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Eclesiologia
Fundamentação Bíblica,
Características e Sacramentos da
evkklhsi,a de Jesus Cristo
Autor:
Joab Martins de Lima
Bacharel em Teologia pelo Instituto Metodista Bennett. Mestre em Teologia Bíblica pela
Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RIO).
Julho 2016
Joab Martins de Lima
Joab Martins de Lima
2018.08.26 01:27:30 -04'00'
Eclesiologia
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joablimateologo@gmail.com
Sumário
Introdução..................................................................................................................................... 3
1 Fundamentação bíblica de Igreja............................................................................................... 6
1.1 Antecedentes no Antigo Testamento ................................................................................. 6
1.2 Significado de “evkklhsi,a” antes da literatura neotestamentária....................................... 8
1.3 O termo “evkklhsi,a” – significado e emprego no Novo Testamento. ................................. 9
1.3.1 “evkklhsi,a” no Evangelho de São Mateus................................................................... 11
1.3.1.1 Breve análise da Perícope de Mt 16, 13-20 ....................................................... 12
1.3.1.2 Breve análise da Perícope de Mt 18,15-18. ....................................................... 15
1.3.2 Considerações sobre a fundação da Igreja. ................................................................ 16
1.3.3 A Igreja (“evkklhsi,a”) em Atos dos Apóstolos (Igreja Primitiva) .............................. 18
1.3.4 Aspectos de Igreja (“evkklhsi,a”) nos escritos paulinos............................................... 20
2 Características e atos fundamentais da Igreja. ........................................................................ 24
2.1 O credo Niceno-Constantinopolitano ............................................................................... 24
2.1.1 Igreja Una................................................................................................................... 25
2.1.1.1 Exemplo bíblico de Unidade da Igreja............................................................... 26
2.1.2 Igreja Santa................................................................................................................. 27
2.1.3 Igreja Católica ............................................................................................................ 29
2.1.4 Igreja Apostólica ........................................................................................................ 30
2.2 Atos fundamentais da Igreja ............................................................................................. 32
2.2.1 Pregação e testemunho............................................................................................... 32
2.2.2 Culto divino, sacramentos e oração............................................................................ 32
2.2.3 Diaconia e comunhão fraternal................................................................................... 33
3 Sacramentos da Igreja.............................................................................................................. 34
3.1 Significado de sacramento e sua abordagem histórica..................................................... 34
3.2 Sacramento do Batismo .................................................................................................... 38
3.2.1 Conceito de batismo................................................................................................... 40
3.2.2 Abordagem histórica sobre o batismo........................................................................ 41
3.2.3 Abordagem teológica sobre o batismo. ...................................................................... 43
3.3 Sacramento da Eucaristia (Ceia do Senhor)...................................................................... 44
3.3.1 Conceito de Eucaristia................................................................................................ 44
3.3.2 Abordagem histórica sobre a Ceia do Senhor. ........................................................... 45
3.3.3 Abordagem teológica sobre a Ceia do Senhor. .......................................................... 49
Conclusão.................................................................................................................................... 53
Referências bibliográficas ........................................................................................................... 58
Eclesiologia
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Introdução
Eclesiologia é o estudo de tudo que se refere a Igreja. Eclesiologia é uma palavra
composta pelos termos gregos evkklhsi,a (Igreja) e logia (conhecimento de; explicação
racional de; estudo de). De acordo com esses dados, eclesiologia teria como definição;
explicação racional de Igreja, ou Estudo de Igreja. A Cristologia e a Pneumatologia são
os referenciais bíblico – teológico para a Eclesiologia, pois Igreja é uma realidade
espiritual. Eclesiologia é o Estudo da Igreja, em relação a sua origem, doutrina,
relacionamento com o mundo, salvação, forma de governo, crises enfrentadas, papel
social...etc.
O estudo da Eclesiologia geralmente é tratado pela Teologia Sistemática, que é o
ramo da teologia que descreve de forma ordenada, racional e coerente verdades da fé
cristã, em “tratados dogmáticos” por muitas vezes extensos. Há por exemplo tratados
eclesiológicos que ultrapassam duzentas páginas. É, na verdade, um estudo muito
extenso que abrangeria tempo para tratar dos diversos assuntos e pesquisa sobre
variadas questões que poderiam advir do seu estudo. Em poucas páginas, julgamos que
não seria possível tratar um assunto tão extenso e interessante sobre a Igreja.
A eclesiologia em sua pesquisa sempre fará uso recorrente da história da Igreja,
em todos os seus momentos, seja, nos pais apostólicos, patrística grega e latina,
escolástica, reforma e contra reforma, concílios ecumênicos até o concílio vaticano II.
Como podemos notar é um período longo e que nos leva a afirmar que, eclesiologia
abrange história da Igreja. É na história da Igreja que nasce a eclesiologia. O primeiro
tratado sobre eclesiologia foi publicado em 1301-1302 por Tiago de Viterbo na obra
intitulada De regimine christiano. (Cf. NINOT-PIÉ, Salvador. Introdução à Eclesiologia. p.
13).
O nosso estudo não se propõe a esgotar o tema eclesiologia, mas de aborda-lo de
maneira mais simples possível sem deixar de se aprofundar nos temas propostos nos
capítulos que foram desenvolvidos.
As notas explicativas em notas de rodapé têm o objetivo de esclarecer termos e
apresentar informações a respeito de períodos da história da Igreja, ocorrências de
palavras empregadas na Bíblia, bem como de referências bíblicas. Por isso, é necessário
que o leitor faça uso das mesmas, pois irá encontrar informações importantes que não
estão inseridas no texto principal.
Propomos a divisão do tema de nosso estudo em três capítulos, os quais
procuramos articulá-los entre si.
Eclesiologia
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No primeiro capítulo 1 Fundamentação bíblica de Igreja a abordagem será em
estudar no Antigo e Novo Testamento a fundamentação terminológica dos termos que
se encontram na literatura bíblica referentes a Igreja. O estudo destes termos, tanto no
hebraico quanto no grego serão abordados separadamente. Assim, em 1.1 Antecedentes
no Antigo Testamento a raiz do termo hebraico lhq será estudada tanto como verbo e
como substantivo, abordando o seu uso pelos escritores veterotestamentários. Em 1.2
Significado de “evkklhsi,a” antes da literatura neotestamentária, a abordagem terá
foco no significado de evkklhsi,a no grego clássico, passando logo após a abordagem
feita em 1.3 O termo “evkklhsi,a” – significado e emprego no Novo Testamento onde
partiremos da definição do termo, para a sua aplicação no Novo Testamento em textos
do Evangelho de São Mateus em 1.3.1 “evkklhsi,a” no Evangelho de São Mateus.
Nesta parte do estudo fez-se necessária uma abordagem de dois textos do Evangelho de
São Mateus, onde o termo evkklhsi,a aparece, tratadas respectivamente em 1.3.1.1 Breve
análise da Perícope de Mt 16,13-20 e em 1.3.1.2 Breve análise da Perícope de Mt
18,15-18. A palavra evkklhsi,a encontrada nos lábios de Jesus no Evangelho de São
Mateus, levou-nos a abordagem sobre a fundação da Igreja tratada em 1.3.2
Considerações sobre a fundação da Igreja. O estudo segue, então, para a última parte
do primeiro capítulo fazendo considerações sobre a evkklhsi,a em 1.3.3 A evkklhsi,a em
Atos dos Apóstolos (Igreja Primitiva), tendo como foco o comportamento da Igreja
Primitiva e em 1.3.4 Aspectos de Igreja (evkklhsi,a) nos escritos paulinos onde três
aspectos são usados em referência a Igreja; Corpo de Cristo, Povo de Deus, Templo de
Deus.
O segundo capítulo, 2 Características e atos fundamentais da Igreja está
dividido em duas partes conforme seu título. As características da Igreja estão baseadas
na confissão do Credo do segundo concílio ecumênico realizado em Constantinopla no
ano 381 d.C. Tratamos disso no 2.1. O credo Niceno-Constantinopolitano, onde os
dois credos são colocados lado a lado para possível comparação. É neste credo que as
quatro características da Igreja são enumeradas e serão estudadas separadamente. O
primeiro estudo em 2.1.1. Igreja Una e, logo após tomamos um exemplo bíblico de
unidade em 2.1.1.1 Exemplo bíblico de unidade da Igreja, que é um comentário sobre
a Igreja Primitiva no livro de Atos dos Apóstolos. A segunda característica a ser
estudada será em 2.1.2. Igreja Santa, seguida de 2.1.3. lgreja Católica, e 2.1.4. Igreja
Apostólica. Terminada esta primeira parte que tratou das características da Igreja,
passaremos a um breve comentário sobre 2.2. Atos fundamentais da Igreja,
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enumerados da seguinte forma: 2.2.1. Pregação e testemunho, 2.2.2. Culto divino,
sacramentos e oração, 2.2.3. Diaconia e comunhão fraternal.
O último capítulo 3 Sacramentos da Igreja, encerra o nosso estudo. Estudaremos
primeiro em 3.1. Significado de sacramento e sua abordagem histórica, abrangendo
sua tradução do grego para o latim usado na Vulgata Latina, seguido da abordagem
histórica desde a patrística, passando pela escolástica até aos reformadores que
aceitaram somente dois sacramentos que a Igreja Evangélica herdou. O primeiro deles
3.2. O sacramento do Batismo, fazendo uma rápida abordagem sobre o elemento
usado no batismo, a água, e o seu uso na Bíblia. Segue-se para o 3.2.1. Conceito de
Batismo, onde terá atenção especial a sua origem no grego profano e no grego bíblico
para entendermos mais à frente o seu sentido. Dando continuidade ao nosso estudo,
seguirá 3.2.2 Abordagem histórica sobre o batismo, passando pela Igreja do século I
até os inícios do século III abordando sobre a sua prática na Igreja. Encerrando o estudo
do batismo faremos em 3.2.3 Abordagem teológica sobre o batismo onde trataremos
do sentido do batismo cristão. O último tema a ser estudado no capítulo três será em 3.3.
O sacramento da Eucaristia (ceia do Senhor) que abordará em 3.3.1 Conceito de
Eucaristia que será tratado na sua etimologia. Segue-se em 3.3.2 Abordagem histórica
sobre a Ceia do Senhor que fará um percurso desde os antecedentes da páscoa judaica
até ao pensamento dos reformadores. Por último em 3.3.3 Abordagem teológica sobre
a Ceia do Senhor, faremos uma tentativa de abordar o sentido da eucaristia na ceia do
Senhor.
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1
Fundamentação bíblica de Igreja
1.1 Antecedentes no Antigo Testamento
O vocábulo Igreja tem seus antecedentes provenientes do termo hebraico lh'q'
1
(qähäl). A raiz do termo hebraico lhq, traduzida para o grego pela LXX2
como
evkklew3
(ekkleö), é empregada no Antigo Testamento como verbo ou substantivo4
.
Como verbo lh;q' (qähal) tem o sentido de “reunir-se, congregar-se, juntar-se,
amotinar-se, concentrar-se” (Ni), “congregar, convocar, reunir” (Hi)5
.
Expressa, portanto, a ideia de reunir um grupo de pessoas tais como o povo (cf.
Dt 4,10), autoridades e anciãos (cf. Dt 31,28) e as tribos de Israel (cf. 1Rs 12,21), para
um propósito seja ele:
defesa mútua (cf. Est 8,11; 9,2; 15-16,18); entrar em guerra (cf. Js
22,12; Jz 20,1); adorar (cf. 2Cr 20,26); pedir a ídolos (cf. Êx 32,1);
ungir Arão (cf. Lv 8,4); armar a tenda da congregação (cf. Js 18,1);
transportar a arca até o templo (cf. 1Rs 8,2; 2Cr 5,3); juntar uma turba
contra alguém (cf. Jr 26,9); rebelar-se contra alguém (cf. Nm 16,3;
20,2; 2Sm 20,14); recenseamento (cf. Nm 1,18); purificação dos
levitas (cf. Nm 8,9); para fazer sair água da rocha (cf. Nm 20,8); para
ouvir as palavras da lei (cf. Êx 35,1; cf. Dt 31,12,28), e para ouvir a
mensagem de despedida de Moisés (cf. Dt 4,10)6
.
1
Substantivo masculino singular absoluto.
2
A sigla LXX refere-se a Septuaginta ou Bíblia dos Setenta que é a tradução do texto do Antigo
Testamento Hebraico para o Grego por volta dos séculos III e II a.C. Esta tradução foi feita, segundo a
lenda que se encontra no escrito extra canônico chamado Epístola a Aristeias {8.1.8}, por 70 sábios
judeus em Alexandria no Egito, estes por sua vez, incentivados pelo rei egípcio Ptolomeu II. A
Septuaginta (LXX) ou Bíblia dos Setenta contém livros a mais que a Bíblia Hebraica, os chamados livro
“deuterocanônicos”, aceito por cristão ortodoxos e em parte pelos católicos. Cf. KONINGS, Johan. A
Bíblia, sua origem e sua leitura. Petrópolis-RJ: Ed. Vozes 8ª edição, 2014. p.18.
3
Este vocábulo grego formado pela preposição evk (fora) junto ao verbo grego kalew (chamar, chamar
para fora, chamar de) dá o sentido de chamar para fora. Cf. RUSCONI, Carlo. Dicionário do Grego do
Novo Testamento. São Paulo-SP: Ed. Paulus 2ª edição, 2005. pp.153, 247. Na LXX kalew é usado com
frequência para “nomear coisas” (cf. Gn 1,5,8,9, “dia”, “noite”, “céu”, “terra”; cf. Gn 2,19 “os animais”)
ou pessoas (cf. Gn 25,26, Jacó; cf. Gn 29, 32-35; 30,6-24, “os filhos de Jacó) ou cidades (cf. 2Sm 5,9 “a
cidade de Davi”) ou qualidades (cf. Is 35,8 um caminho é chamado santo, e em Êx 12,16 um dia; Is 56,7,
onde o templo é chamado casa de oração). Cf. COENEN, Lothar. “Chamar kalew” DITNT. p.350.
4
Na forma verbal “lhq” é mais frequente em duas conjugações do verbo hebraico, a saber, Nifal (Ni) e
Hifil (Hi) Cf. ALONSO SCHÖKEL, Luis. “lhq” DBHP, p. 573. “O verbo ocorre 39 vezes nas formas
do nifal e do hifil, tendo o sentido de “reunir-se” ou “reunir”. A raiz lhq aparece 13 vezes no material
extra bíblico de Qumran, referindo-se a reuniões e a grupos de vários tipos, sendo que em apenas uma
ocasião a palavra aparece num contexto de adoração, fazendo paralelo com o uso encontrado em Salmos
22,23”. Cf. LEWIS, Jack P. “lh'q'” DITAT, p.1326.
5
No Nifal ocorre em: Ex 32,1; Lv 8,4; Js 18,1, 22,12; Jz 20,1; 2Sm 20,14; 1Rs 8,2; Est 8,11, 9,2,15,18;
Nm 16,2, 17,7, 20,2; Jr 26,9; Ez 7,8. No Hifil ocorre em: Ex 35,1; Lv 8,3; Nm 1,18, 20,8; Dt 4,10; 1Rs
8,1; Ez 38,13; Jó 11,10.
6
Cf. LEWIS, Jack P. “lh'q'” DITAT, p.1326.
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Como substantivo lh'q' (qähäl), transmite a ideia de assembleia, grupo,
congregação e a LXX o traduz por evkklhsi,a (ekklësia), embora em 36 casos lh'q'
(qähäl) é traduzido por sunagwgh, (synagogëº)7
.
O substantivo lh'q' (qähäl) designa uma assembleia de qualquer espécie e
objetivo8
, mas especialmente uma assembleia que objetive propósitos religiosos como
ocorre na experiência do Horebe, chamado de “dia da congregação” (cf. Dt 9,10; 10,4;
18,16), em ocasiões de festas, jejum e adoração (cf. 2Cr 20,5; 30,25; Ne 5,13; Jl 2,16)9
.
Expressa, portanto, uma assembleia cerimonial que abarca o resultado da aliança feita
no Sinai por uma comunidade histórica, ou seja, o povo de Israel10
.
É importante destacar que o substantivo lh'q' (qähäl) pode designar uma
congregação como corpo organizado, como demonstrado abaixo:
 laer"f.yI lh;q.-lK' (Kol-qühal yiSrä´ël) toda congregação de Israel (cf. Dt 31,30)
 ~yhil{a/h' lh;q.Bi (Biqhal hä´élöhîm) congregação de Deus (cf. Ne 13,1)
 hw"hy> lh;q.-l[; (`al-qühal yhwh{´ädönäy}) sobre a congregação do Senhor (cf. Nm
16,3).
No Antigo testamento o sintagma hw"hy> lh;q. (qühal yhwh{´ädönäy}) (cf. Dt 23, 2-
4; Mq 2,5; 1Cr 28,8), que a LXX traduz por evkklhsi,an kuri,ou (ekklësia kyriou) que
significa Assembleia do Senhor, é o que mais se aproxima do que hoje conhecemos por
“Igreja do Senhor”11
.
7
Cf. LEWIS, Ibidem. Em Gn, Lv e Nm lh'q' (qähäl) é traduzido por sunagwgh, (synagogëº) 21 vezes e em
15 passagens de Ez, com exceção de Ez 32,23. Cf. COENEN, Lothar. “Igreja evkklhsi,a ” DITNT. p.985.
8
Pode ser para dar maus conselhos ou fazer coisas ruins (cf. Gn 49,6; Sl 26,5), para tratar de assuntos
civis (cf. 1Rs 2,3; Pv 5,14; 26,26; Jó 30,28) ou para fazer guerra (cf. Nm 22,4; Jz 20,2 etc.). Os exércitos
reunidos presenciam o combate entre Davi e Golias (cf. 1Sm 17,47). Em outros contextos o termo pode
designar uma multidão de nações reunidas (cf. Gn 35,11), povos reunidos (cf. Gn 28,3; 48,4) ou mesmo
mortos reunidos (cf. Pv 21,16). Pode referir-se aos exilados que voltam (cf. Jr 31,8; Esd 2,64), e então a
comunidade restaurada em Jerusalém é um lh'q' (qähäl) (cf. Esd 10,12, 14; Ne 8,2,17). Cf. LEWIS,
Ibidem.
9
Parece que é intencional a distinção entre td:[] (`ádat) e lh'q' (qähäl) em Lv 4,13: “se toda a congregação
(hd'[e) de Israel pecar por ignorância, e isto for oculto aos olhos da coletividade (lh'q' (qähäl))...” Aqui
lh'q' (qähäl) tem o sentido de representantes judiciais da comunidade. Existe também o caso em que
certos israelitas não podem entrar no lh'q' (qähäl) (cf. Dt 23,2). Mas em outras passagens os dois
vocábulos são empregados em frases sucessivas tendo o mesmo sentido (cf. Nm 16,3) e também são
colocados juntos (cf. Pv 5,14). Em geral são sinônimos. Cf. LEWIS, Ibidem.
10
Cf. COENEN, Lothar. “Igreja evkklhsi,a ” DITNT. p. 988.
11
Cf. LEWIS, Jack P. “lh'q'” DITAT, p.1327.
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1.2 Significado de “evkklhsi,a” antes da literatura neotestamentária.
O termo evkklhsi,a (ekklësia) na literatura do grego clássico12
é atestada em
Eurípides e Heródoto no sec.V a.C, com o significado de “assembleia popular dos
cidadão efetivos e componentes da polis, (cidade)”. A evkklhsi,a (ekklësia) na Grécia
antiga, alcançou sua importância máxima no séc.V a.C, quando se reunia em intervalos
regulares, em Atenas por exemplo cerca de 30 a 40 vezes ao ano, sendo, porém, menos
frequente em outros lugares. A reunião de uma evkklhsi,a (ekklësia) servia para dirimir
assuntos como; mudanças de lei, nomeações para posições oficiais e questões de
importância política seja interna ou externa como contratos, tratados, guerra e paz, e
finanças. Em uma evkklhsi,a (ekklësia) cada cidadão tinha o direito de falar, propor e
debater assuntos, podendo somente discutir propostas se houvesse a opinião de um
perito sobre um assunto. As reuniões da evkklhsi,a (ekklësia) eram iniciadas com orações
e sacrifícios às divindades da cidade13
.
A evkklhsi,a (ekklësia) “antes da tradução da LXX e dos tempos do Novo
testamento” nunca era usada como comunidade religiosa, pois, caracterizava-se por ser
uma assembleia da polis (cidade) constituída por cidadãos efetivos, arraigada em
constituição democrática que tomava decisões fundamentais e de cunho político e
judicial, e com competência variada em vários estados14
.
Dentro do contexto do período do grego clássico, outra palavra que assumiu
importância é sunagwgh, (synagogëº). Esta palavra é atestada a partir do séc. V a.C em
diante exprimindo uma vasta gama de usos. De modo geral significava, em sentido
transitivo, “reunir” ou “ajuntar” “coisas (livros, cartas, posses, frutos no tempo da
colheita) e também tropas e pessoas”15
.
A partir do sec. II a.C, período este do grego koinê, ou seja, o grego comum16
, a
palavra sunagwgh, (synagogëº) começou a ser usada, em sentido intransitivo, para
12
O período clássico da língua grega foi de 900 a 330a.C tornando-se conhecida graças as famosas obras
literárias que tiveram origem neste período e foram preservadas até hoje, como a Ilíada e a Odisseia
ambas atribuídas a Homero. Estas obras são as mais antigas da literatura grega, seguidas por obras de
Hesíodo, Heródoto e Platão, entre outros. O dialeto que mais se destacou neste período foi o ático o qual
chegou a ser a base principal para o grego koinê, o grego que foi escrito a LXX e o Novo Testamento. Cf.
REGA, Lourenço. BERGMANN, Johannes. Noções do Grego Bíblico. São Paulo-SP. Ed. Vida Nova. p.
8.
13
Cf. COENEN, Lothar. “Igreja evkklhsi,a ” DITNT. p.984.
14
Ibidem. p.985.
15
Cf. COENEN, Lothar. “Igreja evkklhsi,a ” DITNT. p. 985.
16
Com as conquistas de Alexandre o “Grande”, por volta de 330 a.C, o grego usado passou a ser o
“Koinê”, ou seja, o grego conhecido como “comum”. Lembrando que foi neste período que a tradução do
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designar a assembleia regular, principalmente festiva como refeições e sacrifícios, de
grupos de comunidades cúlticas. No entanto, não é possível atestar claramente que
sunagwgh, (synagogëº), no Grego Clássico (séc. V a.C), fosse empregado no sentido de
assembleia, sendo este muito provavelmente originado no judaísmo no período
helenístico (séc. IV a.C)17
. Portanto, dentro do contexto do sec. III a II a.C, sunagwgh,
(synagogëº) é empregado pela LXX para “indicar a comunidade de Javé” definida de
forma religiosa18
.
É importante ressaltar que quando a LXX emprega evkklhsi,a (ekklësia) na
tradução do hebraico lh'q' (qähäl), o faz para indicar a assembleia do povo ou uma
assembleia jurídica (cf. Dt 9,10; 23,3ss; Jz 21,5,8; Mq 2,5) e corpo político (cf. Esd
10,8; 12; Ne 8,2;17). Especialmente em Crônicas a LXX emprega evkklhsi,a (ekklësia)
como assembleia do povo para adoração (cf. 2Cr 6,3; 30,2,4,13,17). O emprego de
evkklhsi,a (ekklësia) como assembleia do povo de Deus é caracterizado pela resposta ao
chamado de Javé, embora faça alusão a grandeza histórica de Israel19
.
Sendo assim, percebemos que evkklhsi,a (ekklësia) na LXX não emprega o sentido
que outrora tinha no grego clássico, sentido este de uma assembleia da polis (cidade),
mas, sim, de uma assembleia do povo de Deus.
