nº 1728, Maputo, Caixa Postal nº 1167 * Celulares: (+258) 82 27 17 645 e (+258) 84 57 78 117 *
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Director Editorial: Eduardo Quive (eduardoquive@gmail.com)
Coordenador: Amosse Mucavele (amosse1987@yahoo.com.br)
Editor - Canto da Poesia: Rafael Inguane (inguane.rafael@hotmail.com)
Redacção: David Bamo, Nelson Lineu, Mauro Brito, Izidine Jaime, Japone Arijuane.
Colaboradores: Maputo: Osório Chembene Júnior * Xai-Xai: Deusa D´África * Tete: Ruth Boane * Nampula: Jessemusse Cacinda * Lichinga: Mukurruza*
Brasil: Itapema - Pedro Du Bois * Santa Catarina: Samuel da Costa * Nilton Pavin * Marcelo Soriano * Portugal: Victor Eustaquio e Joana Ruas.
Design e páginação: Eduardo Quive
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Terça-feira, 19 de Julho de 2011 CRóNICA / OpINIãO 5
CARTA DO ANIVERSARIANTE NO DIA EM FiLosoFoNias rapsódicas
QUE NãO SE FARÁ A FESTA
MARCELO SORIANO - BRASIL
m.m.soriano@gmail.com
AMOSSE MUCAVELE - MApUTO
Nota preliminar: Antes de
Ontem foi o dia do meu adversário, comemorei com as 4 prosseguir com este artigo,
paredes que ladeiam o meu quarto, lembro ao leitor que me
E hoje dia em que os Astros advogaram sem uma causa justa, dirijo à CPLP(Comunidade
mas com um aviso prévio sendo este o verdadeiro dia do meu dos Países de Língua
aniversário. Portuguesa), portanto,
24 Anos completam-se em mim, e eu nem estou aí, neste podemos encontrar
instante procuro refúgio na imensidão deste poema - assim o gerúndios, futuros do
julgo eterno. pretérito, expressões etnocêntricas, familiares a certos leitores,
Tal como a as palavras que o guiam, eu deambulo no vazio do suco que refresca o bolo que vos porém, inusitadas a outros. Oxalá, que esta peculiaridade não seja
ofereço. pretexto para correções, mas para integrações e enriquecimentos
Desculpe a todos que esperavam uma festa - léxicos e culturais entre nós. Marcelo Soriano. Santa Maria - RS -
Agora vos digo – eu não sei organizar uma festa, assim sendo tenho da vossa companhia motivos BR. 14/07/2011.
suficientes para estarmos em festa. 1. LeiturA: dA suBLimAção Ao ideÁrio
Que zanguem os homens das gargantas abertas, os das barrigas vazias, pois não há mas nada a
dizer por isso sintetizo – eu não sei organizar uma festa.
Conheci uma pessoa que escrevera um livro. Um livro tão
Depois de uma conversa afiada com a minha mãe no cemitério - onde, eu fui lhe dar uma água, bom que acabou tornando o autor um ponto irrelevante.
uma flor, um beijo, e jurar perante ela que eu já sou homem crescido e novo. Aprofundei-me no texto e cheguei a uma página.Aprofundei-
Já não sou aquele menino tal como o pai que destruía lares e eu sendo filho de peixe sabia me um pouco mais e cheguei a um parágrafo único. Entrando
nadar até no areal, e em contrapartida desmanchava prazeres das meninas, brincava com os mais a fundo, ainda, foquei-me em apenas uma frase. No
sentimentos delas, agora sou um novo homem, 24 poemas me esperam,,,,,,,,,desde já juro mesmo sentido, acabei sendo levado a visualizar uma só
fidelidade as garrafas e aos livros. palavra. Ora, a palavra era composta por letras e, dentre
E mulheres preciso daquelas divorciadas, humilhadas, mal amadas, pois ontem á noite recebi o estas, uma específica resumia tudo. Então, como num passe
antídoto para este veneno chamado traição, e as minhas namoradas do passado que o presente de mágica, a letra sublimou-se e vislumbrei a idéia mãe. Tão
tornou-lhas Ex. Nem sei onde foi o buscar este prefixo e o futuro chama-as por amigas, elas pura, tão bela, tão sublime, que nem mesmo eu e o símbolo
me amaram e eu as violentei domesticamente no meu pobre quarto de Madeira e zinco, no havíamos sobrevivido à comunhão daquela totalidade
momento diziam me machuca, eu puxava-lhes as mexas, dava-lhes palmadas, e não tinham onde invisível.
queixar pois pediam que as machuca - se, ponto final eu já não quero brincar ou fazer orgias
com os virgens sentimentos destas miúdas. 2. conFucionistA
O que me espera agora é viajar no silêncio de uma garrafa de whisky OLD PASCAS
Conhecimento é capacidade de conhecer. O conhecimento
vem... E deveria perpassar através de nós. Conhecimento
pROSA pOéTICA que se acumula e fica retido não converge em Sabedoria.
ALINE pEREIRA - RIO DE JANEIRO Sabedoria não é conhecimento em si. É o que ele causou
alinepereiraletras@hotmail.com em nós e o que nós causamos nele. Acho que entendo:
conhecimento é a parte egoísta da sabedoria.
O meu herói é um sertanejo perseguido pela polícia, ao mesmo tempo
em que sonha com uma história de amor. Todos esperam fugir com 3. monóLogos póstumos com quintAnA -
o que ele esconde, e sentem muita sede, mas a água é propriedade pArte i
da mulher que esfria sob a iluminação dramática da biblioteca. Ele
se pergunta se ela estaria no palco de encenação das nuvens, enquanto a moça é envidraçada, “Poeta não é profissão. É um estado espírito, ou de
como ossos de crianças vendidas por igrejas romanas. Ele, que um dia guardara o sonho no fundo coma”
dos olhos, foi o arquétipo romântico que a leitora inventou. Rebelde, apaixonado, veio atrás da Mário Quintana
observadora estática de um olho único. Eram tantos livros que ele apenas sorria com seu par
de órgãos em movimento constante. Bastava. Ela era cinza, fria e dura mesmo antes de morta.
