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III Seminário Nacional
PaternidadeS
e Primeira Infância
Avanços e Desafios do Cuidar
Promoção:
Rede Nacional Primeira Infância- RNPI
Secretaria Executiva da RNPI/ CECIP- Centro de
Criação de Imagem Popular (Biênio 2015-2017)
Claudius Ceccon
Maria Mostafa
Simone Valadares
Rosa Maria Mattos
Isabella Gregory
Verena Dolabella
Elaboração e Revisão do Relatório
Técnico:
Aguinaldo Campos
Revisão Técnica:
Grupo de Trabalho Homens Pela Primeira Infância
Integrantes do
GT Homens pela Primeira Infância:
Aguinaldo Campos (Aldeias Infantis SOS Brasil)
Fabio Paes (Aldeias Infantis SOS Brasil)
Leandro Ziotto (4Daddy)
Mariana Azevedo (Instituto Papai)
Marcus Renato de Carvalho (Aleitamento.com/UFRJ)
Milena do Carmo (Instituto Promundo Brasil)
Simone Valadares (CECIP)
Viviane Manso Castello Branco (Comitê Vida/
Secretaria Municipal de Saúde do Rio de Janeiro)
Téo Cordeiro – Casa de Parto David Capistrano
Projeto Gráfico e Diagramação:
Ramon Tanino
Aldeias Infantis SOS Brasil
Cartuns e Vinhetas:
Claudius Ceccon
Organização:
GT Homens pela Primeira Infância
Realização:
Aldeias Infantis SOS Brasil
4Daddy
Apoio:
Fundação Maria Cecília Souto Vidigal
Instituto Papai
Plan International Brasil
Impressão:
Paulus
III Seminário Nacional Paternidades e Primeira Infância: Avanços e Desafios do Cuidar
Relatório Técnico
Introdução	 5
Principais Discussões /
Reflexões do Seminário		 7
Mesa de Abertura	 7
Lançamento do documentário 	
O Poder do Cuidar	 10
Primeira mesa:
Políticas Públicas de
Apoio ao Cuidado Paterno	 11
Participação da Plenária	 16
Participação Infantil	 17
Segunda mesa:
Paternidades Diversas	 18
Casa de Oportunidades	 19
Participação da Plenária	 21
Terceira mesa:
Paternidades e Dinâmicas Familiares	 23
Participação da Plenária	 26
Desafios do Cuidar:	
Oficinas Vivenciais e Rodas de
Conversas para Escuta e
Troca de Experiências	 27
Oficina de Roda 1: Amamentação e
Alimentação Saudável	 28
Oficina de Roda 2: Homens nas
Creches Parentais e na
Educação Infantil: 	 30
Oficina de Roda 3: Educação para a
Equidade de Gênero 	 34
Bate Papo com autores 	 36
Show de Encerramento	 39
Carta de Recomendações	 40
Referências Bibliográficas	 42
Leis 	 42
Teses e Trabalhos Acadêmicos	 43
Cartilhas e Manuais	 44
Links de Vídeos	 44
Links Recomendados		 44
Sites das organizações integrantes do
GT Homens pela Primeira Infância	 45
Sumário
III Seminário Nacional Paternidade e Primeira Infância 5
Um país que vinha se destacando por déca-
das na liderança de movimentos e de políticas
públicas voltadas para a criança e o adolescente,
percebe-se em um momento de reflexão e de crí-
tica que necessita ser feita, a bem do futuro dos
avanços conseguidos, encarando e enfrentando
os desafios trazidos nos últimos dois anos de per-
das de direitos fundamentais que se revelarão no
prejuízo da constituição de, pelo menos, uma ge-
ração de brasileirinhas e brasileirinhos.
Nesse contexto desafiador, a proposta do III
Seminário Nacional Paternidades e Primeira In-
fância: avanços e desafios do cuidar, promovido
pelo GT Homens pela Primeira Infância, da Rede
Nacional Primeira Infância, veio propor a visibili-
dade das diversidades de experiências de pater-
nidades e possibilidades de ampliação de direi-
tos e efetivação das políticas públicas instauradas
pelo Marco Legal da Primeira Infância.
A abordagem da perspectiva do direito à
paternidade pelos pais encarcerados, os pais
adolescentes, os pais de todas as raças, os pais
LGBTTRANS, como vieses de possibilidades de
exercício do cuidado, acabou revelando uma re-
flexão de classe, oportunizando a pauta da crian-
ça e da família que têm suas dinâmicas fortemen-
te influenciadas pelos interditos socioculturais e,
sobretudo, econômicos, demandando espaço
para a urgência de discussão e implementação
de políticas públicas que possam alterar essa rea-
lidade repleta de iniquidades.
Avanços também são percebidos: empresas
como a Natura já assimilam a importância e o ga-
nho real para a produtividade quando amplia a
licença-paternidade e incentiva os funcionários a
gozarem desse direito de consolidarem os víncu-
los com seus filhos e companheiras/os.
A construção da maternidade e da paterni-
dade passa por um processo que vai desde a so-
lidificação e implementação, garantia e controle
de execução dos direitos já conquistados pelas
políticas públicas à construção desse direito de
conviver desde as primeiras horas com os filhos/
as, da educação, saúde, cultura, lazer, espaços e
cidades adequados, inclusivos e humanos que se
deseja para eles.
Mesmo em um momento em que a luta pela
manutenção de direitos já conquistados legalmen-
te é urgente, não se pode perder de vista a ne-
cessidade de continuar em busca das utopias que
movem coletivamente para uma sociedade natu-
ralmente envolta pela equidade dos gêneros, no
exercício de suas sensibilidades e potencialidades,
em que o olhar integral do ser seja a base para as
relações em todos os âmbitos, da educação à saú-
de, ao direito de amamentar, às garantias de se-
gurança, respeito, alteridade e intercâmbio. Uma
sociedade, não só pelo direito, mas de fato, justa.
Introdução
“Quando amamos, cuidamos e quando cuidamos,
amamos. O cuidado constitui a categoria central do
novo paradigma de civilização que trata de emergir
em todo o mundo. O cuidado assume uma dupla fun-
ção de prevenção de danos futuros e regeneração de
danos passados...” Leonardo Boff.
III Seminário Nacional Paternidade e Primeira Infância 7
Mesa de Abertura
A mesa de abertura foi composta por:
Simone Valadares, Representante do CECIP-
Centro de Criação de Imagem Popular, atual
Secretaria Executiva da Rede Nacional Primeira
Infância; Mariana Azevedo, Coordenadora Ge-
ral do Instituto Papai e Coordenadora do GT
Homens pela Primeira Infância; Sandra Greco,
Gestora Nacional da Aldeias Infantis SOS Bra-
sil; Flávio Debique, Gerente de Estratégias de
Programas da Plan International Brasil; Leandro
Ziotto, membro fundador do Portal 4Daddy e
Ana Claudia Vasconcellos, representante de
parcerias e comunicação do Projeto Quixote.
Após a composição da mesa, todos foram
convidados a cantar o Hino Nacional Brasileiro,
acompanhado pela voz de crianças1
.
1
Vídeo produzido por Iraildes Palmeira para o I Encontro
Estadual de Educação Infantil da Bahia. https://www.youtu-
be.com/watch?v=oDLXBpHF_wk 
Simone Valadares fez um histórico do sur-
gimento do GT Homens pela Primeira Infância
na Rede Nacional Primeira Infância explicando
que, com o avanço nos direitos da primeira in-
fância, o tema da paternidade ganhou relevân-
cia, em especial a participação dos homens nos
cuidados das crianças. O CECIP desenvolveu
uma Campanha sobre a participação dos ho-
mens na educação e no cuidado das crianças,
que teve como resultados a criação do Grupo
de Trabalho Homens pela Primeira Infância, mo-
mento em que foram convidadas organizações
da RNPI, com reconhecida experiência no tema,
para discutir a participação dos homens nos
cuidados das crianças pequenas. Isso resultou
no desafio de realizar o I Seminário Nacional
Paternidade e Primeira Infância, que acon-
teceu nos dias 26 e 27 de agosto de 2015 no
Rio de Janeiro, e possibilitou, promoveu e divul-
gou a elaboração de um relatório técnico que
compilou o posicionamento de especialistas de
diversas áreas sobre o exercício da paternida-
de. A partir daí, os integrantes do GT passa-
ram a desenvolver atividades, propor reflexões
e atuar, na RNPI, no sentido de proposição de
políticas públicas que favorecessem a participa-
ção do homem na vida dos filhos e filhas. Em
2015, época em que tramitava na câmara dos
deputados, o projeto de lei 6998/13, específico
ao tratar de questões do desenvolvimento da
criança na primeira infância, houve forte ação de
incidência da RNPI que contou com a incansá-
vel atuação de seus membros ao acompanhar
e pressionar a aprovação do PL que, em março
de 2016, foi sancionado pela presidenta Dilma
Rousseff e deu origem à Lei 13.257/16, conhe-
cida como Marco Legal da Primeira Infância.
Principais
Discussões /
Reflexões do
Seminário
Primeiro dia: 01/09/2017
Relatório Técnico 20178
O Marco Legal ampliou a licença paternidade
de cinco para vinte dias, fortalecendo as discus-
sões iniciadas pelo GT Homens pela Primeira
Infância sobre a participação dos homens nos
cuidados com as crianças. Já o II Seminário
Nacional Paternidade e Primeira Infância,
realizado em Recife, nos dias 30 e 31 de agosto
de 2016, provocou a discussão sobre os desa-
fios e possibilidades da ampliação da licença-
-paternidade, passando da teoria à prática. Ao
encerrar sua fala, Simone mencionou a criação
do logo do III Seminário Nacional Paternida-
des e Primeira Infância, também realizada por
Claudius Ceccon, que traz a imagem do pai pre-
sente, como no primeiro seminário, desta vez,
acompanhado de outros pais, em uma propos-
ta ampliada de vínculos afetivos. Ela encerrou
reforçando a satisfação da Secretaria Executiva
da RNPI em apoiar a realização desse terceiro
Seminário, que é uma construção coletiva do
Grupo de Trabalho Homens pela Primeira In-
fância da RNPI, e a oportunidade de avançar
nas discussões e ampliar o debate com o pú-
blico sobre temas que garantam os direitos das
crianças de 0 a 6 anos, em especial, o direito de
toda criança ter o pai ao seu lado, estabelecen-
do um vínculo de afeto e cuidado entre eles,
desde o nascimento.
Ao iniciar sua fala, Mariana Azevedo lem-
brou que o Instituto Papai está completando
vinte anos e que foi sede do II Seminário Pa-
ternidade e Primeira Infância, em Recife,
momento marcado pela aprovação do Marco
Legal da Primeira Infância e pelo avanço de
outras legislações. Ressaltou que se vivem mo-
mentos difíceis no país e que a luta por direitos
é necessária, sendo preciso pensar os desafios
que se impõem. Fez um agradecimento espe-
cial às organizações realizadoras do seminário:
Aldeias Infantis SOS Brasil e 4Daddy.
A Gestora Nacional da Aldeias Infantis SOS
Brasil, Sandra Greco, iniciou sua reflexão agra-
decendo a participação de todas as organiza-
ções na realização do evento e lembrou que já
há uma trajetória do tema Paternidade na Al-
deias Infantis SOS uma vez que os meninos que
ali estavam fazendo a cobertura jornalística irão
se tornar homens e bons pais. Refletiu que será
melhor ainda, no futuro, discutir a humanidade
e não mais o gênero. Disse que o cuidado é a
essência da Aldeias Infantis SOS e por isso é
natural que a organização esteja em todas as
instâncias de discussão e neste GT da RNPI. Ela
disse que o tema da Paternidade também está
focado na educação e que discutir plenamente
a questão de gênero levará a que todos sejam
boas pessoas e agentes de cuidado e prote-
ção, sobretudo, neste momento em que se vive
retrocessos e desalento no país. Lembrou per-
tencer a uma geração que lutou por um outro
contexto, que não o que se vive, mas que, jus-
tamente, por isso, é importante ter esses espa-
ços para discutir o Brasil e a Paternidade que se
quer. Lembrou de um concurso realizado nesta
semana, em João Pessoa, para os jovens dis-
cutirem o tema “Ética, a estética da alma”. Ar-
gumentou que a ética é comportamento para
se viver em paz, em comunidade. O valor da
recompensa por essa vivência é a compreensão
profunda do que se pode e também do que
não se pode comprar. É o que se espera do
hoje, não do amanhã. Por isso, encerrou com
uma frase de uma jovem adolescente, ganha-
dora do concurso: “Ter ética é brincar de fazer
III Seminário Nacional Paternidade e Primeira Infância 9
o bem”. Além dos desafios, disse, fica essa pa-
lavra de esperança.
O Gerente de Estratégias da Plan Interna-
tional Brasil, Flávio Debique, disse que o GT
Homens pela Primeira Infância era um exemplo
de como se deve trabalhar em rede, um exem-
plo de trabalho conjunto. Explicou que o tema
Paternidade para a Plan International é muito
importante em relação à equidade de meni-
nas e que ainda não é discutido amplamente
como deveria. Disse esperar que isso possa se
transformar em um processo natural em que as
crianças cresçam protegidas, daí a importância
da participação do pai. O envolvimento e enga-
jamento dos homens nos cuidados deve acon-
tecer o mais cedo, pois faz parte da humani-
dade; quanto mais cedo o homem se perceber
nesse lugar, mais cedo se discutirá o prazer de
ser cuidadores em comunidade.
Leandro Ziotto iniciou sua fala agrade-
cendo a todo o GT. Disse que faria uma fala
de pai. Relatou que, há seis anos, realizou uma
pesquisa, no Google, sobre como colocar
uma criança para dormir e só encontrou res-
postas de mulheres. Foi então que sentiu o
desafio de produzir textos para homens a fim
de que estes assumissem o compromisso jun-
to às companheiras de cuidar dos filhos, en-
frentando os preconceitos sociais que só exi-
gem das mulheres, assumindo uma condição
de protagonismo no cuidado.
A representante de parcerias e comuni-
cação do Projeto Quixote, Ana Claudia Vas-
concellos, agradeceu pela oportunidade de
o Projeto Quixote sediar o evento que, disse,
tem muito a ver com a organização. Explicou
que o núcleo de famílias com quem trabalham
é composto por mães, mas ressaltou que há
Relatório Técnico 201710
também muitos pais e que eles se envolvem.
Disse que o tema a levou a pensar sobre a po-
pulação que o Projeto atende, de risco, com
pouco acesso à educação, mas que se deu
conta de que muitas das questões afeitas à
paternidade acontecem com seus amigos, fa-
miliares... Em sua casa, compartilhou, ela não
enfrenta essas questões, pois é natural que o
marido e os filhos lavem a louça e que ela leve
o carro ao mecânico. Comemorou que isso
tudo pudesse ser discutido em alto nível.
Ao se desfazer a mesa de abertura, foi
apresentada uma atração cultural, o lançamen-
to de um documentário, a fim de introduzir os
temas das mesas de discussão
Lançamento do documentário
O Poder do Cuidar
Rodrigo Zavala, Gerente de Comunicação
da Aldeias Infantis SOS Brasil, fez a introdução
para a apresentação do documentário realiza-
do pela organização. O tema “Família impor-
ta!”, explicou, remete ao compromisso da Al-
deias Infantis com as crianças e o documentário
é fruto de uma experiência, na cidade de Lo-
rena, em que a organização apoiou o pai de
seis filhos que haviam sido retirados dele, pela
justiça, com alegação de que ele não sabia cui-
dar. O documentário trata da consciência de ter
condições de cuidar dos filhos, que é o poder
do cuidar. Ele aborda o como o cuidado reflete
no relacionamento e na garantia de direitos.
Fábio Paes, Assessor de Advocacy da
Aldeias Infantis SOS Brasil, complementou
dizendo que o filme quer trazer esse debate
do cuidado para a sociedade. Relatou que o
protagonista, Sr. César, hoje, vive situação di-
ferente. Perguntam-lhe: Por que você não tra-
balha? Você só cuida dos filhos? E sua mulher?
Agora, ele vive o preconceito que, via de re-
gra, é a mulher quem sofre cotidianamente, no
entanto, tem os filhos de volta e reaprendeu o
processo do cuidado que deve ser desenvol-
vido e assimilado como rotina. Essa pequena
narrativa quer trazer reflexões e suscitar ques-
tionamentos. Não se pretende roteiro de um
exemplo ou de “modelo de pai”, mas como
provocação que dependerá do olhar instigado
de cada espectador.
O Poder do Cuidar2
2
Disponível em: O Poder do Cuidar : https://youtu.be/
Iypyd29wwiY
III Seminário Nacional Paternidade e Primeira Infância 11
Primeira mesa: Políticas Públicas
de Apoio ao Cuidado Paterno
A mesa “Políticas Públicas de Apoio ao
Cuidado Paterno” teve a mediação do Dr.
Marcus Renato de Carvalho (Aleitamento.com/
UFRJ) e contou com a participação de: Vital Di-
donet (Assessor da Organização Mundial para a
Educação Pré-Escolar-OMEP e Assessor Legis-
lativo da Rede Nacional Primeira Infância); Cise-
le Ortiz (Presidente da Associação Brasileira de
Estudos sobre o Bebê e Coordenadora Adjunta
do Intituto Avisa Lá); Marina de Moura Borges
Leal (responsável pela implementação da licen-
ça-paternidade estendida na empresa Natura
Cosméticos S/A. Trabalha no departamento de
Educação e Desenvolvimento, um núcleo da Vi-
ce-Presidência de Pessoas e Cultura) e Viviane
Manso Castello Branco (Coordenadora de Polí-
ticas Públicas e Ações Intersetoriais da Superin-
tendência de Promoção da Saúde, da Secreta-
ria Municipal de Saúde do Rio de Janeiro).
O Dr. Marcus Renato passou a palavra
ao Professor Vital Didonet que falou sobre
o “Marco Legal: próximos passos para a
regulamentação e efetivação”. Ele iniciou
dizendo que foi um pai que “curtiu os filhos,
um pai que dividia as dores”. Essa experiência
pessoal é muito importante, pois a forma como
o bebê e a criança pequena são cuidados vai
determinar como serão quando adultos. São
os exemplos dos cuidadores que moldarão o
modo de ser desses pequenos e o como eles se
inserirão no mundo adulto posteriormente. Vi-
tal falou sobre o papel, hegemonicamente, de-
terminado do pai como aquele que brinca e dá
bronca e o da mãe como aquela que lava lou-
ça e cuida. Disse ser preciso questionar essas
coisas, essas várias pontas de fios de mudança
para uma nova tessitura de comportamentos e
papéis. Explicou que o Marco Legal da Primeira
Infância também teve a preocupação com esse
tema. Observou que uma lei não cria fatos,
mas as pessoas sim. A lei sinaliza, determina
ações que as pessoas podem transformar em
realidade. O Marco Legal abriu espaço para o
cuidado integral da criança. Promover a cultura
do cuidado integral não só pela proteção, mas
promoção. O cuidado é a tônica do Marco Le-
gal. O homem e a mulher têm o cuidado com-
partilhado, então, o papel do homem é funda-
mental para a concepção do cuidado, do olhar
de pertença da criança. Explicou o princípio da
licença-paternidade, de como a empresa pode
promover esse direito que é financiado pelo
próprio povo brasileiro. A ideia que, às vezes,
se dissemina de que gozar a licença pode cau-
sar a perda do emprego foi vencida pela ideia
do bem que é ser pai e poder cuidar do filho.
Ele lembrou que, à época da discussão do Mar-
co Legal, a questão era o reconhecimento do
direito de ampliação de cinco para vinte dias
de licença-paternidade e que, atualmente, o
contexto é outro, a discussão está centrada na
licença-parentalidade, o que está sendo ama-
durecido também no GT Homens pela Primeira
Infância. Vital defendeu que a legislação preci-
sa avançar no sentido de que a família entenda
quais as opções que tem para escolher. Falou
ainda dos avanços da implementação da licen-
ça no funcionalismo e nas empresas. Observou
que já se está comprovando a importância do
envolvimento quando o homem faz as visitas
pré-natais, o direito de acompanhar quando a
Relatório Técnico 201712
criança está internada, participar do parto, etc.,
o que constrói vínculos e aprendizado. Deu
exemplo de um estudo sobre a possibilidade
de antecipação de cura da criança quando tem
acompanhante na internação. Falou sobre os
desafios do cuidar não são só circunscritos à fa-
mília, mas na cidade, nos espaços todos. Não
se pode ter uma cidade em que as crianças não
possam ir ao parque. Elas precisam ter garan-
tidas a segurança e a possibilidade de partici-
pação. A cidade deve ser apropriada, cada vez
mais pensada para a criança. Relatou que have-
rá estudos e pesquisas sobre a primeira infância
nos cursos superiores: biblioteconomia, arqui-
tetura, urbanismo, etc., com o intuito de dar
atenção às necessidades das crianças. Encerrou
dizendo que tudo isso está no Marco Legal. É
a atenção voltada à criança pelos profissionais
todos, relacionando esses saberes, inclusive, a
comunicação em um mundo que explode em
significados. “Se levarmos em conta a forma
como cuidamos das crianças, perceberemos
que o cuidado influencia na mãe e no pai que
eles serão. Então, somos os criadores do ama-
nhã, anunciamos um novo mundo, um mundo
de equidade e justiça”.
A Professora Cisele Ortiz falou sobre “A
importância da figura masculina no de-
senvolvimento da criança”. Iniciou sua fala
explicando que falaria sobre a importância do
homem na família. Que lugar ele ocuparia? A
partir da pergunta, ela construiu historicamen-
te o lugar do homem no seio familiar. Explicou
que o homem era visto como o dono de tudo
e de todos. A ele, todos obedeciam. Era visto
como alguém que não conseguia comunicar
afeto, pois era disciplinador. Na sociedade pa-
triarcal, a vida doméstica não importava: o po-
der era exercido pela repressão e violência. Ci-
sele mostrou a evolução da relação do homem
com a família por meio de cartazes sobre a
amamentação, explicando como essa visão en-
gessada do homem tem se modificado. A partir
desse ponto de partida, explicou que a criança
precisa de todos os cuidados, inclusive, men-
tais. “Antes de qualquer coisa, a criança precisa
existir na mente e no coração de quem cuida”.
Insistiu que os cuidados psiquiátricos são fun-
damentais. A função materna dá sentidos e sig-
nificados ao sentimento, ao que o bebê precisa
de fato, ao que é importante para a sua sub-
jetividade e intersubjetividade. Observou que
“o pai e a mãe nascem junto com a criança” e
que esse aprendizado é essencial. Falou sobre
o processo de separação da mãe e da criança
que é realizado pelo pai, símbolo da lei, das
normatizações, daquilo que não pode. É dessa
forma que a criança constrói a subjetividade.
Isso tudo acontece inserido em uma cultura. Ser
pai e ser mãe no Brasil é muito diferente dessa
experiência em outros lugares. Falou das pes-
quisas sobre os problemas quando a intersub-
jetividade não foi bem estabelecida. Quanto
maior a relação com a mãe, maior a segurança,
pois o papel que a mãe desempenha primeira-
mente com o bebê, de maneira insubstituível,
como o papel da família como um todo, da es-
cola e, por conseguinte, da interação da criança
com a sociedade é de fundamental importância
para seu crescimento saudável. Entre esses pa-
péis, o de maior grandeza é o estabelecido por
uma família estruturada e ajustada que evitará
conflitos para a criança. Essa linha de raciocínio
III Seminário Nacional Paternidade e Primeira Infância 13
é desenvolvida pelo teórico Bowlby3
. Ele diz
que a “família fornece uma base segura para
que a criança/adolescente possam explorar o
mundo e se constituírem”. Quanto mais sau-
dáveis as relações e as emoções entre os adul-
tos, mais estruturada a subjetividade da criança
levando-a a se tornar um adulto equilibrado
afetivamente, capaz de solucionar problemas
quando os vínculos sejam afetados. Os víncu-
los afetivos e os estados emocionais caminham
juntos, por isso, o principal é aprender a viver
com a diversidade: é bom que o pai e a mãe se-
jam diferentes. Isso propicia à criança aprender
e criar um mundo melhor para viver.
Marina de Moura Borges Leal falou sobre
a “implementação da licença-paternidade
estendida na empresa Natura Cosméticos
S/A. Responsável pela área da diversidade, na
empresa, relatou que, atualmente, a Natura
concede quarenta dias de licença-paternidade
como Empresa Cidadã. Lembrou que a Natu-
ra é uma empresa e, portanto, também precisa
entender o consumo para continuar se estabe-
lecendo e crescendo. “A empresa expressa um
comportamento empresarial alinhado à promo-
ção do desenvolvimento sustentável na cria-
ção de produtos que promovam o bemestar-
bem”. A concessão da licença-paternidade aos
funcionários aconteceu dentro de uma estraté-
gia da empresa de alcançar uma visão positiva
até 2050. Explicou ainda que a Natura desen-
volve discussões, reflexões com os funcionários
3
BOWLBY, John. Formação e Rompimento dos Laços Afe-
tivos. Trad. Álvaro Cabral. São Paulo: Editora Martins Fon-
tes São Paulo, 2001.
e incorporaram os ODS 54
. Fazem pesquisas
sobre o significado da masculinidade porque
os homens não são iguais. Há questões que
precisam ser levantadas: como, em que e de
qual lugar o homem se vê, hoje? O que é mas-
culinidade para ele? De onde parte a sua fala?