1.3 O termo “evkklhsi,a” – significado e emprego no Novo Testamento.
Anteriormente constatamos que o vocábulo Igreja tem suas origens do hebraico
lh'q' (qähäl) e foi traduzido pela LXX (septuaginta) para o termo grego evkklhsi,a
(ekklësia) e vimos também o significado deste antes dos escritos neotestamentários. Em
continuidade ao nosso estudo, vamos analisar o termo grego evkklhsi,a (ekklësia) para
compreender o seu significado e analisa-lo nos escritos do Novo Testamento.
O termo evkklhsi,a (ekklësia) é composto de uma preposição evk (ek) e do
substantivo klhsi,a (klësia). Quanto a preposição evk (ek) o seu significado denota
“origem”, no sentido de procedência de um ponto de onde procede um movimento.
Pode significar “de, fora, depois, entre, por, o meio de, a partir de, entre, adiante, sobre,
Antigo Testamento hebraico para o grego conhecida por Septuaginta “LXX”, utilizou o grego Koinê.
Mais tarde, já no séc. I d.C, os escritores do Novo Testamento utilizaram o mesmo grego nos seus
escritos. Cf. REGA, Lourenço. BERGMANN, Johannes. Noções do Grego Bíblico. p. 8.
17
Cf. COENEN, op. cit. p. 985.
18
Ibidem p. 989.
19
Ibidem p. 988-989.
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para fora”. Com frequência esta preposição é usada em composição a outra palavra
significando “fora de, embora”. Sugere também a “algo que parte do interior para o
exterior”20
.
O substantivo klhsi,a (klësia) é a forma mais curta do verbo kalew (kaleö)
{“chamar, chamar para”}. Este denota o mesmo sentido do verbo assumindo o
significado de “um chamado, convite, intimação, mensagem, convocação de Deus para
a religião da vida”21
.
Tendo em vista os dados até aqui apresentados, desde o substantivo hebraico lh'q'
(qähäl), passando pela abordagem do termo evkklhsi,a (ekklësia) no período que
antecedeu os escritos do Novo Testamento, podemos, então, afirmar, que evkklhsi,a
(ekklësia) nos escritos neotestamentários poderá assumir o significado literal de: “um
chamado (para) fora; uma assembleia; reunião da assembleia; uma comunidade;
congregação; Igreja; sociedade; a assembleia de cristãos na cidade ou comunidade”22
.
O emprego de evkklhsi,a (ekklësia) no Novo Testamento ocorre 114 vezes23
;
 Nos evangelhos somente em Mateus 3 vezes;
 Em Atos dos Apóstolos 23 vezes;
 Nos escritos paulinos 62 vezes;
 Em Hebreus 02 vezes e em Tiago 01 vez;
 Na terceira carta de João 03 vezes;
 Em Apocalipse 20 vezes;
No entanto, evkklhsi,a (ekklësia) não aparece em 1ª e 2ª Pedro; 2ª Timóteo e Tito24
.
20
Cf. SOUTER, Alexander M. A. A Pocket Lexicon to the Greek New Testament. p. 74. Cf. STRONG,
James. Greek Dictionary of The New Testament. p.145. Cf. RUSCONI, Carlo. Dicionário do Grego do
Novo Testamento. p. 153.
21
Cf. STRONG, James. Greek Dictionary of The New Testament. p. 265.
22
Cf. SOUTER, Alexander M. A. A Pocket Lexicon to the Greek New Testament. pp. 75-76.
23
Cf. em Mateus (cf. Mt 16,18; 18,17{2x}); em Atos dos Apóstolos (cf. At 5,11; 7,38; 8,1,3; 9,31;
11,22,26; 12,1,5; 13,1; 14,23,27; 15,3,4,22,41; 16,5; 18,22; 19,32,39,40; 20,17,28) em Romanos (Rm
16,1,4,5,16,23); em 1/2 Coríntios (cf. 1Cor 1,2; 4,17; 6,4; 7,17; 10,32; 11,16,18,22; 12,28; 14,4,5,12,
19,23,28,33,34,35; 15,9; 16,1 16,19 (2x); 2Cor 1,1; 8,1, 18,19,23,24; 11,8,28; 12,13); em Gálatas (cf. Gl
1,2,13,22) em Efésios (cf. Ef 1,22; 3,10,21; 5,23,24,25,27,29,32) em Filipenses (cf. Fl 3,6; 4,15) em
Colosenses (cf. Cl 1,18,24; 4,15,16); 1/2 Tessalonisenses (cf. 1Ts 1,1; 2,14; 2Ts 1,1,4); em 1 Timóteo (cf.
Tm 3,5,15; 5,16); em Filemom (cf. Fm 1,2) em Hebreus (cf. Hb 2,12; 12,23) em Tiago (cf. Tg 5,14); em 3
João (cf. 3Jo 1,6,9,10); em Apocalipse (cf. Ap 1,4,11,20{2x}; 2,1,7,8,11,12,17,18,23,29; 3,1,6,7,13,14,22;
22,16).
24
Cf. COENEN, Lothar. “Igreja evkklhsi,a ” DITNT. p. 991.
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1.3.1 “evkklhsi,a” no Evangelho de São Mateus.
Ao falar-se de evangelho, fala-se, na verdade, da “pregação oral viva e essencial
da Igreja” que “recebeu a missão de torná-lo conhecido, crido e amado, pelos homens”,
pois, “a mensagem de salvação anunciada por Jesus Cristo e realizada na sua pessoa,
torna-se ativa na vida de quem ouve a pregação da Igreja”. Portanto, através desta, os
homens têm a possibilidade de receber uma nova vida com plenitude total em Jesus
Cristo (cf. Jo 10,10)25
.
Já ao falar-se de evangelhos, fala-se dos livros que são o testemunho escrito de
um evangelho, ou seja, a vida, mensagem e obra redentora da pessoa de Jesus Cristo
relatada nos evangelhos, de Mateus, Marcos, Lucas (sinóticos)26
e João, que tratam de
um único evento histórico-salvífico: Jesus Cristo, morto e ressuscitado, sendo este o
querigma27
feito pelos apóstolos aos destinatários da pregação.
O Evangelho de São Mateus é o primeiro em ordem canônica no Novo
Testamento, porém, não em ordem cronológica de composição, sendo que esta ocorreu
entre os anos 70/80 d.C, para uma comunidade de judeus convertidos, da Antioquia da
Síria ou outra comunidade de cidade litorânea da região sírio-fenícia28
.
A comunidade de Mateus era formada por judeus convertidos ao cristianismo e
que, por esta razão, eram hostilizados e perseguidos por judeus conservadores. A
comunidade, a evkklhsi,a (ekklësia) do Evangelho de Mateus encontra-se à margem da
sociedade, pois é perseguida pela sinagoga (judeus) e pelo império romano. É uma
evkklhsi,a (ekklësia) que busca construir o reino de Deus na terra, plausível a homens e
mulheres de todas as condições, tentando com isto, romper com paradoxos tradicionais.
No entanto, por sua proposta, a evkklhsi,a (ekklësia) mateana sofre muito e vive em
25
Cf. FERNANDES, Leonardo Agostini. A Bíblia e a sua mensagem. Introdução à leitura e ao estudo da
Bíblia. p. 117.
26
“Estes evangelhos são chamados de sinóticos, porque possuem semelhança e oferecem concordância de
material e de linha estrutural, podendo ser dispostos em colunas paralelas”. Ibidem. p. 118.
27
“Querigma” significa proclamação. “No uso profano indica a proclamação que um arauto realiza em
nome do rei (cf. Gn 41,43; Is 42,9; 52,7). No NT, o termo indica o conteúdo essencial da pregação que os
apóstolos fazem sobre Jesus Cristo (cf. At 2,22-24; 3,13-26; 4,10-12 etc.). Em um evangelho, significa o
anuncio da proximidade do reino de Deus feito por João Batista, por Jesus e seus discípulos (cf. Mt 3,1-2;
4,17; 10,7.27)”. Ibidem. p. 117.
28
O relato de Mt 22,7, da parábola do banquete nupcial, faz referência direta a destruição de Jerusalém no
ano 70 na primeira destruição da cidade, o que leva os exegetas a datá-lo entre os anos 70 e 80 d.C.
Quanto ao local de composição deste evangelho, sugeriu-se primeiramente a cidade de Jerusalém, mas, no
entanto, este foi rejeitado, pois sabe-se que a partir da morte de Tiago (irmão de João, ambos filhos de
Zebedeu Mc 3,17) entre os anos 44-46 d.C, os discípulos fogem de Jerusalém e é nessa dispersão para a
Fenícia, Chipre e Antioquia que o evangelho é anunciado somente aos judeus dessas regiões (cf. At
11,19). Cf. MAZZAROLO, Isidoro. Evangelho de São Mateus. pp. 5-6. Cf. MAZZAROLO, Isidoro. A
Bíblia em suas mãos. p. 133. Cf. CARTER, Warren. O Evangelho de São Mateus. Comentário
sociopolítico e religioso a partir das margens. p. 16.
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permanente tensão, com os adversários, os hipócritas e outros. Como exemplo podemos
citar que no sermão da montanha (cf. Mt 5-7); Jesus, ao falar das bem-aventuranças,
exerce sua “pedagogia da inclusão” e mostra uma inversão de perspectivas, sendo este
fator, algo que causou conflitos com autoridades e nobres, pois, as multidões aderem a
Jesus29
.
A eclesiologia de Mateus apresenta uma visão do ‘império de Deus’,
sua vontade, seu jeito, suas formas políticas e econômicas,
contrapondo-se frontalmente a um império dos homens, suas regras,
seus princípios e suas concepções excludentes. O modelo de Jesus é a
libertação do homem, e o modelo do império é a sua escravização30
.
A evkklhsi,a (ekklësia) mateana é o novo Israel de Deus, constituída não só por
judeus convertidos, mas também por pagãos. Embora existam, hostilidades e
perseguições, o mandamento do amor prevalece (cf. Mt 22,34-40), e deve, contudo, ser
praticado inclusive diante dos inimigos como exigência de perfeição, a exemplo de
Jesus Cristo (cf. Mt 5,43-48)31
.
1.3.1.1 Breve análise da Perícope de Mt 16, 13-2032
Faremos uma rápida análise de duas perícopes do Evangelho de São Mateus, onde
os termos evkklhsi,a (ekklësia) aparece nos lábios de Jesus. No entanto, esta análise não
será hermenêutica no ponto de vista exegético utilizando os métodos diacrônicos ou
sincrônicos. Será uma análise para entender o sentido de evkklhsi,a (ekklësia) no
Evangelho de São Mateus.
“13
Chegando Jesus ao território de Cesaréia de Filipe, perguntou aos
discípulos: Quem dizem os homens ser o Filho do Homem?”
“14
Disseram. Uns afirmam que é João o Batista, outros que é Elias,
outros, ainda que é Jeremias ou um dos profetas.”
“15
Então lhes perguntou; E vós, quem dizeis que eu sou?”
“16
Simão Pedro, respondendo, disse: Tú és o Cristo, o filho do Deus
vivo.”
“17
Jesus respondeu-lhe; Bem-aventurado és tu, Simão, Filho de Jonas,
porque não foi carne ou sangue que te revelaram isso, e sim meu Pai
que está nos céus.”
“18
Também te digo que tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei
minha Igreja {evkklhsi,a (ekklësia)}, e as portas do Hades nunca
prevalecerão contra ela.”
29
Cf. MAZZAROLO, Isidoro. Evangelho de São Mateus. p. 11.
30
Cf. Ibidem.
31
Cf. FERNANDES, Leonardo Agostini. A Bíblia e a sua mensagem. Introdução à leitura e ao estudo da
Bíblia. p. 119.
32
O que nos interessa nesta rápida análise é a palavra evkklhsi,a, portanto analisaremos o texto até o
v.18.
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“19
Eu te darei as chaves do reino dos Céus e o que ligares na terra será
ligado nos céus, e o que desligares na terra será desligado nos céus”.
“20
Em seguida, proibiu severamente aos discípulos de falarem a
alguém que ele era o Cristo”. Mt 16,13-20 (Bíblia de Jerusalém).
Esta perícope encontra paralelos em Mc 8,27-10 e Lc 9,18-21. Em ambos os
textos paralelos, não há a menção de evkklhsi,a (ekklësia), e nem do título atribuído a
Jesus “Filho de Deus”.
Na perícope em apreço, o autor do evangelho relata o momento em que Jesus,
antes do primeiro anuncio da sua paixão (cf. Mt 16, 21-23), recebe a profissão de fé de
seus discípulos representados por Simão Pedro.
Jesus faz duas indagações aos seus discípulos, a saber: a) o que o povo, as
autoridades e os seus opositores falavam sobre quem era o filho do homem33
; b) e o que
os discípulos (de Jesus) diriam sobre a sua pessoa, tendo em vista que os discípulos
poderiam ter se deixado influenciar pela opinião pública a respeito de Jesus. Assim
temos a resposta, pelos discípulos, à primeira indagação: João Batista (cf. 14, 1-2); Elias
(cf. Mt 11,14; 17,12-13); Jeremias ou algum dos profetas (cf. Mt 2,17; 27,9).
Na segunda indagação a resposta é dada por Simão Pedro que responde: “Tú és os
Cristo (ungido/messias) o filho do Deus vivo” (v.16). Na resposta de Simão Pedro há
duas declarações: a) Jesus é o Cristo o messias esperado; b) Jesus é o Filho do Deus
vivo.34
Perante tal declaração, Jesus afirma a Pedro: “Bem-aventurado és tu, Simão filho
de Jonas...” (v.17)35
. Tal bem-aventurança tem um motivo; não foi nem a carne e nem o
sangue que revelaram a identidade de Jesus a Pedro, mas, sim, o Pai que está nos céus
(v.17).
A expressão carne e sangue denota a condição humana perante Deus,
não como uma de mortalidade, mas como inabilidade para conhecer
Deus e os modos de Deus. Sublinha as limitações das capacidades
intelectual, religiosa e mística humanas perante Deus36
.
33
Esta expressão tem dois sentidos, sendo, um humano em sentido de homem ser humano e um sentido
teológico fazendo alusão a Dn 7,13-14 onde Filho do Homem designa um ser celeste, transcendente. No
Novo Testamento esta expressão e encontrada nos lábios de Jesus ao referir-se a sua vida terrestre (cf. Mt
8,20); as predições de seu sofrimento, morte e ressurreição (cf. Mc 8,31; 9,31; 10-33-34); e a sua vinda
como Filho do Homem em futuro próximo glorioso (cf. Mc 8,38; 13,26; 14,62). Cf. MAZZAROLO,
Isidoro. Evangelho de São Mateus. p. 251.
34
Cf. MAZZAROLO, Isidoro. Evangelho de São Mateus. p. 251.
35
Esta expressão aramaica “bar-Iônah (cf. Jo 1,42) seria uma forma revolucionária ou anarquista de
caracterizar a pessoa, de modo semelhante a Mt 10,4 definindo Simão, o cananeu”. Cf. MAZZAROLO,
loc. cit.
36
Cf. CARTER, Warren. O Evangelho de São Mateus. Comentário sociopolítico e religioso a partir das
margens. p. 423.
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Logo após a esta afirmativa, Jesus, continua suas afirmativas a Pedro dizendo que
sobre a rocha construirá a sua Igreja evkklhsi, a (ekklësia): “18
Também te digo que tu és
Pedro, e sobre esta pedra edificarei minha Igreja {evkklhsi,a (ekklësia)}, e as portas do
Hades nunca prevalecerão contra ela.”
Pedro (Petros) era um nome próprio usado no universo grego e a
associação com “petra” (pedra) é uma questão de estrutura. Jesus
afirma que sobre a rocha ele construirá a sua Igreja. Qual seria a
compreensão de Jesus a respeito? Quem seria a rocha? A tradição da
Igreja associou a rocha com Pedro, mas em muitos outros textos a
rocha é Cristo (cf. Mt 21,42 e paralelos; cf. At 4,11; 1Pe 2,7; Sl
118,22). Na estrutura de Mateus, e desta perícope, Pedro pode ser
visto como modelo de discípulo, como aquele que tem coragem de
explicitar a fé; ele se tornará o modelo de líder37
.
Em torno desta temática sobre qual seria a rocha que Jesus declara há outras teses
aqui elencadas;
É Jesus Cristo que toma a iniciativa da construção da sua Igreja; Ele
tem a autoridade e construirá sua Igreja depois de sua morte e
ressurreição; A Igreja não seriam os apóstolos, nem os missionários a
posteriori, mas a comunidade messiânica reunida em torno de Jesus,
comprometida com uma nova realidade; Na narrativa de Mateus, Jesus
estaria dirigindo esta profecia à pessoa de Pedro, o qual lidera a
comunidade dos apóstolos na Igreja de Jerusalém; Jesus usa uma ideia
judia ao falar que as portas do Hades não teriam êxito contra a
comunidade messiânica; ela não seria barrada pela morte (cf. Is 38,10;
Jó 38,17; Sl 9,14; Sb 16,13)38
.
Sobre a questão das portas do Hades não prevalecerem sobre a Igreja, entendemos
isto num contexto que a Igreja mateana estava sendo perseguida e já haviam ocorrido
martírios como o de Estevão no ano 36 d.C (cf. At 7,55-60) e Tiago irmão de João no
ano 44-46 d.C (cf. At 12,2).
A Igreja tem uma conotação política, social e cultural. ‘Eu construirei’
essa assembleia como uma comunidade alternativa à ordem imperial e
do Templo. Esta comunidade alternativa teria que enfrentar as portas
do inferno. No inferno estão as forças maléficas, as potestades
demoníacas e as potências do mal, mas essas forças não ofereciam
perigo algum na escatologia, e por isso, surge a pergunta: Quem são
essas portas do Inferno? Onde estavam os demônios durante a missão
de Jesus? De que forma esses demônios se manifestam na vida dos
discípulos? As portas do inferno não estão na escatologia, pois lá não
37
Cf. MAZZAROLO, loc. cit. Ulrich Luz teólogo protestante suíço identifica quatro linhas clássicas de
interpretação sobre quem é a rocha; (1) Pedro o representante de todo cristão; (2) a fé ou confissão de
Pedro no v.16; (3) Cristo; (4) Pedro, o bispo modelo. Cf. LUZ, Ulrich, Matthew in History. pp 57-74, esp.
pp 57-63; Burgess, History of the Exegesis of Matthew 16,17-19. Apud CARTER, Warren. O Evangelho
de São Mateus. Comentário sociopolítico e religioso a partir das margens. p. 423.
38
Cf. MAZZAROLO, Isidoro. Evangelho de São Mateus. p. 251-252.
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haverá comunicação entre os dois universos – salvos e perdido (Lc 16,
19-31) – mas é na história que o Reino de Deus encontra as
hostilidades do reino do Beelzeboul (Ap 12, A Mulher x A Besta). As
portas representam o acesso ou a saída, e quando elas se abrem saem
delas exércitos, forças, cortejos e potencias39
.
Entendemos que a rocha sobre a qual Jesus declara construir a sua Igreja é a
profissão de fé que Pedro faz ao declarar que Jesus é o Cristo filho do Deus vivo. Sendo
assim, sobre esta profissão de fé revelada por Deus é que a Igreja será construída, ou
seja, a fé no filho do Deus vivo.
1.3.1.2 Breve análise da Perícope de Mt 18,15-1840.
“15
Se o teu irmão pecar, vai corrigi-lo a sós. Se ele te ouvir, ganhaste o
teu irmão.
“16
Se não te ouvir, porém, toma contigo mais uma ou duas pessoas,
para que toda questão seja decidida pela palavra de duas ou três
testemunhas”.
“17
Caso não lhes der ouvido, dize-o à Igreja {evkklhsi,a (ekklësia)}. Se
nem mesmo à Igreja {evkklhsi,a (ekklësia)} der ouvidos, trata-o como
gentio ou publicano”.
“18
Em verdade vos digo: tudo quanto ligares na terra será ligado no
céu e tudo quanto desligardes na terra será desligado no céu.” Mt
18,15-18 (Bíblia de Jerusalém).
Esta perícope é parte do capítulo 18 que descreve várias instruções sobre a vida
comunitária. Neste capítulo o autor do evangelho “passa algumas máximas de vida
validas para todos aqueles que querem fazer parte da nova família, da nova
comunidade”41
.
É, portanto, neste capítulo, o discurso eclesiológico em que as palavras de Jesus
soam como instruções para a sua evkklhsi,a (ekklësia).
Essas instruções visam criar na comunidade relações e práticas sustentadoras.
Pode-se elencar, conforme o vocabulário – chave repetido e temas distintos, seis seções:
Esta comunidade vive como crianças marginais (18,1-5). Os membros
não fazem tropeçar um ao outro (18,6-9). Tomam conta um do outro
(18,10-14). Exercitam admoestação e reabilitação comunitária (18,15-
20). Perdoam repetidamente (18,21-22), nunca esquecendo que o
perdão de Deus lhes exige que estendam o perdão um ao outro (18,23-
39
Cf. MAZZAROLO, Isidoro. Evangelho de São Mateus. p 252.
40
O que nos interessa nesta rápida análise é a palavra evkklhsi,a, portanto analisaremos o texto até o
v.17.
41
Ibidem. p 267.
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25). Com estas práticas eles se sustentam mutuamente no caminho
exigente da cruz42
.
A perícope em apreço apresenta a questão de algum irmão da comunidade que
tenha pecado contra outro irmão, e recomenda que, o que pecou seja corrigido em
particular, e, se o que pecou aceitar a repreensão a questão fica resolvida “ganhaste a teu
irmão”. Caso o que pecou não dê ouvidos, ou não aceite a correção, duas ou três
testemunhas deverão ser convocadas, para resolverem a questão. No entanto, caso não
seja resolvida a questão, a evkklhsi,a (ekklësia) deverá ser convocada e caso o que pecou
não der ouvidos, não será considerado como membro integrante da comunidade.
Conforme esse ensino, há três esforços que a Igreja deve exercer para a
reconciliação de uma pessoa: a) repreensão em particular (a sós); b) duas ou três
testemunhas; c) levar a questão à evkklhsi,a (ekklësia) com o objetivo de reconciliação
no meio da comunidade.
A evkklhsi,a (ekklësia) deve ter, portanto, atitude reconciliadora, seja ela de forma
individual, com duas ou três testemunhas ou comunitariamente, e nunca de exclusão,
pois, um irmão ou irmã que não aceita a correção com objetivo de reconciliar, acaba por
tomar a decisão de se “auto” excluir da evkklhsi,a (ekklësia).
1.3.2 Considerações sobre a fundação da Igreja.
“Jesus instituiu, ou fundou a Igreja una”43
. Esta afirmativa pode ser entendida da
seguinte forma:
O Senhor terreno e ressurreto bem consciente, expressamente estatuiu
determinados atos jurídicos formais por meio dos quais ele fundou a
Igreja como instituição visível, juridicamente estabelecida por sua
vontade em todos os pontos essenciais44
.
A exegese recente questiona tal posicionamento, pois, o mesmo fundamenta-se
nos textos eclesiológicos de Mt 16,18; 18,17 onde o próprio Jesus pronuncia o termo
evkklhsi,a (ekklësia).
42
Cf. CARTER, Warren. O Evangelho de São Mateus. Comentário sociopolítico e religioso a partir das
margens. p. 455.
43
Formulação que está claramente expressa no juramento antimodernista do Papa Pio X formulado em 1
setembro de 1910, a ser proferido obrigatoriamente por todos os padres, bispos, catequistas e
seminaristas. “eu acredito com fé igualmente firme que a Igreja, Guardiã e mestra da Palavra Revelada,
foi instituída pessoalmente pelo Cristo histórico e real quando Ele viveu entre nós...” Este juramento,
mais tarde, foi abolido pelo Papa Paulo VI em 1967. Cf. X, Papa São Pio - "Juramento contra o
Modernismo" MONTFORT Associação Cultural http://www.montfort.org.br
44
Cf. WIEDENHOFER, Siegfried. In Manual de Dogmática Vol 2. Eclesiologia. p. 56.