Agora, as esmeraldas pelas quais ele se perdera cabem num baú sob a terra. A terra é lugar dele [Consciência e Sonho]
também, mas seus pés ainda pisam o chão, e ele sente na palma a correnteza do rio que passa Eu a ele: A poesia, Senhor Mário, parece estar direta e
por debaixo. Seu nome, o pai lhe dera porque achava bom. Vinha de uma família de homens. intimamente ligada à arte de perambular pelas ruas. Como se, a
Fosse um nome de mulher como Ismália, ele mesmo, o pai, levantaria uma torre alta para pular perambular, o poeta atinja o seu mais perfeito estado... O estado
no espelho em noite de lua gorda. Mas a mata, a biblioteca, e todo espaço é agora para o meu de sonambulismo lúcido.
herói um tempo em suspensão, onde se encontram o silêncio e a ausência. A mulher morta que
ele amou sempre teve predileção pelo oculto e pelos labirintos cheios de dobras como origamis. [Silencioso Enigma]
Ela não buscou nada, tampouco fugiu, mas ele foge o tempo todo, e também busca e carrega o Ele a mim: O Silêncio, sim, silêncio com “S” maiúsculo - de pedir
que pode. Para trás apenas a cabana queimada, sem sementes. Conforme a hora do dia, ele chega para que as crianças emudeçam com um sonoro “Sssssss!”, com
numa praia e observa o mar aludindo ao eterno movimento do universo e da vida. O fim do mar o dedo indicador em riste diante dos lábios - é o maior de todos
não há, mas o outro lado sim. Do outro lado, os pássaros observam o snorkel no arquipélago. Na os poetas. O Barulho também. Aliás, estes dois rivais não vivem
Ilha, meia dúzia de esposas sabem que o céu está a venda, e do barco o homem do leme grita pra um sem o outro. Vivem disputando a atenção da gente e acabam
elas: “Forjai lâminas!” Elas tremem pois sabem que precisam mesmo das armas. Meu herói, que sempre eternizados nos traços, letras, pensamentos encalacrados
já não é mais um menino, nunca teve mãe. Um menino, se descoberto, foge pra casa mesmo do escritor desavisado, que acaba sempre acenando com suas
que sua mãe não permita a sua entrada e o obrigue a se desculpar com as onças. O meu herói laudas brancas, guardanapos e paredes... Bandeiras brancas da
não vai poder terminar a sua caminhada em busca do arco-íris. Ele mergulha no tanque elíptico paz equilibrada. Paz silenciosa dos jazigos. Paz barulhenta das
do infinito para esquecer que nunca deixou de ser homem. Nadando o quanto pode nesse espaço horas tumultuadas de recreação colegial.
que não se permite conhecer, atualiza-se em peixe, renascendo do inusitado, e adquire formas e
cores variadas, fazendo seu corpo flutuar no encantamento. (3.) continuA nA próximA edição...
_________________________ ___________________
Aline Pereira é formada em Publicidade, atualmente estuda Letras (Português / Literaturas) Marcelo Soriano é natural de Santa Maria - RS - Brasil (1967).
na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), tendo optado pelos estudos literários. Engenheiro, poeta e novo autor (apesar de estar em estado de
Colabora com trabalhos em pesquisa de Literatura Brasileira.Tem artigos publicados em revistas. literatura desde 1985). É cronista das Revistas Tempo e Literatas
Vencedora do segundo lugar, no gênero Poesia, em um concurso de Literatura promovido pela (Moçambique)
UERJ. Dedica-se a escrever poesia e prosa poética, deixando alguns dos seus escritos no blog
http://tudomenosumpouco.blogspot.com/. Entrar em contato com outros textos, como os
contemplados pela revista Literatas, é certamente de meu interesse
6. 6 BLA BLA BLA Exero 01, 5555
Terça-feira, 19 de Julho de 2011 https://revistaliteratas.blogspot.com 6
- discurso dirEcto
“Respiro poesia pela manhã,
DEMETRIOS GALVãO E LUIz pelo poeta Guido Bilharinho, de Uberaba/MG, na década firmando compromisso apenas com o exercício poético. Preferi
VALADARES FILHO - pIAUí de 1980, o mesmo que publicava a famosa revista: Dimen-
são. A linguagem do longo poema incluído na coletânea já
a poesia, apenas a poesia, por entender como Torquato Neto
que a poesia é a mãe das artes, das arte/manhas e das armas de
indicava inquietações éticas e por que não dizer, estéticas, hoje e de amanhã. O espetáculo poético-musical que chamei
Luiz valadares Filho 1- o teu nome “du que somente hoje estão em volga: a nossa sobrevivência, de “corpo-a-corpo”, reuniu a espinha dorsal do livro: A Profissão
nascimento” tem algo de afrancesado? nos fale um numa sociedade que parece ter esquecido que somos apenas dos Peixes, levado a treze cidades brasileiras, em 1987. De Cruz
pouco a respeito disso. formiguinhas entregues ao mar de águas que a cada virada das Almas/Ba, passando por Belo Horizonte, Rio, São Paulo, capi-
de estação causa um dilúvio de calamidades, ao invadir a tal, Ourinhos/SP, Londrina/PR, Curitiba e por último, o que eu
Rubervam Du Nascimento: Du é um jogo sonoro pequena extensão de terra que nos resta para sobreviver, por denominei de “Peregrinação Poética”, em Paranaguá/PR, sempre
inventado a partir do modo como pronunciamos as conta dos maus tratos que cometemos contra a natureza e o contando com a articulação de pessoas ou grupos de poetas
palavras. Nunca ouvi ninguém dizer por aqui “do”. ambiente das cidades. Quanto ao poetas de minha geração, com os quais mantinha contato. Lembro de uma dessas apre-
Do é outra coisa que ao ser pronunciado ganha um gosto de alguns, de outros não, Sem citar nomes, penso que sentações como um momento inesquecível, tanto pelo clima
acento que não existe, um acento imaginário que alguns não evoluíram. De qualquer modo, não tenho dúvidas mágico que se formou no local, cujo teto era uma lua enorme
o empurra para outro significado. Du acompanha de que se trata de uma geração que é a pedra do sapato no céu escuro, quanto pela interacção do público, praticamente
a voz de Ru do início do meu nome. Uma hom- dos críticos e estudiosos do assunto. Posso garantir que são formado por poetas e artistas, com os poemas lidos, no pátio
enagem, digamos, ao som produzido pela voz de mais de meia dúzia os poetas que se firmaram e podem ser aberto de uma Casa de Cultura em Cruz das Almas, interior da
nossas letras e palavras. Nada a ver com o francês. considerados bons poetas, alguns com trabalhos editados Bahia, onde anteriormente funcionou uma cadeia pública. O
Du é um dado a mais que contribui para a pos- que verdadeiramente se sustentam como livros dignos de pátio serviu no passado para os presos tomarem banho de sol.