Os resultados mostram que a questão cultural
determina o comportamento do homem, como
aquele que não pode demonstrar fraqueza, daí
uma série de circunstâncias que prejudicam o
próprio homem como não ter o costume de
cuidar da própria saúde, não conseguir expres-
sar os sentimentos e apresentar dificuldades
para se comunicar e desenvolver relações pro-
fundas e verdadeiras. Não é à toa que a OMS
aponta como principal causa de suicídio entre
os homens a depressão5
. Ela argumentou que a
paternidade, hoje, pode alterar tudo, inclusive,
a afetividade e a presença na vida da criança.
A Natura tem levantado dados sobre os papéis
dos pais na vida dos filhos e perceberam a re-
levância da participação masculina. A licença-
-paternidade passou a ser vista pela empresa
como benefício e direito a ser estendido: con-
cedem de 40 dias a 6 meses para cada licen-
ça, incluindo, adoções por pais LGBT. Pela lei
Empresa Cidadã, a Natura teria de conceder
vinte dias de licença-paternidade, no entanto,
4
Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, da ONU. O
ODS propõe alcançar a igualdade de gênero e empoderar
todas as mulheres e meninas a partir de 6 metas e 3 sub-
metas.
5
In: http://www.natura.com.br/homem: O número de ho-
mens que se matam no Brasil é quase quatro vezes maior
que o de mulheres. No Reino Unido, o suicídio é a principal
causa de morte de homens com idades entre 20 e 49 anos.
Relatório Técnico 201714
crendo nos benefícios, concede quarenta dias
acreditando no papel do pai em todas as va-
riáveis desse processo/convívio. Oferecem seis
meses para as mulheres, quando a lei determi-
na apenas quatro. Marina relatou que a adesão
dos funcionários é de 80%. Eles procuram ouvir
aqueles que não aderem ao benefício. Algumas
das justificativas são de que não saberiam o que
fazer com esses dias em casa. A Natura tenta
explicar a esses funcionários a importância des-
se período para o desenvolvimento de vínculos
e dos bebês. Outro dado curioso: as mulheres
funcionárias dizem preferir ficar sozinhas com
os bebês. Alguns funcionários têm medo de se-
rem substituídos durante a licença de quarenta
dias, achando que a empresa poderá consi-
derar que não são insubstituíveis. Nesse caso,
costumam argumentar com eles que as mulhe-
res ficarão seis meses fora. Elas seriam menos
profissionais do que eles? Seriam menos neces-
sárias? Marina observou que é preciso envolver
o mundo empresarial porque o resultado será
a facilitação para o desenvolvimento de polí-
tica públicas. Pontuou que a adesão vem cres-
cendo entre os funcionários porque essa é uma
política pública que a empresa supervaloriza e
incorpora. A Natura também oferece berçário
e creche para os filhos dos funcionários, o que
permite a amamentação durante a jornada de
trabalho. Desde 2016, houve adesão de 80%
dos pais funcionários. Isso graças a um trabalho
de conscientização sobre o papel do homem
na sociedade atual, na importância da sua par-
ticipação. Têm trabalhado com os funcionários
que a figura do homem não pode ser apenas
a presença austera, mas aquela que tornará a
criança melhor integrada socialmente. Encer-
rou dizendo que a licença-paternidade é um fa-
tor de mudança social porque a criança, quan-
do adulta, terá outra atuação em sociedade.
Então, para a Natura trata-se de um estudo de
mudança social.
Finalizando as apresentações da mesa,
Viviane Manso Castello Branco falou sobre
“A valorização da paternidade nos serviços de
saúde”. Observou como, normalmente, nos
serviços de saúde, a capacidade de cuidado
do homem não costuma ser reconhecida. Ex-
plicou que passaram a desenvolver, na Secre-
taria Municipal de Saúde do Rio de Janeiro, a
iniciativa “Unidade de Saúde Parceira do Pai”.
Ela fez um apanhado histórico de como esse
processo começou a ser construído, a partir de
2002, com a criação do “Comitê Vida” para a
implementação de políticas públicas voltadas
para as masculinidades, envolvendo outras
secretarias, ONGs e universidades. Falou dos
princípios desse trabalho como o “reforço às
potencialidades do homem: pai acrescenta”,
explicando que procuram trabalhar a equida-
de de gênero e outas questões importantes
como o “direito à ternura”. “Estamos no XVI
Mês de Valorização da Paternidade, estra-
tégia implantada no Rio de Janeiro que já se
tornou uma política pública nacional”. Nesse
período, são realizados seminários, pesquisas,
rodas de conversas, oficinas, programas de rá-
dio e TV, etc. Realizam várias atividades que
objetivam qualificar o cuidado paterno, além
de oportunidades de formação para os profis-
sionais e revisão das rotinas institucionais. O
envolvimento paterno nas ações de cuidado é
um dos recursos mais importantes e subapro-
veitado na promoção da saúde da criança. Os
III Seminário Nacional Paternidade e Primeira Infância 15
serviços de saúde, muitas vezes, chamados de
materno-infantis, contribuem para afastar os
homens, uma vez que reforçam uma concepção
de cuidado afeita à responsabilidade exclusiva
das mulheres. Relatou que, em 2005, pesquisa
realizada durante a campanha de vacinação no
Mês de Valorização da Paternidade, com cerca
de 6.000 bebês, constatou que 84% deles ti-
nham convivência diária com os pais. Apenas
4% dos bebês não tinha qualquer contato com
os pais. Isso constata a presença masculina no
início da vida e traz, para o serviço de saúde, a
responsabilidade de acolher, orientar e apoiar o
homem. A relação do pai com o bebê durante
a gravidez é mais abstrata e a passagem pelo
serviço de saúde, quando o genitor pode ouvir
os batimentos cardíacos ou participar do par-
to, por exemplo, pode ajudar a dar concretude,
fortalecendo o vínculo com o bebê. A maneira
como são tratados nos serviços de saúde afe-
ta a maneira como os homens percebem sua
capacidade de exercer o cuidado. Se a unida-
de de saúde não for sensível, pode contribuir
para que se sintam incompetentes frente a uma
responsabilidade tão complexa quanto cuidar
de uma criança. Ela falou ainda sobre as reco-
mendações para a implantação de Unidades de
Saúde parceiras do Pai: 1- preparo da equipe de
saúde; 2- inclusão dos pais nas consultas e exa-
mes; 3- inclusão dos pais no pré-parto, parto e
pós-parto; 4- inclusão dos pais nas enfermarias;
5- atividades educativas com homens; 6- aco-
lhimento e cuidados com homens; 7- preparo
do ambiente, colocando três cadeiras, etc.;
8- viabilidade para o tema do cuidado pater-
no; 9- horários acessíveis ao homem; 10- rede
de apoio social. Viviane relatou que foi muito
importante a incorporação, pelo Ministério da
Saúde, do tema da paternidade como um eixo
estratégico da Coordenação de Saúde do Ho-
mem. Comentou sobre a estratégia “Pré-natal
do Parceiro” que está sendo trabalhada com
profissionais de todo o país. Ela citou diversos
recursos que podem ajudar na reflexão sobre
esse tema, como o programa de TV “Aquela
Conversa”, do MultiRio e o vídeo “ O Pai está”,
do projeto Rede de Adolescentes Promotores
da Saúde, o RAP da Saúde. Ao encerrar, ob-
servou que os homens, para cuidar, também
precisam ser cuidados pelos serviços de saúde.
Para exemplificar uma frente importante desse
trabalho, o protagonismo paterno nos serviços
de saúde, Viviane chamou um dos criadores do
Grupo de Pais da Casa de Parto David Capis-
trano, Téo Cordeiro. Ele relatou que havia uma
grande inibição dos pais para falar nos grupos
educativos. Esse grupo, gerenciado pelos pró-
prios homens, nasceu para estimular a partici-
pação e a troca de experiências entre os pais.
Relatório Técnico 201716
Participação da Plenária
Encerradas as apresentações, foi aberta a
possibilidade para que os participantes fizessem
perguntas. Algumas delas: quais os desafios atuais
para as políticas públicas relacionadas ao tema pa-
ternidade? A Natura pensou na licença parental?
Pensaram na equiparação do tempo da licença?
A participante, psicóloga Eliane Lemos, do
Instituto Entre Rodas, afirmou que o Marco Legal
não acolheu as crianças com deficiência. E que di-
zer sobre as crianças com paralisia cerebral? Qual
a probabilidade de que sejam incluídas, de criar
políticas públicas que atendam às crianças com
deficiência? E quanto às mães que se encontram
no cárcere, no sistema prisional? E quanto ao pai
que se encontra fora com os filhos enquanto a
companheira está presa? Há uma preocupação
de prepará-lo para o cuidado?
Marina começou a bateria de respostas, ex-
plicando que a Natura escolheu conceder quaren-
ta dias de licença-paternidade por causa do puer-
pério6
, visando a recuperação da mulher. Disse
que, em relação aos custos, são relativos. Embora
sejam altos, trazem o benefício do engajamento
na volta do trabalhador. É o que denominam de
“fator de felicidade”. Os custos são amortizados
sob essa perspectiva. Isso é tão positivo que a
empresa começou concedendo quarenta dias,
mas como um primeiro passo porque há a possi-
bilidade de ampliação. Relatou que já acontecem
ações e que existe um GT com mais de quarenta
empresas para discutirem diversos temas, como
6
Período que decorre desde o parto até que os órgãos
genitais e o estado geral da mulher voltem às condições
anteriores à gestação, de 6 a 8 semanas.
a mulher no mercado de trabalho e que, mesmo
aí, o homem sempre aparece como tema. Entre-
tanto, não há um grupo específico sobre o estudo
do homem. A respeito da pessoa com deficiência,
disse que é preciso tratar com acolhimento o pai
com deficiência.
O Professor Vital respondeu dizendo que
existem ações junto aos poderes públicos para fa-
zerem valer as políticas públicas, as leis. Falou das
resistências das próprias mães sobre a participa-
ção dos homens, argumentando que se trata de
uma cultura de reserva de espaços que se foram
construindo. Também falou sobre as políticas pú-
blicas para as pessoas com deficiência e os direi-
tos da pessoa encarcerada.
Viviane disse que se está diante de uma
mudança cultural que envolve a participação dos
dois, homens e mulheres, e os locais de atuação
que precisam ser deslocados. Segundo explicou,
a grande questão é a formação dos profissionais:
“É preciso respeitar o primeiro desejo do bebê: o
seu dia de vir à vida”. Isso serve para o restante
das reflexões também, disse. Quando o homem
participa das consultas, de todo o processo, ele
está mais preparado para a circunstância. Eles pre-
cisam do cuidado, não da crítica. Os homens sen-
tem-se incompetentes para o cuidado. No caso
do Zica vírus, isso ficou latente.
A última a responder as questões foi a Pro-
fessora Cisele que falou sobre a necessidade de
espaços de formação a partir das coisas práticas
que acontecem no cotidiano das pessoas. Argu-
mentou que a escuta da criança deve ser muito
atenta e acontecer antes, não no momento em
que ela expressa a fala. É preciso olhos e ouvidos
para essa escuta, a partir do estabelecimento de
vínculos, de afetos. A escuta cuidadosa, atenta,
parte desse pressuposto de antecipação à fala da
criança. Ela encerrou dizendo que, por isso, a “for-
mação em serviço” é a chave e o desafio, aban-
donando-se conteudismo e abrindo-se aos temas
existentes na prática da realidade vivida.
Participação Infantil
Enquanto o seminário se desenvolvia, os
pais que trouxeram crianças puderam partici-
par das discussões enquanto seus filhos partici-
pavam de oficinas e brincadeiras assistidos por
Educadores da Aldeias Infantis SOS Brasil. Essa
foi uma preocupação da organização, pelo GT,
pensando em um espaço para acolher e desen-
volver atividades lúdicas com as crianças, pro-
porcionando momento agradáveis que levaram
à reflexão do cuidado uns para com os outros.
Essa iniciativa vem de encontro aos ideais de
inclusão e de preparação de espaços em que as
crianças sejam protagonistas e tenham o direito
a suas escolhas respeitado.
O evento contou ainda com uma estraté-
gia de Educomunicação em que meninos e me-
ninas dos serviços de acolhimento da Aldeias
Infantis SOS Brasil, das cidades de São Paulo,
Poá e São Bernardo do Campo, produziram,
por meio de fotojornalismo e vídeos, a memó-
ria dos acontecimentos e atividades o que terá
como resultado um relato por meio de fotos e
de um vídeodocumentário.
Simultaneamente, houve a transmissão do
evento pelo Twitter: @aldeiasinfantis.com.
Relatório Técnico 201718
A parte da tarde foi iniciada com a atividade
da Mesa 2: Paternidades Diversas que teve
a mediação de Milena do Carmo (Instituto
Promundo Brasil) e contou com a participação
de: Marco Antônio da Silva Souza, Markinhus
(Cientista Social e Educador Social, membro
do Movimento Nacional de Meninos e
Meninas de Rua-MNMMR e Conselheiro do
Conselho de Direitos Humanos do Estado
de São Paulo) e Fábio Paranhos (ativista
da defesa das causas de cidadania LGBT;
fundador do Grupo de Pais de Homossexuais-
GP; fundador do Projeto Acolher: Grupo de
Apoio à Adoção e Convivência; participa
do HOMOPATER7
(plataforma virtual de
apoio a homens e pais com relacionamentos
homoafetivos) e mantém o blog Homem,
Homossexual e Pai8
).
7
http://homopater.com.br
8
http://paigay.blogspot.com.br
Milena abriu o espaço de reflexão cha-
mando a atenção para a importância da di-
versidade e do lugar de todos, não apenas
do masculino e do feminino.
O Conselheiro de Direitos Humanos do
Estado de São Paulo, Markinhus foi o pri-
meiro a fazer uso da palavra. Alertou que
após 27 anos do ECA há ainda muita criança
na invisibilidade diante da sociedade e do
Estado brasileiros. Falou sobre a Conferência
Nacional dos Direitos da Criança e do Ado-
lescente e da importância desses espaços
para a participação da criança. Observou a
forma como a sociedade enxerga a infância e
os excluídos dela: como lidar com o menino
travesti? Como dar voz a ele? E as crianças ci-
ganas? E aquelas que têm os pais encarcera-
dos? As crianças têm o direito de usufruir da
paternidade mesmo que os pais tenham co-
metido um delito. Advertiu que, sem discutir
o peso que a escravidão tem na história do
Brasil, não se conseguirá discutir o tema dos
invisíveis da sociedade. Observou que o en-
carceramento causa grande impacto. O Brasil
é o quarto país que mais encarcera. No en-
tanto, é o país da impunidade. O Movimento
Nacional de Meninos e Meninas de Rua pro-
moveu um estudo, em 2012, sobre o número
e sexo dos encarcerados adolescentes, pois
não há dados sobre essa população. Levan-
taram que havia 479.499 adolescentes mas-
culinos e 32.786 adolescentes femininos. Em
outra pesquisa, apuraram que há de 587.857
a 731.707 crianças e adolescentes que têm
algum parente encarcerado. Não obstante, é
estimado que pelo menos dois milhões de
crianças tenham algum parente adulto en-
III Seminário Nacional Paternidade e Primeira Infância 19
carcerado, mas o fato de maior relevância é
que não há dados sobre essas crianças. Falou
sobre o estigma que sofrem os filhos de pais
encarcerados e a desestruturação que isso
provoca na dinâmica familiar. Isso alerta para
a necessidade de qualificar e formar esses
meninos e meninas, uma vez que o impacto
econômico que o encarceramento provoca
é assustador. A família acaba vendendo os
poucos bens para pagar advogados e tam-
bém para garantir a segurança do encarce-
rado dentro da cadeia. Chamou a atenção
para a sobrecarga da mulher que tem o cam-
panheiro prisioneiro em relação ao cuidado
e manutenção da família. Relatou uma pes-
quisa feita nos Estados Unidos que identifi-
cou uma síndrome nas crianças que têm pais
encarcerados e que revela os efeitos do en-
carceramento em massa: trauma, vergonha e
estigma. Atualizou que houve 500% no au-
mento do encarceramento de mulheres nos
últimos anos, muitas delas grávidas ou com
crianças. A elas não se dá o direito de cuidar
dos filhos, quase que sequer o de amamen-
tar. Citou o caso da esposa do ex-governa-
dor do Rio de Janeiro, presos pela Operação
Lava Jato, que foi solta sob a alegação e o
direito de cuidar de um filho dependente.
Isso revela que se vive no Brasil uma socie-
dade de classe, não de direitos, uma vez que
aos pobres não é estendido esse benefício.
A sociedade brasileira não vive o estado
democrático de direitos, mas a truculência
do Estado na vida dessas crianças. Revelou
que um estudo sobre o encarceramento no
Brasil, em andamento, será apresentado em
novembro no evento “I Seminário Nacional
sobre Crianças e Adolescentes com Familia-
res Encarcerados: Invisíveis até quando?” e
encerrou dizendo que o Sistema de Garantia
de Direitos, o Sistema de Justiça e o Sistema
Penal não dialogam. Assim, o interesse supe-
rior da criança, garantido por lei, não é leva-
do em conta, sobretudo, em situações como
a exemplificada. Terminou com a pergunta:
como podem essas crianças e adolescentes
terem seus direitos considerados sendo fi-
lhos de encarcerados?
Casa de Oportunidades
A mediadora, antes de passar a palavra
ao segundo debatedor, chamou o jovem Fre-
derico, que vive na Aldeias Infantis de Poá
e participa de um projeto chamado Casa de
Oportunidades, criado para oportunizar a
participação dos adolescentes e jovens com
vistas à emancipação futura. Ele e outros jo-
vens da Aldeia de Poá elaboraram camise-
tas e canecas com o logo do Seminário. Fred
subiu ao palco para falar dessa experiência
e divulgar os produtos para os participantes.
Para a Aldeias Infantis SOS Brasil é um dos
projetos que visa dar voz e oportunidade a
esses adolescentes e jovens preparando-os
para a vida adulta autônoma.
Relatório Técnico 201720
têm sonhos e decepções. Disse ser impressio-
nante o número de crianças devolvidas após
a adoção. Por isso, essas conversas são im-
portantes. Há um grupo que reflete sobre as
crianças poderem conviver na família para fu-
tura adoção. Ele ainda comentou as perspec-
tivas de adoção pelas pessoas solteiras. Disse
que os homens solteiros compreendem ape-
nas 1% dos pleiteantes, sendo a minoria da
minoria. Esses homens alegam que se acham
incapazes de cuidar, que não serão capazes de
suprir as necessidades de uma criança. A partir
desse apanhado, Fábio falou sobre sua experi-
ência de pai adotivo. Derrubou mitos dizendo
que quem quer adotar faz isso porque quer.
Somente e simplesmene por isso! “Quem
adota é um egoísta, basicamente!” (Sic) Ob-
servou que nada pode ser idealizado e que a
prova disso é que o amor é construção. Disse
que quase desistiu de adotar, pois no início
também pensava, como o senso comum, que
uma criança precisa de um pai e de uma mãe.
Entretanto, quando conheceu sua filha, que
hoje tem 21 anos e foi adotada por ele aos 3,
ficou com medo, em dúvida. Esse turvamen-
to das emoções e da razão caíram por terra
no momento em que soube que três casais já
haviam desistido da menina. Nesse instante,
soube o que poderia ser para ela e lhe disse:
“De hoje em diante, eu sou seu pai!”. Fábio
refletiu ainda sobre diversos temas que envol-
vem os grupos de discussão sobre a adoção
e encerrou dizendo que há muitas questões
sobre a adoção que precisam ser analisadas
profundamente, sobretudo, a fim de minorar
e esclarecer os preconceitos que a sociedade
tem, apresenta e, muitas vezes, fomenta.
Em seguida, Milena passou a palavra ao
Fábio Paranhos9
que iniciou falando sobre o
Projeto Acolher, um grupo de apoio à adoção,
fundado por ele em 1999. Disse que, hoje,
existem quatro grupos em São Paulo. Fábio
partiu de sua vivência pessoal: relatou que
não podia participar de alguns grupos de dis-
cussão simplesmente porque não era mãe. No
grupo, propiciam conversas com pessoas que
têm filhos adotados. Relatou que, assim como
os pais biológicos, os pais adotivos também
9
Autor do livro Coragem de ser que narra 15 depoimentos
de homens que assumiram a homossexualidade depois de
ter formado uma família, revelando sentimentos paradoxais
como vergonha, dor e culpa ao abrir espaço para a espe-
rança, a capacidade de superação e o amor incondicional
pelos filhos.
III Seminário Nacional Paternidade e Primeira Infância 21
Participação da Plenária
Os participantes passaram à interação
com os palestrantes. Josimar Silveira10
, que
se autodenominou Pai Integral, relatou que,
após o desemprego, passou a cuidar dos fi-
lhos enquanto a esposa trabalhava. Isso aca-
bou sendo assumido em comum acordo pelo
casal como nova configuração de atuação de
ambos na família. Ele disse que falaria enquan-
to pai negro, a partir do recorte racial. Falou
dos estereótipos criados em relação ao ho-
mem negro, como a sexualidade, virilidade,
etc, o que levanta questões e dúvidas: como
ele pode cuidar? Como vai cuidar de uma me-
nina? Em contraponto, lembrou que a maior
parte das crianças que se encontram em abri-
gos são negras e que de lá não sairão para
adoção por esse motivo. Daí sua fala a partir
do recorte racial que influencia nas questões
de abandono. Ele sugeriu que o próximo se-
minário traga esses temas como reflexão.
Fernando Valentim, Sociólogo, fundador
e coordenador da plataforma virtual Observa-
tório da Guarda Compartilhada11
, deu seu tes-
temunho em relação ao Poder Judiciário que,
segundo opinou, está pessimamente prepara-
do para lidar com o melhor interesse da crian-
ça. Os problemas que acabam na vara penal
começam na vara de família. Um poder que
deveria mediar conflitos torna-os excludentes,
excluindo crianças e seus pais.
10
Autor do Canal do Youtube “Família Quilombo”: https://
www.youtube.com/channel/UCJ0h2QguAJ-alGccw0PdfOw
11
https://papodepai.com/guarda-compartilhada-o-que-e-isso
Outro participante, Jorge Donizetti Ro-
drigues Jr., Representante Sindical dos Téc-
nicos Administrativos da UFABC, falou sobre
o determinismo que acaba acompanhando a
vida de gerações de encarcerados. Citou o do-
cumentário lançado pela Aldeias Infantis SOS
Brasil para mostrar que uma organização dando
suporte à família em vulnerabilidade pode fazer
a diferença e evitar mais abandono. Observou
que o Estado não cumpre o seu papel, pois se
a Aldeias Infantis não tivesse apoiado aquele
homem, as crianças estariam no abrigo, longe
do amor e do vínculo paternos.
Mariana, do Instituto Papai, observou que
o tema da paternidade é visto de forma elitiza-
da e é preciso fazer um recorte de classe, ten-
tando valorizar as experiências de todos, sain-
do da classe média, ouvindo as periferias.
Outro comentário partiu do Fábio Paes,
da Aldeias Infantis SOS Brasil, sobre as pater-
nidades invisíveis, garantindo que as falas de
todos os presentes seriam contempladas no
relatório técnico resultante do seminário e que
as paternidades não representadas, nas mesas
de debate, estavam sendo na plenária pela par-
ticipação de cada um que pôde fazer uso da
palavra tendo sua voz reconhecida.
Levantando importante questionamento,
Milena observou que, a partir do lugar de fala
de cada um, deve-se perguntar: onde se está
também inviabilizando esses pais e filhos?
Markinhus relatou que muitos pais encar-
cerados negam ter filhos por medo de o Estado
tirar-lhes a guarda. Outros dois temas a se recu-
perar, insistiu, é o de meninos em medida de in-
ternação (SINASE) e em acolhimento. Disse que
o Estado Penal é superior ao Estado de Direito
Relatório Técnico 201722
e falou sobre o levantamento que está sendo
realizado sobre os encarcerados. Em relação à
incidência, observou que a especialização le-
vou à fragmentação o que fragilizou a área da
infância. Reafirmou que outros atores precisam
dialogar, não apenas a Rede Nacional Primeira
Infância, pois é necessário sair da fragmentação
para enfrentar temas como a mudança da CLT,
redução da maioridade penal... Refletiu que
não há dúvidas de que as mudanças na CLT
interferirão na infância, inclusive. É o resultado
da fragmentação da política social, que sempre
traz perdas. Por isso, é urgente pensar a crian-
ça/adolescente de forma integrada. Há outras
forças na comunidade para manter e cuidar da
criança. Sugeriu que é preciso refletir sobre a
solidariedade comunitária, as formas e potên-
cias comunitárias para o cuidado. Encerrou
afirmando que o que se deseja é um Estado/
Nação em que caibam todos.