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Este questionamento fundamenta-se na em que tais textos do Evangelho de São
Mateus são provenientes da situação pós-pascal. Os evangelhos anunciam as palavras e
atos de Jesus a partir da experiência de sua morte e ressurreição partindo de dentro da
comunidade a ser reunir a partir dali e a esperar o retorno do Senhor. Essa seria a
situação depois da páscoa. Mas, na situação antes da páscoa, a pregação de Jesus é
centralizada no “reino de Deus escatológico45
que irá irromper em futuro imediato
(expectativa imediata)” e na “conscientização do amor e misericórdia incondicionais e
ilimitados de Deus em situações concretas de desgraças”46
. A pregação de Jesus é o
domínio definitivo e universal de paz de Deus nesta vida dentro de um horizonte terreno
e temporal (cf. Mt 5,4; 6,10); domínio este iminente como expectativa imediata que iria
irromper num outro mundo; domínio transcendente e interior que visa o indivíduo e lhe
exige fé para abraçar a sua proposta do reino de Deus47
.
Esta pregação de Jesus é dirigida para todo o Israel sem acepção de grupos ou
pessoas, tendo como objetivo, “reunir, renovar e preparar o povo inteiro face ao reino de
Deus iminente”. No entanto, Jesus, “não pretendia fundar uma nova comunidade
religiosa e nem construir uma comunidade santa restante ou comunidade eclesial em
Israel”. Porém, Jesus, com sua pregação, causou um movimento de pessoas que se
congregaram e que se separaram do judaísmo vigente aderindo, assim, a proposta do
reino de Deus, ou seja, o que fez esse rompimento, Igreja – Israel, foi a reação dos
ouvintes de Jesus. Fica difícil, diante de tal fato, afirmar uma fundação da Igreja em
sentido tradicional48
.
No entanto, se lermos a atuação de Jesus tendo como base o pano de fundo
histórico da fé de Israel e considerarmos o fracasso de sua intenção direta de reunir
Israel, pode-se dizer que a Igreja tem o seu fundamento na vontade de Jesus, pois leva-
se em consideração que a Igreja surge como comunidade de fé distinta de Israel porque
abraça e acolhe a pregação de Jesus.
O Jesus pré-pascal inicia um movimento escatológico voltado para Israel por meio
de sinais do reino de Deus iminente. Estes sinais formam comunhão e constituem a base
objetiva e teológica bem como histórico-sociológica para a institucionalização da
45
Significa que o “reino de Deus se realiza plena e definitivamente no final dos tempos e como
acontecimento já está perto”. A ideia escatológica do reino de Deus “significa o regime de Deus que põe
fim ao curso anterior do mundo, aniquila o que é hostil a Deus, tudo que é satânico, que faz agora suspirar
o mundo, e da mesma forma põe fim a toda necessidade e dor, traz a saúde para o povo de Deus, que
aguarda o cumprimento das promessas proféticas. Cf. KÜNG, Hans. La Iglesia. Editorial Herder.
Barcelona, 1968. pp. 62-63.
46
Cf. WIEDENHOFER, Siegfried. In Manual de Dogmática Vol 2. Eclesiologia. p. 56.
47
Ibidem. pp. 61-63.
48
Ibidem. p. 56-57.
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Igreja49
. Podemos também dizer, que o Jesus pré-Pascal lança os fundamentos para
surgir a Igreja pós pascal. Seria uma
“eclesiologia implícita que significa que Deus leva adiante o reino de
Deus iniciado por Jesus e que permanece fiel a esse início quando o
confia, depois da páscoa, a uma Igreja, ligada ao mesmo tempo a esse
início”50
.
Portanto, a Igreja passa a existir após a Páscoa, ou mesmo após o Pentecostes,
ocorrendo então a sua institucionalização concreta como nova comunidade de fé51
.
Utilizando um sentido amplo e aberto de Igreja, é possível afirmar que Jesus
funda uma “comunhão dos que creem, esperam e amam, inaugurada por Deus por meio
de Cristo no Espírito Santo”, diferente, portanto, de um sentido específico de uma Igreja
como “comunhão de fiéis que sob direção do papa e dos bispos, compartilham a mesma
fé eclesial e recebem os mesmos sacramentos”52
.
1.3.3 A Igreja (“evkklhsi,a”) em Atos dos Apóstolos (Igreja Primitiva)
No período apostólico (30-65 d.C) a Igreja está em processo de divórcio de Israel
e por isso passa a ter o seu lugar próprio e seu centro na eucaristia.
Como relata o livro de At 2, após a assunção de Jesus ocorre o derramamento do
Espírito Santo sobre os apóstolos no cenáculo. Logo após esse evento, Pedro faz o seu
discurso que resulta na conversão de 3 mil almas que se agregam aos apóstolos (cf. At
2,1-36.41).
Estes novos membros da Igreja {evkklhsi,a (ekklësia) os chamados para fora}
precisam satisfazer a exigências tais como: “a conversão à fé em Cristo, o batismo, o
dom do Espírito Santo, a celebração eucarística, o amor operante e comunitário” (cf. At
2,38.42-47). Portanto, a Igreja Apostólica, ou seja, a Igreja iniciada pelos apóstolos no
dia de pentecostes, deu continuidade e desenvolvimento a pregação e missão de Jesus53
.
No livro de Atos dos Apóstolos notamos a existência de três sumários análogos
que nos informam como era o modo de vida da primeira evkklhsi,a (ekklësia), os
chamados para fora, a comunidade de cristãos, a Igreja primitiva, a Igreja Apostólica.
49
Cf. WIEDENHOFER, Siegfried. In Manual de Dogmática Vol 2. Eclesiologia. p. 58.
50
Cf. NINOT-PIÉ, Salvador. Introdução à Eclesiologia. pp.46-47.
51
Cf. WIEDENHOFER, Siegfried. p. 58.
52
Ibidem. p. 57.
53
Cf. NINOT-PIÉ, Salvador. Introdução à Eclesiologia. p. 40. O autor de Atos dos Apóstolos enfatiza o
constante crescimento da Igreja apostólica ou primitiva (cf. At 2,47; 4,4; 5,14; 6,1.7; 9,31; 11,21.24;
13,48-49; 19,20).
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Temos assim: a) At 2,42-47; b) At 4,32-35; c) At 5,12-16. Passemos a olha-los com
mais atenção:
a) At 2,42-47 tem como base a palavra-chave “assiduidade”. Descreve quatro
aspectos da Igreja apostólica ou primitiva em questões relativas a
catequese (ensino), comunhão fraternal, eucaristia (ceia do Senhor) e
oração. O primeiro aspecto refere-se a catequese (ensino) ministrada
pelos apóstolos. Esta catequese seria sobre “as Escrituras explicadas a luz
dos eventos cristãos, não mais como Boa Nova a não cristãos”54
.
O segundo aspecto, refere-se a comunhão fraternal que é a comunhão
dos bens pela comunidade (cf. At 2,44). Esta comunhão dos bens,
“exprime e reforça a união dos corações (cf. At 2,46; 4,32)” como
resultado “da partilha do evangelho e de todos os bens recebidos de Deus
por Jesus Cristo na comunidade apostólica”55
.
O terceiro aspecto é a “fração do pão”, que faz referência a eucaristia, ou
como conhecemos no meio protestante Ceia do Senhor (cf. 1Co 10,16;
11,24; Lc 22,19; 24,35). Este rito era praticado numa casa e não no
templo; era praticado junto com uma refeição (cf. 1Co 11,20-24)56
.
No quarto aspecto temos as orações em comum. Como exemplo cf. At
4,24-30; 1,14+24; 12,5. Em At 6,4 fica claro que os apóstolos tinham a
tarefa da oração e ensino na comunidade.
b) O segundo sumário At 4,36-37 trata da partilha de bens. Descreve como
era feita e toma como exemplo a Barnabé, sendo este o modelo a ser
seguido, que vende uma propriedade e entrega o valor da venda aos
apóstolos. Já em At 5,1-11 temos o relato de Ananias e Safira, o modelo
que não deve ser seguido, que venderam uma propriedade não entregando
o valor total da venda aos apóstolos.
c) O terceiro sumário At 5,12-16 descreve o poder de realizar milagres
exercido pelos apóstolos e o deslocamento de pessoas das cidades vizinhas
que traziam enfermos e atormentados por espíritos impuros para serem
curados.
Com as perseguições em Jerusalém a Igreja é dispersa e começa assim a anunciar
o evangelho aos gentios que têm na pessoa de Paulo o seu principal representante.
54
Bíblia de Jerusalém. p. 1905, nota “e”.
55
Bíblia de Jerusalém. p. 1905, nota “f”.
56
Bíblia de Jerusalém. p. 1905, nota “g”.
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Os escritos paulinos e os demais escritos do Novo Testamento mostram elementos
teológicos e organizacionais dessa Igreja Nascente57
.
1.3.4 Aspectos de Igreja (“evkklhsi,a”) nos escritos paulinos.
Os escritos paulinos enquadram-se dentro de um gênero literário situado entre
carta e epístola. A carta tem um caráter mais pessoal, enquanto a epístola tem caráter
comunitário. No entanto, estes dois gêneros se entrelaçam e tendo em vista que são
objetos de leitura pessoal e coletivo, não há óbice em utilizar o termo carta para os
escritos paulinos58
.
O corpo de escritos paulinos é composto por treze cartas, sendo sete
consideradas como:
Protopaulinas, isto é, de autenticidade do apóstolo Paulo: 1Ts; 1-2Co;
Gl; Fl; Rm e Fm. Seis são consideradas deuteropaulinas, isto é, não
seriam autenticamente do apóstolo Paulo; 2Ts; Ef; Cl; 1-2 Tm; Tt”.
Porém esta questão é muito discutida entre os estudiosos”59
.
Nas cartas paulinas o termo Igreja aparece relacionado a três aspectos; corpo de
Cristo; povo de Deus; e templo de Deus ou templo do Espírito Santo.
- Corpo de Cristo.
Aquele que crê em Cristo e em sua obra redentora, passa a estar em Cristo e isso
implica em ser uma nova criatura como uma nova realidade. É estar num novo espaço
de vida agora dominado por Cristo. Nesta nova realidade há uma nova socialização da
qual o crente em Jesus Cristo passa a fazer parte, onde “não há judeu nem grego, não há
escravo nem livre, não há homem nem mulher; pois todos sois um só em Cristo Jesus”
(cf. Gl 3,28). Acontece então a anulação das estruturas sociais, antes, em vigor.
Diante de tal realidade, a Igreja fica condicionada pela cristologia passando,
assim, a ser o corpo de Cristo, pois os participantes deste corpo comungam juntos do
corpo e sangue de Cristo, unindo-se assim ao Cristo crucificado e ressurreto através da
eucaristia (Ceia do Senhor)60
.
A Igreja formada por muitos crentes e unida por um só Espírito (cf. Rm 12,5; 1
Co 12,12.27) “cujos diversos membros estão aí uns para com os outros e uns com os
57
Cf. NINOT-PIÉ, Salvador. Introdução à Eclesiologia. p. 40.
58
Cf. FERNANDES, Leonardo Agostini. A Bíblia e a sua mensagem. Introdução à leitura e ao estudo da
Bíblia. p. 132.
59
Ibidem.
60
Cf. WIEDENHOFER, Siegfried. In Manual de Dogmática Vol 2. Eclesiologia. p. 66.
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outros”, formam o corpo terreno do Cristo exaltado. Isto significa “que a Igreja é a
forma de apresentação histórica e a forma de apresentação terrena de comunicação de
Cristo, por meio do qual, Cristo, atua e está presente na história” (cf. Ef 1,22s; 4,7-16;
5,21-33; Cl 1,18; 2,19)61
.
A Igreja como corpo de Cristo é uma unidade orgânica na qual todos tem uma
função (cf. 1Cor 12,12ss). Por isso, no corpo de Cristo não há nenhum membro mais
importante que o outro. No corpo de Cristo nenhum membro é dispensável e até os
considerados mais fracos têm a sua importância.
Em Rm 12,4-8 o apóstolo Paulo elenca diversas funções, ou dons, que os
membros do corpo de Cristo exercem “...segundo a graça que...foi dada...” a cada um.
Esta diversidade de funções, ou dons, produz valor ao corpo, pois a sua fonte é Cristo.
Desta forma, notamos que todos os membros do corpo de Cristo têm uma função a
desempenhar para a saúde do corpo de Cristo, ou seja, a Igreja. Portanto, se cada
membro do corpo se empenhar em sua função dentro do corpo, a Igreja crescerá e se
manterá saudável.
Para isso, faz-se necessário o atendimento ao chamado à vida de santidade,
expressando pertença a Cristo no pensamento e no testemunho diário. Sendo assim,
entendemos, que os membros do corpo terão saúde (espiritual) e poderão desempenhar
funções que possibilitarão a edificação do corpo, sob a liderança de pessoas escolhidas
por Cristo e reconhecidos pela igreja, para funcionar harmoniosamente por estar em
obediência a Cristo e ao seu serviço coletivo.
- Povo de Deus.
O aspecto da Igreja como povo de Deus a relaciona com Israel. Para tanto o
apóstolo Paulo usa várias designações da Igreja como povo de Deus.
A Igreja é o povo de Deus (cf. Rm 9,25s) o ‘Israel de Deus’ (cf. Gl
6,16), a ‘semente de Abraão’ (cf. Rm 9,7s) a (verdadeira) ‘filiação de
Deus’ (cf. Rm 9) e (mais frequentemente) a ‘comunidade’ (reunida)
de Deus ([evkklhsi,an tou/ qeou/] ekklesia tou theou): (cf. 1Cor 15,9; Gl
1,13; 1Cor 10,32; 11,22; 1Cor 14)62
.
O aspecto paulino de povo de Deus, sintetiza experiências diversas como: Deus
permanece fiel a sua aliança, apesar da infidelidade de seu povo eleito; a infidelidade
61
Cf. WIEDENHOFER, Siegfried. In Manual de Dogmática Vol. 2. Eclesiologia. p. 66.
62
Ibidem. p. 67.
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humana com a aliança causadora de rupturas na história da salvação; a morte chega ao
seu fim com a ressurreição de Cristo; e a bem sucedida missão entre os gentios63
.
A Igreja como povo de Deus, recongregado como corpo de Cristo, é uma
comunidade de Deus em Jesus Cristo (cf. 1Ts 2,14). Como povo de Deus a Igreja tem
ao mesmo tempo continuidade e descontinuidade ao povo de Deus Israel64
.
A continuidade está baseada nos seguintes pontos:
a) Fidelidade do Deus uno;
b) Onipotência do Deus uno;
c) Bondade do Deus uno na continuidade de sua promessa no Antigo
Testamento.
Em relação a Igreja estes pontos de continuidade abrangem os seguintes aspectos;
a Igreja fica fundamentada para sempre no povo de Israel, e como cristandade gentia a
Igreja é o ramo enxertado na nobre oliveira que é Israel (cf. Rm 11,1-10).
A descontinuidade com o povo de Israel se baseia:
a) Na morte e ressurreição de Cristo, pois, imprime um caráter escatológico
de confissão de Cristo exigindo decisão;
b) Na justiça de Deus em Cristo, pois, a justificação é pela fé e não mais
baseada na lei mosaica;
c) Na constituição desse povo de Deus agora constituído de judeus e pagãos;
d) A Igreja é agora a nova aliança (cf. Rm 9,24-10,21) entendida como
cumprimento veterotestamentário.
Neste sentido, Igreja é o novo povo de Deus, que existe concretamente
como comunidade individual, inclusive também como comunidade
doméstica, mas particularmente como congregação festiva de culto
divino (celebração da Eucaristia)65
.
- Templo de Deus.
A concepção paulina de Igreja como templo de Deus, remete a ideia de construção
(cf. Ef 2,19) que se edifica. Próximo a este está o conceito de casa ao referir-se a uma
comunidade em particular (cf. Gl 6,10) ou Igreja universal (cf. Ef 2,19; 1Tm 3,15). Em
sentido geral o templo de Deus, refere-se a edifício (cf. 1Cor 3,5ss; Ef 2,19ss; 4,8).
Esta concepção de templo de Deus, mostra que é o lugar em que Deus atua pelo
Espírito Santo, pois o templo como construção, casa, indica que é a habitação de Deus
através do seu Espírito Santo. Portanto, na Igreja como morada de Deus, cumprem-se as
63
Cf. WIEDENHOFER, Siegfried. In Manual de Dogmática Vol. 2. Eclesiologia. p. 67.
64
Ibidem.
65
Ibidem.
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promessas feitas a Israel (cf Lv 26,11; Ez 37,26; Zc 8,8) pois Deus viverá neste templo
por seu Espírito66
.
A Igreja como templo de Deus é edificada por ele através dos dons espirituais
distribuídos pelo Espírito Santo para que haja vida, edificação, pois, é o princípio vital
de serviço aos seus membros67
.
Como templo de Deus a Igreja é possessão de Deus por se encontrar plena do
Espírito Santo. É a possessão sagrada de Deus na terra, que a santifica e a guarda68
.
66
Cf. SCHLIER, Heinrich. Eclesiologia Del Nuevo Testamento In Mysterium Salutis. Manual de
Teologia como história de La salvacion IV/1. La Iglesia. p.169.
67
Cf. Rm 8,1;12,11;15,16; 1Cor 2,10; 6,11; 12,1; 2Cor 1,22; 3,37; Gl 3,1; 5,16; 1Ts 1,5; Ef 1,13; 2,19;
3,3; 5,18.
68
Cf. SCHLIER, Heinrich. op. cit. p.170.
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2
Características e atos fundamentais da Igreja.
2.1 O credo Niceno-Constantinopolitano
A palavra Credo deriva do latim e significa “eu creio”. Em se tratando de um
credo cristão, nada mais é que uma profissão, confissão, ou declaração de fé, que
contém um resumo daquilo em que se deve acreditar, sendo este de uso litúrgico
proclamado nos cultos tendo esta pratica a partir do século II69
. Dessa forma um credo
causa unidade de fé, proporcionando fundamentação doutrinária diante de uma
heresia70
.
O credo Niceno-Constantinopolitano foi elaborado no ano 381 d.C num concílio
ecumênico composto por 150 bispos na cidade de Constantinopla, capital do Império
Romano, hoje a atual cidade de Istambul capital da Turquia, com afirmações de fé em
relação; a Deus, a Jesus Cristo, ao Espírito Santo e a Igreja como Una, Santa, Católica e
Apostólica.
Este credo (Niceno-Constantinopolitano) é assim chamado por ser uma revisão e
ampliação do credo formulado no Concílio de Nicéia71
em 325 d.C, no que se diz em
relação ao Espírito Santo e a Igreja. Segue abaixo o Credo Niceno e o Credo Niceno-
Constantinopolitano72
:
Credo Niceno (325) Credo Niceno-Constantinopolitano (381)
Cremos em um só Deus, Pai onipotente, criador de
todas as coisas visíveis e invisíveis.
Cremos em um Deus, Pai todo-poderoso, Criador do
céu e da terra, de todas as coisas visíveis e invisíveis.
Ε em um só Senhor Jesus Cristo, o Filho de Deus,
gerado pelo Pai, unigênito, isto é, da substância do
Pai;
E em um Senhor, Jesus Cristo, o unigênito Filho de
Deus, gerado pelo Pai antes de todos os séculos,
Deus de Deus, luz de luz, Deus verdadeiro de Deus
verdadeiro, gerado, não feito, de uma só substância
com o Pai;
luz de luz, verdadeiro de Deus de verdadeiro Deus,
gerado, não feito, de uma só substância com o Pai,
Pelo qual foram feitas todas as coisas que estão no
céu e as que estão na terra;
Pelo qual todas as coisas foram feitas;
O qual por nós homens e por nossa salvação, desceu,
se encarnou e se fez homem.
O qual, por nós homens e para a nossa salvação,
desceu dos céus: foi feito carne do Espírito Santo, no
seio da Virgem Maria, e se tornou homem.
E sofreu e ressuscitou ao terceiro dia, subiu ao céu e foi crucificado por nós sob o poder de Pôncio
69
Cf. SCHWIKART, Georg. Dicionário Ilustrado das Religiões. p. 32.
70
“Do grego “hairesis” = diferença, escolha. Tese que se desvia da doutrina comumente aceita (dogma).
As Religiões e Confissões religiosas definiram mais ou menos o que faz e o que não faz parte do seu
elenco doutrinário. Caso o membro da comunidade em questão sustente uma opinião fortemente
contrária, esta é condenada como heresia, conforme o princípio: Uma doutrina que leva ao erro, já é
errônea. - No caso de graves heresias, pode-se chegar até à exclusão da comunidade”. Cf. Ibidem p. 52.
71
İznik, Niceia na Antiguidade, é uma cidade situada na região de Mármara, província de Bursa, Turquia.
A antiga cidade foi o local onde se realizaram o Primeiro e o Segundo concílios de Niceia,
respectivamente em 325 e 787 d.C. Cf. https://pt.wikipedia.org/wiki/Iznik.
72
Cf. BETTENSON, Henry. Documentos da Igreja Cristã. São Paulo. pp. 62-64.
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Pilatos, e padeceu, e foi sepultado e ressuscitou ao
terceiro dia conforme as Escrituras, e subiu aos céus,
e assentou-se à direita do Pai.
E novamente deve vir para julgar os vivos e os
mortos.
E há de vir com glória, para julgar os vivos e os
mortos;
e o Seu reino não terá fim.
E no Espírito Santo.
E no Espírito Santo, Senhor e vivificador, que com o
Pai e o Filho conjuntamente é adorado e glorificado,
que falou pelos profetas.
E a quantos dizem: “Ele era quando não era”, e
“Antes de nascer, Ele não era”, ou que “foi feito do
não existente”, bem como a quantos alegam ser o
Filho de Deus “de outra substância ou essência”, ou
“feito”, ou “mutável”, ou “alterável”. A todos estes a
Igreja Católica e Apostólica anatematiza.
E na Igreja, una, santa, católica e apostólica.
Confessamos um só batismo para remissão dos
pecados. Esperamos a ressurreição dos mortos; e a
vida no século vindouro. Amém.
O que nos interessa, para o nosso estudo de Eclesiologia, é a última parte do
Credo Niceno-Constantinopolitano, que diz Igreja, una, santa, católica e apostólica.
2.1.1 Igreja Una.
Ao referir-se à Igreja como “Una”, não se pode confundir com a ideia de “uma
Igreja”. A Igreja como Una refere-se à unidade, e esta provem do próprio Deus que lhe
dá origem, pois, há um só Deus, um só Senhor, um só batismo, um só Espírito73
.
A unidade da Igreja não se refere a unidade denominacional e nem a união de
várias Igrejas em uma única Igreja formando uma megaIgreja mundial. A unidade da
Igreja refere-se aos alcançados pela graça de Deus, através da fé, ou seja, a abertura ao
acolhimento da ação de Deus expressa na salvação em Cristo74
.
O Espírito Santo é o responsável pela unidade da Igreja. Sendo assim, podemos
afirmar que a unidade da Igreja consiste na comunhão daqueles que só Deus sabe os
nomes e conhece, ou seja, uma Igreja invisível, o corpo místico de Cristo75
.
Este corpo místico de Cristo tem no texto de Ap 21,2-3 imagens que servem de
revelação sobre a Igreja como tenda, cidade, esposa, povo de Deus. Estas expressões
apontam para Deus como ponto final da unicidade e unidade que se comunicam com o
templo onde ele habita, a cidade cujo princípio é o próprio Deus, o esposo que chama
sua esposa trazendo-a a existência e consagrando-a, criando, desta forma, uma unidade.
Portanto, a Igreja é única porque Deus é UNO e ÚNICO em sim mesmo76
. Sendo assim,
podemos afirmar que o princípio fundamental da unidade da Igreja está no Deus Trino,
73
Cf. CALDAS, Carlos. Fundamentos da Teologia da Igreja. São Paulo. Editora Mundo Cristão. 2007. p.
23.
74
Ibidem. p. 24
75
Ibidem.
76
Cf. CONGAR, Yves. Eclesiologia Del Nuevo Testamento In Mysterium Salutis. Manual de Teologia
como história de La salvacion IV/1. La Iglesia. p. 382.