sível decifração dos enigmas que cercam a minha leitura e reflexão. O Corpo-A-Corpo foi apresentado algumas vezes aqui, Luzilân-
poesia. Funciona como uma espécie de anagrama. dia, Parnaíba e Picos. Trata-se de uma tentativa de colocar o
Du é de um atrevimento sem tamanho. Com ele leitor mais perto da poesia. Apesar de ter plena consciência de
posso provocar Deus. Du também vem de Deus. que a expressividade do poema não pode confundir-se, nem
Basta excluir duas letras. Com o Du me coloco ao concorrer com a expressão do teatro, pois são diferentes, colei
lado da criatura divina embriagada de sopro de esse espectáculo ao lançamento da 1ª edição do A Profissão...
fogo e me transformo em criador. Afinal de contas e obtive resultados impressionantes, em relação à divulgação
é por demais inquietante quando o extraordinário da poesia e do livro. Como se sabe, toda poesia guarda áreas
poeta chileno Vicente Uidobro escreve que “ todo de silêncio. A encenação dos meus poemas tenta preencher
poeta é um pequeno Deus”. algumas dessas áreas de silêncio, pois existem outras para
serem preenchidas pelo leitor disposto a fazê-lo.
LvF 2- quando você começou a se descobrir como
LvF 6- como foi tua passagem pela uFpi, naquele tempo de dias
poeta? quais suas primeiras tentações poéticas?
obscuros? viver a época da ditadura te trouxe problemas?
Rubervam Du Nascimento: no início foram os
livros bíblicos que me chamaram a atenção. Aliás, Rubervam Du Nascimento: entrei para o curso de Direito
único conjunto de livros que ocupava espaço na da UFPI com uma experiência considerável de luta estudantil,
casa onde vivi a infância e o começo da adolescên- adquirida enquanto estudante secundarista. Cheguei a ser
cia. Principalmente os livros de Isaias, Ezequiel, eleito em congresso de estudantes para dirigir o Centro Colegial
Daniel, Malaquias e Apocalipse que me desperta- dos Estudantes Piauienses, o CCEP, na década de 1970, época
vam uma espécie de ira sagrada ao lê-los. Ficava de plena dominação militar, censura, perseguição, tortura física,
com um gosto de vinagre apodrecido na boca mental e o que mais de terrível aconteceu naquela época de
quando devorava seus versiculos. Gostava de chumbo aos indivíduos que insistiam em atrapalhar com suas
ficar viajando com as imagens que esses livros ideias e/ou acções a ordem unida das coisas. Tudo o que se fazia,
me traziam. Para tentar compreendê-los decorava incluindo a poesia, era uma afronta ao governo que tomou
capítulo por capítulo e ficava dizendo em voz alta, a ferro e fogo as rédeas desse cavalo aparentemente dócil
trancado em meu quarto. Mas os livros que me chamado Brasil. Passei no vestibular para direito sem saber
despertaram para a poesia foram Os Lusíadas, que existiam dedos duros nas salas de aulas que sequer se
que encontrei entre outros livros empoeirados, demetrios galvão 4 - que importância tem a poesia na sua submeteram a concurso algum. Entraram na UFPI pelo teto, ou
e pastas e papéis inúteis numa espécie de biblio- vida e no seu cotidiano? sob o peso dos coturnos, na cota dos órgãos de repressão, para
teca abandonada no prédio do ginásio onde estu- acompanharem os passos de quem na universidade, questio-
dava, e um livro de poemas estranhíssimos que Rubervam Du Nascimento: além do ofício de poeta, exerço nava o milagre brasileiro do “para frente Brasil” ou do “ame-o o
me chegou às mãos através de um professor de no dia a dia outra profissão, que nem sempre me dá folga deixe-o”, que até hoje tem seus reflexos negativos nos destinos
português chamado Ildegardes: O Guesa Errante. para o exercício da poesia na hora em que bem entendo, deste país. Não entrarei em detalhes sobre as vezes que fui for-
Era adolescente, nessa época, tinha quinze anos posso dizer que çado a dar explicações sobre alguma declaração a jornal, rádio,
e ao invés de ir passear na praça, namorar, ficava
em casa lendo os livros da Bíblia, Sousândrade e
respiro poesia pela manhã, à tarde, a um xerife de plantão na província, na casa onde hoje funciona
uma pousada, na Arlindo Nogueira. Lembro que certa vez fui
Camões. Depois desse encontro, comecei a rabis- à noite e de madrugada. De segun- obrigado a explicar ao cara o que eu queria dizer em um poema
car alguma coisa que pensava tratar-se de poesia, da à sexta e nos fins-de-semana. publicado no jornal do CCEP que trazia em um dos versos o
mas não era, apenas rascunho que foi parar na nome Petrônio. Só que não se tratava do Petrônio Portela,
cesta de lixo, ou no fogo. Gosto de ver meu poema Sou um poeta que vive a poesia tratava-se do outro, do filósofo. Foi difícil explicar. Aliás, não
pegar fogo, virar chama e depois cinza. Alguns durante quarenta e oito horas deu para convencê-lo. Ele me olhava, riscava um papel e insistia
deles, purificados, voltam aos pedaços em versões
posteriores. Outros desaparecem para sempre do
diárias. que o Petrônio, era o Portela. Ao final carimbou o poema no
jornal e devolveu-me com alguma coisa rabiscada, que até hoje
