1. Tribunal de Justiça de Minas Gerais
Número do 1.0512.09.073110-4/001 Númeração 0731104-
Relator: Des.(a) Ana Paula Caixeta
Relator do Acordão: Des.(a) Ana Paula Caixeta
Data do Julgamento: 02/10/2014
Data da Publicação: 09/10/2014
EMENTA: AÇÃO DE INDENIZAÇÃO - INSTALAÇÃO DE PARQUE DE
DIVERSÕES - USO DE BEM PÚBLICO - DETERMINAÇÃO DE
DESMONTAGEM - NÃO COMPROVAÇÃO DO CONSENTIMENTO DO
MUNICÍPIO - RESPONSABILIDADE OBJETIVA - NÃO CONFIGURAÇÃO.
- A responsabilidade civil das pessoas jurídicas de direito público é objetiva -
independente de prova de culpa, porque amparada na teoria do risco
administrativo, prevista no art. 37, § 6º da Constituição Federal/1988.
- Tratando-se de responsabilidade objetiva, revela-se suficiente para o
reconhecimento do dever de indenizar a comprovação da ocorrência do
dano, da autoria e do nexo causal.
- Admite-se que, mediante provas contundentes, seja afastada a
responsabilidade quando evidenciada alguma das excludentes do dever de
indenizar, quais sejam: culpa exclusiva da vítima, caso fortuito ou força maior
e culpa exclusiva de terceiro.
- Não sendo comprovada qualquer irregularidade na atuação do Município,
não há que se falar em condenação ao pagamento de indenização por danos
morais e materiais.
APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.0512.09.073110-4/001 - COMARCA DE PIRAPORA
- APELANTE(S): ANTONIO CARVALHO PERICO - APELADO(A)(S):
MUNICÍPIO BURITIZEIRO
A C Ó R D Ã O
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Vistos etc., acorda, em Turma, a 4ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de
Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos,
em NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO, PREJUDICADO O PEDIDO DE
CONDENAÇÃO POR LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ.
DESA. ANA PAULA CAIXETA
RELATORA.
DESA. ANA PAULA CAIXETA (RELATORA)
V O T O
Cuida-se de apelação cível interposta contra a sentença de f. 91/98,
proferida pela MMa. Juíza de Direito da 2ª Vara Cível da Comarca de
Pirapora, Dra. Fernanda Chaves Carreira Machado, que, nos autos da "Ação
de Indenização por Danos Morais, Materiais e Lucros Cessantes" ajuizada
por Antônio Carvalho Perico - nome fantasia Parque de Diversões Holliday
Center -, em desfavor do Município de Buritizeiro, julgou improcedente o
pedido inicial e condenou o Autor ao pagamento de honorários advocatícios,
arbitrados em R$700,00, suspensa a exigibilidade nos termos do art. 12 da
Lei nº 1.060/50.
Inconformada, a parte Autora, em suas razões recursais, defendeu a
aplicabilidade da teoria da responsabilidade objetiva; que a culpa está
devidamente caracterizada; que de inteira má-fé o Município não liberou o
alvará de funcionamento do parque de diversões quando constatou que
outros compromissos estavam colidindo com permanência do parque no
local.
Sustentou que adotou as medidas necessárias e legais para a instalação
do parque no período de 02.10.09 a 02.11.09, conseguindo autorização para
iniciar suas atividades; que foram devidamente pagos todos os impostos
junto ao Corpo de Bombeiros - DAE, CREA e
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ISS para liberação do alvará; que foi autorizado pelo Gerente de Tributação o
início das atividades, pois o alvará definitivo seria entregue após os trâmites
legais; que o parque de diversões foi instalado por 14 dias na Praça dos
Pescadores e começou a funcionar a partir de 03/10/09, por somente 03
dias.