III Seminário Nacional Paternidade e Primeira Infância 23
Terceira mesa: Paternidades e
Dinâmicas Familiares
Com a mediação de Flávio Debique (Plan
International Brasil), a terceira mesa abordou o
tema “Paternidades e Dinâmicas Familiares”.
Participaram: Dr. Antônio Carlos Malheiros
(Desembargador do TJSP, membro voluntá-
rio de trabalho voltado aos direitos humanos,
integrante da Associação Viva e Deixe Viver);
Damaris Gomes Maranhão (Enfermeira, Profes-
sora do Curso de Pós Graduação em Educação
Infantil do Instituto Superior de Educação Vera
Cruz-ISEVEC, Supervisora da Área de Saúde
das Creches do CEDUC e Consultora do Ins-
tituto Avisa Lá); Jane Valente (Dra. em Serviço
Social, Consultora da Rede Latinoamericana de
Atendimento Familiar-RELAF e autora do livro
Família Acolhedora: as relações de cuida-
do e de proteção no serviço de acolhimen-
to) e Janie Paula (Educadora Perinatal e Paren-
tal, Doula, Comunicadora e Ativista Social).
Ao iniciar a participação da mesa, o media-
dor, Flávio Debique, observou que falar sobre
famílias é tema complexo e relevante para as no-
vas constituições familiares. Relatou que, há dois
meses, em um evento em Bruxelas, solicitou
que não se acatasse o pedido do Vaticano para
que fosse aceito o conceito de família entendi-
do apenas como o constituído por um homem e
uma mulher, mas o de grupo de indivíduos que
se unem pelo amor, suporte e cuidado mútuo.
Com essa ideia de abertura à inclusão e
à diversidade, ele passou a palavra ao Dr. An-
tônio Carlos Malheiros12
que abriu sua fala
comentando o que costuma dizer aos colegas
estudantes da Escola da Magistratura, onde le-
ciona: “Vocês têm de caminhar entre as pessoas,
sentir o gosto das lágrimas delas. Fechar-se no
gabinete não levará à compreensão de nada. O
estudo do livro da vida está na poeira, nas ruas,
no esgoto dos cortiços, no pátio da Fundação
Casa, nas celas dos presídios, nos hospitais... aí
é que vocês precisam estudar, não nas biblio-
tecas”. Ele relatou que, nos anos 70, passou
noites nas ruas para conhecer as crianças em si-
tuação de rua. Citou o caso de um menino que
conheceu aos 11 anos e que havia matado pela
primeira vez aos 9. Ele perguntou ao menino
porque ele havia matado e se havia gostado. O
menino respondeu que não se arrependia, mas
que não havia gostado de matar. Contou que
fora criado com a mãe, dependente química,
que recebia muitos homens em casa. Ele era
maltratado e posto na rua onde sofria abuso se-
xual por parte de vários meninos. Até que, em
certo momento, arrumou um pedaço de vidro
para se defender e cortou o pescoço de um dos
que costumeiramente abusavam dele. Por esse
motivo, perseguido pelo bairro, precisou fugir
de casa e passou a viver em situação de rua. O
Dr. Malheiros perguntou quem era e onde es-
tava a família dele e o menino teria respondido
que os meninos moradores das ruas eram sua
família. Naquele momento, segundo narrou,
ele teve pela primeira vez a percepção de que
havia nuances de famílias que não a compreen-
dida pelo núcleo homem e mulher. Anos mais
12
acmalheiros@tjsp.jus.br
Relatório Técnico 201724
tarde, esse menino foi assassinado com um tiro
na testa. Citou essa história como argumento
de que a criança e o adolescente não são priori-
dade, embora isso esteja preconizado nas con-
venções e nos estatutos, porque a sociedade
não tem vontade de fazer o melhor para eles. A
própria justiça, afirmou, não enfrenta o proble-
ma. Há falta de estrutura das varas, entretanto,
não se pode tirar precipitadamente o poder
parental. O poder público não aparece na vida
dos pobres oferecendo lazer, cultura, saúde,
educação... Os jovens negros continuam sen-
do mortos pela polícia nas periferias... Mas,
quando vem para castigar, o poder público é
efetivo, destruindo a pouca dignidade que as
pessoas têm, arrematou. Relatando outro fato,
lembrou que chegou a trabalhar como volun-
tário, no início da infecção pelo vírus HIV, no
Hospital Emílio Ribas, conhecido como “Hos-
pital da Aids” no início da epidemia. Contou
a história de um rapaz, cantor, que contraiu o
vírus e estava morrendo. O rapaz, quase sem
respiração, pedia a ele que o ajudasse a can-
tar. Atordoado, ele viu uma mulher na porta do
quarto. Foi até ela e descobriu que era a mãe
do moribundo. Ela se negava a chegar perto
do filho a quem não perdoava pelo fato de ser
homossexual. Sem conseguir convencê-la, Dr.
Malheiros viu um homem, engravatado, alto,
forte, entrar no quarto, sentar-se ao lado do ra-
paz, tomar a mão dele entre as suas e beijá-lo
carinhosamente na testa. Nesse momento, Dr.
Malheiros teria se perguntado: “Qual desses
dois é, de fato, a família desse rapaz?” Naque-
le momento, teria voltado a indagação sobre
o conceito de família que, hoje, mais do que
nunca ele considera como aquela formada pela
doação e pelo afeto. Esses episódios acabaram
por levá-lo a desenvolver sua dissertação de
mestrado. Contou que entender o sofrimento
ajuda a decidir, acaba virando parte da for-
mação pessoal e profissional. Partilhou que é
preciso olhar de igual para igual, o que requer
simplicidade, seja decidindo um julgamento
ou contando histórias. Por isso, encerrando, de
forma contundente, afirmou: “Guarda Compar-
tilhada é bobagem!” (sic) Tudo já estava lá, na
Lei. Mas tudo está no coração e na razão. As
crianças são as que mais sofrem. Portanto, essa
guarda é remédio quando concretizada pelos
adultos responsáveis pela criança e não é a Lei
que vai fazer isso. É essa a nova configuração
de família: pela doação e pelo afeto.
A segunda a fazer uso da palavra foi Da-
maris que abordou um capítulo de sua tese
de doutoramento: Capítulo IX: “A Creche é
o Pai”: Instituição pública ou projeção de
uma família idealizada? A difícil comple-
mentaridade entre creche e família13
. O
tema aborda o estudo na área do que é cuidar.
Ela se interessava por entender os conflitos
existentes entre a família e a creche. Explicou
que as relações se complicam porque todos
acham que sabem cuidar melhor, o que denota
13
in: Infância em Perspectiva: Políticas, Pesquisas e Institui-
ções. Org.: Fernanda Müller, 1ª ed. São Paulo, Cortez, 2014.
https://books.google.com.br/books?id=A6r-
FAwAAQBAJ&pg=PT210&lpg=PT210&dq=Da-
maris+Gomes+Maranh%C3%A3o+o+pai+%-
C3%A9+a+creche&source=bl&ots=FBx_5pl0Ck&-
sig=QKE_WiilWKkBDZ-159lJg2QZYqo&hl=pt
BR&sa=X&ved=0ahUKEwib-6TkgZ7WAhULgpAKHXCMC-
c0Q6AEIRTAF#v=onepage&q=Damaris%20Gomes%20
Maranh%C3%A3o%20o%20pai%20%C3%A9%20a%20
creche&f=false
III Seminário Nacional Paternidade e Primeira Infância 25
a percepção de limites imprecisos entre a famí-
lia e a creche. Relatou alguns casos e a neces-
sidade de ser realizado um trabalho em rede,
trazendo as políticas públicas da educação,
saúde, esportes, lazer, cultura, habitação, etc.,
para comporem, uma vez que isolados esses
serviços dificilmente conseguem administrar os
conflitos e lidar com as necessidades das famí-
lias. Insistiu que a articulação é que possibilita-
rá oferecer um suporte às insuficiências familia-
res. Observou ainda que a creche é a primeira
institutição de educação, o primeiro contato
da criança e da família e que essa relação pre-
cisa ser construída, pois sozinha a creche não
é capaz de resolver os problemas. Por isso, ela
deve ser parceira dos pais e mães no cuidado.
Explicou que a creche proporciona estreita re-
lação de afeto e é decisiva para a estruturação
da subjetividade da criança, apresentando as
relações de afeto e cidadania, oferecendo exer-
cícios de participação cidadã. Observou que
não se trata de uma questão exterior ao sujei-
to, mas o oferecimento de condições para uma
sociedade levar adiante um projeto democrá-
tico de relações sociais que estão estritamen-
te vinculados às possibilidades subjetivas dos
cidadãos. Arrematou afirmando que, portanto,
a cidadania é uma questão que diz respeito à
construção de afetos, o que a creche oferece.
Chamada a fazer uso da palavra, Jane Va-
lente relatou que trabalha com famílias aco-
lhedoras há vinte anos. Explicou que o acolhi-
mento familiar é tipificado desde 2009 e que
está previsto no ECA. Como serviço, oferece
o cuidado temporário a crianças afastadas das
famílias pelo serviço de proteção, sendo a elas
propiciado um cuidado por outras famílias.
Nos Estados Unidos, 95% do cuidado já é rea-
lizado por famílias acolhedoras. Apenas 5% se
processa em instituições. Nessa tipificação, as
famílias são formadas para acolher. O cuidado
é compartilhado em trabalho com a rede de
proteção e a família (avós, tios, irmãos...). As
famílias, depois da formação, sentem-se poli-
ticamente atuantes de um estado democrático
de direitos, pois sentem que têm obrigação de
cuidar, de forma natural, envolvida e afetiva.
A grande diferença está no trabalhar com as
famílias e crianças e não para elas. O serviço
é excepcional e provisório: o objetivo é que a
criança vivencie os vínculos, estabeleça afetos
para voltar às famílias de origem ou à adoção.
Relatou o caso de um menino, acolhido por
uma família acolhedora, cujos pais tinham de-
ficiência mental. Com o passar do tempo e da
relação que se foi estabelecendo, o garoto co-
meçou a compreender a situação e quando ia
visitar os pais, tocava violão para o pai. Então,
foi percebendo que os pais não cuidavam dele
porque não podiam, não porque não queriam.
Esse processo ajudou muito no desenvolvimen-
to e autoaceitação da criança. Em contraparti-
da, relatou que pesquisadores da Universidade
de Harvard comprovaram as perdas de crian-
ças que vivem em abrigos institucionais. Não
obstante, lamentou que falte ainda criar uma
cultura de acolhimento familiar. Ao encerrar,
lembrou o despreparo dos profissionais de pro-
teção, o que, em muitos casos, acaba levando
às medidas protetivas da justiça, o que implica
nos prejuízos da institucionalização.
Janie Paula disse que falaria como mãe
adolescente: ela foi mãe aos 16 anos e, depois,
aos 28. Chamou a atenção para o abismo entre
Relatório Técnico 201726
as duas experiências. Isso a estimulou a acom-
panhar pessoas no processo de estruturação fa-
miliar. Estabeleceu uma relação mostrando que
o processo de adoção, o ir e vir até a concre-
tização, é um processo de parto também. Mui-
tos questionamentos surgem: qual o papel da
mãe? E o do pai? Entretanto, disse, é preciso
pensar no papel do cuidador e na criança. O as-
sunto é o núcleo familiar que será desenvolvido
para a criança, sobre o que é o cuidar, sobre as
novas medidas de cuidado. Ela alertou que a
sociedade não fala sobre o respeito à infância e
que a criança continua invisível. Reafirmou que
as pessoas precisam, antes de qualquer coisa,
aprender a se respeitar, o que evidencia que
há paradigmas a serem quebrados. Disse que
é preciso rever os olhares para entender as no-
vas constituições familiares, esses novos arran-
jos que existem, mas são ignorados. Encerrou
alertando que os casais precisam ser parceiros,
precisam se ajudar, aprender a se comunicar e
se respeitar dividindo o cuidado pela infância
com mais respeito ainda.
Antes de abrir para a plenária, o mediador,
Flávio Debique, observou que a valorização do
cuidado e do afeto está na base para as rela-
ções humanas. Lembrou que isso apareceu em
todas as falas dos componentes da mesa, o que
demonstra o quanto todos precisam cuidar e
também de ser cuidados. Disse que se pode
determinar licença-paternidade e outros direi-
tos, mas sem o cuidado por “pertença” não há
compartilhamento, justiça, nem será igualitário.
Argumentou que o seminário trouxe a reflexão:
“Eu sou pai desde sempre!” A questão é a difi-
culdade em respeitar a alteridade, a diferença,
a outra pessoa, a religião, a família, o modo de
ser e de querer ser. Afirmou que é preciso des-
construir estereótipos, pois a realidade atual é
de retrocessos. Pontuou que o congresso pas-
sou da invisibilidade da infância para o dano a
elas. Por isso, finalizou, é preciso aprender com
quem sabe fazer melhor: as próprias crianças.
Participação da Plenária
A participante Ana Cláudia Lima, Psicó-
loga do Instituto Base Gênesis14
, levantou a
questão dos pais refugiados no Brasil. O Institu-
to propicia a inclusão e acolhida deles, mas há
muito a ser considerado para pessoas de outra
cultura. Observou que a paternidade significa
também a descendência e a ancestralidade, o
que tem um valor imensurável para os povos
14
Instituto Base Gênesis: Instituto de Desenvolvimento Hu-
mano. www.institutobasegenesis.org.br
III Seminário Nacional Paternidade e Primeira Infância 27
islâmicos. A sociedade vai precisar se preparar
para essa compreensão e convivência.
Os participantes levantaram questões
aleatoriamente para os palestrantes e tam-
bém comentários:
- Como preservar os vínculos familiares?
- Como trabalhar a questão do cuidado
para que o homem aprenda a cuidar?
- Onde fica a dimensão do masculino e
feminino no cuidado se ambos são com-
ponentes do processo do cuidar como ele-
mento fundante?
Os palestrantes expuseram experiências so-
bre as questões reconhecendo que, de alguma
forma, elas estavam contempladas nas reflexões
até ali. Houve reconhecimento de que o am-
biente da educação infantil é fundamental para
a formação do cidadão que a criança será. Entre-
tanto, a creche tem muita dificuldade em traba-
lhar com a parentalidade e que os pais podem
ajudar muito. O consenso é de que é preciso
que sejam respeitadas as mesmas potencialida-
des a serem desenvolvidas de meninos e meni-
nas para o crescimento e convívio igualitários.
Damaris explicou que conhecer o diferen-
te é torná-lo familiar e, assim, questionar nos-
sas questões socioculturais. As tecnologias de
cuidado são aprendidas dentro da cultura. Tem
uma divisão de funções que é social e não se
pode esquecer que o cuidado sempre esteve
muito a cargo da mulher. Refletiu que a ques-
tão é o como dar suporte à família nos seus
conflitos básicos de convivência. A perspectiva,
finalizou, precisa ser de ajuda, de trazer a famí-
lia para o convívio da criança na creche.
Encerrada a jornada do primeiro dia, todos
foram convidados para as oficinas vivenciais e
rodas de conversas que seriam desenvolvidas
no dia seguinte, com a sequência do Seminário.
Segundo dia: 02/09/2017
Desafios do Cuidar:
Oficinas Vivenciais e Rodas de Conver-
sas para Escuta e Troca de Experiências
O segundo dia do “III Seminário Nacional
Paternidades e Primeira Infância: avanços e de-
safios do cuidar” tinha a proposta de realização
de três oficinas vivenciais: 1- Amamentação
e Alimentação Saudável, com o Dr. Marcus
Renato de Carvalho, da UFRJ e Aleitamento.
com; 2- Educação para Equidade de Gêne-
ro, com Mariana Azevedo, do Instituto Papai, e
Milena do Carmo, do Instituto Promundo Brasil;
3- Homens nas Creches Parentais e na Edu-
cação Infantil, com Téo Cordeiro, do Grupo
de Pais da Casa de Parto David Capistrano-RJ.
Antes do início das atividades, Simone
Valadares, do CECIP, Secretaria Executiva da
RNPI, pediu ao orientador dos trabalhos, Agui-
naldo Campos, que lesse uma mensagem
encaminhada a todos por Claudius Ceccon,
Secretário da Rede Nacional Primeira Infância,
criador do logo do Seminário e que desejava
a todos, por meio de um texto inspirador, os
melhores ensejos de aproveitamento do Semi-
nário, bem como, pedia escusas pela impossi-
bilidade de estar presente.
Relatório Técnico 201728
Texto: Recado Afetivo de Claudius Ceccon15
Procuro lá no fundo da memória o que
dizer sobre paternidade e um filme passa
pela minha cabeça. Um filme com momen-
tos dramáticos: - Meu filho atropelado por
um carro que foge sem prestar socorro...
Momentos que me fazem rir: - Minha filha
de quatro anos na aula de natação, atraves-
sando a piscina, nadando cachorrinho e eu,
pronto para me atirar na água, com roupa
e tudo, para salvá-la do que me parecia ser
afogamento na certa... Passam cenas dos
dois, um pouquinho maiores, desajeitada-
mente pescando num lago, com varas e
iscas improvisadas. Mais tarde, a leitura do
Minotauro, de Monteiro Lobato, antes de
viajarmos para a Grécia. O filme os encon-
tra, já aborrecentes, torcendo o nariz para
tudo o que lhes queríamos mostrar de in-
teressante (aos nossos olhos) numa visita a
15
Arquiteto, designer, jornalista, desenhista, ilustrador e
cartunista. Após ser preso pelo regime militar brasileiro, em
1971, exila-se em Genebra. Lá, tem contato com o educa-
dor Paulo Freire (1921-1997), com quem funda - juntamen-
te com Rosiska Darcy de Oliveira, Miguel Darcy de Oliveira
e Babette Harper - o Instituto de Ação Cultural (IDAC), por
meio do qual trabalha em projetos de alfabetização em pa-
íses africanos de língua portuguesa até 1975. Ao voltar para
o Brasil, em 1978, trabalha com alfabetização em bairros
carentes de São Paulo, também pelo IDAC, junto ao arce-
bispo dom Paulo Evaristo Arns (1921).
Após desligar-se do instituto, funda, com o cineasta Edu-
ardo Coutinho (1933-2014), Paulo Freire, a escritora Ana
Maria Machado (1941) e outros, o Centro de Criação da
Imagem Popular (CECIP), no ano de 1986. O centro produz
o programa de televisão TV Maxabomba e cria materiais
educativos, voltados para a democratização da mídia e da
informação no Brasil. Ganhador de inúmeros prêmios, entre
eles, o Jabuti, de 2016, como melhor Ilustrador.
Londres. Passam muitas sequências da es-
cola, dos infindáveis deveres, dos aborre-
cidíssimos sermões sobre a importância de
estudar. O filme revê namoros, choros, de-
silusões, discussões entre concepções gera-
cionais: a difícil convivência entre o “velho”
e o novo. No filme, revivo momentos de in-
dizível sofrimento: - Um filho em perigo de
vida! Não está na ordem natural das coisas
que ele morra antes de mim! Revejo as mui-
tas lições que os dois me ensinaram, cada
um resolvendo à sua maneira o que ia viven-
do. Passam momentos de puro carinho, de
alumbramento, de silêncios, de uma comu-
nicação sem necessidade de palavras.
Ah, se eu pudesse voltar no tempo
com a consciência que hoje tenho do va-
lor do momento que passa... Eu seria um
melhor pai, muito mais presente, mais ami-
go, mais compreensivo – sem deixar de ser
exigente – sem deixar de ser eu mesmo,
apenas capaz de dialogar com meus filhos.
É isso o que eu deixaria para vocês, hoje:
viver a vida amplamente com seus filhos!
Oficina de Roda 1: Amamentação
e Alimentação Saudável
Acolhidos pela afetividade da mensagem,
os participantes foram convidados às ativida-
des do último dia de seminário.
O número de participantes girava em tor-
no de trinta pessoas mais os organizadores. Em
função disso, foi lançada uma proposta para
que o grupo decidisse: escolheriam as ofici-
III Seminário Nacional Paternidade e Primeira Infância 29
nas separadamente ou elas poderiam ocorrer
concomitantemente, em forma de Roda de
Conversa. Os presentes decidiram pela última
opção uma vez que desejavam participar de to-
das. Abriu-se uma grande roda no anfiteatro e
a primeira oficina foi iniciada.
A Oficina de Roda 1: Amamentação e Ali-
mentação Saudável foi coordenada pelo Dr. Mar-
cus Renato de Carvalho. Ele disse que a oficina
teria início por onde tudo começou: a Campa-
nha de Valorização do Cuidado Paterno cujo
slogan “Pai, dê o peito ao seu filho!” teve a
primeira edição em 2003. Contou alguns casos
sobre a amamentação explicando que o impor-
tante é a presença e o apoio do companheiro à
esposa no momento de amamentar. Relatou a
emblemática história de um homem, viúvo, no Sri
Lanka, cuja filha não conseguia tomar leite, nem
mamadeira. Desesperado, ele a pôs no próprio
peito e amamentou. É a possibilidade do amor
humano. Ele nem tinha as glândulas desenvol-
vidas, mas mostra como há a possibilidade da
dimensão humana, do amor que tudo alcança.
Explicou que o que faz produzir leite é a sucção
do bebê, sendo possível a indução da lactação
mesmo por mães que não “pariram”(sic).
Para dar início à oficina, ele lançou uma per-
gunta como provocação: - Vocês têm a história da
amamentação de vocês? Foram amamentados?
Sabem as causas de não terem sido amamenta-
dos? Causas alegadas (mitos, crenças, tabus...) e
causas reais (determinantes psíquicos, sociais, cul-
turais, econômicos...), trabalho, falta de apoio do
companheiro, da intolerância social, etc.?
Diversos e os mais interessantes foram os
relatos dos participantes e o quanto isso lhes
marcou a memória, sobretudo, no momento de
passarem a amamentar também. Alguns fala-
ram, inclusive, sobre o período em que deixa-
ram de usar chupeta.
A conversa girou em torno das implicações e
consequências da amamentação ou não. Dr. Mar-
cus Renato explicou que as doenças infecciosas e
alérgicas, por exemplo, têm a ver com a pouca ou
nenhuma amamentação exclusiva. Mostrou que,
potencialmente, toda mulher é capaz de ama-
mentar quando informada, apoiada, com desejo
e disponibilidade de fazê-lo. Falou sobre os mi-
tos e crenças, como o do “leite fraco” ou o “leite
que secou por estresse”, etc. A amamentação na
espécie humana não é instintiva ou hormonal e
sim um hábito cultural que precisa ser promovido,
protegido e apoiado por toda a sociedade.
Damaris lembrou que, no ser humano, tudo
é híbrido, nada é inato, tudo é construído socio-
culturalmente, inclusive, a amamentação.
Apareceram relatos socioeconômicos sobre a
amamentação. Ela determina doenças no adulto,
como obesidade na infância, rinite alérgica, bron-
quite asmática... A amamentação não é instintiva
ou inata. É uma cultura para humanos, mas a in-
dústria da chupeta prejudica.
Dr. Marcus lembrou que a amamentação
é um direito, não dever da mulher. Mas que ela
precisa ter informação. Ele lembrou que cada
mãe produz o leite certo para o seu bebê, mas
ressaltou a importância dos bancos de leite.
Explicou ainda que a amamentação não é para
rachar, doer, ter problema de pele... É preciso
preparo, técnica para amamentar, coisa que o
serviço de saúde deveria prover. Falou da co-
brança social, muito grande sobre a amamen-
tação, sendo que não há apoio e compreensão
do companheiro, muitas vezes.
Relatório Técnico 201730
Oficina de Roda 2: Homens nas
Creches Parentais e na Educação
Infantil, coordenada por Téo Cordeiro.
A oficina seria a terceira na ordem da
programação, entretanto, havia um gancho a
partir da reflexão do desmame e o assunto
entrou naturalmente indicando a condução
da roda de conversa.
Téo refletiu que há uma interessante ques-
tão relacionada à experiência do desmame: a
sensação de abandono, pois está relacionado
aos cuidados, à pessoa de referência, à confian-
ça. O companheiro precisa amparar porque o
desmame poder ser traumático. Quando o com-
panheiro é presente, o diálogo com a criança é
tranquilo, inclusive, para a retirada da chupeta.
Abud Bellini, Cristiane Rodrigues Duarte e Mariana Ferrer
Duarte. https://revistas.pucsp.br/index.php/RFCMS/article/
viewFile/21445/pdf
Damaris trouxe a reflexão de que as doen-
ças são determinadas socialmente pelo modo
de vida e que, inclusive, a amamentação é deter-
minada. Segundo ela, hoje, não é possível ama-
mentar por causa de algumas poucas doenças
infecciosas, como o HIV e o HTLV. A amamen-
tação é um ato psicossomático complexo com
uma determinação socioeconômica e cultural.