meu caderno de memórias. Nessa época escrevi Não que eu considere tudo que eu vejo como matéria poé- não sei decifrar direito, rabiscou com a intenção de confundir-
um poema chamado: deslumbramento que uma tica. Alguma coisa que a gente encontra em nosso caminho a me, acredito. Nunca descobri o que escreveu. Acho que tinha
professora de português elogiou na sala de aula, gente tem que empurrar para o lixo. Não pode ser traduzido alguma coisa com censurado. Guardo comigo este e outros
chamou de poesia. Até hoje guardo cópia, mas por poesia, nem pode terminar em poema. Qualquer tentativa poemas meus carimbados pelos censores da PF. Mas nunca fui
jamais será publicado. Embora seja um poema de forçada do poeta com material não poético pode danificar o torturado fisicamente. O que me salvou, penso, foi nunca ter
forma livre, é muito ruim, de linguagem pobre, poema e torná-lo objecto escrito imprestável. Posso dizer que assumido papel de protagonista político partidário. Sempre
coisa de iniciante, muito parecido com a maioria o substrato principal dos meus poemas vem do meu olhar votei na chamada esquerda, desconfio que a direita continua a
do que é veiculado e que abarrota os espaços da atento, mas selectivo do comportamento humano, dos livros, existir e tem ganho força ultimamente, mas nunca assinei ficha
internet e que chamam de poesia. revistas e jornais que leio, das pesquisas e interpretações de partido político algum. Havia umas chapas eleitorais na UFPI
históricas, sociológicas, antropológicas que faço. constituídas por petistas, outras ligadas ao partido Comunista
LvF 3- Fale sobre os poetas e a poesia de
do Brasil, das quais sempre me neguei a participar, por entender
sua geração e comente um pouco sobre sua
LvF 5- Fala da tua relação com o teatro. que seguiam cegamente pautas de actividades partidárias que
participação na coletânea “ponta de lança na
não contemplavam qualquer discussão artística e cultural.
praça”?
Rubervam Du Nascimento: fiz curso de teatro no Rio de Minha luta, tanto como secundarista, quanto universitária era
Janeiro com o mesmo grupo do Fulvo Stefanini, José Wilker, pela arte e pela cultura que os partidos políticos nunca deram o
Rubervam Du Nascimento: mantenho contato Rosa Maria Murtinho e outros que hoje são artistas famosos. verdadeiro valor que merecem. O que eles querem dos artistas
com vários autores brasileiros e estrangeiros, Vim para o Piauí, tive algumas experiências nesse sentido, é ajuda para armar e desarmar o circo. Usam os artistas para
principalmente da América Latina. Com esses mas resolvi parar de fazer teatro. Afinal de contas descobri complementarem seus risos de deboches, para brincadeiras
autores troco além de correspondência, poemas. que escolher esta distanteresina para fazer arte, principal- de mau gosto, para molecagem. Todo partido político tem
Dessa forma alguns me pedem autorização para mente, é escolher um limite. Não se pode querer fazer uma uma dificuldade enorme em conviver com tudo que simboliza
incluírem meus poemas em livros ou para serem porção de coisas ao mesmo tempo, pois se corre o risco ou expressa arte e cultura. Não é a toa que os poetas foram
editadas em jornais ou blogs. Assim aconteceu de fazer-se tudo mal feito. Andei escrevendo uns contos, expulsos da República, desde Platão. Foram expulsos em razão
com a coletânea: ponta de lança na praça, editada algumas peças de teatro, iniciei um romance, mas acabei da arte e da cultura serem rebeldes por natureza, não aceitarem
7. Exero 01, 5555 BLA BLA BLA 7
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- discurso dirEcto
à tarde, à noite e de madrugada”
a mesmice, o jogo cínico e desigual do poder. Os doce dos indivíduos, em meus poemas. Já disse várias vezes
a poesia na sociedade do espectáculo ridículo mediático, da
mesmice diária, da brincadeira maliciosa, sem qualquer porção
defensores da sociedade ideal, planificada, racio- que poesia não é dom. Poesia é bagagem, é esforço contínuo, lúdica, dos meios de comunicação, todos eles, preocupados
nal, não aceitam o jeito torto dos poetas. Pior, é compromisso estético que precisa de renovação contínua, apenas em usar os artistas para a justificativa dos anúncios
todo partido que atinge o poder vira refém do para evitar o que eu chamo de “igolatria poética”: comprome- comerciais de produtos que vendem, descaradamente,
conservadorismo secular das elites políticas que timento precário dos poetas apenas esforçados que não vai dentro ou entre um capítulo e outro das novelas e programas
odeiam cultura. Não tem jeito. Antes de deixar além do umbigo, que acaba gerando poesia em série como de auditório. O que esperar, poetas, de uma sociedade que
o CCEP criei uma imensa biblioteca com mais de se fosse a coisa mais fácil equilibrar um poema no papel, mas perdeu o encanto e o direito à rebeldia e vive constantemente
cinco mil livros que hoje não sei onde foram parar, que acham que são bons poetas, entendem que para fazer sob a ameaça da violência e da tolice repetida até à exaustão?