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aquele que é Pai, Filho e Espírito Santo. Deus Pai arquiteto do plano de salvação; Jesus
Cristo consumador do plano de salvação; e Espírito Santo santificador e unificador da
Igreja que prepara a Igreja una para seu encontro com o esposo Jesus Cristo.
2.1.1.1 Exemplo bíblico de Unidade da Igreja
Tomando como base os livros de Atos dos Apóstolos, podemos notar como era a
unidade da Igreja Primitiva. Podemos, assim, destacar três pontos; a) a Igreja tinha
unidade no ensino apostólico; b) a Igreja tinha unidade no plano de vida social; e c) a
Igreja tinha unidade na celebração do culto77
.
a) Unidade no ensino apostólico; essa unidade implica na aceitação por parte
da Igreja do ensino apostólico, através do qual era inserida unidade da fé e
confissão (cf. At 2,42; 1Cor 1,10; Rm 15,6; Ef 4,14ss).
b) Unidade no plano de vida social; essa unidade implica em uma
comunidade fraterna que se traduz numa forma de vida comum (cf. At
2,44-47); numa comunidade que voluntariamente repartia os seus bens (cf.
4,32-37; Hb 13,16); numa comunidade unida em sentimentos (cf. At 4,32;
Fl 2,2); numa comunidade que repartia o pão por causa de sua convivência
fraterna (cf. Mt 5,23-24; 18,19-20).
c) Unidade cúltica; essa unidade implica na oração e partilha do pão
eucarístico, através do qual os cristãos eram unidos a Cristo e entre si (cf.
1Cor 10,16-17).
A forma de unidade vivida pela Igreja primitiva nos leva a refletir em algo, que
hoje, torna-se escasso em nossa sociedade e atinge nossas famílias. Esse algo que nos
falta é o amor, que consideramos uma marca do evangelho pregado por Cristo e que a
Igreja apostólica cultivou. Prova disso é a forma de unidade que a Igreja primitiva vivia,
pois, esta vivia, como já elencamos acima: a unidade no ensino apostólico, sendo esta
permeada pelo amor, pois, amavam o ensino da palavra do Senhor proferida pelos
apóstolos; a unidade no plano de vida social também tinha como base o amor, pois,
com o amor fraternal podia-se repartir e tornar em comum os bens que tinham. Embora
hoje nossa realidade seja totalmente diferente, há cristãos que se tronaram amantes de si
mesmos e não repartem o que tem, com os que não tem, fechando os olhos e o coração
para os necessitados; e pôr fim a unidade cúltica nos mostra o quanto tinham o prazer
de orar, cultuar e comungar juntos. O comungar causava a união entre eles, porque
77
Cf. CONGAR, Yves. Eclesiologia Del Nuevo Testamento In Mysterium Salutis. Manual de Teologia
como história de La salvacion IV/1. La Iglesia. p. 387.
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repartiam, além dos bens que possuíam e com isso não havia necessitados entre eles, o
pão eucarístico, e o alimento que era comum nestas reuniões de comunhão.
Cristo como cabeça do corpo Igreja, lhe confere vida e, portanto, esta está sob o
seu domínio. Sendo assim, a Igreja, sob o domínio de Cristo, torna-se UNA. No entanto,
esta unidade é manifestada na palavra e nos sacramentos. Esta unidade não é
uniformidade de organização, doutrina ou vida, mas sim, no fator unificador Evangelho.
“As várias comunhões eclesiásticas são expressões diversas da Igreja Una”78
.
2.1.2 Igreja Santa.
“Se a Igreja é sinal de salvação, sacramento histórico do amor de Deus, seria uma
contradição que não fosse santa”. Assim se expressa o Teólogo Jon Sobrino79
acerca da
santidade da Igreja.
Demonstrar este atributo da santidade da Igreja é difícil, pois a mesma não é um
aglomerado de santos impecáveis, mas de pecadores redimidos por Cristo, composta ao
mesmo tempo por pessoas justas e pecadoras, fato este que pode ser visto em várias
Igrejas; a pecaminosidade de seus membros. Sendo assim, podemos dizer que a Igreja é
ao mesmo tempo santa e pecadora porque os seus membros também o são80
.
A Bíblia em algumas passagens do Novo Testamento demonstra que haviam
problemas terríveis na Igreja como: mentira (cf. At 5,1-11); divisões e rixas entre os
membros (cf. 1Cor 1,10-13); carnalidade entre os membros (cf. 1Cor 3,1-4);
imoralidade por parte de membro da Igreja (cf. 1Cor 5,1); discordância de ensino
doutrinário ( cf. 1Cor 15,12 ); falta de unanimidade entre irmãos (cf. Fp 4,2-3); inveja,
ambição, maldade, autoritarismo (cf. 3Jo 9-11); abandono do primeiro amor, desvios
doutrinários, prostituição sagrada, esfriamento espiritual (cf. Ap 2,4-5, 14-16, 20-23;
3,1-3, 14-19). Como, então, falar de santidade da Igreja diante de tais fatos?
Precisamos entender que santidade não reflete perfeição. Ser santo não é ser
perfeito, pois somente Deus é perfeito em todos os seus atos. A santidade da Igreja
refere-se ao seu crescimento (em graça) e fortalecimento dado por Deus que dia a dia
trabalha, através do Espírito Santo, para tirar as manchas do pecado que os seus
membros possuem. Em outras palavras, santidade é um processo, dependente da ação
do Espírito Santo que nela age, e não um estado de vida, pois na Igreja sempre haverá
78
Cf. AULÉN, Gustaf. A Fé Cristã. p. 274.
79
Cf. SOBRINO, Jon. Ressurreição da verdadeira Igreja. São Paulo: Loyola, 1982. Apud CALDAS,
Carlos. Fundamentos da Teologia da Igreja. p. 25.
80
Ibidem. p. 25. Cf. AULÉN, Gustaf. op. cit. p. 279.
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pessoas que não fazem parte do reino de Deus bem como de pessoas hipócritas que
vivem uma falsa santidade.
Portanto, “o homem não é detentor de qualquer santidade subjetiva própria”,
sendo “ao mesmo tempo justo e pecador”81
.
A Igreja é santa aos olhos do Senhor. Cada membro é santo pelos
méritos de Cristo. A condição de santos não se dá por méritos
próprios, mas pela graça de Deus que lhe é conferida. Em razão disso,
o Novo Testamento sempre se refere às igrejas como formadas por
“santos” (Rm 1,7; 1Cor 1,2; 2Cor 1,1; Ef 1,1; Fp 1,1; Cl 1,2)82
.
A Igreja é santa por estar no domínio de Cristo. Esta afirmativa implica em
afirmar a obra redentora de Cristo que torna a Igreja santa, porém não num caráter
externo de forma hierárquica, institucional, de sociedade fechada e limitada que alega
santidade fundamentada em suas próprias qualidades pessoais. A obra redentora de
Cristo torna a Igreja santa por seu amor redentor e pelo seu perdão. Confessar a fé numa
Igreja santa é confessar a fé na vitória de Cristo. Isso quer dizer que somente pela fé é
que podemos ver a santidade da Igreja83
.
A santidade da Igreja decorre do fato de o Senhor mesmo estar
presente nela e nela realizar a obra de redenção por Ele consumada
uma vez por todas. Ele tira os homens da servidão dos poderes do mal
e os leva para o novo contexto de vida na nova era da ressurreição84
.
A santidade da Igreja reside, também, no fato de que a mesma, embora viva e aja
neste mundo, não pertence a este mundo. Esta verdade fundamenta-se no fato que seus
membros, que vivem sob o domínio de Cristo, vivem uma perspectiva, na fé, de um
mundo superterreno. Esta ideia de santidade, que torna a Igreja não pertencente a este
mundo, defende a Igreja de tendências que podem confiná-la a este mundo85
.
Contudo, precisamos estar alertas quanto a alienação que pode vir desta santidade,
que faz com que a Igreja se feche para o que acontece em seu redor e faz com que seus
membros se fechem também para a vida.
A santidade da Igreja deve refletir o amor e a justiça divina, justamente pelo fato
da Igreja não ser deste mundo. Somente desta forma, a Igreja pode mostrar sua
verdadeira cidadania do reino de Deus, sendo luz de Cristo em um mundo cheio de
trevas, e não se fechando em si mesma.
81
Cf. AULÉN, Gustaf. A Fé Cristã. p. 278.
82
Cf. CALDAS, Carlos. Fundamentos da Teologia da Igreja. p. 26.
83
Cf. AULÉN, Gustaf. op. cit. p. 278.
84
Ibidem. p. 279.
85
Ibidem. p. 279.
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2.1.3 Igreja Católica
Antes de falar sobre o atributo “Igreja Católica”, vamos entender o que o termo
“Católica” significa. O termo Católica (o) deriva do grego καθολικος, (katolikos) e é
formada pela combinação de duas palavra gregas; kata (kata) – com sentido de
concernente, pertencente a; e o[lovj (ólos) com sentido de – totalidade, abrangente86
.
Sendo assim, podemos entender que o termo “católica” expressa um sentido; de
pertencer a uma totalidade, um todo, universal. Portanto, quando nos referimos ao
atributo da Igreja como “Igreja Católica”, estamos na verdade expressando o sentido de
autenticidade e universalidade da Igreja. A Igreja por ser católica é uma Igreja
universal, não pertencendo a uma localidade.
Nos primeiros séculos de sua história, a Igreja se denominava
“católica”, indicando sua mundialidade em contraste com o aspecto
limitado da igreja local. Esse é o sentido básico que aparece no Credo
Apostólico...creio [...] na santa igreja católica... O termo também
apontava para a preservação da pureza da ortodoxia doutrinária: os
cristãos católicos criam na plena divindade e na plena humanidade de
Jesus, em contraste com os “arianos”, que só aceitava a plena
humanidade do Salvador87
.
Diante de heresias como arianismo, fez-se necessário que a Igreja no séc. IV,
tivesse em seu credo uma afirmação de universalidade, para mostrar que o cristão
católico está legitimamente ligado à Igreja Católica e que não se separou dela como
herege.
Como entender, no sentido hodierno, o atributo de Igreja Católica? São Cirilo
(314-387), Bispo de Jerusalém no sec. IV d.C, em sua catequese define a catolicidade da
Igreja da seguinte forma:
A Igreja é chamada católica porque se estende por todo o mundo, de
um extremo da terra ao outro. E porque ensina completamente, e sem
quaisquer omissões, todas as doutrinas que devem ser conhecidas da
humanidade concernentes aos assuntos visíveis e invisíveis, terrestres
e celestes; e porque congrega todos os tipos de pessoas – soberanos ou
súditos, eruditos ou ignorantes – sob influência da verdadeira piedade;
e porque universalmente trata de todo tipo de pecado e o cura, seja
cometido pela alma seja pelo corpo [...] Ela (a igreja) é a noiva de
nosso Senhor Jesus Cristo, o Filho unigênito de Deus88
.
86
Cf. STRONG, James. Greek Dictionary of The New Testament. pp. 238, 244.
87
Cf. CALDAS, Carlos. Fundamentos da Teologia da Igreja. p. 27.
88
Catequese XVIII apud CALDAS, Carlos. Fundamentos da Teologia da Igreja. p. 28.
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Esta catequese aponta para um aspecto missionário da Igreja. A Igreja estendida
para as extremidades do mundo, revela a importância missionária, pois esta abrange
pessoas de países diferentes, com culturas e costumes diferentes.
A Igreja não está limitada a um território como um país ou cidade. A mensagem
do evangelho é universal, “porque o ato de Deus em Cristo tem significação e
propósitos universais”89
. A mensagem do evangelho, da mesma forma que passou dos
limites de Jerusalém por causa da perseguição a Igreja primitiva, deve ser pregada a
todos os povos, pois essa é a grande comissão que lhe foi conferida; pregar e fazer
discípulos em todo o mundo (cf. Mt 28,19; Mc 16,15). O caráter missionário de
inclusão no reino de Deus, imprime marca de autenticidade e torna a Igreja Católica.
2.1.4 Igreja Apostólica
Para melhor compreensão sobre a característica Igreja Apostólica, primeiramente,
esclareceremos o que significa o termo apóstolo e o que os apóstolos de Jesus
significam para a Igreja e sua sucessão histórica exercida pelos Bispos.
O termo apóstolo significa enviado90
. No cristianismo primitivo os apóstolos eram
homens e mulheres que gozaram de grande prestígio e autoridade por serem
testemunhas oculares do ministério, paixão e ressurreição de Jesus, quando estiveram
intimamente ligados a ele91
.
O apóstolo é serviço autorizado em nome e incumbência de Cristo.
Ele tem sua origem num ato historicamente único de missão (envio)
pelo Ressurreto. Sua tarefa é a pregação do evangelho fundado na
ressurreição de Cristo e que remete para a vida e obra de Jesus. Seu
objetivo é a congregação da igreja, a reunião do povo escatológico de
Deus fundado sobre esse testemunho único na história92
.
O último dos apóstolos de Jesus a morrer, por volta do ano 90, foi João o mais
jovem dentre eles. Conta a tradição que João morreu em Éfeso onde foi bispo de todos
89
Cf. AULÉN, Gustaf. A Fé Cristã. p. 282.
90
Apóstolo (avpo,stoloj), é literalmente, “enviado” (formado de apo, “de”, e stello, “enviar”). Enviado,
mensageiro. “A palavra é usada acerca do Senhor Jesus para descrever sua relação com Deus (cf. Hb 3.1;
Jo 17.3). Os doze discípulos escolhidos pelo Senhor para treinamento especial foram chamados assim (cf.
Lc 6.13; 9.10). Paulo, embora tivesse visto o Senhor Jesus (cf. 1Cor 9.1; 15.8), não tinha ‘acompanhado’
os Doze ‘todo o tempo’ do Seu ministério terrestre e, consequentemente, não era elegível para um lugar
entre eles, de acordo com a descrição de Pedro sobre as qualificações necessárias (cf. At 1.22, ARA).
Paulo foi comissionado diretamente pelo próprio Senhor, depois de sua ascensão, para levar o Evangelho
aos gentios”. Cf. VINE, W. E.; UNGER, M. F.; WHITE Jr., W. (Ed.). Dicionário Vine. Rio de Janeiro:
CPAD, p 407.
91
Cf. OLSON, Roger. História da Teologia Cristã. Ed. Vida. São Paulo. p. 25.
92
Cf. WIEDENHOFER, Siegfried. In Manual de Dogmática Vol 2. Eclesiologia. p. 123.
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os cristãos e das Igrejas da região da Ásia Menor93
. Desta forma, com o
desaparecimento dos apóstolos, surgiram os bispos que são os discípulos dos apóstolos,
também conhecidos na história da Igreja por “pais apostólicos”94
, pois conheceram um
ou mais apóstolos, mas não eram apóstolos.
Os Bispos foram nomeados pelos apóstolos e os sucederam diante das Igrejas por
eles fundadas, e mantiveram o ensino apostólico diante das heresias cismáticas que
ameaçavam e ameaçariam a Igreja nos séculos seguintes.
Portanto, após a era apostólica não se empregou mais o título apóstolo e na era
patrística permaneceu o entendimento que os apóstolos eram aqueles que foram
chamados por Jesus e testemunharam a sua ressurreição95
.
Como então a Igreja pode ser apostólica nos dias de hoje? A Igreja é Apostólica
por estar “edificada sobre o fundamento dos apóstolos”. É apostólica “por seguir a
doutrina dos apóstolos” (cf. At 2,42). É a doutrina da fé. Isso legitima a sucessão
apostólica, mas não no sentido episcopal e sim no sentido do depósito da fé, ou seja, o
evangelho apostólico (cf. 2Tm 2,2) aquele que os apóstolos pregaram96
.
A apostolicidade da Igreja da mesma forma como sua catolicidade, possui aspecto
missionário. Esse aspecto missionário relacionado a apostolicidade é o dever de manter
a estrutura apostólica no sentido de ser enviada, de ser missionária.
A Igreja somente é igreja se ela seguir ao testemunho apostólico e se
ela der continuidade perante o mundo, em pregação, culto e
comunhão, ao testemunho apostólico que proporciona ao Senhor
ressurreto nova forma histórica atual97
.
Assim como a Igreja primitiva estava fundamentada no ensino e prática apostólica
e transcendeu os limites de onde se originou (Jerusalém), assim deve ser a Igreja
hodierna em seu dever de conservar a transmissão do verdadeiro evangelho pregado por
Jesus sem, no entanto, limitá-lo em algum local geográfico.
93
Cf. OLSON, Roger. História da Teologia Cristã. p. 25.
94
A categoria de “pais apostólicos” consiste em pessoas e documentos que interpretam e pregaram a
mensagem apostólica na primeira geração depois dos apóstolos, que foi cercada de falsos evangelhos e
ataques de céticos pagãos. Quem foram os pais apostólicos? A partir do século XVI, os historiadores
incluem nessa categoria entre oito e dez autores e documentos anônimos. (Os historiadores
tradicionalmente referem-se a certos documentos anônimos como “pais apostólicos”). Entre os aceitos por
todos estão Clemente, Inácio, Policarpo, o Didaquê [o ensino dos doze apóstolos], epístola de Barnabé e
O pastor de Hermas. Outros comumente citados e descritos como pais apostólicos são a chamada
Segunda epístola de Clemente, de autor desconhecido, a Epístola a Diogneto e fragmentos de escritos de
Papias. Cf. OLSON, Roger. História da Teologia Cristã. p. 40.
95
Cf. CALDAS, Carlos. Fundamentos da Teologia da Igreja. p. 29.
96
Ibidem.
97
Cf. WIEDENHOFER, Siegfried. In Manual de Dogmática Vol 2. Eclesiologia. p. 123.
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2.2 Atos fundamentais da Igreja
A Igreja é estabelecida em sua existência e missão em atos fundamentais como:
pregação e testemunho; culto divino, sacramentos e oração; e serviço do amor e
comunhão fraterna. A Igreja é resultado desses atos, pois na sua missão de evangelizar,
a Igreja testemunha, anuncia e proclama o evangelho de Jesus Cristo, porque ela própria
é criação da palavra de Deus. A Igreja também celebra o culto divino e os sacramentos,
pois celebra e rememora o sacrifício de Cristo e volta a ser constituída novamente. A
Igreja tem a incumbência da diaconia e comunhão, porque a mesma é resultado do
amor–serviço de Jesus e de todos os que o seguiram98
.
2.2.1 Pregação e testemunho
A Igreja por ter acolhido, através dos apóstolos, a palavra de Cristo, ou seja, a boa
nova anunciada, recebe a incumbência de dar continuidade a esse testemunho e anuncio.
Não poderá existir fé salvadora, ou seja, a fé que conduz a Cristo se não houver anuncio
e testemunho.
A palavra anunciada e testemunhada pela Igreja deve gerar na mesma comunhão e
experiência com Deus, pois esse anuncio e testemunho só se tornará vivo e eficaz nos
ouvintes do evangelho se tiver vida e eficácia no anunciante, a Igreja.
2.2.2 Culto divino, sacramentos e oração
A Igreja tem a missão e a incumbência de no culto divino anunciar a palavra da
conciliação, inserir novos crentes através do Batismo dentro da comunidade
conciliadora, orar e prestar ações de graças nesta comunidade conciliadora e através da
Eucaristia celebrar a memória da morte e ressurreição de Cristo. Tudo isto deve
acontecer com fé e responsabilidade por toda a comunidade eclesial99
.
Culto divino, sacramentos e oração, como uma incumbência da Igreja, devem
ocorrer por causa da experiência dos membros da Igreja com Deus através do sacrifício
vicário de Cristo. Os membros da Igreja são pessoas reconciliadas com Deus (cf. Rm
5,10; 2Cor 5,18; Col 1,20-22) e por isso o cultuam, celebram a morte e ressurreição de
Cristo e oram exercendo a sua comunhão comunitária e individual.
98
Cf. WIEDENHOFER, Siegfried. In Manual de Dogmática Vol 2. Eclesiologia. p. 104.
99
Ibidem. p. 105.
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2.2.3 Diaconia e comunhão fraternal
A Igreja, como uma comunidade, tem a incumbência da diaconia e comunhão
fraterna. Estas são consequência da experiência prévia, vivida por seus membros, no
amor de Deus. É nesta diaconia ou serviço do amor e na comunhão fraterna em que a
Igreja deve empenhar-se na incumbência de discípular os seus membros para que haja
comunhão fraterna através do amor – serviço. No entanto, deve-se ter consciência de
que isto só será possível se houver por parte da comunidade eclesial a responsabilidade
e a fé100
.
100
Cf. WIEDENHOFER, Siegfried. In Manual de Dogmática Vol 2. Eclesiologia. p. 106.
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3
Sacramentos da Igreja
3.1 Significado de sacramento e sua abordagem histórica
Os sacramentos ocupam uma posição de destaque, pois fazem parte da liturgia da
Igreja. O termo sacramento não é encontrado na Bíblia no sentido como empregamos
hoje. Este é a tradução do grego musth,rion (mysterion)101
, traduzido para o latim na
Vulgata Latina102
, como sacramentum103
.
O termo mysterion na cultura grega era empregado em sentido cultico. Tem o
significado de fechar os olhos ou a boca, refletindo uma reação que não se pode explicar
em palavras. Há no Novo Testamento este entendimento em algumas passagens: “o
poder da ilegalidade (cf. 2Ts 2,7); a transformação dos seres humanos por ocasião da
parusia104
(volta) de Cristo (cf. 1Cor 15,51); a futura história de Israel (cf. Rm 11,25s)”.
101
O termo grego musth,rion (mysterion) ocorre 17 vezes (cf. Mc 4,11; Rm 11,25; 1Cor 2,1; 15,51; Ef
1,9; 3,3; 5,32; 6,19; Cl 1,26; 4,3; 2Ts 2,7; 1Tm 3,9,16; Ap 1,20; 10,7; 17,5; 17,7).
102
“No século I d.C., os livros bíblicos já circulavam em latim, pois era a língua do Império romano. As
versões bíblicas nesta língua ficaram conhecidas como Vetus Latina que seguia uma tradução do AT, a
partir do texto grego da LXX. A Vetus Latina é uma expressão usada pelos estudiosos, para falar das
várias tradições da versão latina da Bíblia que circularam durante os séculos I-VIII d.C. A Vetus Latina é
anterior à Vulgata e continuou circulando depois dela. A sua tradução baseia-se, para o AT, na versão dos
LXX. Após o século XVI, uma versão latina da Bíblia tornou-se o texto oficial da Igreja Católica Romana
ou do rito Ocidental, conhecida como Vulgata. A Vulgata deve-se ao interesse do Papa Damaso I (366-
384), que queria fazer uma revisão da Bíblia em latim, a partir dos manuscritos em hebraico, aramaico e
grego. Tal tarefa foi confiada a um ilustre personagem, São Jerônimo, que se transferiu para a Palestina,
instalando-se em Belém, numa gruta próxima daquela que se acredita ter sido o local onde nasceu Jesus
Cristo. São Jerônimo levou mais de vinte anos para fazer as traduções. A Vulgata foi oficializada,
solenemente, pelo magistério da Igreja Católica durante o Concílio de Trento (1545-1563), após uma
nova revisão do texto, para corrigir os erros que, sucessivamente, foram cometidos pelos copistas. A
versão oficial, texto padrão estampado na Bíblia de Gutemberg, entre os anos 1452-1455, servirá de base
para as várias traduções que serão feitas nas diferentes línguas. A Vulgata, para o NT, totaliza 27 livros e
46 para o AT”. Cf. FERNANDES, Leonardo Agostini. A Bíblia e a sua mensagem. Introdução à leitura e
ao estudo da Bíblia. pp. 28-29.
103
O termo sacramentum ocorre na vulgata latina dez vezes, sendo quatro vezes no Antigo Testamento
(cf. Tb 12,7; Dn 2,30, 47; 4,6) e no Novo Testamento ocorre seis vezes (cf. Ef 1,9; 3,3; 5,32; 1Tm 3,6; Ap
1,20; 17,7).