Dr. Marcus lembrou que o bebê que mama
no peito não aceita chupeta porque tem boa
sucção. Com relação à colocação da Damaris,
explicou que uma mãe pode doar o leite, mas
só para bancos de leite, uma vez que lá são
pasteurizados, matando vírus como hepatite
B, HIV, etc., por isso, não é recomendável uma
mãe amamentar outras crianças. A não ser que
se saiba da real condição de boa saúde dela.
Tânia Sobral levantou interessante reflexão
ao afirmar que não há uma cultura de pós-ama-
mentação para a mulher. Explicou que as ma-
mas não são acompanhadas pelo ginecologista
e que do zero aos três anos há o período de
amamentação, sendo necessário que se fizesse
um trabalho de preparação para o desmame.
Dr. Marcus Renato agradeceu a partici-
pação e o envolvimento de todos observando
que a amamentação é uma questão complexa.
Ele encerrou a oficina/conversa indicando dois
livros: O mito do amor eterno16
e Aleitamento
Materno: uma reflexão sobre o papel do Pai17
.
16
Badinter, Elisabeth. Um amor conquistado: o Mito do
Amor Eterno. Trad.: Waltensir Dutra. Rio de Janeiro: Ed.
Nova Fronteira, 1985. http://www.redeblh.fiocruz.br/me-
dia/livrodigital%20(pdf)%20(rev).pdf
17
In: Rev. Fac. Ciênc. Méd. Sorocaba, v. 17, n. 3, p. 140 -
147, 2015. Artigo de Ruth Bernarda Riveros Jeneral, Luíza
III Seminário Nacional Paternidade e Primeira Infância 31
Essas experiências são acompanhadas na ordem
natural das creches. Ele disse que costuma fazer
pesquisas para conhecer a situação da creche
parental. Explicou que elas começaram a ser
experimentadas na Europa, na década de 70,
por famílias que queriam uma opção diferente
de educação. No Brasil, a experiência vem de
outra prática: a das comunidades, com as mães
que cuidam dos filhos das outras. Entretanto,
a creche parental apresenta-se como propos-
ta alternativa às creches institucionais porque
passam pelo comprometimento dos pais com a
educação dos filhos. Cada uma terá o seu dese-
nho estabelecido por acordo entre os pais par-
ticipantes. Por exemplo, em tal dia da semana,
as crianças ficarão na casa de tal família e esta se
responsabilizará pelo cuidado e atividades.
Como a oficina começasse já em forma de
roda de conversa, as intervenções e reflexões fo-
ram acontecendo naturalmente.
Josimar Silveira falou sobre sua experiência
de cuidado exclusivo. Disse cuidar de crianças de
quatro famílias de amigos. Tudo teria começado
como espécie de brincadeira ao fazerem um rodí-
zio de casais para ficarem com as crianças e terem
algum tempo para si. Com o tempo, deram-se
conta de que essa experiência demonstrava fragi-
lidades e dificuldades: não das crianças, mas dos
pais. Alguns casais tinham receio de que o filho
fizesse xixi na cama, como acontecia em casa. Na
casa dele, o menino pediu para ir ao banheiro, no
meio da noite. Ao relatar o caso, o pai da criança
ficou surpreso. Outras coisas corriqueiras como o
fato de não comer legumes ou fazer manha para
se alimentar. Nada disso acontecia na casa dos
outros casais, o que os levou a perceber que o
problema estava na relação que os pais estabele-
ciam com os filhos. Toda essa experiência levan-
tou para os casais importante reflexão em relação
à qualidade de vida, de representatividade das
crianças e do seu melhor desenvolvimento e per-
tencimento. Acabaram percebendo que estavam
diante de uma espécie de educação compartilha-
da, de certa forma.
Fábio Paes argumentou que o direito à
educação no país foi conquistado sob duras lu-
tas e que se está sob forte retrocesso de direitos
por parte do atual governo, inclusive, garantidos
por acordos internacionais. Nesse sentido, disse
que gostaria de entender qual deveria ser o de-
bate da política pública para o tema da Creche
Parental. Explicou que seria importante enten-
der o lugar do público nessa experiência para
que não venha a ficar à margem de um sistema
de direitos. A política pública não é necessária
nesse nicho? Falou de experiências de creches
parentais na Bolívia, mas que acontecem porque
não existem creches institucionais, o governo re-
lega às famílias o encargo. Como seria isso, no
Brasil? Seria necessário algum subsídio governa-
mental para as famílias interessadas nesse arran-
jo educacional? Alguma nova linha de políticas
públicas, de caráter menos institucional, pode
ser proposta a partir disso? Ou se está falando
de uma experiência autônoma e que o estado
não tem importância nessa esfera?
Em resposta, Josimar explicou que o ide-
al seria que as creches/escolas tivessem esse
preparo, disponibilidade e olhar da creche pa-
rental. Argumentou que a educação é branca e
não apresenta a cultura da diversidade. Há o di-
reito constitucional à educação, mas na prática,
há exclusão. Disse haver políticas públicas para
a educação, mas não são aplicadas com esse
Relatório Técnico 201732
fim. O próprio ECA, afirmou, não é cumprido,
senão não haveria discussão pela redução da
maioridade penal, etc.
Damaris observou que há pontos impor-
tantes a serem refletidos: é preciso tomar cui-
dado para não baratear a discussão, entretan-
to, também seria necessário reconhecer que há
famílias que não teriam condições de oferecer
o cuidado exigido pela creche parental. Evo-
cando uma experiência de mais de 20 anos de
trabalho em creches da Prefeitura de São Paulo
argumentou que o modelo que ali estava sen-
do trazido de creche parental era o desenvol-
vido por famílias com mais ou menos acesso a
bens culturais e que podem proporcionar ex-
periências ricas para as crianças. Não que a po-
breza não possa, mas tem muitas vezes uma li-
mitação extrema de espaço, escolaridade e até
de condições sanitárias. Na periferia, veem-se
placas anunciando: toma-se conta de crianças!
Então, o tipo de trabalho/atuação dos pais, in-
clusive, nesses casos, precisa ser considerado.
Haveria ainda a possibilidade de se pensar em
turnos para uma opção de creche parental, mas
o fato é que se apresenta como uma opção e
isso deve ser entendido sob análise de um todo
sistêmico: a política pública da Creche é carís-
sima, no mundo todo, explicou, mas é efetiva
e estruturada, tentando alcançar a demanda. A
creche parental também precisa discutir o cui-
dar, pois não se pode confundir o tomar conta
precário, o que a classe média tem buscado.
Observou os riscos, falando sobre pesquisa que
teria realizado sobre mortes em creches: 70%
não seriam reconhecidas legalmente pelos es-
tabelecimentos. Essas coisas podem acontecer.
E quando acontecer em uma creche parental?
Aí volta o arcabouço da necessidade da políti-
ca pública: é preciso tomar o cuidado de não
transformar essa experiência em uma política
pública barata para o governo.
Em contraponto, Téo argumentou que não
se trata de um simples tomar conta, mas de
um cuidado oferecido por famílias que se co-
nhecem. Disse que as experiências ainda são
pouquíssimas, por isso, fica difícil uma análise
ou até mesmo crítica. Por outro lado, enfatizou
que as creches são elitizadas mesmo.
Fábio Paes arrazoou que falta o reconhe-
cimento ao direito público de educação infantil
de qualidade e que as pessoas podem orga-
nizar a educação de acordo com a sua possi-
bilidade criativa. Ponderou que há pontos a
serem refletidos sobre a creche pública: o ta-
manho das estruturas, a falta de educadores/
cuidadores e os espaços nada infantis ou pen-
sado para as crianças. Há, em muitos casos, um
adulto para cuidar de vinte crianças enquanto
na creche parental, há um adulto para cuidar de
quatro. O problema estaria nas pouquíssimas
experiências de creche parental o que inviabi-
lizaria qualquer condição de pensar em regula-
mentação por enquanto.
Téo passou a palavra ao Pedagogo Edi-
naldo J. Crispim, que atua no CEI-Centro de
Educação Infantil Shangrilá, no Grajaú, bairro
de São Paulo, para que fizesse um relato do seu
dia a dia cuidando de crianças em uma creche
institucional, o que ainda não é muito comum,
uma vez que a grande maioria de cuidadores e
professores ainda são do sexo feminino.
Edinaldo relatou que desempenha a função
de Professor de Educação Infantil, no CEI. Disse
que inicialmente acontece um clima de descon-
III Seminário Nacional Paternidade e Primeira Infância 33
fiança, parece haver um preconceito por ser um
homem o professor que vai cuidar das crianças.
No entanto, na prática isso acaba se dissipando.
Ele já trabalhava com crianças do fundamental,
antes. Veio para São Paulo com o desejo de tra-
balhar com crianças, na educação infantil. Entrou
na creche. Enfrentou a desconfiança de um pai
que achou estranho um homem cuidando. O di-
retor já havia preparado os pais com uma con-
versa prévia. No final de 2016, quando a criança
avançou o ciclo, os pais foram elogiar o trabalho
dele e pedir que continuasse. Relatou que o tra-
balho é desenvolvido por ele com o auxílio de
uma educadora. Ele era o único homem cuida-
dor da creche. Agora, foi contrato um outro. Fa-
lou sobre as rotinas e atividades sequenciais de
artes, oralidade, linguagem, horta, jardim, etc.
Damaris perguntou a ele como seria trabalhar
em um berçário cuidando de bebês de 4, 6 meses
até 1 ano? Como seria o cuidar nessa condição?
A partir de sua experiência em educação in-
fantil, Tânia Sobral, objetou que a preocupação
da família quando o cuidado é oferecido por um
homem está no recorte de gênero. Disse que a
questão não está no cuidado no berçário, mas na
fase do desfralde, que se dá a partir dos dois anos,
e que é impactante para o pai e a mãe, pois não
imaginam um homem diante da nudez da crian-
ça, ajudando e ensinando a se limpar, porque é
um período também de aquisição da linguagem,
de vocabulário, autonomia e causa melindres um
homem acompanhando esse processo.
Em objeção, Damaris disse que a Tânia
estava se referindo ao ponto de vista da sexu-
alidade, mas o recorte que pretendia era o do
cuidado, o saber se o homem sabe cuidar do
bebê, se tem esse preparo.
Edinaldo voltou a dizer que a direção da
Creche faz reuniões preparatórias com os pais
antes de introduzir qualquer novidade, o que faz
com que as expectativas se acalmem. Os pais
são convidados a participar das atividades e há
aqueles que frequentam a creche ajudando os
cuidadores, então, podem observar o cuidado
com que as crianças são tratadas. Com relação
à pergunta da Damaris, ele respondeu que não
tem o perfil para trabalhar em um berçário, pois
é professor e bastante identificado ao trabalho
com crianças da faixa etária de que cuida.
Outro testemunho foi o do Fellipe Cime-
ne Mendes, que dá aulas de xadrez em escolas
particulares para crianças de 5 a 11 anos. Disse
que é muito difícil ver homens trabalhando com
essa faixa etária nas escolas, ainda predominan-
do o cuidado, a alfabetização, etc., pelas mu-
lheres. Disse querer compartilhar a experiência
dele em relação à estrutura escolar que confia
trinta crianças aos cuidados de um profissional.
Observou a crueldade do modelo que não res-
peita a criança, sendo que deveria entender que
cada uma é um universo e precisa de atenção
individualizada. Como trabalhar com trinta uni-
versos sozinho, ao mesmo tempo? Não have-
ria outra forma para que as crianças pudessem
aprender? Será que é só nesse modelo escolar?
Em muitos países, outros modelos de aprendi-
zado já estão em prática e com melhores resul-
tados para formar seres humanos. Disse que as
crianças precisam ser ouvidas, não mandadas e
direcionadas. Ninguém é dono de criança. Será
que o aprendizado do ser humano só pode ser
alcançado por esse modelo? Apostilas, lição de
casa... ficar 6, 8 horas preso em uma sala e vol-
tar para casa para fazer lição de casa!
Relatório Técnico 201734
menino a estar nos espaços públicos, conquis-
tando, competindo... Os adultos passam toda
a fase de desenvolvimento infantil oferecen-
do esses brinquedos, fortalecendo a ideia de
que o menino é forte, é ogro, tudo pode. Mas
não se pensa nas consequências: por que são
agressivos? Por que o envolvimento com dro-
gas e armas? Por que correm tanto no trânsito?
Estabelecendo um paralelo, quando a criança
cresce, o que se constata nas estatísticas em
relação ao homem é que as causas de mortes
ditas externas são por homicídio e as causadas
pelo trânsito. Refletiu que os brinquedos feitos
para os meninos podem ajudar a entender os
resultados dessas pesquisas e, sobretudo, des-
se comportamento/estereótipo. Os meninos
são proibidos de brincar com bonecas. Muitos
fazem divisão dos brinquedos, o que o menino
pode e não pode. Em relação à mulher, as ima-
gens que vão aparecendo são sempre aquelas
ligadas ao cuidado, então, a boneca é o brin-
quedo principal. Depois, adulta, ela é que vai
gerar, parir, amamentar, cuidar... E o marido vai
dizer: “Olha essa criança chorando. Troca, dá
de mamar, faz alguma coisa! Isso é tarefa da
mãe, eu sou pai, não sei cuidar”. Poderia ter
brincado de boneca... Isso é comportamento
de 90% da sociedade, daí a importância do de-
bate. Brincar de boneca poderia dar aos me-
ninos essa sensibilidade e abertura para essas
práticas e habilidades. Há coisas que não se
observam, mas se acabam reproduzindo, como
o olhar de mães e avós proibindo ou deixando
o menino fora do lugar de atividades de cuida-
dor, apenas sendo cuidado. O questionamento
que se faz para o cuidado masculino passa pela
pergunta: Você não dá uma boneca para o seu
O adiantado da hora alertou para a ne-
cessidade de desenvolver o tempo para a úl-
tima oficina: Educação para a Equidade de
Gênero, coordenada por Milena do Carmo e
Mariana Azevedo.
Milena deu início à oficina/conversa reto-
mando a discussão da creche parental, da polê-
mica que sempre se estabelece quando se fala
de homens cuidando de crianças, a nudez da
criança, sobre outras formas de educar, como
propôs o Fellipe. O que se percebe é que a
educação não é circunscrita, não acontece só
em creche, há outras formas de educar, como
o cuidado parental e isso tem implicações,
construções e reconstruções sobre as normas
de gênero e as consequências disso. Vamos
formulando internamente o que é ser homem
e ser mulher, quais os papeis que se deve cum-
prir. Então, pediu para os participantes dizerem
palavras, características do que é ser homem e
do que é ser mulher. As características do ho-
mem: força, ogro, proteção... As características
da mulher: cuidar, afeto, frágil... Milena mos-
trou algumas fotos sobre brinquedos que se-
riam para meninos e os que são para meninas.
Os brinquedos de meninos mostravam armas,
veículos, consertos, conquistas... O que leva o
III Seminário Nacional Paternidade e Primeira Infância 35
filho por que você tem medo de quê? Que ele
seja um bom pai? Essa é a pergunta lançada
nas oficinas de gênero.
Mariana pontuou a desigualdade na divi-
são das tarefas de trabalho: as ligadas ao cui-
dado são sempre desenvolvidas pelas mulhe-
res sem remuneração, sem reconhecimento ou
mal pago, nos poucos casos em que acontece
retribuição, e, sobretudo, invisibilizado porque
é tarefa direcionada, visto como obrigação da
mulher. Isso vai se refletir também na vida da
mulher adulta, profissional, no mercado de tra-
balho, aceitando os piores empregos e a pior
remuneração. Entretanto, tudo isso é gestado
lá na infância, nas brincadeiras e nas tarefas
impostas às meninas quando são obrigadas a
ajudar a mãe a lavar louça, limpar a casa, cui-
dar dos irmãozinhos... Isso vai determinar me-
nos tempo para elas estudarem, descansarem
e brincarem livremente como os meninos. Para
os homens, o não cuidar acaba se tornando pri-
vilégio, afinal, para que fazer algo que a mãe e
a esposa fazem?
Outro ponto importante foi levantado por
Milena: Essa ideia que a Mariana traz mostra
bem o paradoxo porque como o homem não
cuida, ele também não se cuida. Fecha-se em
uma caixinha com regras a seguir. O maior nú-
mero de suicídios é de homens. Por que será?
Homem não pode chorar, desabafar, expor fra-
gilidades, sensibilidade...
E há o sofrimento psíquico das mulheres,
continuou Mariana. Elas são campeãs, mas os
homens é que se matam. Ao menos, elas pro-
curam ajuda, espaços de diálogo. Até as habi-
lidades que vão sendo desenvolvidas determi-
nam: quem busca as profissões de cuidado?
Entretanto, as habilidades de cálculo de ganho,
de negócios, de competitividade, tudo o que
é valorizado pelo capital, fica com o homem.
O professor Michael Kimmel18
fala disso em
seus livros, da consequência perversa de estar
no topo social. A hierarquia social coloca o ho-
mem no topo patriarcal, machista e pagando
um preço por essa posição. Isso começa na in-
fância, na barriga da mãe, já com a expectativa
pelo sexo do bebê, o que já vai determinando
a história de vida daquela criança. Aí começa
tudo: os sonhos dos pais já vão antecipando o
que esperam da criança, sem levar em conta o
ser único que está sendo gestado. Então, os so-
nhos e projeções vão reproduzindo já os este-
reótipos sem dar chance à criança de escolhas.
As questões heteronormativas nem são levadas
em consideração, não passam pela cabeça dos
pais. Todos acham que a criança, por exemplo,
a menina, vai crescer, preparar o enxoval e ca-
sar com um homem e ter filhos porque é assim
que tem de ser. Esse é o comportamento per-
verso. As consequências do machismo fazem
mal inclusive para o homem. Então, por que
continuamos reproduzindo esses ideais?
Milena observou que quando essa questão
aborda o recorte étnico-racial, a situação piora
muito. Falou das dificuldades até aparecerem
no mercado bonecas inter-raciais, e os modelos
ditados pelos brinquedos o que leva, na adoles-
cência, a transtornos alimentares e tantos outros
problemas porque os modelos foram de bone-
18
Michael Scott Kimmel, Professor de Sociologia e de Es-
tudos de Gênero na StonyBrook University, de New York.
Diretor Executivo do Center for the Study of Men and Mas-
culinities. Michael_kimmel@yahoo.com
Relatório Técnico 201736
cas perfeitas, magras, loiras, como se esse fosse
o padrão de beleza humana. Sem falar que isso
também abre a discussão da mulher como sexo
frágil, mas a mulher branca, delicada, de classe
média porque a mulher preta é forte... Ela rela-
tou casos da ginecologia, que teria se fundado
no estudo dos corpos das mulheres negras: os
maiores maltratos, como dizer que elas não pre-
cisam de anestesia, são fortes, hiperssexualiza-
das, amas de leite... O índice de violência obsté-
trica contra a mulher negra é assustador. Citou o
filme The Mask You live in19
sobre a construção
da masculinidade violenta, heteronormativa, re-
alizado por pesquisadores norteamericanos.
Tânia falou sobre os estereótipos nas cre-
ches. Disse que a criança que é recebida nas
creches, hoje, é muito diferente daquelas que
frequentaram há cinco anos. Atualmente, há es-
paço para o início de ruptura de uma cultura na
educação das crianças.
Edinaldo concordou. Disse que na CEI em
que atua as crianças brincam com todo tipo de
brinquedo, não há separação.
Tânia continuou dizendo que essa infância,
daqui a dez anos, estará nas ruas. Daí a impor-
tância de pensar na criança de 0 a 3 anos porque
é a possibilidade de tentativa de um trabalho
de avanço na sociedade. O que não é possí-
vel é manter um caminho baseado em como as
coisas sempre foram feitas. Existem novos ca-
minhos, novas maneiras de educar, mas é preci-
so mobilização da própria sociedade. É preciso
uma cidade inclusiva, com transporte, lazer... É
preciso linkar (sic) as questões de gênero com
19
Trailler: https://www.youtube.com/watch?v=hc45-ptHMxo
a educação na primeira infância, porque dos 0
aos 6 há a construção do sujeito social que a
criança será depois enquanto adulta.
Milena mostrou na tela uma imagem como
reflexão final para os pais: “Como descobrir se
um brinquedo é para menino ou menina? É só
fazer a pergunta: Para brincar precisa usar os ór-
gãos genitais? Se precisar dos órgãos genitais
para brincar, então, não é brinquedo de criança!
Bate Papo com autores
Atividade conduzida por Leandro Ziotto,
que contou com a participação dos autores Jail-
son de Almeida, Victor Farat e Fábio Paranhos.
O primeiro a falar foi Jailson que relatou ter
sempre trabalhado com audiovisual. Partiu de
experiências que trouxe da atividade profissio-
nal, de entrevistas e vídeos que produzia para
fazer cartilhas, materiais, o que acabou desper-
tando o interesse em escrever para as crianças.
Percebeu a dificuldade das crianças em nomear
as coisas e, a partir também da experiência de
aquisição de linguagem dos filhos, passou a fa-
zer versos rimados para treiná-los a perceberem
as características dos objetos. Daí começaram a
surgir os livros: O que é O que é Coisas so-
bre as Coisas de A a Z20
e Encontro com a
Desimportância21
. O livro O que é... acabou
20
Jailson de Almeida. O que é O que é Coisas sobre as
Coisas de A a Z. São Paulo, Ed. Giostrinho, 2014.
21
Jailson de Almeida. Encontro com a Desimportância. São
Paulo, Ed. Giostri, 2015.
III Seminário Nacional Paternidade e Primeira Infância 37
sendo escolhido para o desenvolvimento de
um projeto de leitura nas escolas de Rio Grande
da Serra, São Paulo, onde serão distribuídos às
crianças gratuitamente como contrapartida pela
edição. Jailson fará oficinas. Disse que a relação
disso tudo com o aprendizado, nos dois dias de
seminário, é que, o que faz a diferença são as
pessoas, a forma como um trabalho é feito, o
envolvimento e isso o seminário proporcionou.
Victor Farat escreveu e ilustrou, em par-
ceria com Rodrigo Bueno, Bebegrafia uma
odisseia gráfica do primeiro ano dos nos-
sos filhos22
, que faz um retrato dos pais no pri-
meiro ano de vida dos filhos. Disse que o filho
nasceu em 2014 e ele ficou um ano em licença
-paternidade, um tempo de encantamento no
processo de convivência com o bebê, o que
o inspirou a desenhar a rotina com o filho. Ele
postava nas redes sociais e houve grande re-
verberação e interesse de outros pais. O livro
acabou propiciando a realização de rodas de
conversas com outros homens interessados
na paternidade, nas questões de gênero e no
cuidar, além da transformação do homem com
o advento da paternidade e a relação com a
companheira. Só em 2016, foram mais de 20
rodas de conversas em congressos de pedia-
tria, eventos e também em empresas que já
começam a perceber a importância do tema
para a vida dos funcionários. Finalizou dizendo
que “Nascer com meu filho inspirou a cuidar, a
ter contato com essa sensibilidade tanto emo-
cional quanto prática”.
22
Rodrigo Bueno e Victor Farat. Bebegrafia uma odis-
seia gráfica do primeiro ano dos nossos filhos. São Paulo,
Editoratimo
Fábio Paranhos e a psicóloga Vera Moris
escreveram o livro Coragem de Ser: relatos de
homens, pais e homossexuais23
. Fábio explicou
que a ideia do livro nasceu de um grupo de
aconselhamento a pais que estavam dentro de
relacionamentos heterossexuais e em determi-
nado momento saíram desses casamentos. O
livro trata da reconstrução que esses homens
tiveram de fazer, pois, em algum momento da
vida, eles perceberam que não eram como
acreditavam ou queriam ser. Ter encontrado
mulheres por quem se apaixonaram e com
quem constituíram família depois de uma in-
fância e adolescência confusas e problemáticas
era a chance de construção da sonhada família.
O problema se estabelece quando não é mais
possível fugir da própria essência, dos dese-
jos... Como agir diante dessa constatação? Que
fazer com os sentimentos, com o grande peso
de não conseguir enganar mais a si mesmo?
Como não machucar as pessoas que se ama? E
23
Fábio Paranhos e Vera Moris. Coragem de Ser: relatos de
homens, pais e homossexuais. São Paulo, GLS, 2017.
Relatório Técnico 201738
isso sob a égide de um assunto que, apesar das
mudanças, avanços e movimentos de luta por
igualdade de direitos, ainda provoca emoções
e reações as mais diversas porque continua cir-
cunscrito a uma cultura determinante.
III Seminário Nacional Paternidade e Primeira Infância 39
Show de Encerramento
O final do Seminário contou com a partici-
pação da Banda Alana que foi criada em 2007
para oferecer a crianças e jovens a oportuni-
dade de imersão em um trabalho cultural. Foi
criado um núcleo de recreação e cultura no
Jardim Pantanal, extremo leste de São Paulo,
onde são oferecidas oficinas de música, canto
coral, percussão, teoria, metais, contrabaixo,
teclado e musicalização infantil. Esse é o su-
porte da banda formada por meninos, meni-
nas e jovens dessa região que, na formação
atual, conta com 40 músicos, com idades entre
11 e 21 anos, todos moradores da região. A
Banda é profissionalizada e já realizou mais de
180 shows, com um público que já superou os
100.000 espectadores .