vez que a sede da entidade, na rua 24 de Janeiro, poesia é necessário apenas inspiração, uma briguinha com O que fazer numa sociedade em que, diante disso, a chamada
onde funcionava a biblioteca, está completamente alguém que ama, ou odeia, se comportam como os escolhi- intelectualidade de farda e pijama se compromete cada dia mais
abandonada. Nos quatro anos e meio que estudei dos por Deus, jamais pelo Diabo, para levar a sua mensagem com a imortalidade dos defuntos e acredita que assim, com
na UFPI participei de passeatas, puxei algumas pelo deserto. seus pontos de vistas mofentos, está contribuindo para alterar
discussões em favor o belo quadro da idiotice social?
da cultura na con-
strução de algumas LvF 12- você é também um
chapas que concor- observador e um incentivador da
riam aos directórios “cena nova” (teu prefácio sobre o
sectoriais e central, meu “versificando” – ainda na gaveta
fui presidente de – ficou melhor que o livro), como
comissão eleitoral, é que você vê esse novo cenário
participei da greve da literatura aqui na “terrinha”?
de fome, ajudei a
reconstruir a UNE, Rubervam Du Nascimento: vejo
mas foi só. pouca articulação conjunta. Como
não acredito que não se subtrai
dg 7- comente um poesia do nada, penso que não se
pouco sobre seu faz arte sozinho. Fico satisfeito em
processo de criação saber que vocês existem. Descon-
e nos diga o que une heço outro colectivo funcionando
e o que distancia hoje como o de vocês nesta distan-
a poética dos seus teresina. A poesia precisa ser lida,
três livros (profissão discutida, remendada. A palavra
dos peixes, marco do outro às vezes salva um poema,
Lusbel desce ao ajuda a retirar uma palavra que está
inferno e os cavalos ferindo de morte um poema porque
de dom rufato)? foi mal colocada no verso e que
o poeta, por uma razão ou outra,
Rubervam Du sozinho não descobre. Procuro, na
Nascimento: em medida do possível, acompanhar o
artigo publicado que é editado a nível de poesia, por
recentemente na aqui e pelo país. Sempre que viajo à
imprensa local, serviço da repartição onde trabalho
o poeta Salgado ou para participar de algum festival
Maranhão que eu literário, passo horas em livrarias e
respeito, tanto como sebos procurando novidades. Con-
poeta, quanto como fesso que entre um grande número
ser humano, após a de bobagens, de repente aparece
leitura de Os cavalos um livro que merece releituras. O
de dom Ruffato, aponta-me como um migrante da dg 9- você acha que a literatura tem uma função política? Raniere Ribas, vocês o conhecem? Ele é professor da UFPI, tem
tagarelice espontânea da chamada Poesia Mar- uma poesia que incomoda, uma poesia consistente. Ele editou
ginal, para o discurso motivado da linguagem. E Rubervam Du Nascimento: a única causa que a poesia há cinco anos, mais ou menos, um livro de título e conteúdo
acrescenta em seu artigo que “poucos perceberam defende é a sua própria causa. A função da poesia nunca intrigante, Os Cactus de Lakatus e ninguém teve a coragem de
esse rito de passagem que trouxe vigor e amadure- foi e jamais será política, sempre foi e será poética. Falo da escrever alguma coisa sobre o livro. Silenciaram diante da ousa-
cimento ao verso praticado actualmente”. Inclui o política como sempre se praticou no país e no mundo por dia e da agressividade estética e de linguagem de um poeta
livro Os cavalos de Dom Ruffato como um exemplo partidos a reboque de pessoas disfarçadas de bons cidadãos, que merece ser lido e discutido. Gosto da poesia do Wanderson
que bem diferencia os desabafos sentimentais da a rigor, da pior espécie, que se apresentam como agentes Lima, do Adriano Lobão, da Carmen Gonzalez. Poetas um tanto
arte poética na sua duríssima carpintaria. Entendo responsáveis pela solução de nossos problemas, mas que jovens, mas com uma poesia que em nada perde para a poesia
que esse comentário do Salgado responde a per- na prática defendem seus próprios interesses e dos que lhes que se publica por grandes editoras no eixo Rio-São Paulo. Tem
gunta e dá pistas sobre o que aconteceu com a servem. A definição mais objectiva dessa política está no um poeta que publicou apenas um livro e é da minha geração,
minha poesia desde os indicadores de renova- dicionário. Diz lá que política é a prática ou profissão de con- mas que nunca mais ouvi falar em seu nome, o Francisco Sales.
ção presentes na 1ª edição do meu projecto de duzir negócios políticos. Podem grifar a palavra: negócios. A Ele editou o livro: Esboços ( paredes de papéis finíssimos) em
“vida palavra” que denominei de A Profissão dos Profissão dos Peixes, confesso, não tem nada a ver com isso. 1995 e de lá para cá não editou mais. É um bom poeta. Outro
Peixes, editado em 1987, com 2ª edição em 2003, A poesia somente se segura como objecto de prazer estético. dia deparei-me aqui com um livro excelente chamado: Terreiros,
no título e nas janelas do livro Marco Lusbel desce Desse modo, a poesia mexe e remexe todo o sistema límbico de uma poeta que não conheço pessoalmente de nome Keula
ao inferno, nos desafios postos no Os cavalos de do indivíduo. Não suporta o que não é sangue, o que não Araújo e me assustei com os poemas que escreve. Poemas
Dom Ruffato, até chegar à densidade estética e pula, nem pulsa. Ameaça o domínio da emoção domada, densos, bem construídos. Leio sempre a poesia do Demetrios.