104
“O vocábulo grego parousia (de páreimi: estar presente, estar aí, chegar) é originalmente referido tanto
para a descida ou manifestação de pessoas divinas na terra (por ocasião de uma festa religiosa ou por uma
intervenção milagrosa), quanto para as visitas que reis e príncipes fazem às cidades submetidas ao seu
império. O sentido principal do termo, conforme a cultura Grega, é de visita, chegada, advento de um
soberano ou de uma divindade. Serve tanto para ser empregado como conceito político, quanto religioso.
Esta identificação entre o profano e o sagrado deve-se ao fato de que em ambiente helenístico as figuras
reais são consideradas com acentos divinos. O que sempre de destaca para a parousia é o seu caráter
triunfal e glorioso. Trata-se de uma manifestação em poder e glória, que tem um acento explicitamente
jubiloso e festivo. No Novo Testamento, o conceito é utilizado para descrever a futura vinda de Cristo,
Senhor de tudo e de todos (Pantocrátor) do final dos tempos. As descrições desse advento valem-se das
imagens da manifestação gloriosa do imperador romano. Na época imperial, a parusia do César podia
inclusive dar lugar a uma nova era, comportando uma virada determinante da história. O imperador era
aclamado em sua parusia como senhor e portador da salvação. O povo aguardava com expectativa a sua
vinda, porque da mesma se esperava conseguir benefícios excepcionais. Cf. BRUSTOLIN, Leomar
Antônio. Quando Jesus vem...: a parusia na escatologia cristã. São Paulo-SP. Ed. Paulus. 2001. p. 17.
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No entanto, o termo mysterion não aparece relacionado a atos litúrgicos. Por
conseguinte, o entendimento de mysterion faz-se necessário para “descrever a relação de
sacramentos com o evento crístico e com o mistério de sua presença na Igreja” 105
.
Quanto a palavra latina sacramentum, tomando como base o seu radical sacr em
emprego religioso, significa: “destinar algo ou alguém à esfera do sagrado, ‘consagrar’;
sacramentum é tanto o ato de consagração como também o meio consagrador”.
Etimologicamente é “algo que santifica o que é santo”. No uso linguístico, na
Antiguidade Latina, sacramentum é empregado em sentido jurídico como: juramento
em um processo civil; juramento a bandeira no exército; e juramento de partidos em
litígio em relação a quantia de dinheiro depositada como caução de processo jurídico.
Nestes três exemplos, sacramentum tem conotação religiosa, pois “juramento e
juramento à bandeira entregam a pessoa ao juízo da divindade, a caução processual é
destinada a um santuário no caso de uma derrota” 106
.
Com o decorrer da história da Igreja, o significado de sacramento passou por um
processo de desenvolvimento, quanto ao seu entendimento.
Na patrística107
Santo Agostinho († 430) denomina sacramentos como “sinais
dados, sinais sagrados, porque apontam para uma realidade sagrada”. Ou seja, através
de coisas visíveis o crente é conduzido a realidade invisível. Nesta definição o batismo é
tomado como exemplo, pois, ao ser ministrado, a água “toca o corpo e lava o coração”.
A água é o sinal visível que aponta para uma realidade invisível, a purificação. No
entanto, só terá esse efeito mediante a palavra que neste caso é a fórmula batismal em
nome da Santíssima Trindade. Esta palavra tem fundamentação teológica, pois é
“palavra de fé da Igreja, palavra extraída da Bíblia, em última análise, palavra de Cristo.
Daí tem seu poder”108
.
A ampla conceituação de sacramento na Igreja antiga vai perdurar até o século
XII, quando começam a surgir os primeiros tratados sobre os sacramentos. O teólogo
105
Cf. NOCKE, Franz-Josef. In Manual de Dogmática Vol 2. Doutrina Geral dos Sacramentos. pp. 173-
174.
106
Ibidem. pp. 173-178. Cf. OTT, Ludwig. Manual de Teologia Dogmática. Editoral Herder. Barcelona.
Espanha. 1966. p. 486.
107
A teologia patrística abarca o período de seis séculos, compreendendo desde a geração imediatamente
posterior aos apóstolos até a dos que prepararam a teologia medieval. A teologia patrística viveu fases
distintas da seguinte forma: séc. I-II Padres apostólicos (Clemente, Inácio, Policarpo, Didaché); séc. II
Apologistas (Justino, Taciano, Teófilo, Carta a Diogneto); séc. II-III Reflexão sistemática (Tertuliano,
Orígenes, Irineu, Hipólito); séc. III-IV Escolas teológicas (Alexandria: Atanásio, Cirilo. Capadócia:
Basílio, Gregório de Nazianzo, Gregório de Nissa. Antioquia: Teodoro, Cirilo de Jerusalém, João
Crisóstomo); séc. IV-V Fase de esplendor: (Agostinho, Jerônimo, Ambrósio, Leão Magno, Efrém); séc.
VI-VII Final (Gregório Magno, Isidoro de Sevilha, Boécio, João Damasceno). Cf. LIBÂNIO, J. B;
MURAD, Afonso. Introdução à Teologia. Perfil, enfoques, tarefas. Ed. Loyola. São Paulo-SP. pp.
115,124.
108
Cf. NOCKE, Franz-Josef. op.cit. p. 181.
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Hugo de São Vitor († 1140), afirma que os sacramentos “contem a graça que sinalizam;
portanto, não são apenas sinais, mas também vasos da graça”. Esta figura do vaso tem
significado terapêutico na doutrina sacramental da escolástica109
, e a graça sacramental
é entendida como remédio contra o pecado e suas consequências. Isto faz dos
sacramentos recipientes de medicamento. Hugo de São Vitor dá uma definição mais
restrita de sacramento em sua obra sacramentum christianae fidei (sacramento da fé
cristã);
sacramento é um elemento material, apresentado exteriormente
perceptível aos sentidos e que, em virtude de uma semelhança,
representa, em virtude da instituição, significa e em virtude de uma
consagração santificadora, contém uma graça espiritual invisível110
.
Outro teólogo escolástico, Pedro Lombardo († 1160) afirma que sacramento não é
somente sinal, mas causa de graça. Já Tomás de Aquino († 1274), defende que
sacramentos “são instrumentos na mão de Deus. O próprio Deus permanece sendo o
verdadeiro sujeito do agir da graça; no entanto, os sacramentos não são necessários
apenas em virtude de uma ordem divina, mas em virtude da causa em si”111
.
Entre os teólogos protestantes há um entendimento diferente em relação a
sacramento. Este refere-se a fórmula teológica sacramental da escolástica, ex opere
operato, que quer dizer, que independente da fé do ministrante e do recebedor, o
sacramento não perde a sua eficácia, pois é o agir de Deus que confere ao sacramento a
sua eficácia. Esta fórmula “quer deixar claro que nos sacramentos o sujeito da ação não
é o ser humano, e, sim, Deus, respectivamente Cristo”112
.
A refutação dos teólogos protestantes em relação a fórmula teológica sacramental
da escolástica, ex opere operato, está no argumento que os sacramentos necessitam de
109
A teologia escolástica medieval atravessou praticamente oito séculos, marcando ainda presença
durante a idade moderna. Pode-se identificar três grandes fases; a transição e gestação da dialética, a
grande escolástica e a escolástica tardia. Séc. VII-X gestação da escolástica; séc. XI-XII inícios da
escolástica (Anselmo de Cantuária, Pedro Abelardo, Pedro Lombardo); séc. XIII alta escolástica (Escola
Dominicana: Alberto Magno, Tomás de Aquino, Mestre Eckart); séc. XIV-XV escolástica tardia (Escola
franciscana: Boaventura, Duns Escoto, Guilherme de Ockham, Gabriel Biel). Cf. LIBÂNIO, J. B;
MURAD, Afonso. Introdução à Teologia. Perfil, enfoques, tarefas. pp. 127,131.
110
Na época da pré-escolástica ainda proliferam ideias muito divergentes sobre o número dos
sacramentos. Os bispos Fulberto de Chartres († 1028) e Bruno de Würzburg († 1153) admitem somente
dois: Batismo e Eucaristia, enquanto Bernardo de Claraval († 1153) admite dez (entre eles o lava pés), e o
cardeal Pedro Damião († 1072) quer doze (inclusive a unção do rei). Outros se movem entre essas
grandezas. Somente com o interesse sistematizante da escolástica primitiva surgem os primeiros tratados
sobre os sacramentos, e, com eles, tentativas de definição, bem como (por volta da metade do século XII)
a fixação em sete. Cf. NOCKE, Franz-Josef. In Manual de Dogmática Vol 2. Doutrina Geral dos
Sacramentos. p. 181.
111
Ibidem. p. 182.
112
Ibidem. pp. 183-184.
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Estudo de eclesiologia

  • 1. Eclesiologia Fundamentação Bíblica, Características e Sacramentos da evkklhsi,a de Jesus Cristo Autor: Joab Martins de Lima Bacharel em Teologia pelo Instituto Metodista Bennett. Mestre em Teologia Bíblica pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RIO). Julho 2016 Joab Martins de Lima Joab Martins de Lima 2018.08.26 01:27:30 -04'00'
  • 2. Eclesiologia Página 2 Copyright © 2016 Joab Martins de Lima - todos os direitos reservados. joablimateologo@gmail.com Sumário Introdução..................................................................................................................................... 3 1 Fundamentação bíblica de Igreja............................................................................................... 6 1.1 Antecedentes no Antigo Testamento ................................................................................. 6 1.2 Significado de “evkklhsi,a” antes da literatura neotestamentária....................................... 8 1.3 O termo “evkklhsi,a” – significado e emprego no Novo Testamento. ................................. 9 1.3.1 “evkklhsi,a” no Evangelho de São Mateus................................................................... 11 1.3.1.1 Breve análise da Perícope de Mt 16, 13-20 ....................................................... 12 1.3.1.2 Breve análise da Perícope de Mt 18,15-18. ....................................................... 15 1.3.2 Considerações sobre a fundação da Igreja. ................................................................ 16 1.3.3 A Igreja (“evkklhsi,a”) em Atos dos Apóstolos (Igreja Primitiva) .............................. 18 1.3.4 Aspectos de Igreja (“evkklhsi,a”) nos escritos paulinos............................................... 20 2 Características e atos fundamentais da Igreja. ........................................................................ 24 2.1 O credo Niceno-Constantinopolitano ............................................................................... 24 2.1.1 Igreja Una................................................................................................................... 25 2.1.1.1 Exemplo bíblico de Unidade da Igreja............................................................... 26 2.1.2 Igreja Santa................................................................................................................. 27 2.1.3 Igreja Católica ............................................................................................................ 29 2.1.4 Igreja Apostólica ........................................................................................................ 30 2.2 Atos fundamentais da Igreja ............................................................................................. 32 2.2.1 Pregação e testemunho............................................................................................... 32 2.2.2 Culto divino, sacramentos e oração............................................................................ 32 2.2.3 Diaconia e comunhão fraternal................................................................................... 33 3 Sacramentos da Igreja.............................................................................................................. 34 3.1 Significado de sacramento e sua abordagem histórica..................................................... 34 3.2 Sacramento do Batismo .................................................................................................... 38 3.2.1 Conceito de batismo................................................................................................... 40 3.2.2 Abordagem histórica sobre o batismo........................................................................ 41 3.2.3 Abordagem teológica sobre o batismo. ...................................................................... 43 3.3 Sacramento da Eucaristia (Ceia do Senhor)...................................................................... 44 3.3.1 Conceito de Eucaristia................................................................................................ 44 3.3.2 Abordagem histórica sobre a Ceia do Senhor. ........................................................... 45 3.3.3 Abordagem teológica sobre a Ceia do Senhor. .......................................................... 49 Conclusão.................................................................................................................................... 53 Referências bibliográficas ........................................................................................................... 58
  • 3. Eclesiologia Página 3 Copyright © 2016 Joab Martins de Lima - todos os direitos reservados. joablimateologo@gmail.com Introdução Eclesiologia é o estudo de tudo que se refere a Igreja. Eclesiologia é uma palavra composta pelos termos gregos evkklhsi,a (Igreja) e logia (conhecimento de; explicação racional de; estudo de). De acordo com esses dados, eclesiologia teria como definição; explicação racional de Igreja, ou Estudo de Igreja. A Cristologia e a Pneumatologia são os referenciais bíblico – teológico para a Eclesiologia, pois Igreja é uma realidade espiritual. Eclesiologia é o Estudo da Igreja, em relação a sua origem, doutrina, relacionamento com o mundo, salvação, forma de governo, crises enfrentadas, papel social...etc. O estudo da Eclesiologia geralmente é tratado pela Teologia Sistemática, que é o ramo da teologia que descreve de forma ordenada, racional e coerente verdades da fé cristã, em “tratados dogmáticos” por muitas vezes extensos. Há por exemplo tratados eclesiológicos que ultrapassam duzentas páginas. É, na verdade, um estudo muito extenso que abrangeria tempo para tratar dos diversos assuntos e pesquisa sobre variadas questões que poderiam advir do seu estudo. Em poucas páginas, julgamos que não seria possível tratar um assunto tão extenso e interessante sobre a Igreja. A eclesiologia em sua pesquisa sempre fará uso recorrente da história da Igreja, em todos os seus momentos, seja, nos pais apostólicos, patrística grega e latina, escolástica, reforma e contra reforma, concílios ecumênicos até o concílio vaticano II. Como podemos notar é um período longo e que nos leva a afirmar que, eclesiologia abrange história da Igreja. É na história da Igreja que nasce a eclesiologia. O primeiro tratado sobre eclesiologia foi publicado em 1301-1302 por Tiago de Viterbo na obra intitulada De regimine christiano. (Cf. NINOT-PIÉ, Salvador. Introdução à Eclesiologia. p. 13). O nosso estudo não se propõe a esgotar o tema eclesiologia, mas de aborda-lo de maneira mais simples possível sem deixar de se aprofundar nos temas propostos nos capítulos que foram desenvolvidos. As notas explicativas em notas de rodapé têm o objetivo de esclarecer termos e apresentar informações a respeito de períodos da história da Igreja, ocorrências de palavras empregadas na Bíblia, bem como de referências bíblicas. Por isso, é necessário que o leitor faça uso das mesmas, pois irá encontrar informações importantes que não estão inseridas no texto principal. Propomos a divisão do tema de nosso estudo em três capítulos, os quais procuramos articulá-los entre si.
  • 4. Eclesiologia Página 4 Copyright © 2016 Joab Martins de Lima - todos os direitos reservados. joablimateologo@gmail.com No primeiro capítulo 1 Fundamentação bíblica de Igreja a abordagem será em estudar no Antigo e Novo Testamento a fundamentação terminológica dos termos que se encontram na literatura bíblica referentes a Igreja. O estudo destes termos, tanto no hebraico quanto no grego serão abordados separadamente. Assim, em 1.1 Antecedentes no Antigo Testamento a raiz do termo hebraico lhq será estudada tanto como verbo e como substantivo, abordando o seu uso pelos escritores veterotestamentários. Em 1.2 Significado de “evkklhsi,a” antes da literatura neotestamentária, a abordagem terá foco no significado de evkklhsi,a no grego clássico, passando logo após a abordagem feita em 1.3 O termo “evkklhsi,a” – significado e emprego no Novo Testamento onde partiremos da definição do termo, para a sua aplicação no Novo Testamento em textos do Evangelho de São Mateus em 1.3.1 “evkklhsi,a” no Evangelho de São Mateus. Nesta parte do estudo fez-se necessária uma abordagem de dois textos do Evangelho de São Mateus, onde o termo evkklhsi,a aparece, tratadas respectivamente em 1.3.1.1 Breve análise da Perícope de Mt 16,13-20 e em 1.3.1.2 Breve análise da Perícope de Mt 18,15-18. A palavra evkklhsi,a encontrada nos lábios de Jesus no Evangelho de São Mateus, levou-nos a abordagem sobre a fundação da Igreja tratada em 1.3.2 Considerações sobre a fundação da Igreja. O estudo segue, então, para a última parte do primeiro capítulo fazendo considerações sobre a evkklhsi,a em 1.3.3 A evkklhsi,a em Atos dos Apóstolos (Igreja Primitiva), tendo como foco o comportamento da Igreja Primitiva e em 1.3.4 Aspectos de Igreja (evkklhsi,a) nos escritos paulinos onde três aspectos são usados em referência a Igreja; Corpo de Cristo, Povo de Deus, Templo de Deus. O segundo capítulo, 2 Características e atos fundamentais da Igreja está dividido em duas partes conforme seu título. As características da Igreja estão baseadas na confissão do Credo do segundo concílio ecumênico realizado em Constantinopla no ano 381 d.C. Tratamos disso no 2.1. O credo Niceno-Constantinopolitano, onde os dois credos são colocados lado a lado para possível comparação. É neste credo que as quatro características da Igreja são enumeradas e serão estudadas separadamente. O primeiro estudo em 2.1.1. Igreja Una e, logo após tomamos um exemplo bíblico de unidade em 2.1.1.1 Exemplo bíblico de unidade da Igreja, que é um comentário sobre a Igreja Primitiva no livro de Atos dos Apóstolos. A segunda característica a ser estudada será em 2.1.2. Igreja Santa, seguida de 2.1.3. lgreja Católica, e 2.1.4. Igreja Apostólica. Terminada esta primeira parte que tratou das características da Igreja, passaremos a um breve comentário sobre 2.2. Atos fundamentais da Igreja,
  • 5. Eclesiologia Página 5 Copyright © 2016 Joab Martins de Lima - todos os direitos reservados. joablimateologo@gmail.com enumerados da seguinte forma: 2.2.1. Pregação e testemunho, 2.2.2. Culto divino, sacramentos e oração, 2.2.3. Diaconia e comunhão fraternal. O último capítulo 3 Sacramentos da Igreja, encerra o nosso estudo. Estudaremos primeiro em 3.1. Significado de sacramento e sua abordagem histórica, abrangendo sua tradução do grego para o latim usado na Vulgata Latina, seguido da abordagem histórica desde a patrística, passando pela escolástica até aos reformadores que aceitaram somente dois sacramentos que a Igreja Evangélica herdou. O primeiro deles 3.2. O sacramento do Batismo, fazendo uma rápida abordagem sobre o elemento usado no batismo, a água, e o seu uso na Bíblia. Segue-se para o 3.2.1. Conceito de Batismo, onde terá atenção especial a sua origem no grego profano e no grego bíblico para entendermos mais à frente o seu sentido. Dando continuidade ao nosso estudo, seguirá 3.2.2 Abordagem histórica sobre o batismo, passando pela Igreja do século I até os inícios do século III abordando sobre a sua prática na Igreja. Encerrando o estudo do batismo faremos em 3.2.3 Abordagem teológica sobre o batismo onde trataremos do sentido do batismo cristão. O último tema a ser estudado no capítulo três será em 3.3. O sacramento da Eucaristia (ceia do Senhor) que abordará em 3.3.1 Conceito de Eucaristia que será tratado na sua etimologia. Segue-se em 3.3.2 Abordagem histórica sobre a Ceia do Senhor que fará um percurso desde os antecedentes da páscoa judaica até ao pensamento dos reformadores. Por último em 3.3.3 Abordagem teológica sobre a Ceia do Senhor, faremos uma tentativa de abordar o sentido da eucaristia na ceia do Senhor.
  • 6. Eclesiologia Página 6 Copyright © 2016 Joab Martins de Lima - todos os direitos reservados. joablimateologo@gmail.com 1 Fundamentação bíblica de Igreja 1.1 Antecedentes no Antigo Testamento O vocábulo Igreja tem seus antecedentes provenientes do termo hebraico lh'q' 1 (qähäl). A raiz do termo hebraico lhq, traduzida para o grego pela LXX2 como evkklew3 (ekkleö), é empregada no Antigo Testamento como verbo ou substantivo4 . Como verbo lh;q' (qähal) tem o sentido de “reunir-se, congregar-se, juntar-se, amotinar-se, concentrar-se” (Ni), “congregar, convocar, reunir” (Hi)5 . Expressa, portanto, a ideia de reunir um grupo de pessoas tais como o povo (cf. Dt 4,10), autoridades e anciãos (cf. Dt 31,28) e as tribos de Israel (cf. 1Rs 12,21), para um propósito seja ele: defesa mútua (cf. Est 8,11; 9,2; 15-16,18); entrar em guerra (cf. Js 22,12; Jz 20,1); adorar (cf. 2Cr 20,26); pedir a ídolos (cf. Êx 32,1); ungir Arão (cf. Lv 8,4); armar a tenda da congregação (cf. Js 18,1); transportar a arca até o templo (cf. 1Rs 8,2; 2Cr 5,3); juntar uma turba contra alguém (cf. Jr 26,9); rebelar-se contra alguém (cf. Nm 16,3; 20,2; 2Sm 20,14); recenseamento (cf. Nm 1,18); purificação dos levitas (cf. Nm 8,9); para fazer sair água da rocha (cf. Nm 20,8); para ouvir as palavras da lei (cf. Êx 35,1; cf. Dt 31,12,28), e para ouvir a mensagem de despedida de Moisés (cf. Dt 4,10)6 . 1 Substantivo masculino singular absoluto. 2 A sigla LXX refere-se a Septuaginta ou Bíblia dos Setenta que é a tradução do texto do Antigo Testamento Hebraico para o Grego por volta dos séculos III e II a.C. Esta tradução foi feita, segundo a lenda que se encontra no escrito extra canônico chamado Epístola a Aristeias {8.1.8}, por 70 sábios judeus em Alexandria no Egito, estes por sua vez, incentivados pelo rei egípcio Ptolomeu II. A Septuaginta (LXX) ou Bíblia dos Setenta contém livros a mais que a Bíblia Hebraica, os chamados livro “deuterocanônicos”, aceito por cristão ortodoxos e em parte pelos católicos. Cf. KONINGS, Johan. A Bíblia, sua origem e sua leitura. Petrópolis-RJ: Ed. Vozes 8ª edição, 2014. p.18. 3 Este vocábulo grego formado pela preposição evk (fora) junto ao verbo grego kalew (chamar, chamar para fora, chamar de) dá o sentido de chamar para fora. Cf. RUSCONI, Carlo. Dicionário do Grego do Novo Testamento. São Paulo-SP: Ed. Paulus 2ª edição, 2005. pp.153, 247. Na LXX kalew é usado com frequência para “nomear coisas” (cf. Gn 1,5,8,9, “dia”, “noite”, “céu”, “terra”; cf. Gn 2,19 “os animais”) ou pessoas (cf. Gn 25,26, Jacó; cf. Gn 29, 32-35; 30,6-24, “os filhos de Jacó) ou cidades (cf. 2Sm 5,9 “a cidade de Davi”) ou qualidades (cf. Is 35,8 um caminho é chamado santo, e em Êx 12,16 um dia; Is 56,7, onde o templo é chamado casa de oração). Cf. COENEN, Lothar. “Chamar kalew” DITNT. p.350. 4 Na forma verbal “lhq” é mais frequente em duas conjugações do verbo hebraico, a saber, Nifal (Ni) e Hifil (Hi) Cf. ALONSO SCHÖKEL, Luis. “lhq” DBHP, p. 573. “O verbo ocorre 39 vezes nas formas do nifal e do hifil, tendo o sentido de “reunir-se” ou “reunir”. A raiz lhq aparece 13 vezes no material extra bíblico de Qumran, referindo-se a reuniões e a grupos de vários tipos, sendo que em apenas uma ocasião a palavra aparece num contexto de adoração, fazendo paralelo com o uso encontrado em Salmos 22,23”. Cf. LEWIS, Jack P. “lh'q'” DITAT, p.1326. 5 No Nifal ocorre em: Ex 32,1; Lv 8,4; Js 18,1, 22,12; Jz 20,1; 2Sm 20,14; 1Rs 8,2; Est 8,11, 9,2,15,18; Nm 16,2, 17,7, 20,2; Jr 26,9; Ez 7,8. No Hifil ocorre em: Ex 35,1; Lv 8,3; Nm 1,18, 20,8; Dt 4,10; 1Rs 8,1; Ez 38,13; Jó 11,10. 6 Cf. LEWIS, Jack P. “lh'q'” DITAT, p.1326.