Sob a energia da Banda Alana, o III Semi-
nário Paternidades e Primeira Infância: avan-
ços e desafios do cuidar deixou a mensagem
de que a palavra pai ou paternidade inclui todas
as figuras que são referências de cuidado e afe-
to para crianças e adolescentes. Uma dedicação
amorosa favorece a criança e o adolescente que
recebem, mas também o adulto de referência
que se doa e tem de volta, na ampliação de suas
vivências emocionais, a dilatação do seu olhar
para o bem-estar familiar e social.
Relatório Técnico 201740
Carta de Recomendações:
Propondo um debate aberto e propositivo frente às diversidades de experiências de paternidades e possibilidades de am-
pliação de direitos e efetivação das políticas públicas instauradas pelo Marco Legal da Primeira Infância, O III Seminário Na-
cional Paternidades e Primeira Infância: avanços e desafios do cuidar, resultou em um conjunto de recomendações:
1.	 Desenvolvimento de ações de incidência frente à implementação de políticas públicas que qualifiquem a
relação de cuidado dos pais encarcerados com seus filhos e garantam às mães encarceradas o direito de
permanecerem com seus bebês;
2.	 Incidência junto ao Sistema de Garantia de Direitos, o Sistema de Justiça e o Sistema Penal sinalizando a
importância do diálogo entre essas instâncias para a garantia do interesse superior da criança;
3.	 Ações de informação e formação para o cuidado voltadas para as perspectivas de adoção por pes-
soas solteiras;
4.	 Investimento em ações de promoção do cuidado integral da criança, como preconizado pelo Marco Le-
gal da Primeira Infância, buscando a efetivação de políticas públicas de qualidade na área do esporte,
lazer, saúde, educação, cultura e meio ambiente;
5.	 Ações que incentivem o avanço da legislação sobre as opções da família em relação à licença-parentalidade;
6.	 Mobilização pelo direito à cidade com serviços, segurança e espaços adequados às experiências de vi-
vências das crianças;
7.	 Desenvolvimento de ações para propiciar o fortalecimento de vínculos entre crianças e cuidadores/as;
III Seminário Paternidades e Primeira Infância: Relatório Técnico
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III Seminário Paternidades e Primeira Infância: Relatório Técnico

  • 1. III Seminário Nacional PaternidadeS e Primeira Infância Avanços e Desafios do Cuidar
  • 2. Promoção: Rede Nacional Primeira Infância- RNPI Secretaria Executiva da RNPI/ CECIP- Centro de Criação de Imagem Popular (Biênio 2015-2017) Claudius Ceccon Maria Mostafa Simone Valadares Rosa Maria Mattos Isabella Gregory Verena Dolabella Elaboração e Revisão do Relatório Técnico: Aguinaldo Campos Revisão Técnica: Grupo de Trabalho Homens Pela Primeira Infância Integrantes do GT Homens pela Primeira Infância: Aguinaldo Campos (Aldeias Infantis SOS Brasil) Fabio Paes (Aldeias Infantis SOS Brasil) Leandro Ziotto (4Daddy) Mariana Azevedo (Instituto Papai) Marcus Renato de Carvalho (Aleitamento.com/UFRJ) Milena do Carmo (Instituto Promundo Brasil) Simone Valadares (CECIP) Viviane Manso Castello Branco (Comitê Vida/ Secretaria Municipal de Saúde do Rio de Janeiro) Téo Cordeiro – Casa de Parto David Capistrano Projeto Gráfico e Diagramação: Ramon Tanino Aldeias Infantis SOS Brasil Cartuns e Vinhetas: Claudius Ceccon Organização: GT Homens pela Primeira Infância Realização: Aldeias Infantis SOS Brasil 4Daddy Apoio: Fundação Maria Cecília Souto Vidigal Instituto Papai Plan International Brasil Impressão: Paulus III Seminário Nacional Paternidades e Primeira Infância: Avanços e Desafios do Cuidar Relatório Técnico
  • 3. Introdução 5 Principais Discussões / Reflexões do Seminário 7 Mesa de Abertura 7 Lançamento do documentário O Poder do Cuidar 10 Primeira mesa: Políticas Públicas de Apoio ao Cuidado Paterno 11 Participação da Plenária 16 Participação Infantil 17 Segunda mesa: Paternidades Diversas 18 Casa de Oportunidades 19 Participação da Plenária 21 Terceira mesa: Paternidades e Dinâmicas Familiares 23 Participação da Plenária 26 Desafios do Cuidar: Oficinas Vivenciais e Rodas de Conversas para Escuta e Troca de Experiências 27 Oficina de Roda 1: Amamentação e Alimentação Saudável 28 Oficina de Roda 2: Homens nas Creches Parentais e na Educação Infantil: 30 Oficina de Roda 3: Educação para a Equidade de Gênero 34 Bate Papo com autores 36 Show de Encerramento 39 Carta de Recomendações 40 Referências Bibliográficas 42 Leis 42 Teses e Trabalhos Acadêmicos 43 Cartilhas e Manuais 44 Links de Vídeos 44 Links Recomendados 44 Sites das organizações integrantes do GT Homens pela Primeira Infância 45 Sumário
  • 4.
  • 5. III Seminário Nacional Paternidade e Primeira Infância 5 Um país que vinha se destacando por déca- das na liderança de movimentos e de políticas públicas voltadas para a criança e o adolescente, percebe-se em um momento de reflexão e de crí- tica que necessita ser feita, a bem do futuro dos avanços conseguidos, encarando e enfrentando os desafios trazidos nos últimos dois anos de per- das de direitos fundamentais que se revelarão no prejuízo da constituição de, pelo menos, uma ge- ração de brasileirinhas e brasileirinhos. Nesse contexto desafiador, a proposta do III Seminário Nacional Paternidades e Primeira In- fância: avanços e desafios do cuidar, promovido pelo GT Homens pela Primeira Infância, da Rede Nacional Primeira Infância, veio propor a visibili- dade das diversidades de experiências de pater- nidades e possibilidades de ampliação de direi- tos e efetivação das políticas públicas instauradas pelo Marco Legal da Primeira Infância. A abordagem da perspectiva do direito à paternidade pelos pais encarcerados, os pais adolescentes, os pais de todas as raças, os pais LGBTTRANS, como vieses de possibilidades de exercício do cuidado, acabou revelando uma re- flexão de classe, oportunizando a pauta da crian- ça e da família que têm suas dinâmicas fortemen- te influenciadas pelos interditos socioculturais e, sobretudo, econômicos, demandando espaço para a urgência de discussão e implementação de políticas públicas que possam alterar essa rea- lidade repleta de iniquidades. Avanços também são percebidos: empresas como a Natura já assimilam a importância e o ga- nho real para a produtividade quando amplia a licença-paternidade e incentiva os funcionários a gozarem desse direito de consolidarem os víncu- los com seus filhos e companheiras/os. A construção da maternidade e da paterni- dade passa por um processo que vai desde a so- lidificação e implementação, garantia e controle de execução dos direitos já conquistados pelas políticas públicas à construção desse direito de conviver desde as primeiras horas com os filhos/ as, da educação, saúde, cultura, lazer, espaços e cidades adequados, inclusivos e humanos que se deseja para eles. Mesmo em um momento em que a luta pela manutenção de direitos já conquistados legalmen- te é urgente, não se pode perder de vista a ne- cessidade de continuar em busca das utopias que movem coletivamente para uma sociedade natu- ralmente envolta pela equidade dos gêneros, no exercício de suas sensibilidades e potencialidades, em que o olhar integral do ser seja a base para as relações em todos os âmbitos, da educação à saú- de, ao direito de amamentar, às garantias de se- gurança, respeito, alteridade e intercâmbio. Uma sociedade, não só pelo direito, mas de fato, justa. Introdução “Quando amamos, cuidamos e quando cuidamos, amamos. O cuidado constitui a categoria central do novo paradigma de civilização que trata de emergir em todo o mundo. O cuidado assume uma dupla fun- ção de prevenção de danos futuros e regeneração de danos passados...” Leonardo Boff.
  • 6.
  • 7. III Seminário Nacional Paternidade e Primeira Infância 7 Mesa de Abertura A mesa de abertura foi composta por: Simone Valadares, Representante do CECIP- Centro de Criação de Imagem Popular, atual Secretaria Executiva da Rede Nacional Primeira Infância; Mariana Azevedo, Coordenadora Ge- ral do Instituto Papai e Coordenadora do GT Homens pela Primeira Infância; Sandra Greco, Gestora Nacional da Aldeias Infantis SOS Bra- sil; Flávio Debique, Gerente de Estratégias de Programas da Plan International Brasil; Leandro Ziotto, membro fundador do Portal 4Daddy e Ana Claudia Vasconcellos, representante de parcerias e comunicação do Projeto Quixote. Após a composição da mesa, todos foram convidados a cantar o Hino Nacional Brasileiro, acompanhado pela voz de crianças1 . 1 Vídeo produzido por Iraildes Palmeira para o I Encontro Estadual de Educação Infantil da Bahia. https://www.youtu- be.com/watch?v=oDLXBpHF_wk  Simone Valadares fez um histórico do sur- gimento do GT Homens pela Primeira Infância na Rede Nacional Primeira Infância explicando que, com o avanço nos direitos da primeira in- fância, o tema da paternidade ganhou relevân- cia, em especial a participação dos homens nos cuidados das crianças. O CECIP desenvolveu uma Campanha sobre a participação dos ho- mens na educação e no cuidado das crianças, que teve como resultados a criação do Grupo de Trabalho Homens pela Primeira Infância, mo- mento em que foram convidadas organizações da RNPI, com reconhecida experiência no tema, para discutir a participação dos homens nos cuidados das crianças pequenas. Isso resultou no desafio de realizar o I Seminário Nacional Paternidade e Primeira Infância, que acon- teceu nos dias 26 e 27 de agosto de 2015 no Rio de Janeiro, e possibilitou, promoveu e divul- gou a elaboração de um relatório técnico que compilou o posicionamento de especialistas de diversas áreas sobre o exercício da paternida- de. A partir daí, os integrantes do GT passa- ram a desenvolver atividades, propor reflexões e atuar, na RNPI, no sentido de proposição de políticas públicas que favorecessem a participa- ção do homem na vida dos filhos e filhas. Em 2015, época em que tramitava na câmara dos deputados, o projeto de lei 6998/13, específico ao tratar de questões do desenvolvimento da criança na primeira infância, houve forte ação de incidência da RNPI que contou com a incansá- vel atuação de seus membros ao acompanhar e pressionar a aprovação do PL que, em março de 2016, foi sancionado pela presidenta Dilma Rousseff e deu origem à Lei 13.257/16, conhe- cida como Marco Legal da Primeira Infância. Principais Discussões / Reflexões do Seminário Primeiro dia: 01/09/2017
  • 8. Relatório Técnico 20178 O Marco Legal ampliou a licença paternidade de cinco para vinte dias, fortalecendo as discus- sões iniciadas pelo GT Homens pela Primeira Infância sobre a participação dos homens nos cuidados com as crianças. Já o II Seminário Nacional Paternidade e Primeira Infância, realizado em Recife, nos dias 30 e 31 de agosto de 2016, provocou a discussão sobre os desa- fios e possibilidades da ampliação da licença- -paternidade, passando da teoria à prática. Ao encerrar sua fala, Simone mencionou a criação do logo do III Seminário Nacional Paternida- des e Primeira Infância, também realizada por Claudius Ceccon, que traz a imagem do pai pre- sente, como no primeiro seminário, desta vez, acompanhado de outros pais, em uma propos- ta ampliada de vínculos afetivos. Ela encerrou reforçando a satisfação da Secretaria Executiva da RNPI em apoiar a realização desse terceiro Seminário, que é uma construção coletiva do Grupo de Trabalho Homens pela Primeira In- fância da RNPI, e a oportunidade de avançar nas discussões e ampliar o debate com o pú- blico sobre temas que garantam os direitos das crianças de 0 a 6 anos, em especial, o direito de toda criança ter o pai ao seu lado, estabelecen- do um vínculo de afeto e cuidado entre eles, desde o nascimento. Ao iniciar sua fala, Mariana Azevedo lem- brou que o Instituto Papai está completando vinte anos e que foi sede do II Seminário Pa- ternidade e Primeira Infância, em Recife, momento marcado pela aprovação do Marco Legal da Primeira Infância e pelo avanço de outras legislações. Ressaltou que se vivem mo- mentos difíceis no país e que a luta por direitos é necessária, sendo preciso pensar os desafios que se impõem. Fez um agradecimento espe- cial às organizações realizadoras do seminário: Aldeias Infantis SOS Brasil e 4Daddy. A Gestora Nacional da Aldeias Infantis SOS Brasil, Sandra Greco, iniciou sua reflexão agra- decendo a participação de todas as organiza- ções na realização do evento e lembrou que já há uma trajetória do tema Paternidade na Al- deias Infantis SOS uma vez que os meninos que ali estavam fazendo a cobertura jornalística irão se tornar homens e bons pais. Refletiu que será melhor ainda, no futuro, discutir a humanidade e não mais o gênero. Disse que o cuidado é a essência da Aldeias Infantis SOS e por isso é natural que a organização esteja em todas as instâncias de discussão e neste GT da RNPI. Ela disse que o tema da Paternidade também está focado na educação e que discutir plenamente a questão de gênero levará a que todos sejam boas pessoas e agentes de cuidado e prote- ção, sobretudo, neste momento em que se vive retrocessos e desalento no país. Lembrou per- tencer a uma geração que lutou por um outro contexto, que não o que se vive, mas que, jus- tamente, por isso, é importante ter esses espa- ços para discutir o Brasil e a Paternidade que se quer. Lembrou de um concurso realizado nesta semana, em João Pessoa, para os jovens dis- cutirem o tema “Ética, a estética da alma”. Ar- gumentou que a ética é comportamento para se viver em paz, em comunidade. O valor da recompensa por essa vivência é a compreensão profunda do que se pode e também do que não se pode comprar. É o que se espera do hoje, não do amanhã. Por isso, encerrou com uma frase de uma jovem adolescente, ganha- dora do concurso: “Ter ética é brincar de fazer
  • 9. III Seminário Nacional Paternidade e Primeira Infância 9 o bem”. Além dos desafios, disse, fica essa pa- lavra de esperança. O Gerente de Estratégias da Plan Interna- tional Brasil, Flávio Debique, disse que o GT Homens pela Primeira Infância era um exemplo de como se deve trabalhar em rede, um exem- plo de trabalho conjunto. Explicou que o tema Paternidade para a Plan International é muito importante em relação à equidade de meni- nas e que ainda não é discutido amplamente como deveria. Disse esperar que isso possa se transformar em um processo natural em que as crianças cresçam protegidas, daí a importância da participação do pai. O envolvimento e enga- jamento dos homens nos cuidados deve acon- tecer o mais cedo, pois faz parte da humani- dade; quanto mais cedo o homem se perceber nesse lugar, mais cedo se discutirá o prazer de ser cuidadores em comunidade. Leandro Ziotto iniciou sua fala agrade- cendo a todo o GT. Disse que faria uma fala de pai. Relatou que, há seis anos, realizou uma pesquisa, no Google, sobre como colocar uma criança para dormir e só encontrou res- postas de mulheres. Foi então que sentiu o desafio de produzir textos para homens a fim de que estes assumissem o compromisso jun- to às companheiras de cuidar dos filhos, en- frentando os preconceitos sociais que só exi- gem das mulheres, assumindo uma condição de protagonismo no cuidado. A representante de parcerias e comuni- cação do Projeto Quixote, Ana Claudia Vas- concellos, agradeceu pela oportunidade de o Projeto Quixote sediar o evento que, disse, tem muito a ver com a organização. Explicou que o núcleo de famílias com quem trabalham é composto por mães, mas ressaltou que há
  • 10. Relatório Técnico 201710 também muitos pais e que eles se envolvem. Disse que o tema a levou a pensar sobre a po- pulação que o Projeto atende, de risco, com pouco acesso à educação, mas que se deu conta de que muitas das questões afeitas à paternidade acontecem com seus amigos, fa- miliares... Em sua casa, compartilhou, ela não enfrenta essas questões, pois é natural que o marido e os filhos lavem a louça e que ela leve o carro ao mecânico. Comemorou que isso tudo pudesse ser discutido em alto nível. Ao se desfazer a mesa de abertura, foi apresentada uma atração cultural, o lançamen- to de um documentário, a fim de introduzir os temas das mesas de discussão Lançamento do documentário O Poder do Cuidar Rodrigo Zavala, Gerente de Comunicação da Aldeias Infantis SOS Brasil, fez a introdução para a apresentação do documentário realiza- do pela organização. O tema “Família impor- ta!”, explicou, remete ao compromisso da Al- deias Infantis com as crianças e o documentário é fruto de uma experiência, na cidade de Lo- rena, em que a organização apoiou o pai de seis filhos que haviam sido retirados dele, pela justiça, com alegação de que ele não sabia cui- dar. O documentário trata da consciência de ter condições de cuidar dos filhos, que é o poder do cuidar. Ele aborda o como o cuidado reflete no relacionamento e na garantia de direitos. Fábio Paes, Assessor de Advocacy da Aldeias Infantis SOS Brasil, complementou dizendo que o filme quer trazer esse debate do cuidado para a sociedade. Relatou que o protagonista, Sr. César, hoje, vive situação di- ferente. Perguntam-lhe: Por que você não tra- balha? Você só cuida dos filhos? E sua mulher? Agora, ele vive o preconceito que, via de re- gra, é a mulher quem sofre cotidianamente, no entanto, tem os filhos de volta e reaprendeu o processo do cuidado que deve ser desenvol- vido e assimilado como rotina. Essa pequena narrativa quer trazer reflexões e suscitar ques- tionamentos. Não se pretende roteiro de um exemplo ou de “modelo de pai”, mas como provocação que dependerá do olhar instigado de cada espectador. O Poder do Cuidar2 2 Disponível em: O Poder do Cuidar : https://youtu.be/ Iypyd29wwiY
  • 11. III Seminário Nacional Paternidade e Primeira Infância 11 Primeira mesa: Políticas Públicas de Apoio ao Cuidado Paterno A mesa “Políticas Públicas de Apoio ao Cuidado Paterno” teve a mediação do Dr. Marcus Renato de Carvalho (Aleitamento.com/ UFRJ) e contou com a participação de: Vital Di- donet (Assessor da Organização Mundial para a Educação Pré-Escolar-OMEP e Assessor Legis- lativo da Rede Nacional Primeira Infância); Cise- le Ortiz (Presidente da Associação Brasileira de Estudos sobre o Bebê e Coordenadora Adjunta do Intituto Avisa Lá); Marina de Moura Borges Leal (responsável pela implementação da licen- ça-paternidade estendida na empresa Natura Cosméticos S/A. Trabalha no departamento de Educação e Desenvolvimento, um núcleo da Vi- ce-Presidência de Pessoas e Cultura) e Viviane Manso Castello Branco (Coordenadora de Polí- ticas Públicas e Ações Intersetoriais da Superin- tendência de Promoção da Saúde, da Secreta- ria Municipal de Saúde do Rio de Janeiro). O Dr. Marcus Renato passou a palavra ao Professor Vital Didonet que falou sobre o “Marco Legal: próximos passos para a regulamentação e efetivação”. Ele iniciou dizendo que foi um pai que “curtiu os filhos, um pai que dividia as dores”. Essa experiência pessoal é muito importante, pois a forma como o bebê e a criança pequena são cuidados vai determinar como serão quando adultos. São os exemplos dos cuidadores que moldarão o modo de ser desses pequenos e o como eles se inserirão no mundo adulto posteriormente. Vi- tal falou sobre o papel, hegemonicamente, de- terminado do pai como aquele que brinca e dá bronca e o da mãe como aquela que lava lou- ça e cuida. Disse ser preciso questionar essas coisas, essas várias pontas de fios de mudança para uma nova tessitura de comportamentos e papéis. Explicou que o Marco Legal da Primeira Infância também teve a preocupação com esse tema. Observou que uma lei não cria fatos, mas as pessoas sim. A lei sinaliza, determina ações que as pessoas podem transformar em realidade. O Marco Legal abriu espaço para o cuidado integral da criança. Promover a cultura do cuidado integral não só pela proteção, mas promoção. O cuidado é a tônica do Marco Le- gal. O homem e a mulher têm o cuidado com- partilhado, então, o papel do homem é funda- mental para a concepção do cuidado, do olhar de pertença da criança. Explicou o princípio da licença-paternidade, de como a empresa pode promover esse direito que é financiado pelo próprio povo brasileiro. A ideia que, às vezes, se dissemina de que gozar a licença pode cau- sar a perda do emprego foi vencida pela ideia do bem que é ser pai e poder cuidar do filho. Ele lembrou que, à época da discussão do Mar- co Legal, a questão era o reconhecimento do direito de ampliação de cinco para vinte dias de licença-paternidade e que, atualmente, o contexto é outro, a discussão está centrada na licença-parentalidade, o que está sendo ama- durecido também no GT Homens pela Primeira Infância. Vital defendeu que a legislação preci- sa avançar no sentido de que a família entenda quais as opções que tem para escolher. Falou ainda dos avanços da implementação da licen- ça no funcionalismo e nas empresas. Observou que já se está comprovando a importância do envolvimento quando o homem faz as visitas pré-natais, o direito de acompanhar quando a
  • 12. Relatório Técnico 201712 criança está internada, participar do parto, etc., o que constrói vínculos e aprendizado. Deu exemplo de um estudo sobre a possibilidade de antecipação de cura da criança quando tem acompanhante na internação. Falou sobre os desafios do cuidar não são só circunscritos à fa- mília, mas na cidade, nos espaços todos. Não se pode ter uma cidade em que as crianças não possam ir ao parque. Elas precisam ter garan- tidas a segurança e a possibilidade de partici- pação. A cidade deve ser apropriada, cada vez mais pensada para a criança. Relatou que have- rá estudos e pesquisas sobre a primeira infância nos cursos superiores: biblioteconomia, arqui- tetura, urbanismo, etc., com o intuito de dar atenção às necessidades das crianças. Encerrou dizendo que tudo isso está no Marco Legal. É a atenção voltada à criança pelos profissionais todos, relacionando esses saberes, inclusive, a comunicação em um mundo que explode em significados. “Se levarmos em conta a forma como cuidamos das crianças, perceberemos que o cuidado influencia na mãe e no pai que eles serão. Então, somos os criadores do ama- nhã, anunciamos um novo mundo, um mundo de equidade e justiça”. A Professora Cisele Ortiz falou sobre “A importância da figura masculina no de- senvolvimento da criança”. Iniciou sua fala explicando que falaria sobre a importância do homem na família. Que lugar ele ocuparia? A partir da pergunta, ela construiu historicamen- te o lugar do homem no seio familiar. Explicou que o homem era visto como o dono de tudo e de todos. A ele, todos obedeciam. Era visto como alguém que não conseguia comunicar afeto, pois era disciplinador. Na sociedade pa- triarcal, a vida doméstica não importava: o po- der era exercido pela repressão e violência. Ci- sele mostrou a evolução da relação do homem com a família por meio de cartazes sobre a amamentação, explicando como essa visão en- gessada do homem tem se modificado. A partir desse ponto de partida, explicou que a criança precisa de todos os cuidados, inclusive, men- tais. “Antes de qualquer coisa, a criança precisa existir na mente e no coração de quem cuida”. Insistiu que os cuidados psiquiátricos são fun- damentais. A função materna dá sentidos e sig- nificados ao sentimento, ao que o bebê precisa de fato, ao que é importante para a sua sub- jetividade e intersubjetividade. Observou que “o pai e a mãe nascem junto com a criança” e que esse aprendizado é essencial. Falou sobre o processo de separação da mãe e da criança que é realizado pelo pai, símbolo da lei, das normatizações, daquilo que não pode. É dessa forma que a criança constrói a subjetividade. Isso tudo acontece inserido em uma cultura. Ser pai e ser mãe no Brasil é muito diferente dessa experiência em outros lugares. Falou das pes- quisas sobre os problemas quando a intersub- jetividade não foi bem estabelecida. Quanto maior a relação com a mãe, maior a segurança, pois o papel que a mãe desempenha primeira- mente com o bebê, de maneira insubstituível, como o papel da família como um todo, da es- cola e, por conseguinte, da interação da criança com a sociedade é de fundamental importância para seu crescimento saudável. Entre esses pa- péis, o de maior grandeza é o estabelecido por uma família estruturada e ajustada que evitará conflitos para a criança. Essa linha de raciocínio
  • 13. III Seminário Nacional Paternidade e Primeira Infância 13 é desenvolvida pelo teórico Bowlby3 . Ele diz que a “família fornece uma base segura para que a criança/adolescente possam explorar o mundo e se constituírem”. Quanto mais sau- dáveis as relações e as emoções entre os adul- tos, mais estruturada a subjetividade da criança levando-a a se tornar um adulto equilibrado afetivamente, capaz de solucionar problemas quando os vínculos sejam afetados. Os víncu- los afetivos e os estados emocionais caminham juntos, por isso, o principal é aprender a viver com a diversidade: é bom que o pai e a mãe se- jam diferentes. Isso propicia à criança aprender e criar um mundo melhor para viver. Marina de Moura Borges Leal falou sobre a “implementação da licença-paternidade estendida na empresa Natura Cosméticos S/A. Responsável pela área da diversidade, na empresa, relatou que, atualmente, a Natura concede quarenta dias de licença-paternidade como Empresa Cidadã. Lembrou que a Natu- ra é uma empresa e, portanto, também precisa entender o consumo para continuar se estabe- lecendo e crescendo. “A empresa expressa um comportamento empresarial alinhado à promo- ção do desenvolvimento sustentável na cria- ção de produtos que promovam o bemestar- bem”. A concessão da licença-paternidade aos funcionários aconteceu dentro de uma estraté- gia da empresa de alcançar uma visão positiva até 2050. Explicou ainda que a Natura desen- volve discussões, reflexões com os funcionários 3 BOWLBY, John. Formação e Rompimento dos Laços Afe- tivos. Trad. Álvaro Cabral. São Paulo: Editora Martins Fon- tes São Paulo, 2001. e incorporaram os ODS 54 . Fazem pesquisas sobre o significado da masculinidade porque os homens não são iguais. Há questões que precisam ser levantadas: como, em que e de qual lugar o homem se vê, hoje? O que é mas- culinidade para ele? De onde parte a sua fala? Os resultados mostram que a questão cultural determina o comportamento do homem, como aquele que não pode demonstrar fraqueza, daí uma série de circunstâncias que prejudicam o próprio homem como não ter o costume de cuidar da própria saúde, não conseguir expres- sar os sentimentos e apresentar dificuldades para se comunicar e desenvolver relações pro- fundas e verdadeiras. Não é à toa que a OMS aponta como principal causa de suicídio entre os homens a depressão5 . Ela argumentou que a paternidade, hoje, pode alterar tudo, inclusive, a afetividade e a presença na vida da criança. A Natura tem levantado dados sobre os papéis dos pais na vida dos filhos e perceberam a re- levância da participação masculina. A licença- -paternidade passou a ser vista pela empresa como benefício e direito a ser estendido: con- cedem de 40 dias a 6 meses para cada licen- ça, incluindo, adoções por pais LGBT. Pela lei Empresa Cidadã, a Natura teria de conceder vinte dias de licença-paternidade, no entanto, 4 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, da ONU. O ODS propõe alcançar a igualdade de gênero e empoderar todas as mulheres e meninas a partir de 6 metas e 3 sub- metas. 5 In: http://www.natura.com.br/homem: O número de ho- mens que se matam no Brasil é quase quatro vezes maior que o de mulheres. No Reino Unido, o suicídio é a principal causa de morte de homens com idades entre 20 e 49 anos.