substância de linguagem que consegui atingir na que nunca explode, escondida em baú de ossos, fechado Uma poesia urbana, visceral, visionária. O Valadares eu conheço
3ª edição, revista e diminuída, do A Profissão...que a sete chaves. A emoção que termina criando a morbidez de algum tempo e tem bons poemas. Vocês não sabiam, mas
será editada, ainda este ano, por uma editora de romântica, o atavismo das paixões embrulhadas em tecidos acompanhei de perto o que era editado na Trimeira. Comprava
São Paulo, tudo indica a Geração Editorial. apodrecidos, despedaçados e que teimamos em remendar. nas bancas de revistas e jornais. Cadê o pessoal que fazia a
A poesia transita muito bem entre o desequilíbrio e o medo Trimeira? A Trimeira acabou? Vocêsa anunciaram no terceiro
dg 8- quais seus dispositivos de criação?
de cair. Sabe conduzir-se pelo fio tênue estendido em cada número o fim da revista, não foi? Lembro versos como: mas
janela dos nossos dias. Experiência em escadas inseguras as vestes que te diziam alguma coisa/ não existem mais, da
Rubervam Du Nascimento: para permanecer por um fio à beira do abismo. Chega e se apossa de tudo que Lorena Albuquerque, alguma coisa da Renata Flávia, da Lee
poeta, procuro manter no dia a dia uma faca amo- pensamos que é assim, desse jeito e vira tudo pelo avesso. Flores, do Rodrigo Leite e da Arianne Pirajá que escreve versos
lada na pedra do meu cais, com uma enorme ponta O grande lance da poesia é que ela não existe com o fim inteligentes, de imagens fortes, como: flores constipadas, final
de fogo, guardada em minha pele, manejada por de mudar alguma coisa. É um brinquedo perigoso por que do poema: vida bandida, recentemente anexado no blog da
mim toda vez que me aproximo de algo que me intriga o entendimento das coisas. Dar outro nome às coisas academia onírica e da Laís Romero que escreve poemas com
provoca, me assusta, me excita. É com essa faca de que a gente acredita já ter nome. Reforça a cor das coisas que achados impressionantes. Parece-me a mais exigente, a mais
luz que corto e recorto o poema, antes e depois de a gente descobre esquecida num canto empoeirado de nossa preocupada em encontrar uma poética particular
ser colocado no papel, ou na tela do computador. casa. Pergunto: a beleza existe para mudar o quê?
Diferentemente de Shakespeare, poeta inglês, por
exemplo, que referencia a maioria de seus poemas dg 10- na sua percepção, que lugar a poesia tem ocupado no
em estrelas em órbitas, gosto mais de utilizar a
terra, o chão, as águas e o asco podre, azedo ou
mundo contemporâneo?
Rubervam Du Nascimento: é visível a falta de espaço para ESCRITO NO pORTUGUÊS BRASILEIRO
8. 8 BLA BLA BLA Exero 01, 5555
Terça-feira, 19 de Julho de 2011 https://revistaliteratas.blogspot.com 8
Em outras paLavras
O veneno de Sócrates
… Foi pois sob o «veneno de Sócrates» que Carlos Antunes
sucumbiu entre as pernas da mulher, com os lábios ainda
molhados de sucos vaginais … enfermidades. A malária, papeira, pneumonia e tuberculose, E, por isso, foi necessário julgar o homem e abater sobre a cabeça
que assumiram por vezes um carácter epidémico, são disso deste um dilúvio apocalíptico, na senda da violenta destruição
VICTOR EUSTAQUIO - LISBOA um bom exemplo ao aparecerem nas proposições hipocráticas de Sodoma e Gomorra, na senda da ira original contra Adão,
inelutavelmente relacionadas com factores climáticos, raciais e que não resistiu a desobedecer a Deus e comer da árvore do
A mise-en-scène brochante não passou disso mesmo. De um mesmo dietéticos, denominadores comuns que fazem avultar a conhecimento do bem e do mal. “No dia em que dela comeres,
fait divers que acabou por brochar com o tempo, não obstante os importância da escala de valores em que cada povo se posiciona certamente morrerás”, disse o Senhor a Adão. Mas o aviso não
protagonistas do caso ou, em rigor, o próprio caso em si ter ficado e o modo como cada um conduz a sua vida, física e espiritual. A foi suficiente. Resultado: Adão e Eva, que dantes andavam nus,
mundialmente conhecido. Ou quase. O que parece dramático, dicotomia é evidente e inevitável: está-se do lado das forças do perderam a inocência, passando a cobrir os seus órgãos genitais,
insistimos, é que há mais, muito mais. Citemos apenas mais um bem ou das forças do mal. E a isto ninguém escapa, pois não há tal como perderam a imortalidade. E mais: o parto, símbolo
caso, ainda no Chile, referenciado aqui sem qualquer objectividade meio-termo. E é aqui que entram as mulheres. Com efeito, Hipó- derradeiro da vontade celestial, que devia ser um momento de
geográfica, aproveitamos para sublinhar, mas tão-somente devido crates demonstrou de forma cabal e inequívoca – suprima-se a prazer supremo, foi condenado ao sacrifício da dor. “Multiplicarei
à profusão de notícias que do País chegam e que muito têm con- redundância pleonástica – como a mulher é uma espécie inferior, grandemente a tua dor, e a tua concepção; com dor darás à luz
tribuído para a história recente do sexo oral na sua dimensão palu- equivalente à dos animais; é o que se pode inferir da sua análise filhos; e o teu desejo será para o teu marido, e ele dominará”,
dosa: uma adolescente de 15 anos foi filmada num quarto, também sobre a histeria, um desarranjo mental tipicamente feminino. ditou o Senhor à mulher. E a Adão disse: “Deste ouvidos à voz de
com telemóveis, com a boca nos pénis de três amigos, com idades Com base num extenso e longo trabalho de pesquisa científica, tua mulher, e comeste da árvore de que te ordenei, dizendo: não
compreendidas entre os 25 e 30 anos, e houve rumores de que teria embrionário é certo, mas longe do empirismo áspero e penoso comerás dela, maldita é a terra por causa de ti; com dor comerás
feito o mesmo com um outro homem, uma fricção labial culminante do polímata egípcio Imhotep (por vezes citado como Immutef, dela todos os dias da tua vida. Espinhos, e cardos também, te
que terá sido igualmente registada em formato digital. Im-hotep ou Ii-em-Hotep), Hipócrates concluiu que, quando as produzirão; e comerás a erva do campo.”