  • 7. Eclesiologia Página 7 Copyright © 2016 Joab Martins de Lima - todos os direitos reservados. joablimateologo@gmail.com Como substantivo lh'q' (qähäl), transmite a ideia de assembleia, grupo, congregação e a LXX o traduz por evkklhsi,a (ekklësia), embora em 36 casos lh'q' (qähäl) é traduzido por sunagwgh, (synagogëº)7 . O substantivo lh'q' (qähäl) designa uma assembleia de qualquer espécie e objetivo8 , mas especialmente uma assembleia que objetive propósitos religiosos como ocorre na experiência do Horebe, chamado de “dia da congregação” (cf. Dt 9,10; 10,4; 18,16), em ocasiões de festas, jejum e adoração (cf. 2Cr 20,5; 30,25; Ne 5,13; Jl 2,16)9 . Expressa, portanto, uma assembleia cerimonial que abarca o resultado da aliança feita no Sinai por uma comunidade histórica, ou seja, o povo de Israel10 . É importante destacar que o substantivo lh'q' (qähäl) pode designar uma congregação como corpo organizado, como demonstrado abaixo:  laer"f.yI lh;q.-lK' (Kol-qühal yiSrä´ël) toda congregação de Israel (cf. Dt 31,30)  ~yhil{a/h' lh;q.Bi (Biqhal hä´élöhîm) congregação de Deus (cf. Ne 13,1)  hw"hy> lh;q.-l[; (`al-qühal yhwh{´ädönäy}) sobre a congregação do Senhor (cf. Nm 16,3). No Antigo testamento o sintagma hw"hy> lh;q. (qühal yhwh{´ädönäy}) (cf. Dt 23, 2- 4; Mq 2,5; 1Cr 28,8), que a LXX traduz por evkklhsi,an kuri,ou (ekklësia kyriou) que significa Assembleia do Senhor, é o que mais se aproxima do que hoje conhecemos por “Igreja do Senhor”11 . 7 Cf. LEWIS, Ibidem. Em Gn, Lv e Nm lh'q' (qähäl) é traduzido por sunagwgh, (synagogëº) 21 vezes e em 15 passagens de Ez, com exceção de Ez 32,23. Cf. COENEN, Lothar. “Igreja evkklhsi,a ” DITNT. p.985. 8 Pode ser para dar maus conselhos ou fazer coisas ruins (cf. Gn 49,6; Sl 26,5), para tratar de assuntos civis (cf. 1Rs 2,3; Pv 5,14; 26,26; Jó 30,28) ou para fazer guerra (cf. Nm 22,4; Jz 20,2 etc.). Os exércitos reunidos presenciam o combate entre Davi e Golias (cf. 1Sm 17,47). Em outros contextos o termo pode designar uma multidão de nações reunidas (cf. Gn 35,11), povos reunidos (cf. Gn 28,3; 48,4) ou mesmo mortos reunidos (cf. Pv 21,16). Pode referir-se aos exilados que voltam (cf. Jr 31,8; Esd 2,64), e então a comunidade restaurada em Jerusalém é um lh'q' (qähäl) (cf. Esd 10,12, 14; Ne 8,2,17). Cf. LEWIS, Ibidem. 9 Parece que é intencional a distinção entre td:[] (`ádat) e lh'q' (qähäl) em Lv 4,13: “se toda a congregação (hd'[e) de Israel pecar por ignorância, e isto for oculto aos olhos da coletividade (lh'q' (qähäl))...” Aqui lh'q' (qähäl) tem o sentido de representantes judiciais da comunidade. Existe também o caso em que certos israelitas não podem entrar no lh'q' (qähäl) (cf. Dt 23,2). Mas em outras passagens os dois vocábulos são empregados em frases sucessivas tendo o mesmo sentido (cf. Nm 16,3) e também são colocados juntos (cf. Pv 5,14). Em geral são sinônimos. Cf. LEWIS, Ibidem. 10 Cf. COENEN, Lothar. “Igreja evkklhsi,a ” DITNT. p. 988. 11 Cf. LEWIS, Jack P. “lh'q'” DITAT, p.1327.
  • 8. Eclesiologia Página 8 Copyright © 2016 Joab Martins de Lima - todos os direitos reservados. joablimateologo@gmail.com 1.2 Significado de “evkklhsi,a” antes da literatura neotestamentária. O termo evkklhsi,a (ekklësia) na literatura do grego clássico12 é atestada em Eurípides e Heródoto no sec.V a.C, com o significado de “assembleia popular dos cidadão efetivos e componentes da polis, (cidade)”. A evkklhsi,a (ekklësia) na Grécia antiga, alcançou sua importância máxima no séc.V a.C, quando se reunia em intervalos regulares, em Atenas por exemplo cerca de 30 a 40 vezes ao ano, sendo, porém, menos frequente em outros lugares. A reunião de uma evkklhsi,a (ekklësia) servia para dirimir assuntos como; mudanças de lei, nomeações para posições oficiais e questões de importância política seja interna ou externa como contratos, tratados, guerra e paz, e finanças. Em uma evkklhsi,a (ekklësia) cada cidadão tinha o direito de falar, propor e debater assuntos, podendo somente discutir propostas se houvesse a opinião de um perito sobre um assunto. As reuniões da evkklhsi,a (ekklësia) eram iniciadas com orações e sacrifícios às divindades da cidade13 . A evkklhsi,a (ekklësia) “antes da tradução da LXX e dos tempos do Novo testamento” nunca era usada como comunidade religiosa, pois, caracterizava-se por ser uma assembleia da polis (cidade) constituída por cidadãos efetivos, arraigada em constituição democrática que tomava decisões fundamentais e de cunho político e judicial, e com competência variada em vários estados14 . Dentro do contexto do período do grego clássico, outra palavra que assumiu importância é sunagwgh, (synagogëº). Esta palavra é atestada a partir do séc. V a.C em diante exprimindo uma vasta gama de usos. De modo geral significava, em sentido transitivo, “reunir” ou “ajuntar” “coisas (livros, cartas, posses, frutos no tempo da colheita) e também tropas e pessoas”15 . A partir do sec. II a.C, período este do grego koinê, ou seja, o grego comum16 , a palavra sunagwgh, (synagogëº) começou a ser usada, em sentido intransitivo, para 12 O período clássico da língua grega foi de 900 a 330a.C tornando-se conhecida graças as famosas obras literárias que tiveram origem neste período e foram preservadas até hoje, como a Ilíada e a Odisseia ambas atribuídas a Homero. Estas obras são as mais antigas da literatura grega, seguidas por obras de Hesíodo, Heródoto e Platão, entre outros. O dialeto que mais se destacou neste período foi o ático o qual chegou a ser a base principal para o grego koinê, o grego que foi escrito a LXX e o Novo Testamento. Cf. REGA, Lourenço. BERGMANN, Johannes. Noções do Grego Bíblico. São Paulo-SP. Ed. Vida Nova. p. 8. 13 Cf. COENEN, Lothar. “Igreja evkklhsi,a ” DITNT. p.984. 14 Ibidem. p.985. 15 Cf. COENEN, Lothar. “Igreja evkklhsi,a ” DITNT. p. 985. 16 Com as conquistas de Alexandre o “Grande”, por volta de 330 a.C, o grego usado passou a ser o “Koinê”, ou seja, o grego conhecido como “comum”. Lembrando que foi neste período que a tradução do
  • 9. Eclesiologia Página 9 Copyright © 2016 Joab Martins de Lima - todos os direitos reservados. joablimateologo@gmail.com designar a assembleia regular, principalmente festiva como refeições e sacrifícios, de grupos de comunidades cúlticas. No entanto, não é possível atestar claramente que sunagwgh, (synagogëº), no Grego Clássico (séc. V a.C), fosse empregado no sentido de assembleia, sendo este muito provavelmente originado no judaísmo no período helenístico (séc. IV a.C)17 . Portanto, dentro do contexto do sec. III a II a.C, sunagwgh, (synagogëº) é empregado pela LXX para “indicar a comunidade de Javé” definida de forma religiosa18 . É importante ressaltar que quando a LXX emprega evkklhsi,a (ekklësia) na tradução do hebraico lh'q' (qähäl), o faz para indicar a assembleia do povo ou uma assembleia jurídica (cf. Dt 9,10; 23,3ss; Jz 21,5,8; Mq 2,5) e corpo político (cf. Esd 10,8; 12; Ne 8,2;17). Especialmente em Crônicas a LXX emprega evkklhsi,a (ekklësia) como assembleia do povo para adoração (cf. 2Cr 6,3; 30,2,4,13,17). O emprego de evkklhsi,a (ekklësia) como assembleia do povo de Deus é caracterizado pela resposta ao chamado de Javé, embora faça alusão a grandeza histórica de Israel19 . Sendo assim, percebemos que evkklhsi,a (ekklësia) na LXX não emprega o sentido que outrora tinha no grego clássico, sentido este de uma assembleia da polis (cidade), mas, sim, de uma assembleia do povo de Deus. 1.3 O termo “evkklhsi,a” – significado e emprego no Novo Testamento. Anteriormente constatamos que o vocábulo Igreja tem suas origens do hebraico lh'q' (qähäl) e foi traduzido pela LXX (septuaginta) para o termo grego evkklhsi,a (ekklësia) e vimos também o significado deste antes dos escritos neotestamentários. Em continuidade ao nosso estudo, vamos analisar o termo grego evkklhsi,a (ekklësia) para compreender o seu significado e analisa-lo nos escritos do Novo Testamento. O termo evkklhsi,a (ekklësia) é composto de uma preposição evk (ek) e do substantivo klhsi,a (klësia). Quanto a preposição evk (ek) o seu significado denota “origem”, no sentido de procedência de um ponto de onde procede um movimento. Pode significar “de, fora, depois, entre, por, o meio de, a partir de, entre, adiante, sobre, Antigo Testamento hebraico para o grego conhecida por Septuaginta “LXX”, utilizou o grego Koinê. Mais tarde, já no séc. I d.C, os escritores do Novo Testamento utilizaram o mesmo grego nos seus escritos. Cf. REGA, Lourenço. BERGMANN, Johannes. Noções do Grego Bíblico. p. 8. 17 Cf. COENEN, op. cit. p. 985. 18 Ibidem p. 989. 19 Ibidem p. 988-989.
  • 10. Eclesiologia Página 10 Copyright © 2016 Joab Martins de Lima - todos os direitos reservados. joablimateologo@gmail.com para fora”. Com frequência esta preposição é usada em composição a outra palavra significando “fora de, embora”. Sugere também a “algo que parte do interior para o exterior”20 . O substantivo klhsi,a (klësia) é a forma mais curta do verbo kalew (kaleö) {“chamar, chamar para”}. Este denota o mesmo sentido do verbo assumindo o significado de “um chamado, convite, intimação, mensagem, convocação de Deus para a religião da vida”21 . Tendo em vista os dados até aqui apresentados, desde o substantivo hebraico lh'q' (qähäl), passando pela abordagem do termo evkklhsi,a (ekklësia) no período que antecedeu os escritos do Novo Testamento, podemos, então, afirmar, que evkklhsi,a (ekklësia) nos escritos neotestamentários poderá assumir o significado literal de: “um chamado (para) fora; uma assembleia; reunião da assembleia; uma comunidade; congregação; Igreja; sociedade; a assembleia de cristãos na cidade ou comunidade”22 . O emprego de evkklhsi,a (ekklësia) no Novo Testamento ocorre 114 vezes23 ;  Nos evangelhos somente em Mateus 3 vezes;  Em Atos dos Apóstolos 23 vezes;  Nos escritos paulinos 62 vezes;  Em Hebreus 02 vezes e em Tiago 01 vez;  Na terceira carta de João 03 vezes;  Em Apocalipse 20 vezes; No entanto, evkklhsi,a (ekklësia) não aparece em 1ª e 2ª Pedro; 2ª Timóteo e Tito24 . 20 Cf. SOUTER, Alexander M. A. A Pocket Lexicon to the Greek New Testament. p. 74. Cf. STRONG, James. Greek Dictionary of The New Testament. p.145. Cf. RUSCONI, Carlo. Dicionário do Grego do Novo Testamento. p. 153. 21 Cf. STRONG, James. Greek Dictionary of The New Testament. p. 265. 22 Cf. SOUTER, Alexander M. A. A Pocket Lexicon to the Greek New Testament. pp. 75-76. 23 Cf. em Mateus (cf. Mt 16,18; 18,17{2x}); em Atos dos Apóstolos (cf. At 5,11; 7,38; 8,1,3; 9,31; 11,22,26; 12,1,5; 13,1; 14,23,27; 15,3,4,22,41; 16,5; 18,22; 19,32,39,40; 20,17,28) em Romanos (Rm 16,1,4,5,16,23); em 1/2 Coríntios (cf. 1Cor 1,2; 4,17; 6,4; 7,17; 10,32; 11,16,18,22; 12,28; 14,4,5,12, 19,23,28,33,34,35; 15,9; 16,1 16,19 (2x); 2Cor 1,1; 8,1, 18,19,23,24; 11,8,28; 12,13); em Gálatas (cf. Gl 1,2,13,22) em Efésios (cf. Ef 1,22; 3,10,21; 5,23,24,25,27,29,32) em Filipenses (cf. Fl 3,6; 4,15) em Colosenses (cf. Cl 1,18,24; 4,15,16); 1/2 Tessalonisenses (cf. 1Ts 1,1; 2,14; 2Ts 1,1,4); em 1 Timóteo (cf. Tm 3,5,15; 5,16); em Filemom (cf. Fm 1,2) em Hebreus (cf. Hb 2,12; 12,23) em Tiago (cf. Tg 5,14); em 3 João (cf. 3Jo 1,6,9,10); em Apocalipse (cf. Ap 1,4,11,20{2x}; 2,1,7,8,11,12,17,18,23,29; 3,1,6,7,13,14,22; 22,16). 24 Cf. COENEN, Lothar. “Igreja evkklhsi,a ” DITNT. p. 991.
  • 11. Eclesiologia Página 11 Copyright © 2016 Joab Martins de Lima - todos os direitos reservados. joablimateologo@gmail.com 1.3.1 “evkklhsi,a” no Evangelho de São Mateus. Ao falar-se de evangelho, fala-se, na verdade, da “pregação oral viva e essencial da Igreja” que “recebeu a missão de torná-lo conhecido, crido e amado, pelos homens”, pois, “a mensagem de salvação anunciada por Jesus Cristo e realizada na sua pessoa, torna-se ativa na vida de quem ouve a pregação da Igreja”. Portanto, através desta, os homens têm a possibilidade de receber uma nova vida com plenitude total em Jesus Cristo (cf. Jo 10,10)25 . Já ao falar-se de evangelhos, fala-se dos livros que são o testemunho escrito de um evangelho, ou seja, a vida, mensagem e obra redentora da pessoa de Jesus Cristo relatada nos evangelhos, de Mateus, Marcos, Lucas (sinóticos)26 e João, que tratam de um único evento histórico-salvífico: Jesus Cristo, morto e ressuscitado, sendo este o querigma27 feito pelos apóstolos aos destinatários da pregação. O Evangelho de São Mateus é o primeiro em ordem canônica no Novo Testamento, porém, não em ordem cronológica de composição, sendo que esta ocorreu entre os anos 70/80 d.C, para uma comunidade de judeus convertidos, da Antioquia da Síria ou outra comunidade de cidade litorânea da região sírio-fenícia28 . A comunidade de Mateus era formada por judeus convertidos ao cristianismo e que, por esta razão, eram hostilizados e perseguidos por judeus conservadores. A comunidade, a evkklhsi,a (ekklësia) do Evangelho de Mateus encontra-se à margem da sociedade, pois é perseguida pela sinagoga (judeus) e pelo império romano. É uma evkklhsi,a (ekklësia) que busca construir o reino de Deus na terra, plausível a homens e mulheres de todas as condições, tentando com isto, romper com paradoxos tradicionais. No entanto, por sua proposta, a evkklhsi,a (ekklësia) mateana sofre muito e vive em 25 Cf. FERNANDES, Leonardo Agostini. A Bíblia e a sua mensagem. Introdução à leitura e ao estudo da Bíblia. p. 117. 26 “Estes evangelhos são chamados de sinóticos, porque possuem semelhança e oferecem concordância de material e de linha estrutural, podendo ser dispostos em colunas paralelas”. Ibidem. p. 118. 27 “Querigma” significa proclamação. “No uso profano indica a proclamação que um arauto realiza em nome do rei (cf. Gn 41,43; Is 42,9; 52,7). No NT, o termo indica o conteúdo essencial da pregação que os apóstolos fazem sobre Jesus Cristo (cf. At 2,22-24; 3,13-26; 4,10-12 etc.). Em um evangelho, significa o anuncio da proximidade do reino de Deus feito por João Batista, por Jesus e seus discípulos (cf. Mt 3,1-2; 4,17; 10,7.27)”. Ibidem. p. 117. 28 O relato de Mt 22,7, da parábola do banquete nupcial, faz referência direta a destruição de Jerusalém no ano 70 na primeira destruição da cidade, o que leva os exegetas a datá-lo entre os anos 70 e 80 d.C. Quanto ao local de composição deste evangelho, sugeriu-se primeiramente a cidade de Jerusalém, mas, no entanto, este foi rejeitado, pois sabe-se que a partir da morte de Tiago (irmão de João, ambos filhos de Zebedeu Mc 3,17) entre os anos 44-46 d.C, os discípulos fogem de Jerusalém e é nessa dispersão para a Fenícia, Chipre e Antioquia que o evangelho é anunciado somente aos judeus dessas regiões (cf. At 11,19). Cf. MAZZAROLO, Isidoro. Evangelho de São Mateus. pp. 5-6. Cf. MAZZAROLO, Isidoro. A Bíblia em suas mãos. p. 133. Cf. CARTER, Warren. O Evangelho de São Mateus. Comentário sociopolítico e religioso a partir das margens. p. 16.
  • 12. Eclesiologia Página 12 Copyright © 2016 Joab Martins de Lima - todos os direitos reservados. joablimateologo@gmail.com permanente tensão, com os adversários, os hipócritas e outros. Como exemplo podemos citar que no sermão da montanha (cf. Mt 5-7); Jesus, ao falar das bem-aventuranças, exerce sua “pedagogia da inclusão” e mostra uma inversão de perspectivas, sendo este fator, algo que causou conflitos com autoridades e nobres, pois, as multidões aderem a Jesus29 . A eclesiologia de Mateus apresenta uma visão do ‘império de Deus’, sua vontade, seu jeito, suas formas políticas e econômicas, contrapondo-se frontalmente a um império dos homens, suas regras, seus princípios e suas concepções excludentes. O modelo de Jesus é a libertação do homem, e o modelo do império é a sua escravização30 . A evkklhsi,a (ekklësia) mateana é o novo Israel de Deus, constituída não só por judeus convertidos, mas também por pagãos. Embora existam, hostilidades e perseguições, o mandamento do amor prevalece (cf. Mt 22,34-40), e deve, contudo, ser praticado inclusive diante dos inimigos como exigência de perfeição, a exemplo de Jesus Cristo (cf. Mt 5,43-48)31 . 1.3.1.1 Breve análise da Perícope de Mt 16, 13-2032 Faremos uma rápida análise de duas perícopes do Evangelho de São Mateus, onde os termos evkklhsi,a (ekklësia) aparece nos lábios de Jesus. No entanto, esta análise não será hermenêutica no ponto de vista exegético utilizando os métodos diacrônicos ou sincrônicos. Será uma análise para entender o sentido de evkklhsi,a (ekklësia) no Evangelho de São Mateus. “13 Chegando Jesus ao território de Cesaréia de Filipe, perguntou aos discípulos: Quem dizem os homens ser o Filho do Homem?” “14 Disseram. Uns afirmam que é João o Batista, outros que é Elias, outros, ainda que é Jeremias ou um dos profetas.” “15 Então lhes perguntou; E vós, quem dizeis que eu sou?” “16 Simão Pedro, respondendo, disse: Tú és o Cristo, o filho do Deus vivo.” “17 Jesus respondeu-lhe; Bem-aventurado és tu, Simão, Filho de Jonas, porque não foi carne ou sangue que te revelaram isso, e sim meu Pai que está nos céus.” “18 Também te digo que tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei minha Igreja {evkklhsi,a (ekklësia)}, e as portas do Hades nunca prevalecerão contra ela.” 29 Cf. MAZZAROLO, Isidoro. Evangelho de São Mateus. p. 11. 30 Cf. Ibidem. 31 Cf. FERNANDES, Leonardo Agostini. A Bíblia e a sua mensagem. Introdução à leitura e ao estudo da Bíblia. p. 119. 32 O que nos interessa nesta rápida análise é a palavra evkklhsi,a, portanto analisaremos o texto até o v.18.
  • 13. Eclesiologia Página 13 Copyright © 2016 Joab Martins de Lima - todos os direitos reservados. joablimateologo@gmail.com “19 Eu te darei as chaves do reino dos Céus e o que ligares na terra será ligado nos céus, e o que desligares na terra será desligado nos céus”. “20 Em seguida, proibiu severamente aos discípulos de falarem a alguém que ele era o Cristo”. Mt 16,13-20 (Bíblia de Jerusalém). Esta perícope encontra paralelos em Mc 8,27-10 e Lc 9,18-21. Em ambos os textos paralelos, não há a menção de evkklhsi,a (ekklësia), e nem do título atribuído a Jesus “Filho de Deus”. Na perícope em apreço, o autor do evangelho relata o momento em que Jesus, antes do primeiro anuncio da sua paixão (cf. Mt 16, 21-23), recebe a profissão de fé de seus discípulos representados por Simão Pedro. Jesus faz duas indagações aos seus discípulos, a saber: a) o que o povo, as autoridades e os seus opositores falavam sobre quem era o filho do homem33 ; b) e o que os discípulos (de Jesus) diriam sobre a sua pessoa, tendo em vista que os discípulos poderiam ter se deixado influenciar pela opinião pública a respeito de Jesus. Assim temos a resposta, pelos discípulos, à primeira indagação: João Batista (cf. 14, 1-2); Elias (cf. Mt 11,14; 17,12-13); Jeremias ou algum dos profetas (cf. Mt 2,17; 27,9). Na segunda indagação a resposta é dada por Simão Pedro que responde: “Tú és os Cristo (ungido/messias) o filho do Deus vivo” (v.16). Na resposta de Simão Pedro há duas declarações: a) Jesus é o Cristo o messias esperado; b) Jesus é o Filho do Deus vivo.34 Perante tal declaração, Jesus afirma a Pedro: “Bem-aventurado és tu, Simão filho de Jonas...” (v.17)35 . Tal bem-aventurança tem um motivo; não foi nem a carne e nem o sangue que revelaram a identidade de Jesus a Pedro, mas, sim, o Pai que está nos céus (v.17). A expressão carne e sangue denota a condição humana perante Deus, não como uma de mortalidade, mas como inabilidade para conhecer Deus e os modos de Deus. Sublinha as limitações das capacidades intelectual, religiosa e mística humanas perante Deus36 . 33 Esta expressão tem dois sentidos, sendo, um humano em sentido de homem ser humano e um sentido teológico fazendo alusão a Dn 7,13-14 onde Filho do Homem designa um ser celeste, transcendente. No Novo Testamento esta expressão e encontrada nos lábios de Jesus ao referir-se a sua vida terrestre (cf. Mt 8,20); as predições de seu sofrimento, morte e ressurreição (cf. Mc 8,31; 9,31; 10-33-34); e a sua vinda como Filho do Homem em futuro próximo glorioso (cf. Mc 8,38; 13,26; 14,62). Cf. MAZZAROLO, Isidoro. Evangelho de São Mateus. p. 251. 34 Cf. MAZZAROLO, Isidoro. Evangelho de São Mateus. p. 251. 35 Esta expressão aramaica “bar-Iônah (cf. Jo 1,42) seria uma forma revolucionária ou anarquista de caracterizar a pessoa, de modo semelhante a Mt 10,4 definindo Simão, o cananeu”. Cf. MAZZAROLO, loc. cit. 36 Cf. CARTER, Warren. O Evangelho de São Mateus. Comentário sociopolítico e religioso a partir das margens. p. 423.