  • 14. Relatório Técnico 201714 crendo nos benefícios, concede quarenta dias acreditando no papel do pai em todas as va- riáveis desse processo/convívio. Oferecem seis meses para as mulheres, quando a lei determi- na apenas quatro. Marina relatou que a adesão dos funcionários é de 80%. Eles procuram ouvir aqueles que não aderem ao benefício. Algumas das justificativas são de que não saberiam o que fazer com esses dias em casa. A Natura tenta explicar a esses funcionários a importância des- se período para o desenvolvimento de vínculos e dos bebês. Outro dado curioso: as mulheres funcionárias dizem preferir ficar sozinhas com os bebês. Alguns funcionários têm medo de se- rem substituídos durante a licença de quarenta dias, achando que a empresa poderá consi- derar que não são insubstituíveis. Nesse caso, costumam argumentar com eles que as mulhe- res ficarão seis meses fora. Elas seriam menos profissionais do que eles? Seriam menos neces- sárias? Marina observou que é preciso envolver o mundo empresarial porque o resultado será a facilitação para o desenvolvimento de polí- tica públicas. Pontuou que a adesão vem cres- cendo entre os funcionários porque essa é uma política pública que a empresa supervaloriza e incorpora. A Natura também oferece berçário e creche para os filhos dos funcionários, o que permite a amamentação durante a jornada de trabalho. Desde 2016, houve adesão de 80% dos pais funcionários. Isso graças a um trabalho de conscientização sobre o papel do homem na sociedade atual, na importância da sua par- ticipação. Têm trabalhado com os funcionários que a figura do homem não pode ser apenas a presença austera, mas aquela que tornará a criança melhor integrada socialmente. Encer- rou dizendo que a licença-paternidade é um fa- tor de mudança social porque a criança, quan- do adulta, terá outra atuação em sociedade. Então, para a Natura trata-se de um estudo de mudança social. Finalizando as apresentações da mesa, Viviane Manso Castello Branco falou sobre “A valorização da paternidade nos serviços de saúde”. Observou como, normalmente, nos serviços de saúde, a capacidade de cuidado do homem não costuma ser reconhecida. Ex- plicou que passaram a desenvolver, na Secre- taria Municipal de Saúde do Rio de Janeiro, a iniciativa “Unidade de Saúde Parceira do Pai”. Ela fez um apanhado histórico de como esse processo começou a ser construído, a partir de 2002, com a criação do “Comitê Vida” para a implementação de políticas públicas voltadas para as masculinidades, envolvendo outras secretarias, ONGs e universidades. Falou dos princípios desse trabalho como o “reforço às potencialidades do homem: pai acrescenta”, explicando que procuram trabalhar a equida- de de gênero e outas questões importantes como o “direito à ternura”. “Estamos no XVI Mês de Valorização da Paternidade, estra- tégia implantada no Rio de Janeiro que já se tornou uma política pública nacional”. Nesse período, são realizados seminários, pesquisas, rodas de conversas, oficinas, programas de rá- dio e TV, etc. Realizam várias atividades que objetivam qualificar o cuidado paterno, além de oportunidades de formação para os profis- sionais e revisão das rotinas institucionais. O envolvimento paterno nas ações de cuidado é um dos recursos mais importantes e subapro- veitado na promoção da saúde da criança. Os
  • 15. III Seminário Nacional Paternidade e Primeira Infância 15 serviços de saúde, muitas vezes, chamados de materno-infantis, contribuem para afastar os homens, uma vez que reforçam uma concepção de cuidado afeita à responsabilidade exclusiva das mulheres. Relatou que, em 2005, pesquisa realizada durante a campanha de vacinação no Mês de Valorização da Paternidade, com cerca de 6.000 bebês, constatou que 84% deles ti- nham convivência diária com os pais. Apenas 4% dos bebês não tinha qualquer contato com os pais. Isso constata a presença masculina no início da vida e traz, para o serviço de saúde, a responsabilidade de acolher, orientar e apoiar o homem. A relação do pai com o bebê durante a gravidez é mais abstrata e a passagem pelo serviço de saúde, quando o genitor pode ouvir os batimentos cardíacos ou participar do par- to, por exemplo, pode ajudar a dar concretude, fortalecendo o vínculo com o bebê. A maneira como são tratados nos serviços de saúde afe- ta a maneira como os homens percebem sua capacidade de exercer o cuidado. Se a unida- de de saúde não for sensível, pode contribuir para que se sintam incompetentes frente a uma responsabilidade tão complexa quanto cuidar de uma criança. Ela falou ainda sobre as reco- mendações para a implantação de Unidades de Saúde parceiras do Pai: 1- preparo da equipe de saúde; 2- inclusão dos pais nas consultas e exa- mes; 3- inclusão dos pais no pré-parto, parto e pós-parto; 4- inclusão dos pais nas enfermarias; 5- atividades educativas com homens; 6- aco- lhimento e cuidados com homens; 7- preparo do ambiente, colocando três cadeiras, etc.; 8- viabilidade para o tema do cuidado pater- no; 9- horários acessíveis ao homem; 10- rede de apoio social. Viviane relatou que foi muito importante a incorporação, pelo Ministério da Saúde, do tema da paternidade como um eixo estratégico da Coordenação de Saúde do Ho- mem. Comentou sobre a estratégia “Pré-natal do Parceiro” que está sendo trabalhada com profissionais de todo o país. Ela citou diversos recursos que podem ajudar na reflexão sobre esse tema, como o programa de TV “Aquela Conversa”, do MultiRio e o vídeo “ O Pai está”, do projeto Rede de Adolescentes Promotores da Saúde, o RAP da Saúde. Ao encerrar, ob- servou que os homens, para cuidar, também precisam ser cuidados pelos serviços de saúde. Para exemplificar uma frente importante desse trabalho, o protagonismo paterno nos serviços de saúde, Viviane chamou um dos criadores do Grupo de Pais da Casa de Parto David Capis- trano, Téo Cordeiro. Ele relatou que havia uma grande inibição dos pais para falar nos grupos educativos. Esse grupo, gerenciado pelos pró- prios homens, nasceu para estimular a partici- pação e a troca de experiências entre os pais.
  • 16. Relatório Técnico 201716 Participação da Plenária Encerradas as apresentações, foi aberta a possibilidade para que os participantes fizessem perguntas. Algumas delas: quais os desafios atuais para as políticas públicas relacionadas ao tema pa- ternidade? A Natura pensou na licença parental? Pensaram na equiparação do tempo da licença? A participante, psicóloga Eliane Lemos, do Instituto Entre Rodas, afirmou que o Marco Legal não acolheu as crianças com deficiência. E que di- zer sobre as crianças com paralisia cerebral? Qual a probabilidade de que sejam incluídas, de criar políticas públicas que atendam às crianças com deficiência? E quanto às mães que se encontram no cárcere, no sistema prisional? E quanto ao pai que se encontra fora com os filhos enquanto a companheira está presa? Há uma preocupação de prepará-lo para o cuidado? Marina começou a bateria de respostas, ex- plicando que a Natura escolheu conceder quaren- ta dias de licença-paternidade por causa do puer- pério6 , visando a recuperação da mulher. Disse que, em relação aos custos, são relativos. Embora sejam altos, trazem o benefício do engajamento na volta do trabalhador. É o que denominam de “fator de felicidade”. Os custos são amortizados sob essa perspectiva. Isso é tão positivo que a empresa começou concedendo quarenta dias, mas como um primeiro passo porque há a possi- bilidade de ampliação. Relatou que já acontecem ações e que existe um GT com mais de quarenta empresas para discutirem diversos temas, como 6 Período que decorre desde o parto até que os órgãos genitais e o estado geral da mulher voltem às condições anteriores à gestação, de 6 a 8 semanas. a mulher no mercado de trabalho e que, mesmo aí, o homem sempre aparece como tema. Entre- tanto, não há um grupo específico sobre o estudo do homem. A respeito da pessoa com deficiência, disse que é preciso tratar com acolhimento o pai com deficiência. O Professor Vital respondeu dizendo que existem ações junto aos poderes públicos para fa- zerem valer as políticas públicas, as leis. Falou das resistências das próprias mães sobre a participa- ção dos homens, argumentando que se trata de uma cultura de reserva de espaços que se foram construindo. Também falou sobre as políticas pú- blicas para as pessoas com deficiência e os direi- tos da pessoa encarcerada. Viviane disse que se está diante de uma mudança cultural que envolve a participação dos dois, homens e mulheres, e os locais de atuação que precisam ser deslocados. Segundo explicou, a grande questão é a formação dos profissionais: “É preciso respeitar o primeiro desejo do bebê: o seu dia de vir à vida”. Isso serve para o restante das reflexões também, disse. Quando o homem participa das consultas, de todo o processo, ele está mais preparado para a circunstância. Eles pre- cisam do cuidado, não da crítica. Os homens sen- tem-se incompetentes para o cuidado. No caso do Zica vírus, isso ficou latente. A última a responder as questões foi a Pro- fessora Cisele que falou sobre a necessidade de espaços de formação a partir das coisas práticas que acontecem no cotidiano das pessoas. Argu- mentou que a escuta da criança deve ser muito atenta e acontecer antes, não no momento em que ela expressa a fala. É preciso olhos e ouvidos para essa escuta, a partir do estabelecimento de vínculos, de afetos. A escuta cuidadosa, atenta,
  • 17. parte desse pressuposto de antecipação à fala da criança. Ela encerrou dizendo que, por isso, a “for- mação em serviço” é a chave e o desafio, aban- donando-se conteudismo e abrindo-se aos temas existentes na prática da realidade vivida. Participação Infantil Enquanto o seminário se desenvolvia, os pais que trouxeram crianças puderam partici- par das discussões enquanto seus filhos partici- pavam de oficinas e brincadeiras assistidos por Educadores da Aldeias Infantis SOS Brasil. Essa foi uma preocupação da organização, pelo GT, pensando em um espaço para acolher e desen- volver atividades lúdicas com as crianças, pro- porcionando momento agradáveis que levaram à reflexão do cuidado uns para com os outros. Essa iniciativa vem de encontro aos ideais de inclusão e de preparação de espaços em que as crianças sejam protagonistas e tenham o direito a suas escolhas respeitado. O evento contou ainda com uma estraté- gia de Educomunicação em que meninos e me- ninas dos serviços de acolhimento da Aldeias Infantis SOS Brasil, das cidades de São Paulo, Poá e São Bernardo do Campo, produziram, por meio de fotojornalismo e vídeos, a memó- ria dos acontecimentos e atividades o que terá como resultado um relato por meio de fotos e de um vídeodocumentário. Simultaneamente, houve a transmissão do evento pelo Twitter: @aldeiasinfantis.com.
  • 18. Relatório Técnico 201718 A parte da tarde foi iniciada com a atividade da Mesa 2: Paternidades Diversas que teve a mediação de Milena do Carmo (Instituto Promundo Brasil) e contou com a participação de: Marco Antônio da Silva Souza, Markinhus (Cientista Social e Educador Social, membro do Movimento Nacional de Meninos e Meninas de Rua-MNMMR e Conselheiro do Conselho de Direitos Humanos do Estado de São Paulo) e Fábio Paranhos (ativista da defesa das causas de cidadania LGBT; fundador do Grupo de Pais de Homossexuais- GP; fundador do Projeto Acolher: Grupo de Apoio à Adoção e Convivência; participa do HOMOPATER7 (plataforma virtual de apoio a homens e pais com relacionamentos homoafetivos) e mantém o blog Homem, Homossexual e Pai8 ). 7 http://homopater.com.br 8 http://paigay.blogspot.com.br Milena abriu o espaço de reflexão cha- mando a atenção para a importância da di- versidade e do lugar de todos, não apenas do masculino e do feminino. O Conselheiro de Direitos Humanos do Estado de São Paulo, Markinhus foi o pri- meiro a fazer uso da palavra. Alertou que após 27 anos do ECA há ainda muita criança na invisibilidade diante da sociedade e do Estado brasileiros. Falou sobre a Conferência Nacional dos Direitos da Criança e do Ado- lescente e da importância desses espaços para a participação da criança. Observou a forma como a sociedade enxerga a infância e os excluídos dela: como lidar com o menino travesti? Como dar voz a ele? E as crianças ci- ganas? E aquelas que têm os pais encarcera- dos? As crianças têm o direito de usufruir da paternidade mesmo que os pais tenham co- metido um delito. Advertiu que, sem discutir o peso que a escravidão tem na história do Brasil, não se conseguirá discutir o tema dos invisíveis da sociedade. Observou que o en- carceramento causa grande impacto. O Brasil é o quarto país que mais encarcera. No en- tanto, é o país da impunidade. O Movimento Nacional de Meninos e Meninas de Rua pro- moveu um estudo, em 2012, sobre o número e sexo dos encarcerados adolescentes, pois não há dados sobre essa população. Levan- taram que havia 479.499 adolescentes mas- culinos e 32.786 adolescentes femininos. Em outra pesquisa, apuraram que há de 587.857 a 731.707 crianças e adolescentes que têm algum parente encarcerado. Não obstante, é estimado que pelo menos dois milhões de crianças tenham algum parente adulto en-
  • 19. III Seminário Nacional Paternidade e Primeira Infância 19 carcerado, mas o fato de maior relevância é que não há dados sobre essas crianças. Falou sobre o estigma que sofrem os filhos de pais encarcerados e a desestruturação que isso provoca na dinâmica familiar. Isso alerta para a necessidade de qualificar e formar esses meninos e meninas, uma vez que o impacto econômico que o encarceramento provoca é assustador. A família acaba vendendo os poucos bens para pagar advogados e tam- bém para garantir a segurança do encarce- rado dentro da cadeia. Chamou a atenção para a sobrecarga da mulher que tem o cam- panheiro prisioneiro em relação ao cuidado e manutenção da família. Relatou uma pes- quisa feita nos Estados Unidos que identifi- cou uma síndrome nas crianças que têm pais encarcerados e que revela os efeitos do en- carceramento em massa: trauma, vergonha e estigma. Atualizou que houve 500% no au- mento do encarceramento de mulheres nos últimos anos, muitas delas grávidas ou com crianças. A elas não se dá o direito de cuidar dos filhos, quase que sequer o de amamen- tar. Citou o caso da esposa do ex-governa- dor do Rio de Janeiro, presos pela Operação Lava Jato, que foi solta sob a alegação e o direito de cuidar de um filho dependente. Isso revela que se vive no Brasil uma socie- dade de classe, não de direitos, uma vez que aos pobres não é estendido esse benefício. A sociedade brasileira não vive o estado democrático de direitos, mas a truculência do Estado na vida dessas crianças. Revelou que um estudo sobre o encarceramento no Brasil, em andamento, será apresentado em novembro no evento “I Seminário Nacional sobre Crianças e Adolescentes com Familia- res Encarcerados: Invisíveis até quando?” e encerrou dizendo que o Sistema de Garantia de Direitos, o Sistema de Justiça e o Sistema Penal não dialogam. Assim, o interesse supe- rior da criança, garantido por lei, não é leva- do em conta, sobretudo, em situações como a exemplificada. Terminou com a pergunta: como podem essas crianças e adolescentes terem seus direitos considerados sendo fi- lhos de encarcerados? Casa de Oportunidades A mediadora, antes de passar a palavra ao segundo debatedor, chamou o jovem Fre- derico, que vive na Aldeias Infantis de Poá e participa de um projeto chamado Casa de Oportunidades, criado para oportunizar a participação dos adolescentes e jovens com vistas à emancipação futura. Ele e outros jo- vens da Aldeia de Poá elaboraram camise- tas e canecas com o logo do Seminário. Fred subiu ao palco para falar dessa experiência e divulgar os produtos para os participantes. Para a Aldeias Infantis SOS Brasil é um dos projetos que visa dar voz e oportunidade a esses adolescentes e jovens preparando-os para a vida adulta autônoma.
  • 20. Relatório Técnico 201720 têm sonhos e decepções. Disse ser impressio- nante o número de crianças devolvidas após a adoção. Por isso, essas conversas são im- portantes. Há um grupo que reflete sobre as crianças poderem conviver na família para fu- tura adoção. Ele ainda comentou as perspec- tivas de adoção pelas pessoas solteiras. Disse que os homens solteiros compreendem ape- nas 1% dos pleiteantes, sendo a minoria da minoria. Esses homens alegam que se acham incapazes de cuidar, que não serão capazes de suprir as necessidades de uma criança. A partir desse apanhado, Fábio falou sobre sua experi- ência de pai adotivo. Derrubou mitos dizendo que quem quer adotar faz isso porque quer. Somente e simplesmene por isso! “Quem adota é um egoísta, basicamente!” (Sic) Ob- servou que nada pode ser idealizado e que a prova disso é que o amor é construção. Disse que quase desistiu de adotar, pois no início também pensava, como o senso comum, que uma criança precisa de um pai e de uma mãe. Entretanto, quando conheceu sua filha, que hoje tem 21 anos e foi adotada por ele aos 3, ficou com medo, em dúvida. Esse turvamen- to das emoções e da razão caíram por terra no momento em que soube que três casais já haviam desistido da menina. Nesse instante, soube o que poderia ser para ela e lhe disse: “De hoje em diante, eu sou seu pai!”. Fábio refletiu ainda sobre diversos temas que envol- vem os grupos de discussão sobre a adoção e encerrou dizendo que há muitas questões sobre a adoção que precisam ser analisadas profundamente, sobretudo, a fim de minorar e esclarecer os preconceitos que a sociedade tem, apresenta e, muitas vezes, fomenta. Em seguida, Milena passou a palavra ao Fábio Paranhos9 que iniciou falando sobre o Projeto Acolher, um grupo de apoio à adoção, fundado por ele em 1999. Disse que, hoje, existem quatro grupos em São Paulo. Fábio partiu de sua vivência pessoal: relatou que não podia participar de alguns grupos de dis- cussão simplesmente porque não era mãe. No grupo, propiciam conversas com pessoas que têm filhos adotados. Relatou que, assim como os pais biológicos, os pais adotivos também 9 Autor do livro Coragem de ser que narra 15 depoimentos de homens que assumiram a homossexualidade depois de ter formado uma família, revelando sentimentos paradoxais como vergonha, dor e culpa ao abrir espaço para a espe- rança, a capacidade de superação e o amor incondicional pelos filhos.
  • 21. III Seminário Nacional Paternidade e Primeira Infância 21 Participação da Plenária Os participantes passaram à interação com os palestrantes. Josimar Silveira10 , que se autodenominou Pai Integral, relatou que, após o desemprego, passou a cuidar dos fi- lhos enquanto a esposa trabalhava. Isso aca- bou sendo assumido em comum acordo pelo casal como nova configuração de atuação de ambos na família. Ele disse que falaria enquan- to pai negro, a partir do recorte racial. Falou dos estereótipos criados em relação ao ho- mem negro, como a sexualidade, virilidade, etc, o que levanta questões e dúvidas: como ele pode cuidar? Como vai cuidar de uma me- nina? Em contraponto, lembrou que a maior parte das crianças que se encontram em abri- gos são negras e que de lá não sairão para adoção por esse motivo. Daí sua fala a partir do recorte racial que influencia nas questões de abandono. Ele sugeriu que o próximo se- minário traga esses temas como reflexão. Fernando Valentim, Sociólogo, fundador e coordenador da plataforma virtual Observa- tório da Guarda Compartilhada11 , deu seu tes- temunho em relação ao Poder Judiciário que, segundo opinou, está pessimamente prepara- do para lidar com o melhor interesse da crian- ça. Os problemas que acabam na vara penal começam na vara de família. Um poder que deveria mediar conflitos torna-os excludentes, excluindo crianças e seus pais. 10 Autor do Canal do Youtube “Família Quilombo”: https:// www.youtube.com/channel/UCJ0h2QguAJ-alGccw0PdfOw 11 https://papodepai.com/guarda-compartilhada-o-que-e-isso Outro participante, Jorge Donizetti Ro- drigues Jr., Representante Sindical dos Téc- nicos Administrativos da UFABC, falou sobre o determinismo que acaba acompanhando a vida de gerações de encarcerados. Citou o do- cumentário lançado pela Aldeias Infantis SOS Brasil para mostrar que uma organização dando suporte à família em vulnerabilidade pode fazer a diferença e evitar mais abandono. Observou que o Estado não cumpre o seu papel, pois se a Aldeias Infantis não tivesse apoiado aquele homem, as crianças estariam no abrigo, longe do amor e do vínculo paternos. Mariana, do Instituto Papai, observou que o tema da paternidade é visto de forma elitiza- da e é preciso fazer um recorte de classe, ten- tando valorizar as experiências de todos, sain- do da classe média, ouvindo as periferias. Outro comentário partiu do Fábio Paes, da Aldeias Infantis SOS Brasil, sobre as pater- nidades invisíveis, garantindo que as falas de todos os presentes seriam contempladas no relatório técnico resultante do seminário e que as paternidades não representadas, nas mesas de debate, estavam sendo na plenária pela par- ticipação de cada um que pôde fazer uso da palavra tendo sua voz reconhecida. Levantando importante questionamento, Milena observou que, a partir do lugar de fala de cada um, deve-se perguntar: onde se está também inviabilizando esses pais e filhos? Markinhus relatou que muitos pais encar- cerados negam ter filhos por medo de o Estado tirar-lhes a guarda. Outros dois temas a se recu- perar, insistiu, é o de meninos em medida de in- ternação (SINASE) e em acolhimento. Disse que o Estado Penal é superior ao Estado de Direito
  • 22. Relatório Técnico 201722 e falou sobre o levantamento que está sendo realizado sobre os encarcerados. Em relação à incidência, observou que a especialização le- vou à fragmentação o que fragilizou a área da infância. Reafirmou que outros atores precisam dialogar, não apenas a Rede Nacional Primeira Infância, pois é necessário sair da fragmentação para enfrentar temas como a mudança da CLT, redução da maioridade penal... Refletiu que não há dúvidas de que as mudanças na CLT interferirão na infância, inclusive. É o resultado da fragmentação da política social, que sempre traz perdas. Por isso, é urgente pensar a crian- ça/adolescente de forma integrada. Há outras forças na comunidade para manter e cuidar da criança. Sugeriu que é preciso refletir sobre a solidariedade comunitária, as formas e potên- cias comunitárias para o cuidado. Encerrou afirmando que o que se deseja é um Estado/ Nação em que caibam todos.