Relatou que foi procurado pelo Prefeito Municipal em 07/10/09, quando
foi proibido de ligar a energia, pois, na rua em frente ao Parque seria ligado
um telão para exibição de um filme; que havia vendido naquele dia cerca de
400 ingressos e teve prejuízos; que no dia seguinte foi novamente procurado
pelo Prefeito para que desocupasse a Praça, pois no dia 14/10/09 o
Presidente da República iria visitar o Município e naquele local seria
construído um palanque; que não possuía condições financeiras de
providenciar a desmontagem, tendo o Prefeito assumido as despesas não
programadas; que providenciou a desmontagem de forma rápida, com a
ajuda de pessoas inabilitadas cedidas pela Prefeitura, ocasionando vários
prejuízos e danos aos equipamentos, sem falar nos prejuízos ocasionados
pelo não funcionamento do parque, visto que teve que restituir o dinheiro
para várias pessoas que haviam comprado ingresso.
Defendeu que o Prefeito Municipal da época não liberou o Alvará de
Funcionamento propositalmente, incorrendo nestes autos em litigância de
má-fé
Sustentou a presença dos requisitos configuradores da responsabilidade
civil, pugnando pelo provimento do recurso para o fim de julgar procedente o
pedido inicial.
Regularmente intimado, o Réu apresentou contrarrazões às f. 111/116,
pugnando, em suma, pelo desprovimento do recurso.
Desnecessária a remessa dos autos à Procuradoria-Geral de Justiça.
Conheço do recurso, uma vez presentes seus requisitos
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intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade.
As partes divergem, em essência, quanto à existência de
responsabilidade do Município de Buritizeiro pelo ressarcimento de danos
supostamente suportados pela parte Autora em razão da desmontagem às
pressas do Parque de Diversões Holliday Center, o qual se encontrava
instalado na Praça do Pescador.
A responsabilidade civil das pessoas jurídicas de direito público é objetiva
- independente de prova de culpa, porque amparada na teoria do risco
administrativo, prevista no art. 37, § 6º da Constituição Federal/1988, in
verbis:
§ 6º - As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado
prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus
agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de
regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.
Sobre o tema ensina Diógenes Gasparini:
"Sabe-se que a responsabilidade civil do Estado, instituída nesse
dispositivo constitucional, é a do risco administrativo ou objetiva, dado que a
culpa ou dolo só foi exigida em relação ao agente causador direto do dano.
Quanto às pessoas jurídicas de Direito Público (União, Estado-Membro,
Distrito Federal, Município, autarquia, fundação pública) e às de Direito
Privado prestadoras de serviços públicos (concessionários, permissionários)
nenhuma exigência dessa natureza foi feita. Logo, essas pessoas
respondem independentemente de terem agido com dolo ou culpa, isto é,
objetivamente." (Direito Administrativo, 10ª ed., São Paulo, Saraiva, 2005, p.
913).
Tratando-se de responsabilidade objetiva, revela-se suficiente para o
reconhecimento do dever de indenizar a comprovação da ocorrência do
dano, da autoria e do nexo causal.
Todavia, admite-se que, mediante provas contundentes, seja
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afastada a responsabilidade quando evidenciada alguma das excludentes do
dever de indenizar, quais sejam: culpa exclusiva da vítima, caso fortuito ou
força maior e culpa exclusiva de terceiro, situações em que há o rompimento
do nexo de causalidade.
Sérgio Cavalieri Filho sobre o tema preleciona:
"A teoria do risco administrativo, embora dispense a prova da culpa da
Administração, permite ao Estado afastar a sua responsabilidade nos casos
de exclusão do nexo causal - fato exclusivo da vítima, caso fortuito, força
maior e fato exclusivo de terceiro. O risco administrativo, repita-se, torna o
Estado responsável pelos riscos de sua atividade administrativa, e não pela
atividade de terceiros ou da própria vítima, e nem, ainda, por fenômenos da
Natureza, estranhos à sua atividade. Não significa, portanto, que a
Administração deva indenizar sempre e em qualquer caso o dano suportado
pelo particular." (CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade
Civil, 3. ed., São Paulo: Malheiros, 2002, p. 186).
Do exame atento do caderno processual, verifico que as provas
produzidas em juízo não são hábeis a comprovar o fato constitutivo do direito
do Autor, não tendo este se desincumbido do ônus que lhe era próprio (art.
333, I, CPC). Vejamos.
A controvérsia travada nos autos está relacionada ao uso de bem público
para fins particulares.