  • 14. Eclesiologia Página 14 Copyright © 2016 Joab Martins de Lima - todos os direitos reservados. joablimateologo@gmail.com Logo após a esta afirmativa, Jesus, continua suas afirmativas a Pedro dizendo que sobre a rocha construirá a sua Igreja evkklhsi, a (ekklësia): “18 Também te digo que tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei minha Igreja {evkklhsi,a (ekklësia)}, e as portas do Hades nunca prevalecerão contra ela.” Pedro (Petros) era um nome próprio usado no universo grego e a associação com “petra” (pedra) é uma questão de estrutura. Jesus afirma que sobre a rocha ele construirá a sua Igreja. Qual seria a compreensão de Jesus a respeito? Quem seria a rocha? A tradição da Igreja associou a rocha com Pedro, mas em muitos outros textos a rocha é Cristo (cf. Mt 21,42 e paralelos; cf. At 4,11; 1Pe 2,7; Sl 118,22). Na estrutura de Mateus, e desta perícope, Pedro pode ser visto como modelo de discípulo, como aquele que tem coragem de explicitar a fé; ele se tornará o modelo de líder37 . Em torno desta temática sobre qual seria a rocha que Jesus declara há outras teses aqui elencadas; É Jesus Cristo que toma a iniciativa da construção da sua Igreja; Ele tem a autoridade e construirá sua Igreja depois de sua morte e ressurreição; A Igreja não seriam os apóstolos, nem os missionários a posteriori, mas a comunidade messiânica reunida em torno de Jesus, comprometida com uma nova realidade; Na narrativa de Mateus, Jesus estaria dirigindo esta profecia à pessoa de Pedro, o qual lidera a comunidade dos apóstolos na Igreja de Jerusalém; Jesus usa uma ideia judia ao falar que as portas do Hades não teriam êxito contra a comunidade messiânica; ela não seria barrada pela morte (cf. Is 38,10; Jó 38,17; Sl 9,14; Sb 16,13)38 . Sobre a questão das portas do Hades não prevalecerem sobre a Igreja, entendemos isto num contexto que a Igreja mateana estava sendo perseguida e já haviam ocorrido martírios como o de Estevão no ano 36 d.C (cf. At 7,55-60) e Tiago irmão de João no ano 44-46 d.C (cf. At 12,2). A Igreja tem uma conotação política, social e cultural. ‘Eu construirei’ essa assembleia como uma comunidade alternativa à ordem imperial e do Templo. Esta comunidade alternativa teria que enfrentar as portas do inferno. No inferno estão as forças maléficas, as potestades demoníacas e as potências do mal, mas essas forças não ofereciam perigo algum na escatologia, e por isso, surge a pergunta: Quem são essas portas do Inferno? Onde estavam os demônios durante a missão de Jesus? De que forma esses demônios se manifestam na vida dos discípulos? As portas do inferno não estão na escatologia, pois lá não 37 Cf. MAZZAROLO, loc. cit. Ulrich Luz teólogo protestante suíço identifica quatro linhas clássicas de interpretação sobre quem é a rocha; (1) Pedro o representante de todo cristão; (2) a fé ou confissão de Pedro no v.16; (3) Cristo; (4) Pedro, o bispo modelo. Cf. LUZ, Ulrich, Matthew in History. pp 57-74, esp. pp 57-63; Burgess, History of the Exegesis of Matthew 16,17-19. Apud CARTER, Warren. O Evangelho de São Mateus. Comentário sociopolítico e religioso a partir das margens. p. 423. 38 Cf. MAZZAROLO, Isidoro. Evangelho de São Mateus. p. 251-252.
  • 15. Eclesiologia Página 15 Copyright © 2016 Joab Martins de Lima - todos os direitos reservados. joablimateologo@gmail.com haverá comunicação entre os dois universos – salvos e perdido (Lc 16, 19-31) – mas é na história que o Reino de Deus encontra as hostilidades do reino do Beelzeboul (Ap 12, A Mulher x A Besta). As portas representam o acesso ou a saída, e quando elas se abrem saem delas exércitos, forças, cortejos e potencias39 . Entendemos que a rocha sobre a qual Jesus declara construir a sua Igreja é a profissão de fé que Pedro faz ao declarar que Jesus é o Cristo filho do Deus vivo. Sendo assim, sobre esta profissão de fé revelada por Deus é que a Igreja será construída, ou seja, a fé no filho do Deus vivo. 1.3.1.2 Breve análise da Perícope de Mt 18,15-1840. “15 Se o teu irmão pecar, vai corrigi-lo a sós. Se ele te ouvir, ganhaste o teu irmão. “16 Se não te ouvir, porém, toma contigo mais uma ou duas pessoas, para que toda questão seja decidida pela palavra de duas ou três testemunhas”. “17 Caso não lhes der ouvido, dize-o à Igreja {evkklhsi,a (ekklësia)}. Se nem mesmo à Igreja {evkklhsi,a (ekklësia)} der ouvidos, trata-o como gentio ou publicano”. “18 Em verdade vos digo: tudo quanto ligares na terra será ligado no céu e tudo quanto desligardes na terra será desligado no céu.” Mt 18,15-18 (Bíblia de Jerusalém). Esta perícope é parte do capítulo 18 que descreve várias instruções sobre a vida comunitária. Neste capítulo o autor do evangelho “passa algumas máximas de vida validas para todos aqueles que querem fazer parte da nova família, da nova comunidade”41 . É, portanto, neste capítulo, o discurso eclesiológico em que as palavras de Jesus soam como instruções para a sua evkklhsi,a (ekklësia). Essas instruções visam criar na comunidade relações e práticas sustentadoras. Pode-se elencar, conforme o vocabulário – chave repetido e temas distintos, seis seções: Esta comunidade vive como crianças marginais (18,1-5). Os membros não fazem tropeçar um ao outro (18,6-9). Tomam conta um do outro (18,10-14). Exercitam admoestação e reabilitação comunitária (18,15- 20). Perdoam repetidamente (18,21-22), nunca esquecendo que o perdão de Deus lhes exige que estendam o perdão um ao outro (18,23- 39 Cf. MAZZAROLO, Isidoro. Evangelho de São Mateus. p 252. 40 O que nos interessa nesta rápida análise é a palavra evkklhsi,a, portanto analisaremos o texto até o v.17. 41 Ibidem. p 267.
  • 16. Eclesiologia Página 16 Copyright © 2016 Joab Martins de Lima - todos os direitos reservados. joablimateologo@gmail.com 25). Com estas práticas eles se sustentam mutuamente no caminho exigente da cruz42 . A perícope em apreço apresenta a questão de algum irmão da comunidade que tenha pecado contra outro irmão, e recomenda que, o que pecou seja corrigido em particular, e, se o que pecou aceitar a repreensão a questão fica resolvida “ganhaste a teu irmão”. Caso o que pecou não dê ouvidos, ou não aceite a correção, duas ou três testemunhas deverão ser convocadas, para resolverem a questão. No entanto, caso não seja resolvida a questão, a evkklhsi,a (ekklësia) deverá ser convocada e caso o que pecou não der ouvidos, não será considerado como membro integrante da comunidade. Conforme esse ensino, há três esforços que a Igreja deve exercer para a reconciliação de uma pessoa: a) repreensão em particular (a sós); b) duas ou três testemunhas; c) levar a questão à evkklhsi,a (ekklësia) com o objetivo de reconciliação no meio da comunidade. A evkklhsi,a (ekklësia) deve ter, portanto, atitude reconciliadora, seja ela de forma individual, com duas ou três testemunhas ou comunitariamente, e nunca de exclusão, pois, um irmão ou irmã que não aceita a correção com objetivo de reconciliar, acaba por tomar a decisão de se “auto” excluir da evkklhsi,a (ekklësia). 1.3.2 Considerações sobre a fundação da Igreja. “Jesus instituiu, ou fundou a Igreja una”43 . Esta afirmativa pode ser entendida da seguinte forma: O Senhor terreno e ressurreto bem consciente, expressamente estatuiu determinados atos jurídicos formais por meio dos quais ele fundou a Igreja como instituição visível, juridicamente estabelecida por sua vontade em todos os pontos essenciais44 . A exegese recente questiona tal posicionamento, pois, o mesmo fundamenta-se nos textos eclesiológicos de Mt 16,18; 18,17 onde o próprio Jesus pronuncia o termo evkklhsi,a (ekklësia). 42 Cf. CARTER, Warren. O Evangelho de São Mateus. Comentário sociopolítico e religioso a partir das margens. p. 455. 43 Formulação que está claramente expressa no juramento antimodernista do Papa Pio X formulado em 1 setembro de 1910, a ser proferido obrigatoriamente por todos os padres, bispos, catequistas e seminaristas. “eu acredito com fé igualmente firme que a Igreja, Guardiã e mestra da Palavra Revelada, foi instituída pessoalmente pelo Cristo histórico e real quando Ele viveu entre nós...” Este juramento, mais tarde, foi abolido pelo Papa Paulo VI em 1967. Cf. X, Papa São Pio - "Juramento contra o Modernismo" MONTFORT Associação Cultural http://www.montfort.org.br 44 Cf. WIEDENHOFER, Siegfried. In Manual de Dogmática Vol 2. Eclesiologia. p. 56.
  • 17. Eclesiologia Página 17 Copyright © 2016 Joab Martins de Lima - todos os direitos reservados. joablimateologo@gmail.com Este questionamento fundamenta-se na em que tais textos do Evangelho de São Mateus são provenientes da situação pós-pascal. Os evangelhos anunciam as palavras e atos de Jesus a partir da experiência de sua morte e ressurreição partindo de dentro da comunidade a ser reunir a partir dali e a esperar o retorno do Senhor. Essa seria a situação depois da páscoa. Mas, na situação antes da páscoa, a pregação de Jesus é centralizada no “reino de Deus escatológico45 que irá irromper em futuro imediato (expectativa imediata)” e na “conscientização do amor e misericórdia incondicionais e ilimitados de Deus em situações concretas de desgraças”46 . A pregação de Jesus é o domínio definitivo e universal de paz de Deus nesta vida dentro de um horizonte terreno e temporal (cf. Mt 5,4; 6,10); domínio este iminente como expectativa imediata que iria irromper num outro mundo; domínio transcendente e interior que visa o indivíduo e lhe exige fé para abraçar a sua proposta do reino de Deus47 . Esta pregação de Jesus é dirigida para todo o Israel sem acepção de grupos ou pessoas, tendo como objetivo, “reunir, renovar e preparar o povo inteiro face ao reino de Deus iminente”. No entanto, Jesus, “não pretendia fundar uma nova comunidade religiosa e nem construir uma comunidade santa restante ou comunidade eclesial em Israel”. Porém, Jesus, com sua pregação, causou um movimento de pessoas que se congregaram e que se separaram do judaísmo vigente aderindo, assim, a proposta do reino de Deus, ou seja, o que fez esse rompimento, Igreja – Israel, foi a reação dos ouvintes de Jesus. Fica difícil, diante de tal fato, afirmar uma fundação da Igreja em sentido tradicional48 . No entanto, se lermos a atuação de Jesus tendo como base o pano de fundo histórico da fé de Israel e considerarmos o fracasso de sua intenção direta de reunir Israel, pode-se dizer que a Igreja tem o seu fundamento na vontade de Jesus, pois leva- se em consideração que a Igreja surge como comunidade de fé distinta de Israel porque abraça e acolhe a pregação de Jesus. O Jesus pré-pascal inicia um movimento escatológico voltado para Israel por meio de sinais do reino de Deus iminente. Estes sinais formam comunhão e constituem a base objetiva e teológica bem como histórico-sociológica para a institucionalização da 45 Significa que o “reino de Deus se realiza plena e definitivamente no final dos tempos e como acontecimento já está perto”. A ideia escatológica do reino de Deus “significa o regime de Deus que põe fim ao curso anterior do mundo, aniquila o que é hostil a Deus, tudo que é satânico, que faz agora suspirar o mundo, e da mesma forma põe fim a toda necessidade e dor, traz a saúde para o povo de Deus, que aguarda o cumprimento das promessas proféticas. Cf. KÜNG, Hans. La Iglesia. Editorial Herder. Barcelona, 1968. pp. 62-63. 46 Cf. WIEDENHOFER, Siegfried. In Manual de Dogmática Vol 2. Eclesiologia. p. 56. 47 Ibidem. pp. 61-63. 48 Ibidem. p. 56-57.
  • 18. Eclesiologia Página 18 Copyright © 2016 Joab Martins de Lima - todos os direitos reservados. joablimateologo@gmail.com Igreja49 . Podemos também dizer, que o Jesus pré-Pascal lança os fundamentos para surgir a Igreja pós pascal. Seria uma “eclesiologia implícita que significa que Deus leva adiante o reino de Deus iniciado por Jesus e que permanece fiel a esse início quando o confia, depois da páscoa, a uma Igreja, ligada ao mesmo tempo a esse início”50 . Portanto, a Igreja passa a existir após a Páscoa, ou mesmo após o Pentecostes, ocorrendo então a sua institucionalização concreta como nova comunidade de fé51 . Utilizando um sentido amplo e aberto de Igreja, é possível afirmar que Jesus funda uma “comunhão dos que creem, esperam e amam, inaugurada por Deus por meio de Cristo no Espírito Santo”, diferente, portanto, de um sentido específico de uma Igreja como “comunhão de fiéis que sob direção do papa e dos bispos, compartilham a mesma fé eclesial e recebem os mesmos sacramentos”52 . 1.3.3 A Igreja (“evkklhsi,a”) em Atos dos Apóstolos (Igreja Primitiva) No período apostólico (30-65 d.C) a Igreja está em processo de divórcio de Israel e por isso passa a ter o seu lugar próprio e seu centro na eucaristia. Como relata o livro de At 2, após a assunção de Jesus ocorre o derramamento do Espírito Santo sobre os apóstolos no cenáculo. Logo após esse evento, Pedro faz o seu discurso que resulta na conversão de 3 mil almas que se agregam aos apóstolos (cf. At 2,1-36.41). Estes novos membros da Igreja {evkklhsi,a (ekklësia) os chamados para fora} precisam satisfazer a exigências tais como: “a conversão à fé em Cristo, o batismo, o dom do Espírito Santo, a celebração eucarística, o amor operante e comunitário” (cf. At 2,38.42-47). Portanto, a Igreja Apostólica, ou seja, a Igreja iniciada pelos apóstolos no dia de pentecostes, deu continuidade e desenvolvimento a pregação e missão de Jesus53 . No livro de Atos dos Apóstolos notamos a existência de três sumários análogos que nos informam como era o modo de vida da primeira evkklhsi,a (ekklësia), os chamados para fora, a comunidade de cristãos, a Igreja primitiva, a Igreja Apostólica. 49 Cf. WIEDENHOFER, Siegfried. In Manual de Dogmática Vol 2. Eclesiologia. p. 58. 50 Cf. NINOT-PIÉ, Salvador. Introdução à Eclesiologia. pp.46-47. 51 Cf. WIEDENHOFER, Siegfried. p. 58. 52 Ibidem. p. 57. 53 Cf. NINOT-PIÉ, Salvador. Introdução à Eclesiologia. p. 40. O autor de Atos dos Apóstolos enfatiza o constante crescimento da Igreja apostólica ou primitiva (cf. At 2,47; 4,4; 5,14; 6,1.7; 9,31; 11,21.24; 13,48-49; 19,20).
  • 19. Eclesiologia Página 19 Copyright © 2016 Joab Martins de Lima - todos os direitos reservados. joablimateologo@gmail.com Temos assim: a) At 2,42-47; b) At 4,32-35; c) At 5,12-16. Passemos a olha-los com mais atenção: a) At 2,42-47 tem como base a palavra-chave “assiduidade”. Descreve quatro aspectos da Igreja apostólica ou primitiva em questões relativas a catequese (ensino), comunhão fraternal, eucaristia (ceia do Senhor) e oração. O primeiro aspecto refere-se a catequese (ensino) ministrada pelos apóstolos. Esta catequese seria sobre “as Escrituras explicadas a luz dos eventos cristãos, não mais como Boa Nova a não cristãos”54 . O segundo aspecto, refere-se a comunhão fraternal que é a comunhão dos bens pela comunidade (cf. At 2,44). Esta comunhão dos bens, “exprime e reforça a união dos corações (cf. At 2,46; 4,32)” como resultado “da partilha do evangelho e de todos os bens recebidos de Deus por Jesus Cristo na comunidade apostólica”55 . O terceiro aspecto é a “fração do pão”, que faz referência a eucaristia, ou como conhecemos no meio protestante Ceia do Senhor (cf. 1Co 10,16; 11,24; Lc 22,19; 24,35). Este rito era praticado numa casa e não no templo; era praticado junto com uma refeição (cf. 1Co 11,20-24)56 . No quarto aspecto temos as orações em comum. Como exemplo cf. At 4,24-30; 1,14+24; 12,5. Em At 6,4 fica claro que os apóstolos tinham a tarefa da oração e ensino na comunidade. b) O segundo sumário At 4,36-37 trata da partilha de bens. Descreve como era feita e toma como exemplo a Barnabé, sendo este o modelo a ser seguido, que vende uma propriedade e entrega o valor da venda aos apóstolos. Já em At 5,1-11 temos o relato de Ananias e Safira, o modelo que não deve ser seguido, que venderam uma propriedade não entregando o valor total da venda aos apóstolos. c) O terceiro sumário At 5,12-16 descreve o poder de realizar milagres exercido pelos apóstolos e o deslocamento de pessoas das cidades vizinhas que traziam enfermos e atormentados por espíritos impuros para serem curados. Com as perseguições em Jerusalém a Igreja é dispersa e começa assim a anunciar o evangelho aos gentios que têm na pessoa de Paulo o seu principal representante. 54 Bíblia de Jerusalém. p. 1905, nota “e”. 55 Bíblia de Jerusalém. p. 1905, nota “f”. 56 Bíblia de Jerusalém. p. 1905, nota “g”.
  • 20. Eclesiologia Página 20 Copyright © 2016 Joab Martins de Lima - todos os direitos reservados. joablimateologo@gmail.com Os escritos paulinos e os demais escritos do Novo Testamento mostram elementos teológicos e organizacionais dessa Igreja Nascente57 . 1.3.4 Aspectos de Igreja (“evkklhsi,a”) nos escritos paulinos. Os escritos paulinos enquadram-se dentro de um gênero literário situado entre carta e epístola. A carta tem um caráter mais pessoal, enquanto a epístola tem caráter comunitário. No entanto, estes dois gêneros se entrelaçam e tendo em vista que são objetos de leitura pessoal e coletivo, não há óbice em utilizar o termo carta para os escritos paulinos58 . O corpo de escritos paulinos é composto por treze cartas, sendo sete consideradas como: Protopaulinas, isto é, de autenticidade do apóstolo Paulo: 1Ts; 1-2Co; Gl; Fl; Rm e Fm. Seis são consideradas deuteropaulinas, isto é, não seriam autenticamente do apóstolo Paulo; 2Ts; Ef; Cl; 1-2 Tm; Tt”. Porém esta questão é muito discutida entre os estudiosos”59 . Nas cartas paulinas o termo Igreja aparece relacionado a três aspectos; corpo de Cristo; povo de Deus; e templo de Deus ou templo do Espírito Santo. - Corpo de Cristo. Aquele que crê em Cristo e em sua obra redentora, passa a estar em Cristo e isso implica em ser uma nova criatura como uma nova realidade. É estar num novo espaço de vida agora dominado por Cristo. Nesta nova realidade há uma nova socialização da qual o crente em Jesus Cristo passa a fazer parte, onde “não há judeu nem grego, não há escravo nem livre, não há homem nem mulher; pois todos sois um só em Cristo Jesus” (cf. Gl 3,28). Acontece então a anulação das estruturas sociais, antes, em vigor. Diante de tal realidade, a Igreja fica condicionada pela cristologia passando, assim, a ser o corpo de Cristo, pois os participantes deste corpo comungam juntos do corpo e sangue de Cristo, unindo-se assim ao Cristo crucificado e ressurreto através da eucaristia (Ceia do Senhor)60 . A Igreja formada por muitos crentes e unida por um só Espírito (cf. Rm 12,5; 1 Co 12,12.27) “cujos diversos membros estão aí uns para com os outros e uns com os 57 Cf. NINOT-PIÉ, Salvador. Introdução à Eclesiologia. p. 40. 58 Cf. FERNANDES, Leonardo Agostini. A Bíblia e a sua mensagem. Introdução à leitura e ao estudo da Bíblia. p. 132. 59 Ibidem. 60 Cf. WIEDENHOFER, Siegfried. In Manual de Dogmática Vol 2. Eclesiologia. p. 66.
  • 21. Eclesiologia Página 21 Copyright © 2016 Joab Martins de Lima - todos os direitos reservados. joablimateologo@gmail.com outros”, formam o corpo terreno do Cristo exaltado. Isto significa “que a Igreja é a forma de apresentação histórica e a forma de apresentação terrena de comunicação de Cristo, por meio do qual, Cristo, atua e está presente na história” (cf. Ef 1,22s; 4,7-16; 5,21-33; Cl 1,18; 2,19)61 . A Igreja como corpo de Cristo é uma unidade orgânica na qual todos tem uma função (cf. 1Cor 12,12ss). Por isso, no corpo de Cristo não há nenhum membro mais importante que o outro. No corpo de Cristo nenhum membro é dispensável e até os considerados mais fracos têm a sua importância. Em Rm 12,4-8 o apóstolo Paulo elenca diversas funções, ou dons, que os membros do corpo de Cristo exercem “...segundo a graça que...foi dada...” a cada um. Esta diversidade de funções, ou dons, produz valor ao corpo, pois a sua fonte é Cristo. Desta forma, notamos que todos os membros do corpo de Cristo têm uma função a desempenhar para a saúde do corpo de Cristo, ou seja, a Igreja. Portanto, se cada membro do corpo se empenhar em sua função dentro do corpo, a Igreja crescerá e se manterá saudável. Para isso, faz-se necessário o atendimento ao chamado à vida de santidade, expressando pertença a Cristo no pensamento e no testemunho diário. Sendo assim, entendemos, que os membros do corpo terão saúde (espiritual) e poderão desempenhar funções que possibilitarão a edificação do corpo, sob a liderança de pessoas escolhidas por Cristo e reconhecidos pela igreja, para funcionar harmoniosamente por estar em obediência a Cristo e ao seu serviço coletivo. - Povo de Deus. O aspecto da Igreja como povo de Deus a relaciona com Israel. Para tanto o apóstolo Paulo usa várias designações da Igreja como povo de Deus. A Igreja é o povo de Deus (cf. Rm 9,25s) o ‘Israel de Deus’ (cf. Gl 6,16), a ‘semente de Abraão’ (cf. Rm 9,7s) a (verdadeira) ‘filiação de Deus’ (cf. Rm 9) e (mais frequentemente) a ‘comunidade’ (reunida) de Deus ([evkklhsi,an tou/ qeou/] ekklesia tou theou): (cf. 1Cor 15,9; Gl 1,13; 1Cor 10,32; 11,22; 1Cor 14)62 . O aspecto paulino de povo de Deus, sintetiza experiências diversas como: Deus permanece fiel a sua aliança, apesar da infidelidade de seu povo eleito; a infidelidade 61 Cf. WIEDENHOFER, Siegfried. In Manual de Dogmática Vol. 2. Eclesiologia. p. 66. 62 Ibidem. p. 67.