  • 23. III Seminário Nacional Paternidade e Primeira Infância 23 Terceira mesa: Paternidades e Dinâmicas Familiares Com a mediação de Flávio Debique (Plan International Brasil), a terceira mesa abordou o tema “Paternidades e Dinâmicas Familiares”. Participaram: Dr. Antônio Carlos Malheiros (Desembargador do TJSP, membro voluntá- rio de trabalho voltado aos direitos humanos, integrante da Associação Viva e Deixe Viver); Damaris Gomes Maranhão (Enfermeira, Profes- sora do Curso de Pós Graduação em Educação Infantil do Instituto Superior de Educação Vera Cruz-ISEVEC, Supervisora da Área de Saúde das Creches do CEDUC e Consultora do Ins- tituto Avisa Lá); Jane Valente (Dra. em Serviço Social, Consultora da Rede Latinoamericana de Atendimento Familiar-RELAF e autora do livro Família Acolhedora: as relações de cuida- do e de proteção no serviço de acolhimen- to) e Janie Paula (Educadora Perinatal e Paren- tal, Doula, Comunicadora e Ativista Social). Ao iniciar a participação da mesa, o media- dor, Flávio Debique, observou que falar sobre famílias é tema complexo e relevante para as no- vas constituições familiares. Relatou que, há dois meses, em um evento em Bruxelas, solicitou que não se acatasse o pedido do Vaticano para que fosse aceito o conceito de família entendi- do apenas como o constituído por um homem e uma mulher, mas o de grupo de indivíduos que se unem pelo amor, suporte e cuidado mútuo. Com essa ideia de abertura à inclusão e à diversidade, ele passou a palavra ao Dr. An- tônio Carlos Malheiros12 que abriu sua fala comentando o que costuma dizer aos colegas estudantes da Escola da Magistratura, onde le- ciona: “Vocês têm de caminhar entre as pessoas, sentir o gosto das lágrimas delas. Fechar-se no gabinete não levará à compreensão de nada. O estudo do livro da vida está na poeira, nas ruas, no esgoto dos cortiços, no pátio da Fundação Casa, nas celas dos presídios, nos hospitais... aí é que vocês precisam estudar, não nas biblio- tecas”. Ele relatou que, nos anos 70, passou noites nas ruas para conhecer as crianças em si- tuação de rua. Citou o caso de um menino que conheceu aos 11 anos e que havia matado pela primeira vez aos 9. Ele perguntou ao menino porque ele havia matado e se havia gostado. O menino respondeu que não se arrependia, mas que não havia gostado de matar. Contou que fora criado com a mãe, dependente química, que recebia muitos homens em casa. Ele era maltratado e posto na rua onde sofria abuso se- xual por parte de vários meninos. Até que, em certo momento, arrumou um pedaço de vidro para se defender e cortou o pescoço de um dos que costumeiramente abusavam dele. Por esse motivo, perseguido pelo bairro, precisou fugir de casa e passou a viver em situação de rua. O Dr. Malheiros perguntou quem era e onde es- tava a família dele e o menino teria respondido que os meninos moradores das ruas eram sua família. Naquele momento, segundo narrou, ele teve pela primeira vez a percepção de que havia nuances de famílias que não a compreen- dida pelo núcleo homem e mulher. Anos mais 12 acmalheiros@tjsp.jus.br
  • 24. Relatório Técnico 201724 tarde, esse menino foi assassinado com um tiro na testa. Citou essa história como argumento de que a criança e o adolescente não são priori- dade, embora isso esteja preconizado nas con- venções e nos estatutos, porque a sociedade não tem vontade de fazer o melhor para eles. A própria justiça, afirmou, não enfrenta o proble- ma. Há falta de estrutura das varas, entretanto, não se pode tirar precipitadamente o poder parental. O poder público não aparece na vida dos pobres oferecendo lazer, cultura, saúde, educação... Os jovens negros continuam sen- do mortos pela polícia nas periferias... Mas, quando vem para castigar, o poder público é efetivo, destruindo a pouca dignidade que as pessoas têm, arrematou. Relatando outro fato, lembrou que chegou a trabalhar como volun- tário, no início da infecção pelo vírus HIV, no Hospital Emílio Ribas, conhecido como “Hos- pital da Aids” no início da epidemia. Contou a história de um rapaz, cantor, que contraiu o vírus e estava morrendo. O rapaz, quase sem respiração, pedia a ele que o ajudasse a can- tar. Atordoado, ele viu uma mulher na porta do quarto. Foi até ela e descobriu que era a mãe do moribundo. Ela se negava a chegar perto do filho a quem não perdoava pelo fato de ser homossexual. Sem conseguir convencê-la, Dr. Malheiros viu um homem, engravatado, alto, forte, entrar no quarto, sentar-se ao lado do ra- paz, tomar a mão dele entre as suas e beijá-lo carinhosamente na testa. Nesse momento, Dr. Malheiros teria se perguntado: “Qual desses dois é, de fato, a família desse rapaz?” Naque- le momento, teria voltado a indagação sobre o conceito de família que, hoje, mais do que nunca ele considera como aquela formada pela doação e pelo afeto. Esses episódios acabaram por levá-lo a desenvolver sua dissertação de mestrado. Contou que entender o sofrimento ajuda a decidir, acaba virando parte da for- mação pessoal e profissional. Partilhou que é preciso olhar de igual para igual, o que requer simplicidade, seja decidindo um julgamento ou contando histórias. Por isso, encerrando, de forma contundente, afirmou: “Guarda Compar- tilhada é bobagem!” (sic) Tudo já estava lá, na Lei. Mas tudo está no coração e na razão. As crianças são as que mais sofrem. Portanto, essa guarda é remédio quando concretizada pelos adultos responsáveis pela criança e não é a Lei que vai fazer isso. É essa a nova configuração de família: pela doação e pelo afeto. A segunda a fazer uso da palavra foi Da- maris que abordou um capítulo de sua tese de doutoramento: Capítulo IX: “A Creche é o Pai”: Instituição pública ou projeção de uma família idealizada? A difícil comple- mentaridade entre creche e família13 . O tema aborda o estudo na área do que é cuidar. Ela se interessava por entender os conflitos existentes entre a família e a creche. Explicou que as relações se complicam porque todos acham que sabem cuidar melhor, o que denota 13 in: Infância em Perspectiva: Políticas, Pesquisas e Institui- ções. Org.: Fernanda Müller, 1ª ed. São Paulo, Cortez, 2014. https://books.google.com.br/books?id=A6r- FAwAAQBAJ&pg=PT210&lpg=PT210&dq=Da- maris+Gomes+Maranh%C3%A3o+o+pai+%- C3%A9+a+creche&source=bl&ots=FBx_5pl0Ck&- sig=QKE_WiilWKkBDZ-159lJg2QZYqo&hl=pt BR&sa=X&ved=0ahUKEwib-6TkgZ7WAhULgpAKHXCMC- c0Q6AEIRTAF#v=onepage&q=Damaris%20Gomes%20 Maranh%C3%A3o%20o%20pai%20%C3%A9%20a%20 creche&f=false
  • 25. III Seminário Nacional Paternidade e Primeira Infância 25 a percepção de limites imprecisos entre a famí- lia e a creche. Relatou alguns casos e a neces- sidade de ser realizado um trabalho em rede, trazendo as políticas públicas da educação, saúde, esportes, lazer, cultura, habitação, etc., para comporem, uma vez que isolados esses serviços dificilmente conseguem administrar os conflitos e lidar com as necessidades das famí- lias. Insistiu que a articulação é que possibilita- rá oferecer um suporte às insuficiências familia- res. Observou ainda que a creche é a primeira institutição de educação, o primeiro contato da criança e da família e que essa relação pre- cisa ser construída, pois sozinha a creche não é capaz de resolver os problemas. Por isso, ela deve ser parceira dos pais e mães no cuidado. Explicou que a creche proporciona estreita re- lação de afeto e é decisiva para a estruturação da subjetividade da criança, apresentando as relações de afeto e cidadania, oferecendo exer- cícios de participação cidadã. Observou que não se trata de uma questão exterior ao sujei- to, mas o oferecimento de condições para uma sociedade levar adiante um projeto democrá- tico de relações sociais que estão estritamen- te vinculados às possibilidades subjetivas dos cidadãos. Arrematou afirmando que, portanto, a cidadania é uma questão que diz respeito à construção de afetos, o que a creche oferece. Chamada a fazer uso da palavra, Jane Va- lente relatou que trabalha com famílias aco- lhedoras há vinte anos. Explicou que o acolhi- mento familiar é tipificado desde 2009 e que está previsto no ECA. Como serviço, oferece o cuidado temporário a crianças afastadas das famílias pelo serviço de proteção, sendo a elas propiciado um cuidado por outras famílias. Nos Estados Unidos, 95% do cuidado já é rea- lizado por famílias acolhedoras. Apenas 5% se processa em instituições. Nessa tipificação, as famílias são formadas para acolher. O cuidado é compartilhado em trabalho com a rede de proteção e a família (avós, tios, irmãos...). As famílias, depois da formação, sentem-se poli- ticamente atuantes de um estado democrático de direitos, pois sentem que têm obrigação de cuidar, de forma natural, envolvida e afetiva. A grande diferença está no trabalhar com as famílias e crianças e não para elas. O serviço é excepcional e provisório: o objetivo é que a criança vivencie os vínculos, estabeleça afetos para voltar às famílias de origem ou à adoção. Relatou o caso de um menino, acolhido por uma família acolhedora, cujos pais tinham de- ficiência mental. Com o passar do tempo e da relação que se foi estabelecendo, o garoto co- meçou a compreender a situação e quando ia visitar os pais, tocava violão para o pai. Então, foi percebendo que os pais não cuidavam dele porque não podiam, não porque não queriam. Esse processo ajudou muito no desenvolvimen- to e autoaceitação da criança. Em contraparti- da, relatou que pesquisadores da Universidade de Harvard comprovaram as perdas de crian- ças que vivem em abrigos institucionais. Não obstante, lamentou que falte ainda criar uma cultura de acolhimento familiar. Ao encerrar, lembrou o despreparo dos profissionais de pro- teção, o que, em muitos casos, acaba levando às medidas protetivas da justiça, o que implica nos prejuízos da institucionalização. Janie Paula disse que falaria como mãe adolescente: ela foi mãe aos 16 anos e, depois, aos 28. Chamou a atenção para o abismo entre
  • 26. Relatório Técnico 201726 as duas experiências. Isso a estimulou a acom- panhar pessoas no processo de estruturação fa- miliar. Estabeleceu uma relação mostrando que o processo de adoção, o ir e vir até a concre- tização, é um processo de parto também. Mui- tos questionamentos surgem: qual o papel da mãe? E o do pai? Entretanto, disse, é preciso pensar no papel do cuidador e na criança. O as- sunto é o núcleo familiar que será desenvolvido para a criança, sobre o que é o cuidar, sobre as novas medidas de cuidado. Ela alertou que a sociedade não fala sobre o respeito à infância e que a criança continua invisível. Reafirmou que as pessoas precisam, antes de qualquer coisa, aprender a se respeitar, o que evidencia que há paradigmas a serem quebrados. Disse que é preciso rever os olhares para entender as no- vas constituições familiares, esses novos arran- jos que existem, mas são ignorados. Encerrou alertando que os casais precisam ser parceiros, precisam se ajudar, aprender a se comunicar e se respeitar dividindo o cuidado pela infância com mais respeito ainda. Antes de abrir para a plenária, o mediador, Flávio Debique, observou que a valorização do cuidado e do afeto está na base para as rela- ções humanas. Lembrou que isso apareceu em todas as falas dos componentes da mesa, o que demonstra o quanto todos precisam cuidar e também de ser cuidados. Disse que se pode determinar licença-paternidade e outros direi- tos, mas sem o cuidado por “pertença” não há compartilhamento, justiça, nem será igualitário. Argumentou que o seminário trouxe a reflexão: “Eu sou pai desde sempre!” A questão é a difi- culdade em respeitar a alteridade, a diferença, a outra pessoa, a religião, a família, o modo de ser e de querer ser. Afirmou que é preciso des- construir estereótipos, pois a realidade atual é de retrocessos. Pontuou que o congresso pas- sou da invisibilidade da infância para o dano a elas. Por isso, finalizou, é preciso aprender com quem sabe fazer melhor: as próprias crianças. Participação da Plenária A participante Ana Cláudia Lima, Psicó- loga do Instituto Base Gênesis14 , levantou a questão dos pais refugiados no Brasil. O Institu- to propicia a inclusão e acolhida deles, mas há muito a ser considerado para pessoas de outra cultura. Observou que a paternidade significa também a descendência e a ancestralidade, o que tem um valor imensurável para os povos 14 Instituto Base Gênesis: Instituto de Desenvolvimento Hu- mano. www.institutobasegenesis.org.br
  • 27. III Seminário Nacional Paternidade e Primeira Infância 27 islâmicos. A sociedade vai precisar se preparar para essa compreensão e convivência. Os participantes levantaram questões aleatoriamente para os palestrantes e tam- bém comentários: - Como preservar os vínculos familiares? - Como trabalhar a questão do cuidado para que o homem aprenda a cuidar? - Onde fica a dimensão do masculino e feminino no cuidado se ambos são com- ponentes do processo do cuidar como ele- mento fundante? Os palestrantes expuseram experiências so- bre as questões reconhecendo que, de alguma forma, elas estavam contempladas nas reflexões até ali. Houve reconhecimento de que o am- biente da educação infantil é fundamental para a formação do cidadão que a criança será. Entre- tanto, a creche tem muita dificuldade em traba- lhar com a parentalidade e que os pais podem ajudar muito. O consenso é de que é preciso que sejam respeitadas as mesmas potencialida- des a serem desenvolvidas de meninos e meni- nas para o crescimento e convívio igualitários. Damaris explicou que conhecer o diferen- te é torná-lo familiar e, assim, questionar nos- sas questões socioculturais. As tecnologias de cuidado são aprendidas dentro da cultura. Tem uma divisão de funções que é social e não se pode esquecer que o cuidado sempre esteve muito a cargo da mulher. Refletiu que a ques- tão é o como dar suporte à família nos seus conflitos básicos de convivência. A perspectiva, finalizou, precisa ser de ajuda, de trazer a famí- lia para o convívio da criança na creche. Encerrada a jornada do primeiro dia, todos foram convidados para as oficinas vivenciais e rodas de conversas que seriam desenvolvidas no dia seguinte, com a sequência do Seminário. Segundo dia: 02/09/2017 Desafios do Cuidar: Oficinas Vivenciais e Rodas de Conver- sas para Escuta e Troca de Experiências O segundo dia do “III Seminário Nacional Paternidades e Primeira Infância: avanços e de- safios do cuidar” tinha a proposta de realização de três oficinas vivenciais: 1- Amamentação e Alimentação Saudável, com o Dr. Marcus Renato de Carvalho, da UFRJ e Aleitamento. com; 2- Educação para Equidade de Gêne- ro, com Mariana Azevedo, do Instituto Papai, e Milena do Carmo, do Instituto Promundo Brasil; 3- Homens nas Creches Parentais e na Edu- cação Infantil, com Téo Cordeiro, do Grupo de Pais da Casa de Parto David Capistrano-RJ. Antes do início das atividades, Simone Valadares, do CECIP, Secretaria Executiva da RNPI, pediu ao orientador dos trabalhos, Agui- naldo Campos, que lesse uma mensagem encaminhada a todos por Claudius Ceccon, Secretário da Rede Nacional Primeira Infância, criador do logo do Seminário e que desejava a todos, por meio de um texto inspirador, os melhores ensejos de aproveitamento do Semi- nário, bem como, pedia escusas pela impossi- bilidade de estar presente.
  • 28. Relatório Técnico 201728 Texto: Recado Afetivo de Claudius Ceccon15 Procuro lá no fundo da memória o que dizer sobre paternidade e um filme passa pela minha cabeça. Um filme com momen- tos dramáticos: - Meu filho atropelado por um carro que foge sem prestar socorro... Momentos que me fazem rir: - Minha filha de quatro anos na aula de natação, atraves- sando a piscina, nadando cachorrinho e eu, pronto para me atirar na água, com roupa e tudo, para salvá-la do que me parecia ser afogamento na certa... Passam cenas dos dois, um pouquinho maiores, desajeitada- mente pescando num lago, com varas e iscas improvisadas. Mais tarde, a leitura do Minotauro, de Monteiro Lobato, antes de viajarmos para a Grécia. O filme os encon- tra, já aborrecentes, torcendo o nariz para tudo o que lhes queríamos mostrar de in- teressante (aos nossos olhos) numa visita a 15 Arquiteto, designer, jornalista, desenhista, ilustrador e cartunista. Após ser preso pelo regime militar brasileiro, em 1971, exila-se em Genebra. Lá, tem contato com o educa- dor Paulo Freire (1921-1997), com quem funda - juntamen- te com Rosiska Darcy de Oliveira, Miguel Darcy de Oliveira e Babette Harper - o Instituto de Ação Cultural (IDAC), por meio do qual trabalha em projetos de alfabetização em pa- íses africanos de língua portuguesa até 1975. Ao voltar para o Brasil, em 1978, trabalha com alfabetização em bairros carentes de São Paulo, também pelo IDAC, junto ao arce- bispo dom Paulo Evaristo Arns (1921). Após desligar-se do instituto, funda, com o cineasta Edu- ardo Coutinho (1933-2014), Paulo Freire, a escritora Ana Maria Machado (1941) e outros, o Centro de Criação da Imagem Popular (CECIP), no ano de 1986. O centro produz o programa de televisão TV Maxabomba e cria materiais educativos, voltados para a democratização da mídia e da informação no Brasil. Ganhador de inúmeros prêmios, entre eles, o Jabuti, de 2016, como melhor Ilustrador. Londres. Passam muitas sequências da es- cola, dos infindáveis deveres, dos aborre- cidíssimos sermões sobre a importância de estudar. O filme revê namoros, choros, de- silusões, discussões entre concepções gera- cionais: a difícil convivência entre o “velho” e o novo. No filme, revivo momentos de in- dizível sofrimento: - Um filho em perigo de vida! Não está na ordem natural das coisas que ele morra antes de mim! Revejo as mui- tas lições que os dois me ensinaram, cada um resolvendo à sua maneira o que ia viven- do. Passam momentos de puro carinho, de alumbramento, de silêncios, de uma comu- nicação sem necessidade de palavras. Ah, se eu pudesse voltar no tempo com a consciência que hoje tenho do va- lor do momento que passa... Eu seria um melhor pai, muito mais presente, mais ami- go, mais compreensivo – sem deixar de ser exigente – sem deixar de ser eu mesmo, apenas capaz de dialogar com meus filhos. É isso o que eu deixaria para vocês, hoje: viver a vida amplamente com seus filhos! Oficina de Roda 1: Amamentação e Alimentação Saudável Acolhidos pela afetividade da mensagem, os participantes foram convidados às ativida- des do último dia de seminário. O número de participantes girava em tor- no de trinta pessoas mais os organizadores. Em função disso, foi lançada uma proposta para que o grupo decidisse: escolheriam as ofici-
  • 29. III Seminário Nacional Paternidade e Primeira Infância 29 nas separadamente ou elas poderiam ocorrer concomitantemente, em forma de Roda de Conversa. Os presentes decidiram pela última opção uma vez que desejavam participar de to- das. Abriu-se uma grande roda no anfiteatro e a primeira oficina foi iniciada. A Oficina de Roda 1: Amamentação e Ali- mentação Saudável foi coordenada pelo Dr. Mar- cus Renato de Carvalho. Ele disse que a oficina teria início por onde tudo começou: a Campa- nha de Valorização do Cuidado Paterno cujo slogan “Pai, dê o peito ao seu filho!” teve a primeira edição em 2003. Contou alguns casos sobre a amamentação explicando que o impor- tante é a presença e o apoio do companheiro à esposa no momento de amamentar. Relatou a emblemática história de um homem, viúvo, no Sri Lanka, cuja filha não conseguia tomar leite, nem mamadeira. Desesperado, ele a pôs no próprio peito e amamentou. É a possibilidade do amor humano. Ele nem tinha as glândulas desenvol- vidas, mas mostra como há a possibilidade da dimensão humana, do amor que tudo alcança. Explicou que o que faz produzir leite é a sucção do bebê, sendo possível a indução da lactação mesmo por mães que não “pariram”(sic). Para dar início à oficina, ele lançou uma per- gunta como provocação: - Vocês têm a história da amamentação de vocês? Foram amamentados? Sabem as causas de não terem sido amamenta- dos? Causas alegadas (mitos, crenças, tabus...) e causas reais (determinantes psíquicos, sociais, cul- turais, econômicos...), trabalho, falta de apoio do companheiro, da intolerância social, etc.? Diversos e os mais interessantes foram os relatos dos participantes e o quanto isso lhes marcou a memória, sobretudo, no momento de passarem a amamentar também. Alguns fala- ram, inclusive, sobre o período em que deixa- ram de usar chupeta. A conversa girou em torno das implicações e consequências da amamentação ou não. Dr. Mar- cus Renato explicou que as doenças infecciosas e alérgicas, por exemplo, têm a ver com a pouca ou nenhuma amamentação exclusiva. Mostrou que, potencialmente, toda mulher é capaz de ama- mentar quando informada, apoiada, com desejo e disponibilidade de fazê-lo. Falou sobre os mi- tos e crenças, como o do “leite fraco” ou o “leite que secou por estresse”, etc. A amamentação na espécie humana não é instintiva ou hormonal e sim um hábito cultural que precisa ser promovido, protegido e apoiado por toda a sociedade. Damaris lembrou que, no ser humano, tudo é híbrido, nada é inato, tudo é construído socio- culturalmente, inclusive, a amamentação. Apareceram relatos socioeconômicos sobre a amamentação. Ela determina doenças no adulto, como obesidade na infância, rinite alérgica, bron- quite asmática... A amamentação não é instintiva ou inata. É uma cultura para humanos, mas a in- dústria da chupeta prejudica. Dr. Marcus lembrou que a amamentação é um direito, não dever da mulher. Mas que ela precisa ter informação. Ele lembrou que cada mãe produz o leite certo para o seu bebê, mas ressaltou a importância dos bancos de leite. Explicou ainda que a amamentação não é para rachar, doer, ter problema de pele... É preciso preparo, técnica para amamentar, coisa que o serviço de saúde deveria prover. Falou da co- brança social, muito grande sobre a amamen- tação, sendo que não há apoio e compreensão do companheiro, muitas vezes.