Sobre o tema, José dos Santos Carvalho Filho preleciona:
"Os bens públicos podem ser usados pela pessoa jurídica de direito
público a que pertencem, independentemente de serem de uso comum, de
uso especial ou dominicais. Essa é a regra geral. Se os bens pertencem a
tais pessoas, nada mais normal que elas mesmas os utilizem.
Não obstante, é possível que sejam também utilizados por particulares,
ora com maior liberdade, ora com observância dos
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preceitos legais pertinentes. O que é importante no caso é a demonstração
de que a utilização dos bens públicos por particulares deve atender ao
interesse público, aferido pela Administração. Daí porque inferimos que esse
tipo de utilização pode sofrer, ou não, regulamentação mais minuciosa."
(Manual de Direito Administrativo - 25ª edição revista, ampliada e atualizada
até a Lei nº 12.587, de 3-2-2012 - São Paulo: Atlas, 2012. Pág. 1147.)
Relata a inicial que o Gerente de Tributação do Município informou ao
Autor que este poderia iniciar suas atividades, pois o alvará definitivo seria
entregue posteriormente após trâmites legais para liberação do documento.
Observo que, em 27/07/2009, foi protocolado, perante a Prefeitura
Municipal de Buritizeiro, pedido de expedição de alvará de localização e
funcionamento do Parque de Diversões Holliday Center, nome fantasia do
empresário individual Antonio Carvalho Perico - aqui Autor/Apelante, tendo
sido indicado naquela ocasião o seguinte endereço de instalação: Av. Manoel
Joaquim Melo - área do Supermercado Albatroz, em período a definir (f. 12).
Não há nos autos notícia de que tal pedido tenha sido regularmente
deferido.
Também inexiste explicação quanto à alteração do endereço de
instalação do parque de diversões.
Fato é que o parque foi efetivamente instalado na Praça do Pescador
(Rua Josias Carneiro, 385 - Centro - Buritizeiro), endereço apontado no
Boletim de Ocorrência de f. 16/17, nos documentos de f. 20/24, apresentados
ao Corpo de Bombeiros, e na Anotação de Responsabilidade Técnica - ART,
de f. 25.
Ao que tudo indica, o Autor assumiu o risco de promover a montagem
das máquinas e equipamentos na Praça do Pescador antes de obter o
alvará, pois inexiste qualquer prova que corrobore as alegações de que
houve consentimento do Município, ainda que
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provisório, em momento anterior, certo que atos dessa natureza devem ser
documentados.
Diga-se que o expediente de f. 11, firmado pela Secretária Adjunta de
Turismo, Esporte e Cultura do Município de Buritizeiro, não serve a tal
desiderato, pois apenas informa modificação da data em que o parque
estaria em atividade, sem, contudo, afirmar que houve deferimento do pedido
de alvará. Em verdade, a Secretária solicita ao Gerente de Tributação "que
sejam feitas as exigências cabíveis para a atuação do Parque em nosso
município".
Nesse cenário, ausente prova de que houve consentimento do Município
do uso do bem público, a determinação de desmontagem do parque de
diversões não se afigura ilegal, encontrando-se no âmbito de atuação regular
do poder de polícia estatal.
Pode-se dizer, inclusive, que os danos experimentados pelo Autor
decorreram de sua conduta pouco cautelosa, o que implica dizer que foi ele
próprio quem causou os danos que alega ter sofrido.
Diante de tais fatos, deve ser mantida a conclusão a que chegou a
Magistrada "a quo".
Resta prejudicado o pedido de condenação por litigância de má-fé (f.
106/107).
Com essas considerações, NEGO PROVIMENTO AO RECURSO,
mantendo incólume a sentença vergastada, PREJUDICADO O PEDIDO DE
CONDENAÇÃO POR LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ.
Custas recursais na forma da lei.
DES. MOREIRA DINIZ (REVISOR) - De acordo com o(a) Relator(a).
DES. DUARTE DE PAULA - De acordo com o(a) Relator(a).
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SÚMULA: "NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO,
PREJUDICADO O PEDIDO DE CONDENAÇÃO POR LITIGÂNCIA DE MÁ-
FÉ."
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