O sexo oral sempre teve destes problemas, repetimos, embora o mulheres não podem ter filhos, o útero descai, impede-as de Por que razão se tornou Deus num ser tão vingativo e maldosa-
essencial da questão não resida na modalidade sexual em si. Esta respirar e faz com as que as angústias lhes subam à cabeça, o mente hediondo? Por que razão Deus voltou com a palavra atrás
constitui, aliás, uma prática saudável para a vida íntima de qualquer que explica os devaneios histéricos e a necessidade de cumprir a para encarar o acto do amor como um gesto de pecado? Não faz
casal – excepto para Carlos Antunes – que até pode ser potenciada palavra do Senhor. “Sede fecundos e multiplicai-vos; espalhai-vos sentido, tanto mais que acabou por dar uma nova oportunidade
quando exercida em simultâneo, numa desafiante amálgama de pela Terra e multiplicai-vos sobre ela”, disse Deus a Noé e aos filhos ao homem e repetir a Noé e aos seus filhos o que tão claramente
sucos vaginais e nacos de esperma, com as variantes homossexuais, deste, aquando da nova oportunidade dada ao homem após o havia ordenado a Adão. “Sede fecundos e multiplicai-vos!” Terá
transexuais, lésbicas e mesmo grupais e transgénicas, para arredar fracasso pré-diluviano de toda a descendência de Adão, a quem sido a bestialidade do sexo demais para o olhar puro e imaculado
de vez a monotonia mórbida das paixões missionárias. O problema o Senhor havia recomendado o mesmo. dos anjos, os guardiões e mensageiros do céu? Estaria implícito
está no apetite pela inocência roubada, movido por desejos erráti- Quer isto dizer que, sendo a histeria uma maleita das virgens nas palavras do Senhor que a procriação deveria ser apenas um
cos censuráveis e altamente condenáveis. e das estéreis, mulheres com ausência de ovulação, lesões nas acto missionário, mecânico, fastidioso, enfadonho? Que não
Não admira, pois, que Maria Clara andasse tão convencida de ter trompas de Falópio, endometriose ou problemas do colo do útero deveria haver prazer mas apenas sentido de missão? Se assim foi
razões, e de sobra, para usar, em sede de sexo oral, a mesma arma e, portanto, desnecessárias, o sexo com fins procriadores, e com e assim é, compreende-se que a sodomia, a masturbação e todo
na versão feminina, após anos e anos de cedências esbraseadas aos mulheres férteis – sublinhe-se – apresenta-se como uma obriga- e qualquer outro gesto de manipulação dos órgãos genitais de
mais variados desejos carnais de Carlos Antunes. Um ataque vaginal ção de qualquer homem, tanto mais que só assim se cumpre a outrem são condenáveis.
fulminante contra a integridade da vida do marido, um chefe de palavra do Senhor. O sexo oral sempre teve destes problemas, pelo que não admira
família que pisava convicto os terrenos da Igreja e da fé, onde quem Não podemos deixar de estranhar, contudo, que Deus, Pai todo- que Maria Clara tenha feito da sua vulva uma arma mortífera à
manda são os homens, mesmo sem uma costela, retirada à força poderoso, criador do céu e da terra e de todas as coisas visíveis, o qual sucumbiu Carlos Antunes de forma traiçoeira e grotesca.
pelos propósitos divinos para dela fazer a espécie da mulher, uma mesmo que no Jardim do Éden deu ao homem a liberdade total, Com o «veneno de Sócrates» disfarçado com fragrâncias vaginais
vez criada a espécie dos animais. incentivando a reprodução por via sexual sem nunca referir que a corroer-lhe a língua e os lábios. Após uma dança clitoriana tão
E quem disto tem dúvidas, por eventualmente identificar nos podia haver meios que não serviam os fins, tenha olhado para diligentemente conduzida.
textos sagrados um sentido apócrifo, é bom lembrar os ensina- a Terra pouco tempo depois e determinado, por um misterioso – // –
mentos de Hipócrates, o insuspeito «pai da medicina» da gloriosa silogismo, que a mesma estava corrompida. Por outras palavras, o (continua)
Cidade-Estado de Atenas. O estudioso da Grécia antiga, um homem cumprimento das ordens primeiras deu lugar afinal à percepção Online? Talvez um destes dias (após revisão de comentários e
com uma integridade ética total, que até legou o famoso «Jura- divina da existência da Babilónia, a Grande, morada de meretrizes sugestões, que esta coisa merece atenções redobradas, não vá o
mento de Hipócrates», encontrou sempre uma forte causalidade sentadas numa fera cor de escarlate, com sete cabeças e dez chi- Diabo tecê-las com um ataque massivo de cicutoxina vaginal)
Rua Araújo
exógena no pólo de explicação da maioria das doenças e outras fres (argumento que voltaria a ser recuperado na Era pós-cristã).