  • 30. Relatório Técnico 201730 Oficina de Roda 2: Homens nas Creches Parentais e na Educação Infantil, coordenada por Téo Cordeiro. A oficina seria a terceira na ordem da programação, entretanto, havia um gancho a partir da reflexão do desmame e o assunto entrou naturalmente indicando a condução da roda de conversa. Téo refletiu que há uma interessante ques- tão relacionada à experiência do desmame: a sensação de abandono, pois está relacionado aos cuidados, à pessoa de referência, à confian- ça. O companheiro precisa amparar porque o desmame poder ser traumático. Quando o com- panheiro é presente, o diálogo com a criança é tranquilo, inclusive, para a retirada da chupeta. Abud Bellini, Cristiane Rodrigues Duarte e Mariana Ferrer Duarte. https://revistas.pucsp.br/index.php/RFCMS/article/ viewFile/21445/pdf Damaris trouxe a reflexão de que as doen- ças são determinadas socialmente pelo modo de vida e que, inclusive, a amamentação é deter- minada. Segundo ela, hoje, não é possível ama- mentar por causa de algumas poucas doenças infecciosas, como o HIV e o HTLV. A amamen- tação é um ato psicossomático complexo com uma determinação socioeconômica e cultural. Dr. Marcus lembrou que o bebê que mama no peito não aceita chupeta porque tem boa sucção. Com relação à colocação da Damaris, explicou que uma mãe pode doar o leite, mas só para bancos de leite, uma vez que lá são pasteurizados, matando vírus como hepatite B, HIV, etc., por isso, não é recomendável uma mãe amamentar outras crianças. A não ser que se saiba da real condição de boa saúde dela. Tânia Sobral levantou interessante reflexão ao afirmar que não há uma cultura de pós-ama- mentação para a mulher. Explicou que as ma- mas não são acompanhadas pelo ginecologista e que do zero aos três anos há o período de amamentação, sendo necessário que se fizesse um trabalho de preparação para o desmame. Dr. Marcus Renato agradeceu a partici- pação e o envolvimento de todos observando que a amamentação é uma questão complexa. Ele encerrou a oficina/conversa indicando dois livros: O mito do amor eterno16 e Aleitamento Materno: uma reflexão sobre o papel do Pai17 . 16 Badinter, Elisabeth. Um amor conquistado: o Mito do Amor Eterno. Trad.: Waltensir Dutra. Rio de Janeiro: Ed. Nova Fronteira, 1985. http://www.redeblh.fiocruz.br/me- dia/livrodigital%20(pdf)%20(rev).pdf 17 In: Rev. Fac. Ciênc. Méd. Sorocaba, v. 17, n. 3, p. 140 - 147, 2015. Artigo de Ruth Bernarda Riveros Jeneral, Luíza
  • 31. III Seminário Nacional Paternidade e Primeira Infância 31 Essas experiências são acompanhadas na ordem natural das creches. Ele disse que costuma fazer pesquisas para conhecer a situação da creche parental. Explicou que elas começaram a ser experimentadas na Europa, na década de 70, por famílias que queriam uma opção diferente de educação. No Brasil, a experiência vem de outra prática: a das comunidades, com as mães que cuidam dos filhos das outras. Entretanto, a creche parental apresenta-se como propos- ta alternativa às creches institucionais porque passam pelo comprometimento dos pais com a educação dos filhos. Cada uma terá o seu dese- nho estabelecido por acordo entre os pais par- ticipantes. Por exemplo, em tal dia da semana, as crianças ficarão na casa de tal família e esta se responsabilizará pelo cuidado e atividades. Como a oficina começasse já em forma de roda de conversa, as intervenções e reflexões fo- ram acontecendo naturalmente. Josimar Silveira falou sobre sua experiência de cuidado exclusivo. Disse cuidar de crianças de quatro famílias de amigos. Tudo teria começado como espécie de brincadeira ao fazerem um rodí- zio de casais para ficarem com as crianças e terem algum tempo para si. Com o tempo, deram-se conta de que essa experiência demonstrava fragi- lidades e dificuldades: não das crianças, mas dos pais. Alguns casais tinham receio de que o filho fizesse xixi na cama, como acontecia em casa. Na casa dele, o menino pediu para ir ao banheiro, no meio da noite. Ao relatar o caso, o pai da criança ficou surpreso. Outras coisas corriqueiras como o fato de não comer legumes ou fazer manha para se alimentar. Nada disso acontecia na casa dos outros casais, o que os levou a perceber que o problema estava na relação que os pais estabele- ciam com os filhos. Toda essa experiência levan- tou para os casais importante reflexão em relação à qualidade de vida, de representatividade das crianças e do seu melhor desenvolvimento e per- tencimento. Acabaram percebendo que estavam diante de uma espécie de educação compartilha- da, de certa forma. Fábio Paes argumentou que o direito à educação no país foi conquistado sob duras lu- tas e que se está sob forte retrocesso de direitos por parte do atual governo, inclusive, garantidos por acordos internacionais. Nesse sentido, disse que gostaria de entender qual deveria ser o de- bate da política pública para o tema da Creche Parental. Explicou que seria importante enten- der o lugar do público nessa experiência para que não venha a ficar à margem de um sistema de direitos. A política pública não é necessária nesse nicho? Falou de experiências de creches parentais na Bolívia, mas que acontecem porque não existem creches institucionais, o governo re- lega às famílias o encargo. Como seria isso, no Brasil? Seria necessário algum subsídio governa- mental para as famílias interessadas nesse arran- jo educacional? Alguma nova linha de políticas públicas, de caráter menos institucional, pode ser proposta a partir disso? Ou se está falando de uma experiência autônoma e que o estado não tem importância nessa esfera? Em resposta, Josimar explicou que o ide- al seria que as creches/escolas tivessem esse preparo, disponibilidade e olhar da creche pa- rental. Argumentou que a educação é branca e não apresenta a cultura da diversidade. Há o di- reito constitucional à educação, mas na prática, há exclusão. Disse haver políticas públicas para a educação, mas não são aplicadas com esse
  • 32. Relatório Técnico 201732 fim. O próprio ECA, afirmou, não é cumprido, senão não haveria discussão pela redução da maioridade penal, etc. Damaris observou que há pontos impor- tantes a serem refletidos: é preciso tomar cui- dado para não baratear a discussão, entretan- to, também seria necessário reconhecer que há famílias que não teriam condições de oferecer o cuidado exigido pela creche parental. Evo- cando uma experiência de mais de 20 anos de trabalho em creches da Prefeitura de São Paulo argumentou que o modelo que ali estava sen- do trazido de creche parental era o desenvol- vido por famílias com mais ou menos acesso a bens culturais e que podem proporcionar ex- periências ricas para as crianças. Não que a po- breza não possa, mas tem muitas vezes uma li- mitação extrema de espaço, escolaridade e até de condições sanitárias. Na periferia, veem-se placas anunciando: toma-se conta de crianças! Então, o tipo de trabalho/atuação dos pais, in- clusive, nesses casos, precisa ser considerado. Haveria ainda a possibilidade de se pensar em turnos para uma opção de creche parental, mas o fato é que se apresenta como uma opção e isso deve ser entendido sob análise de um todo sistêmico: a política pública da Creche é carís- sima, no mundo todo, explicou, mas é efetiva e estruturada, tentando alcançar a demanda. A creche parental também precisa discutir o cui- dar, pois não se pode confundir o tomar conta precário, o que a classe média tem buscado. Observou os riscos, falando sobre pesquisa que teria realizado sobre mortes em creches: 70% não seriam reconhecidas legalmente pelos es- tabelecimentos. Essas coisas podem acontecer. E quando acontecer em uma creche parental? Aí volta o arcabouço da necessidade da políti- ca pública: é preciso tomar o cuidado de não transformar essa experiência em uma política pública barata para o governo. Em contraponto, Téo argumentou que não se trata de um simples tomar conta, mas de um cuidado oferecido por famílias que se co- nhecem. Disse que as experiências ainda são pouquíssimas, por isso, fica difícil uma análise ou até mesmo crítica. Por outro lado, enfatizou que as creches são elitizadas mesmo. Fábio Paes arrazoou que falta o reconhe- cimento ao direito público de educação infantil de qualidade e que as pessoas podem orga- nizar a educação de acordo com a sua possi- bilidade criativa. Ponderou que há pontos a serem refletidos sobre a creche pública: o ta- manho das estruturas, a falta de educadores/ cuidadores e os espaços nada infantis ou pen- sado para as crianças. Há, em muitos casos, um adulto para cuidar de vinte crianças enquanto na creche parental, há um adulto para cuidar de quatro. O problema estaria nas pouquíssimas experiências de creche parental o que inviabi- lizaria qualquer condição de pensar em regula- mentação por enquanto. Téo passou a palavra ao Pedagogo Edi- naldo J. Crispim, que atua no CEI-Centro de Educação Infantil Shangrilá, no Grajaú, bairro de São Paulo, para que fizesse um relato do seu dia a dia cuidando de crianças em uma creche institucional, o que ainda não é muito comum, uma vez que a grande maioria de cuidadores e professores ainda são do sexo feminino. Edinaldo relatou que desempenha a função de Professor de Educação Infantil, no CEI. Disse que inicialmente acontece um clima de descon-
  • 33. III Seminário Nacional Paternidade e Primeira Infância 33 fiança, parece haver um preconceito por ser um homem o professor que vai cuidar das crianças. No entanto, na prática isso acaba se dissipando. Ele já trabalhava com crianças do fundamental, antes. Veio para São Paulo com o desejo de tra- balhar com crianças, na educação infantil. Entrou na creche. Enfrentou a desconfiança de um pai que achou estranho um homem cuidando. O di- retor já havia preparado os pais com uma con- versa prévia. No final de 2016, quando a criança avançou o ciclo, os pais foram elogiar o trabalho dele e pedir que continuasse. Relatou que o tra- balho é desenvolvido por ele com o auxílio de uma educadora. Ele era o único homem cuida- dor da creche. Agora, foi contrato um outro. Fa- lou sobre as rotinas e atividades sequenciais de artes, oralidade, linguagem, horta, jardim, etc. Damaris perguntou a ele como seria trabalhar em um berçário cuidando de bebês de 4, 6 meses até 1 ano? Como seria o cuidar nessa condição? A partir de sua experiência em educação in- fantil, Tânia Sobral, objetou que a preocupação da família quando o cuidado é oferecido por um homem está no recorte de gênero. Disse que a questão não está no cuidado no berçário, mas na fase do desfralde, que se dá a partir dos dois anos, e que é impactante para o pai e a mãe, pois não imaginam um homem diante da nudez da crian- ça, ajudando e ensinando a se limpar, porque é um período também de aquisição da linguagem, de vocabulário, autonomia e causa melindres um homem acompanhando esse processo. Em objeção, Damaris disse que a Tânia estava se referindo ao ponto de vista da sexu- alidade, mas o recorte que pretendia era o do cuidado, o saber se o homem sabe cuidar do bebê, se tem esse preparo. Edinaldo voltou a dizer que a direção da Creche faz reuniões preparatórias com os pais antes de introduzir qualquer novidade, o que faz com que as expectativas se acalmem. Os pais são convidados a participar das atividades e há aqueles que frequentam a creche ajudando os cuidadores, então, podem observar o cuidado com que as crianças são tratadas. Com relação à pergunta da Damaris, ele respondeu que não tem o perfil para trabalhar em um berçário, pois é professor e bastante identificado ao trabalho com crianças da faixa etária de que cuida. Outro testemunho foi o do Fellipe Cime- ne Mendes, que dá aulas de xadrez em escolas particulares para crianças de 5 a 11 anos. Disse que é muito difícil ver homens trabalhando com essa faixa etária nas escolas, ainda predominan- do o cuidado, a alfabetização, etc., pelas mu- lheres. Disse querer compartilhar a experiência dele em relação à estrutura escolar que confia trinta crianças aos cuidados de um profissional. Observou a crueldade do modelo que não res- peita a criança, sendo que deveria entender que cada uma é um universo e precisa de atenção individualizada. Como trabalhar com trinta uni- versos sozinho, ao mesmo tempo? Não have- ria outra forma para que as crianças pudessem aprender? Será que é só nesse modelo escolar? Em muitos países, outros modelos de aprendi- zado já estão em prática e com melhores resul- tados para formar seres humanos. Disse que as crianças precisam ser ouvidas, não mandadas e direcionadas. Ninguém é dono de criança. Será que o aprendizado do ser humano só pode ser alcançado por esse modelo? Apostilas, lição de casa... ficar 6, 8 horas preso em uma sala e vol- tar para casa para fazer lição de casa!
  • 34. Relatório Técnico 201734 menino a estar nos espaços públicos, conquis- tando, competindo... Os adultos passam toda a fase de desenvolvimento infantil oferecen- do esses brinquedos, fortalecendo a ideia de que o menino é forte, é ogro, tudo pode. Mas não se pensa nas consequências: por que são agressivos? Por que o envolvimento com dro- gas e armas? Por que correm tanto no trânsito? Estabelecendo um paralelo, quando a criança cresce, o que se constata nas estatísticas em relação ao homem é que as causas de mortes ditas externas são por homicídio e as causadas pelo trânsito. Refletiu que os brinquedos feitos para os meninos podem ajudar a entender os resultados dessas pesquisas e, sobretudo, des- se comportamento/estereótipo. Os meninos são proibidos de brincar com bonecas. Muitos fazem divisão dos brinquedos, o que o menino pode e não pode. Em relação à mulher, as ima- gens que vão aparecendo são sempre aquelas ligadas ao cuidado, então, a boneca é o brin- quedo principal. Depois, adulta, ela é que vai gerar, parir, amamentar, cuidar... E o marido vai dizer: “Olha essa criança chorando. Troca, dá de mamar, faz alguma coisa! Isso é tarefa da mãe, eu sou pai, não sei cuidar”. Poderia ter brincado de boneca... Isso é comportamento de 90% da sociedade, daí a importância do de- bate. Brincar de boneca poderia dar aos me- ninos essa sensibilidade e abertura para essas práticas e habilidades. Há coisas que não se observam, mas se acabam reproduzindo, como o olhar de mães e avós proibindo ou deixando o menino fora do lugar de atividades de cuida- dor, apenas sendo cuidado. O questionamento que se faz para o cuidado masculino passa pela pergunta: Você não dá uma boneca para o seu O adiantado da hora alertou para a ne- cessidade de desenvolver o tempo para a úl- tima oficina: Educação para a Equidade de Gênero, coordenada por Milena do Carmo e Mariana Azevedo. Milena deu início à oficina/conversa reto- mando a discussão da creche parental, da polê- mica que sempre se estabelece quando se fala de homens cuidando de crianças, a nudez da criança, sobre outras formas de educar, como propôs o Fellipe. O que se percebe é que a educação não é circunscrita, não acontece só em creche, há outras formas de educar, como o cuidado parental e isso tem implicações, construções e reconstruções sobre as normas de gênero e as consequências disso. Vamos formulando internamente o que é ser homem e ser mulher, quais os papeis que se deve cum- prir. Então, pediu para os participantes dizerem palavras, características do que é ser homem e do que é ser mulher. As características do ho- mem: força, ogro, proteção... As características da mulher: cuidar, afeto, frágil... Milena mos- trou algumas fotos sobre brinquedos que se- riam para meninos e os que são para meninas. Os brinquedos de meninos mostravam armas, veículos, consertos, conquistas... O que leva o
  • 35. III Seminário Nacional Paternidade e Primeira Infância 35 filho por que você tem medo de quê? Que ele seja um bom pai? Essa é a pergunta lançada nas oficinas de gênero. Mariana pontuou a desigualdade na divi- são das tarefas de trabalho: as ligadas ao cui- dado são sempre desenvolvidas pelas mulhe- res sem remuneração, sem reconhecimento ou mal pago, nos poucos casos em que acontece retribuição, e, sobretudo, invisibilizado porque é tarefa direcionada, visto como obrigação da mulher. Isso vai se refletir também na vida da mulher adulta, profissional, no mercado de tra- balho, aceitando os piores empregos e a pior remuneração. Entretanto, tudo isso é gestado lá na infância, nas brincadeiras e nas tarefas impostas às meninas quando são obrigadas a ajudar a mãe a lavar louça, limpar a casa, cui- dar dos irmãozinhos... Isso vai determinar me- nos tempo para elas estudarem, descansarem e brincarem livremente como os meninos. Para os homens, o não cuidar acaba se tornando pri- vilégio, afinal, para que fazer algo que a mãe e a esposa fazem? Outro ponto importante foi levantado por Milena: Essa ideia que a Mariana traz mostra bem o paradoxo porque como o homem não cuida, ele também não se cuida. Fecha-se em uma caixinha com regras a seguir. O maior nú- mero de suicídios é de homens. Por que será? Homem não pode chorar, desabafar, expor fra- gilidades, sensibilidade... E há o sofrimento psíquico das mulheres, continuou Mariana. Elas são campeãs, mas os homens é que se matam. Ao menos, elas pro- curam ajuda, espaços de diálogo. Até as habi- lidades que vão sendo desenvolvidas determi- nam: quem busca as profissões de cuidado? Entretanto, as habilidades de cálculo de ganho, de negócios, de competitividade, tudo o que é valorizado pelo capital, fica com o homem. O professor Michael Kimmel18 fala disso em seus livros, da consequência perversa de estar no topo social. A hierarquia social coloca o ho- mem no topo patriarcal, machista e pagando um preço por essa posição. Isso começa na in- fância, na barriga da mãe, já com a expectativa pelo sexo do bebê, o que já vai determinando a história de vida daquela criança. Aí começa tudo: os sonhos dos pais já vão antecipando o que esperam da criança, sem levar em conta o ser único que está sendo gestado. Então, os so- nhos e projeções vão reproduzindo já os este- reótipos sem dar chance à criança de escolhas. As questões heteronormativas nem são levadas em consideração, não passam pela cabeça dos pais. Todos acham que a criança, por exemplo, a menina, vai crescer, preparar o enxoval e ca- sar com um homem e ter filhos porque é assim que tem de ser. Esse é o comportamento per- verso. As consequências do machismo fazem mal inclusive para o homem. Então, por que continuamos reproduzindo esses ideais? Milena observou que quando essa questão aborda o recorte étnico-racial, a situação piora muito. Falou das dificuldades até aparecerem no mercado bonecas inter-raciais, e os modelos ditados pelos brinquedos o que leva, na adoles- cência, a transtornos alimentares e tantos outros problemas porque os modelos foram de bone- 18 Michael Scott Kimmel, Professor de Sociologia e de Es- tudos de Gênero na StonyBrook University, de New York. Diretor Executivo do Center for the Study of Men and Mas- culinities. Michael_kimmel@yahoo.com
  • 36. Relatório Técnico 201736 cas perfeitas, magras, loiras, como se esse fosse o padrão de beleza humana. Sem falar que isso também abre a discussão da mulher como sexo frágil, mas a mulher branca, delicada, de classe média porque a mulher preta é forte... Ela rela- tou casos da ginecologia, que teria se fundado no estudo dos corpos das mulheres negras: os maiores maltratos, como dizer que elas não pre- cisam de anestesia, são fortes, hiperssexualiza- das, amas de leite... O índice de violência obsté- trica contra a mulher negra é assustador. Citou o filme The Mask You live in19 sobre a construção da masculinidade violenta, heteronormativa, re- alizado por pesquisadores norteamericanos. Tânia falou sobre os estereótipos nas cre- ches. Disse que a criança que é recebida nas creches, hoje, é muito diferente daquelas que frequentaram há cinco anos. Atualmente, há es- paço para o início de ruptura de uma cultura na educação das crianças. Edinaldo concordou. Disse que na CEI em que atua as crianças brincam com todo tipo de brinquedo, não há separação. Tânia continuou dizendo que essa infância, daqui a dez anos, estará nas ruas. Daí a impor- tância de pensar na criança de 0 a 3 anos porque é a possibilidade de tentativa de um trabalho de avanço na sociedade. O que não é possí- vel é manter um caminho baseado em como as coisas sempre foram feitas. Existem novos ca- minhos, novas maneiras de educar, mas é preci- so mobilização da própria sociedade. É preciso uma cidade inclusiva, com transporte, lazer... É preciso linkar (sic) as questões de gênero com 19 Trailler: https://www.youtube.com/watch?v=hc45-ptHMxo a educação na primeira infância, porque dos 0 aos 6 há a construção do sujeito social que a criança será depois enquanto adulta. Milena mostrou na tela uma imagem como reflexão final para os pais: “Como descobrir se um brinquedo é para menino ou menina? É só fazer a pergunta: Para brincar precisa usar os ór- gãos genitais? Se precisar dos órgãos genitais para brincar, então, não é brinquedo de criança! Bate Papo com autores Atividade conduzida por Leandro Ziotto, que contou com a participação dos autores Jail- son de Almeida, Victor Farat e Fábio Paranhos. O primeiro a falar foi Jailson que relatou ter sempre trabalhado com audiovisual. Partiu de experiências que trouxe da atividade profissio- nal, de entrevistas e vídeos que produzia para fazer cartilhas, materiais, o que acabou desper- tando o interesse em escrever para as crianças. Percebeu a dificuldade das crianças em nomear as coisas e, a partir também da experiência de aquisição de linguagem dos filhos, passou a fa- zer versos rimados para treiná-los a perceberem as características dos objetos. Daí começaram a surgir os livros: O que é O que é Coisas so- bre as Coisas de A a Z20 e Encontro com a Desimportância21 . O livro O que é... acabou 20 Jailson de Almeida. O que é O que é Coisas sobre as Coisas de A a Z. São Paulo, Ed. Giostrinho, 2014. 21 Jailson de Almeida. Encontro com a Desimportância. São Paulo, Ed. Giostri, 2015.
  • 37. III Seminário Nacional Paternidade e Primeira Infância 37 sendo escolhido para o desenvolvimento de um projeto de leitura nas escolas de Rio Grande da Serra, São Paulo, onde serão distribuídos às crianças gratuitamente como contrapartida pela edição. Jailson fará oficinas. Disse que a relação disso tudo com o aprendizado, nos dois dias de seminário, é que, o que faz a diferença são as pessoas, a forma como um trabalho é feito, o envolvimento e isso o seminário proporcionou. Victor Farat escreveu e ilustrou, em par- ceria com Rodrigo Bueno, Bebegrafia uma odisseia gráfica do primeiro ano dos nos- sos filhos22 , que faz um retrato dos pais no pri- meiro ano de vida dos filhos. Disse que o filho nasceu em 2014 e ele ficou um ano em licença -paternidade, um tempo de encantamento no processo de convivência com o bebê, o que o inspirou a desenhar a rotina com o filho. Ele postava nas redes sociais e houve grande re- verberação e interesse de outros pais. O livro acabou propiciando a realização de rodas de conversas com outros homens interessados na paternidade, nas questões de gênero e no cuidar, além da transformação do homem com o advento da paternidade e a relação com a companheira. Só em 2016, foram mais de 20 rodas de conversas em congressos de pedia- tria, eventos e também em empresas que já começam a perceber a importância do tema para a vida dos funcionários. Finalizou dizendo que “Nascer com meu filho inspirou a cuidar, a ter contato com essa sensibilidade tanto emo- cional quanto prática”. 22 Rodrigo Bueno e Victor Farat. Bebegrafia uma odis- seia gráfica do primeiro ano dos nossos filhos. São Paulo, Editoratimo Fábio Paranhos e a psicóloga Vera Moris escreveram o livro Coragem de Ser: relatos de homens, pais e homossexuais23 . Fábio explicou que a ideia do livro nasceu de um grupo de aconselhamento a pais que estavam dentro de relacionamentos heterossexuais e em determi- nado momento saíram desses casamentos. O livro trata da reconstrução que esses homens tiveram de fazer, pois, em algum momento da vida, eles perceberam que não eram como acreditavam ou queriam ser. Ter encontrado mulheres por quem se apaixonaram e com quem constituíram família depois de uma in- fância e adolescência confusas e problemáticas era a chance de construção da sonhada família. O problema se estabelece quando não é mais possível fugir da própria essência, dos dese- jos... Como agir diante dessa constatação? Que fazer com os sentimentos, com o grande peso de não conseguir enganar mais a si mesmo? Como não machucar as pessoas que se ama? E 23 Fábio Paranhos e Vera Moris. Coragem de Ser: relatos de homens, pais e homossexuais. São Paulo, GLS, 2017.
  • 38. Relatório Técnico 201738 isso sob a égide de um assunto que, apesar das mudanças, avanços e movimentos de luta por igualdade de direitos, ainda provoca emoções e reações as mais diversas porque continua cir- cunscrito a uma cultura determinante.
  • 39. III Seminário Nacional Paternidade e Primeira Infância 39 Show de Encerramento O final do Seminário contou com a partici- pação da Banda Alana que foi criada em 2007 para oferecer a crianças e jovens a oportuni- dade de imersão em um trabalho cultural. Foi criado um núcleo de recreação e cultura no Jardim Pantanal, extremo leste de São Paulo, onde são oferecidas oficinas de música, canto coral, percussão, teoria, metais, contrabaixo, teclado e musicalização infantil. Esse é o su- porte da banda formada por meninos, meni- nas e jovens dessa região que, na formação atual, conta com 40 músicos, com idades entre 11 e 21 anos, todos moradores da região. A Banda é profissionalizada e já realizou mais de 180 shows, com um público que já superou os 100.000 espectadores . Sob a energia da Banda Alana, o III Semi- nário Paternidades e Primeira Infância: avan- ços e desafios do cuidar deixou a mensagem de que a palavra pai ou paternidade inclui todas as figuras que são referências de cuidado e afe- to para crianças e adolescentes. Uma dedicação amorosa favorece a criança e o adolescente que recebem, mas também o adulto de referência que se doa e tem de volta, na ampliação de suas vivências emocionais, a dilatação do seu olhar para o bem-estar familiar e social.
  • 40. Relatório Técnico 201740 Carta de Recomendações: Propondo um debate aberto e propositivo frente às diversidades de experiências de paternidades e possibilidades de am- pliação de direitos e efetivação das políticas públicas instauradas pelo Marco Legal da Primeira Infância, O III Seminário Na- cional Paternidades e Primeira Infância: avanços e desafios do cuidar, resultou em um conjunto de recomendações: 1. Desenvolvimento de ações de incidência frente à implementação de políticas públicas que qualifiquem a relação de cuidado dos pais encarcerados com seus filhos e garantam às mães encarceradas o direito de permanecerem com seus bebês; 2. Incidência junto ao Sistema de Garantia de Direitos, o Sistema de Justiça e o Sistema Penal sinalizando a importância do diálogo entre essas instâncias para a garantia do interesse superior da criança; 3. Ações de informação e formação para o cuidado voltadas para as perspectivas de adoção por pes- soas solteiras; 4. Investimento em ações de promoção do cuidado integral da criança, como preconizado pelo Marco Le- gal da Primeira Infância, buscando a efetivação de políticas públicas de qualidade na área do esporte, lazer, saúde, educação, cultura e meio ambiente; 5. Ações que incentivem o avanço da legislação sobre as opções da família em relação à licença-parentalidade; 6. Mobilização pelo direito à cidade com serviços, segurança e espaços adequados às experiências de vi- vências das crianças; 7. Desenvolvimento de ações para propiciar o fortalecimento de vínculos entre crianças e cuidadores/as;