Desde que fora naquele século, só manda cartas, “mas há-de morrer cedo”
EDUARDO QUIVE - MApUTO
diz D. Destina em pensamento alto de dor.
Antes dissera-se com muita fama que havia um santuário carnificínico nas - é quem que vai morrer cedo?
manhas de Maputo, a cidade grande, onde muitos homens se encontram. Uns - Nada vovô! Nada. Não é ninguém não. – Responde com voz de ni tsikli. Na
para melhorar a vida, outros só para viver a sabor, a frescura e desgraça que saudade da sua solteirisse, que não lhe dá o direito de justificar-se a alguém.
se tornou numa graça dos deuses diabólicos. Tal solteirisse se exalta em Nikotile, que vai saciando a fome masculina dos
Mas Maputo fora também cidade de mulheres, umas complementando a homens no Ka Mpfumo. Deixou-se comer na carnificina de Rua Araújo e agora Chega no pequeno quarto improvisado para assuntos de suprema
vida boa que os homens tanto alegavam haver no Ka Mpfumo, outras, eram só ficou com uma coisa. Tal coisa que não lhe serviria em Deus me livre, por rapidez. Estranha o cenário molhado que caracteriza o lugar. Cheiro
mesmo a voz do sacrifício. Munidas de trouxas na cabeça, com a ponta da isso embora a saudade espreitasse seu coração em nenhum momento devia de homem e carne fria, suor e gemidos de gente grande. Olha para
capulana sufocando as poucas notas que garantem o mutlutlu, para famílias para lá voltar. outro lado e vê só camas e postes improvisados. Não tem mala com
numerosas. Escurece. As trevas se instalam no caos da avenida. é hora de ir a putaria. roupa. Nem mesa nem cadeira nem nada. é só cama, e cheiro de
Rua Araújo é também Maputo. é Ka Mpfumo, também. Muitos mares des- Nikotile, enxuga as suas lágrimas com ânimo da sua primeira actividade homem misturado com cheiro de carne descosida, fervida ao calor.
viados do trajecto desaguam lá. Rua Araújo fora uma carnificina que comia laboral. Sai para Rua Araújo de simples vestido de Cai-cai que ganhara de Tenta controlar-se para não fazer perguntas. Mas não aguenta!
tudo quanto mulher, mas também engolia quando podia os homens sexu- presente na única vez que cortara o bolo do seu aniversário, cinco anos antes - é aqui mesmo… – e não para de observar com estranheza.
ados. Xiluva também fora lá parar, na ambição da própria carne, que é fraca, dos 16 que já tem. Kotile é virgem. - Sim. Você vai trabalhar aqui. Fique feliz porque é o melhor.
mesmo com coração de pedra de tanta firmeza. Tudo duro mesmo. Como os Kotile vira das mais puras donzelas da descendência dos Nkomanes, parte Muitas meninas não têm quartos por aqui e acabam tudo nas escadas
verdadeiros Nkomanes e filhos daquelas terras fartas de desgraças deste vizinha com outros viventes do Deus me livre, mas saíra de lá numa aven- emprestadas pelos guardas a cinquenta meticais por cada viagem!
mundo que é hoje. tura desconhecida e de para quedas veio cair na cidade que hoje lhe oferece - Quer dizer que vou viajar também? – pergunta inocentemente.
- Não se faz mais mhamaba, não se faz mais invocação aos deuses, tudo emprego. Emprego de impurezas. Serviço de se entregar por metical aos - Menina. Você não veio aqui para brincar. é para trabalhar… e
era mesmo. Tudo já era – invocam-se os adultos, na voz a sabor da dor que se homens! mais… viagem foi jeito de falar contigo. Toca a mexer. Manda vir o
exalta com a sua pele de velhos. Atravessa o alcatrão com chinelos de pipoca sem fazer barulho. é noite. A primeiro! - Grita para outro lado por onde vem um homem
Mas nem com isso. Tudo fora mesmo com outros Nhankwaves. Os verdadeiros noite é sagrada em Nkomane. é sagrada em Deus me livre também. por isso
desuses, já não existem, todos tombaram na frustração de ver os seus filhos a não pode fazer barulho. Os deuses não gostam. pEQUENO GLOSSÁRIO
trocar Ucanhu, por cerveja e de a valorizarem tanto que não entornam quando “A noite não é para criaça”, recorda nos silenciosos passos de fé que dá até
escurece para dizer “cokwane Mevasse, sou eu Nambita, kanimambo vovô, quando chega. Mutlutlu – molho (geralmente feito com simplicidade)
por ter tirado todo mal de mim. Toma aí fole e um pouco de tontonto.” Conta Sandra. Mulher de longos anos de trabalho com larga experiência no tra- Ka Mpfumu – nome tradicional da cidade de Maputo.
a velha Xinengane, a herança do Deus me livre. Contara isso de propósito a D. balho e funcionária de muito respeito na Rua Araújo, põe-se a recebe-la com Tontonto – aguardente.
Destina, para de seguida perguntar. gestos de bem-vindo. De seguida, manda-a mudar de roupa. O traje não fora Ukanhu - Bedida de Canhu!
- Kotile? com o estilo de trabalho que arranjara com tanta facilidade na cidade que Ni Tsiki – Deixa-me.
Calasse a mulher indignada com o propósito e pertinência em que se invoca muitos homens sofrem para encontrar trabalho e muitas mulheres vivem de Mulumuzana – Chefe de Família!
tal nome daquela que fora sua filha antes de Antoninho decidir ser vivente das vender amendoim torrado, pão e badjia, camarão e peixe frito na rua. Mas Mhamba – Kuphalha – acto de invocar espírito antepassados.
minas, mulumuzana das ma zulu. Nikotile tivera sorte dos Deuses que a protegem. Teve trabalho logo-logo. Kanimambo – obrigado