  • 22. Eclesiologia Página 22 Copyright © 2016 Joab Martins de Lima - todos os direitos reservados. joablimateologo@gmail.com humana com a aliança causadora de rupturas na história da salvação; a morte chega ao seu fim com a ressurreição de Cristo; e a bem sucedida missão entre os gentios63 . A Igreja como povo de Deus, recongregado como corpo de Cristo, é uma comunidade de Deus em Jesus Cristo (cf. 1Ts 2,14). Como povo de Deus a Igreja tem ao mesmo tempo continuidade e descontinuidade ao povo de Deus Israel64 . A continuidade está baseada nos seguintes pontos: a) Fidelidade do Deus uno; b) Onipotência do Deus uno; c) Bondade do Deus uno na continuidade de sua promessa no Antigo Testamento. Em relação a Igreja estes pontos de continuidade abrangem os seguintes aspectos; a Igreja fica fundamentada para sempre no povo de Israel, e como cristandade gentia a Igreja é o ramo enxertado na nobre oliveira que é Israel (cf. Rm 11,1-10). A descontinuidade com o povo de Israel se baseia: a) Na morte e ressurreição de Cristo, pois, imprime um caráter escatológico de confissão de Cristo exigindo decisão; b) Na justiça de Deus em Cristo, pois, a justificação é pela fé e não mais baseada na lei mosaica; c) Na constituição desse povo de Deus agora constituído de judeus e pagãos; d) A Igreja é agora a nova aliança (cf. Rm 9,24-10,21) entendida como cumprimento veterotestamentário. Neste sentido, Igreja é o novo povo de Deus, que existe concretamente como comunidade individual, inclusive também como comunidade doméstica, mas particularmente como congregação festiva de culto divino (celebração da Eucaristia)65 . - Templo de Deus. A concepção paulina de Igreja como templo de Deus, remete a ideia de construção (cf. Ef 2,19) que se edifica. Próximo a este está o conceito de casa ao referir-se a uma comunidade em particular (cf. Gl 6,10) ou Igreja universal (cf. Ef 2,19; 1Tm 3,15). Em sentido geral o templo de Deus, refere-se a edifício (cf. 1Cor 3,5ss; Ef 2,19ss; 4,8). Esta concepção de templo de Deus, mostra que é o lugar em que Deus atua pelo Espírito Santo, pois o templo como construção, casa, indica que é a habitação de Deus através do seu Espírito Santo. Portanto, na Igreja como morada de Deus, cumprem-se as 63 Cf. WIEDENHOFER, Siegfried. In Manual de Dogmática Vol. 2. Eclesiologia. p. 67. 64 Ibidem. 65 Ibidem.
  • 23. Eclesiologia Página 23 Copyright © 2016 Joab Martins de Lima - todos os direitos reservados. joablimateologo@gmail.com promessas feitas a Israel (cf Lv 26,11; Ez 37,26; Zc 8,8) pois Deus viverá neste templo por seu Espírito66 . A Igreja como templo de Deus é edificada por ele através dos dons espirituais distribuídos pelo Espírito Santo para que haja vida, edificação, pois, é o princípio vital de serviço aos seus membros67 . Como templo de Deus a Igreja é possessão de Deus por se encontrar plena do Espírito Santo. É a possessão sagrada de Deus na terra, que a santifica e a guarda68 . 66 Cf. SCHLIER, Heinrich. Eclesiologia Del Nuevo Testamento In Mysterium Salutis. Manual de Teologia como história de La salvacion IV/1. La Iglesia. p.169. 67 Cf. Rm 8,1;12,11;15,16; 1Cor 2,10; 6,11; 12,1; 2Cor 1,22; 3,37; Gl 3,1; 5,16; 1Ts 1,5; Ef 1,13; 2,19; 3,3; 5,18. 68 Cf. SCHLIER, Heinrich. op. cit. p.170.
  • 24. Eclesiologia Página 24 Copyright © 2016 Joab Martins de Lima - todos os direitos reservados. joablimateologo@gmail.com 2 Características e atos fundamentais da Igreja. 2.1 O credo Niceno-Constantinopolitano A palavra Credo deriva do latim e significa “eu creio”. Em se tratando de um credo cristão, nada mais é que uma profissão, confissão, ou declaração de fé, que contém um resumo daquilo em que se deve acreditar, sendo este de uso litúrgico proclamado nos cultos tendo esta pratica a partir do século II69 . Dessa forma um credo causa unidade de fé, proporcionando fundamentação doutrinária diante de uma heresia70 . O credo Niceno-Constantinopolitano foi elaborado no ano 381 d.C num concílio ecumênico composto por 150 bispos na cidade de Constantinopla, capital do Império Romano, hoje a atual cidade de Istambul capital da Turquia, com afirmações de fé em relação; a Deus, a Jesus Cristo, ao Espírito Santo e a Igreja como Una, Santa, Católica e Apostólica. Este credo (Niceno-Constantinopolitano) é assim chamado por ser uma revisão e ampliação do credo formulado no Concílio de Nicéia71 em 325 d.C, no que se diz em relação ao Espírito Santo e a Igreja. Segue abaixo o Credo Niceno e o Credo Niceno- Constantinopolitano72 : Credo Niceno (325) Credo Niceno-Constantinopolitano (381) Cremos em um só Deus, Pai onipotente, criador de todas as coisas visíveis e invisíveis. Cremos em um Deus, Pai todo-poderoso, Criador do céu e da terra, de todas as coisas visíveis e invisíveis. Ε em um só Senhor Jesus Cristo, o Filho de Deus, gerado pelo Pai, unigênito, isto é, da substância do Pai; E em um Senhor, Jesus Cristo, o unigênito Filho de Deus, gerado pelo Pai antes de todos os séculos, Deus de Deus, luz de luz, Deus verdadeiro de Deus verdadeiro, gerado, não feito, de uma só substância com o Pai; luz de luz, verdadeiro de Deus de verdadeiro Deus, gerado, não feito, de uma só substância com o Pai, Pelo qual foram feitas todas as coisas que estão no céu e as que estão na terra; Pelo qual todas as coisas foram feitas; O qual por nós homens e por nossa salvação, desceu, se encarnou e se fez homem. O qual, por nós homens e para a nossa salvação, desceu dos céus: foi feito carne do Espírito Santo, no seio da Virgem Maria, e se tornou homem. E sofreu e ressuscitou ao terceiro dia, subiu ao céu e foi crucificado por nós sob o poder de Pôncio 69 Cf. SCHWIKART, Georg. Dicionário Ilustrado das Religiões. p. 32. 70 “Do grego “hairesis” = diferença, escolha. Tese que se desvia da doutrina comumente aceita (dogma). As Religiões e Confissões religiosas definiram mais ou menos o que faz e o que não faz parte do seu elenco doutrinário. Caso o membro da comunidade em questão sustente uma opinião fortemente contrária, esta é condenada como heresia, conforme o princípio: Uma doutrina que leva ao erro, já é errônea. - No caso de graves heresias, pode-se chegar até à exclusão da comunidade”. Cf. Ibidem p. 52. 71 İznik, Niceia na Antiguidade, é uma cidade situada na região de Mármara, província de Bursa, Turquia. A antiga cidade foi o local onde se realizaram o Primeiro e o Segundo concílios de Niceia, respectivamente em 325 e 787 d.C. Cf. https://pt.wikipedia.org/wiki/Iznik. 72 Cf. BETTENSON, Henry. Documentos da Igreja Cristã. São Paulo. pp. 62-64.
  • 25. Eclesiologia Página 25 Copyright © 2016 Joab Martins de Lima - todos os direitos reservados. joablimateologo@gmail.com Pilatos, e padeceu, e foi sepultado e ressuscitou ao terceiro dia conforme as Escrituras, e subiu aos céus, e assentou-se à direita do Pai. E novamente deve vir para julgar os vivos e os mortos. E há de vir com glória, para julgar os vivos e os mortos; e o Seu reino não terá fim. E no Espírito Santo. E no Espírito Santo, Senhor e vivificador, que com o Pai e o Filho conjuntamente é adorado e glorificado, que falou pelos profetas. E a quantos dizem: “Ele era quando não era”, e “Antes de nascer, Ele não era”, ou que “foi feito do não existente”, bem como a quantos alegam ser o Filho de Deus “de outra substância ou essência”, ou “feito”, ou “mutável”, ou “alterável”. A todos estes a Igreja Católica e Apostólica anatematiza. E na Igreja, una, santa, católica e apostólica. Confessamos um só batismo para remissão dos pecados. Esperamos a ressurreição dos mortos; e a vida no século vindouro. Amém. O que nos interessa, para o nosso estudo de Eclesiologia, é a última parte do Credo Niceno-Constantinopolitano, que diz Igreja, una, santa, católica e apostólica. 2.1.1 Igreja Una. Ao referir-se à Igreja como “Una”, não se pode confundir com a ideia de “uma Igreja”. A Igreja como Una refere-se à unidade, e esta provem do próprio Deus que lhe dá origem, pois, há um só Deus, um só Senhor, um só batismo, um só Espírito73 . A unidade da Igreja não se refere a unidade denominacional e nem a união de várias Igrejas em uma única Igreja formando uma megaIgreja mundial. A unidade da Igreja refere-se aos alcançados pela graça de Deus, através da fé, ou seja, a abertura ao acolhimento da ação de Deus expressa na salvação em Cristo74 . O Espírito Santo é o responsável pela unidade da Igreja. Sendo assim, podemos afirmar que a unidade da Igreja consiste na comunhão daqueles que só Deus sabe os nomes e conhece, ou seja, uma Igreja invisível, o corpo místico de Cristo75 . Este corpo místico de Cristo tem no texto de Ap 21,2-3 imagens que servem de revelação sobre a Igreja como tenda, cidade, esposa, povo de Deus. Estas expressões apontam para Deus como ponto final da unicidade e unidade que se comunicam com o templo onde ele habita, a cidade cujo princípio é o próprio Deus, o esposo que chama sua esposa trazendo-a a existência e consagrando-a, criando, desta forma, uma unidade. Portanto, a Igreja é única porque Deus é UNO e ÚNICO em sim mesmo76 . Sendo assim, podemos afirmar que o princípio fundamental da unidade da Igreja está no Deus Trino, 73 Cf. CALDAS, Carlos. Fundamentos da Teologia da Igreja. São Paulo. Editora Mundo Cristão. 2007. p. 23. 74 Ibidem. p. 24 75 Ibidem. 76 Cf. CONGAR, Yves. Eclesiologia Del Nuevo Testamento In Mysterium Salutis. Manual de Teologia como história de La salvacion IV/1. La Iglesia. p. 382.
  • 26. Eclesiologia Página 26 Copyright © 2016 Joab Martins de Lima - todos os direitos reservados. joablimateologo@gmail.com aquele que é Pai, Filho e Espírito Santo. Deus Pai arquiteto do plano de salvação; Jesus Cristo consumador do plano de salvação; e Espírito Santo santificador e unificador da Igreja que prepara a Igreja una para seu encontro com o esposo Jesus Cristo. 2.1.1.1 Exemplo bíblico de Unidade da Igreja Tomando como base os livros de Atos dos Apóstolos, podemos notar como era a unidade da Igreja Primitiva. Podemos, assim, destacar três pontos; a) a Igreja tinha unidade no ensino apostólico; b) a Igreja tinha unidade no plano de vida social; e c) a Igreja tinha unidade na celebração do culto77 . a) Unidade no ensino apostólico; essa unidade implica na aceitação por parte da Igreja do ensino apostólico, através do qual era inserida unidade da fé e confissão (cf. At 2,42; 1Cor 1,10; Rm 15,6; Ef 4,14ss). b) Unidade no plano de vida social; essa unidade implica em uma comunidade fraterna que se traduz numa forma de vida comum (cf. At 2,44-47); numa comunidade que voluntariamente repartia os seus bens (cf. 4,32-37; Hb 13,16); numa comunidade unida em sentimentos (cf. At 4,32; Fl 2,2); numa comunidade que repartia o pão por causa de sua convivência fraterna (cf. Mt 5,23-24; 18,19-20). c) Unidade cúltica; essa unidade implica na oração e partilha do pão eucarístico, através do qual os cristãos eram unidos a Cristo e entre si (cf. 1Cor 10,16-17). A forma de unidade vivida pela Igreja primitiva nos leva a refletir em algo, que hoje, torna-se escasso em nossa sociedade e atinge nossas famílias. Esse algo que nos falta é o amor, que consideramos uma marca do evangelho pregado por Cristo e que a Igreja apostólica cultivou. Prova disso é a forma de unidade que a Igreja primitiva vivia, pois, esta vivia, como já elencamos acima: a unidade no ensino apostólico, sendo esta permeada pelo amor, pois, amavam o ensino da palavra do Senhor proferida pelos apóstolos; a unidade no plano de vida social também tinha como base o amor, pois, com o amor fraternal podia-se repartir e tornar em comum os bens que tinham. Embora hoje nossa realidade seja totalmente diferente, há cristãos que se tronaram amantes de si mesmos e não repartem o que tem, com os que não tem, fechando os olhos e o coração para os necessitados; e pôr fim a unidade cúltica nos mostra o quanto tinham o prazer de orar, cultuar e comungar juntos. O comungar causava a união entre eles, porque 77 Cf. CONGAR, Yves. Eclesiologia Del Nuevo Testamento In Mysterium Salutis. Manual de Teologia como história de La salvacion IV/1. La Iglesia. p. 387.
  • 27. Eclesiologia Página 27 Copyright © 2016 Joab Martins de Lima - todos os direitos reservados. joablimateologo@gmail.com repartiam, além dos bens que possuíam e com isso não havia necessitados entre eles, o pão eucarístico, e o alimento que era comum nestas reuniões de comunhão. Cristo como cabeça do corpo Igreja, lhe confere vida e, portanto, esta está sob o seu domínio. Sendo assim, a Igreja, sob o domínio de Cristo, torna-se UNA. No entanto, esta unidade é manifestada na palavra e nos sacramentos. Esta unidade não é uniformidade de organização, doutrina ou vida, mas sim, no fator unificador Evangelho. “As várias comunhões eclesiásticas são expressões diversas da Igreja Una”78 . 2.1.2 Igreja Santa. “Se a Igreja é sinal de salvação, sacramento histórico do amor de Deus, seria uma contradição que não fosse santa”. Assim se expressa o Teólogo Jon Sobrino79 acerca da santidade da Igreja. Demonstrar este atributo da santidade da Igreja é difícil, pois a mesma não é um aglomerado de santos impecáveis, mas de pecadores redimidos por Cristo, composta ao mesmo tempo por pessoas justas e pecadoras, fato este que pode ser visto em várias Igrejas; a pecaminosidade de seus membros. Sendo assim, podemos dizer que a Igreja é ao mesmo tempo santa e pecadora porque os seus membros também o são80 . A Bíblia em algumas passagens do Novo Testamento demonstra que haviam problemas terríveis na Igreja como: mentira (cf. At 5,1-11); divisões e rixas entre os membros (cf. 1Cor 1,10-13); carnalidade entre os membros (cf. 1Cor 3,1-4); imoralidade por parte de membro da Igreja (cf. 1Cor 5,1); discordância de ensino doutrinário ( cf. 1Cor 15,12 ); falta de unanimidade entre irmãos (cf. Fp 4,2-3); inveja, ambição, maldade, autoritarismo (cf. 3Jo 9-11); abandono do primeiro amor, desvios doutrinários, prostituição sagrada, esfriamento espiritual (cf. Ap 2,4-5, 14-16, 20-23; 3,1-3, 14-19). Como, então, falar de santidade da Igreja diante de tais fatos? Precisamos entender que santidade não reflete perfeição. Ser santo não é ser perfeito, pois somente Deus é perfeito em todos os seus atos. A santidade da Igreja refere-se ao seu crescimento (em graça) e fortalecimento dado por Deus que dia a dia trabalha, através do Espírito Santo, para tirar as manchas do pecado que os seus membros possuem. Em outras palavras, santidade é um processo, dependente da ação do Espírito Santo que nela age, e não um estado de vida, pois na Igreja sempre haverá 78 Cf. AULÉN, Gustaf. A Fé Cristã. p. 274. 79 Cf. SOBRINO, Jon. Ressurreição da verdadeira Igreja. São Paulo: Loyola, 1982. Apud CALDAS, Carlos. Fundamentos da Teologia da Igreja. p. 25. 80 Ibidem. p. 25. Cf. AULÉN, Gustaf. op. cit. p. 279.
  • 28. Eclesiologia Página 28 Copyright © 2016 Joab Martins de Lima - todos os direitos reservados. joablimateologo@gmail.com pessoas que não fazem parte do reino de Deus bem como de pessoas hipócritas que vivem uma falsa santidade. Portanto, “o homem não é detentor de qualquer santidade subjetiva própria”, sendo “ao mesmo tempo justo e pecador”81 . A Igreja é santa aos olhos do Senhor. Cada membro é santo pelos méritos de Cristo. A condição de santos não se dá por méritos próprios, mas pela graça de Deus que lhe é conferida. Em razão disso, o Novo Testamento sempre se refere às igrejas como formadas por “santos” (Rm 1,7; 1Cor 1,2; 2Cor 1,1; Ef 1,1; Fp 1,1; Cl 1,2)82 . A Igreja é santa por estar no domínio de Cristo. Esta afirmativa implica em afirmar a obra redentora de Cristo que torna a Igreja santa, porém não num caráter externo de forma hierárquica, institucional, de sociedade fechada e limitada que alega santidade fundamentada em suas próprias qualidades pessoais. A obra redentora de Cristo torna a Igreja santa por seu amor redentor e pelo seu perdão. Confessar a fé numa Igreja santa é confessar a fé na vitória de Cristo. Isso quer dizer que somente pela fé é que podemos ver a santidade da Igreja83 . A santidade da Igreja decorre do fato de o Senhor mesmo estar presente nela e nela realizar a obra de redenção por Ele consumada uma vez por todas. Ele tira os homens da servidão dos poderes do mal e os leva para o novo contexto de vida na nova era da ressurreição84 . A santidade da Igreja reside, também, no fato de que a mesma, embora viva e aja neste mundo, não pertence a este mundo. Esta verdade fundamenta-se no fato que seus membros, que vivem sob o domínio de Cristo, vivem uma perspectiva, na fé, de um mundo superterreno. Esta ideia de santidade, que torna a Igreja não pertencente a este mundo, defende a Igreja de tendências que podem confiná-la a este mundo85 . Contudo, precisamos estar alertas quanto a alienação que pode vir desta santidade, que faz com que a Igreja se feche para o que acontece em seu redor e faz com que seus membros se fechem também para a vida. A santidade da Igreja deve refletir o amor e a justiça divina, justamente pelo fato da Igreja não ser deste mundo. Somente desta forma, a Igreja pode mostrar sua verdadeira cidadania do reino de Deus, sendo luz de Cristo em um mundo cheio de trevas, e não se fechando em si mesma. 81 Cf. AULÉN, Gustaf. A Fé Cristã. p. 278. 82 Cf. CALDAS, Carlos. Fundamentos da Teologia da Igreja. p. 26. 83 Cf. AULÉN, Gustaf. op. cit. p. 278. 84 Ibidem. p. 279. 85 Ibidem. p. 279.
  • 29. Eclesiologia Página 29 Copyright © 2016 Joab Martins de Lima - todos os direitos reservados. joablimateologo@gmail.com 2.1.3 Igreja Católica Antes de falar sobre o atributo “Igreja Católica”, vamos entender o que o termo “Católica” significa. O termo Católica (o) deriva do grego καθολικος, (katolikos) e é formada pela combinação de duas palavra gregas; kata (kata) – com sentido de concernente, pertencente a; e o[lovj (ólos) com sentido de – totalidade, abrangente86 . Sendo assim, podemos entender que o termo “católica” expressa um sentido; de pertencer a uma totalidade, um todo, universal. Portanto, quando nos referimos ao atributo da Igreja como “Igreja Católica”, estamos na verdade expressando o sentido de autenticidade e universalidade da Igreja. A Igreja por ser católica é uma Igreja universal, não pertencendo a uma localidade. Nos primeiros séculos de sua história, a Igreja se denominava “católica”, indicando sua mundialidade em contraste com o aspecto limitado da igreja local. Esse é o sentido básico que aparece no Credo Apostólico...creio [...] na santa igreja católica... O termo também apontava para a preservação da pureza da ortodoxia doutrinária: os cristãos católicos criam na plena divindade e na plena humanidade de Jesus, em contraste com os “arianos”, que só aceitava a plena humanidade do Salvador87 . Diante de heresias como arianismo, fez-se necessário que a Igreja no séc. IV, tivesse em seu credo uma afirmação de universalidade, para mostrar que o cristão católico está legitimamente ligado à Igreja Católica e que não se separou dela como herege. Como entender, no sentido hodierno, o atributo de Igreja Católica? São Cirilo (314-387), Bispo de Jerusalém no sec. IV d.C, em sua catequese define a catolicidade da Igreja da seguinte forma: A Igreja é chamada católica porque se estende por todo o mundo, de um extremo da terra ao outro. E porque ensina completamente, e sem quaisquer omissões, todas as doutrinas que devem ser conhecidas da humanidade concernentes aos assuntos visíveis e invisíveis, terrestres e celestes; e porque congrega todos os tipos de pessoas – soberanos ou súditos, eruditos ou ignorantes – sob influência da verdadeira piedade; e porque universalmente trata de todo tipo de pecado e o cura, seja cometido pela alma seja pelo corpo [...] Ela (a igreja) é a noiva de nosso Senhor Jesus Cristo, o Filho unigênito de Deus88 . 86 Cf. STRONG, James. Greek Dictionary of The New Testament. pp. 238, 244. 87 Cf. CALDAS, Carlos. Fundamentos da Teologia da Igreja. p. 27. 88 Catequese XVIII apud CALDAS, Carlos. Fundamentos da Teologia da Igreja. p. 28.
  • 30. Eclesiologia Página 30 Copyright © 2016 Joab Martins de Lima - todos os direitos reservados. joablimateologo@gmail.com Esta catequese aponta para um aspecto missionário da Igreja. A Igreja estendida para as extremidades do mundo, revela a importância missionária, pois esta abrange pessoas de países diferentes, com culturas e costumes diferentes. A Igreja não está limitada a um território como um país ou cidade. A mensagem do evangelho é universal, “porque o ato de Deus em Cristo tem significação e propósitos universais”89 . A mensagem do evangelho, da mesma forma que passou dos limites de Jerusalém por causa da perseguição a Igreja primitiva, deve ser pregada a todos os povos, pois essa é a grande comissão que lhe foi conferida; pregar e fazer discípulos em todo o mundo (cf. Mt 28,19; Mc 16,15). O caráter missionário de inclusão no reino de Deus, imprime marca de autenticidade e torna a Igreja Católica. 2.1.4 Igreja Apostólica Para melhor compreensão sobre a característica Igreja Apostólica, primeiramente, esclareceremos o que significa o termo apóstolo e o que os apóstolos de Jesus significam para a Igreja e sua sucessão histórica exercida pelos Bispos. O termo apóstolo significa enviado90 . No cristianismo primitivo os apóstolos eram homens e mulheres que gozaram de grande prestígio e autoridade por serem testemunhas oculares do ministério, paixão e ressurreição de Jesus, quando estiveram intimamente ligados a ele91 . O apóstolo é serviço autorizado em nome e incumbência de Cristo. Ele tem sua origem num ato historicamente único de missão (envio) pelo Ressurreto. Sua tarefa é a pregação do evangelho fundado na ressurreição de Cristo e que remete para a vida e obra de Jesus. Seu objetivo é a congregação da igreja, a reunião do povo escatológico de Deus fundado sobre esse testemunho único na história92 . O último dos apóstolos de Jesus a morrer, por volta do ano 90, foi João o mais jovem dentre eles. Conta a tradição que João morreu em Éfeso onde foi bispo de todos 89 Cf. AULÉN, Gustaf. A Fé Cristã. p. 282. 90 Apóstolo (avpo,stoloj), é literalmente, “enviado” (formado de apo, “de”, e stello, “enviar”). Enviado, mensageiro. “A palavra é usada acerca do Senhor Jesus para descrever sua relação com Deus (cf. Hb 3.1; Jo 17.3). Os doze discípulos escolhidos pelo Senhor para treinamento especial foram chamados assim (cf. Lc 6.13; 9.10). Paulo, embora tivesse visto o Senhor Jesus (cf. 1Cor 9.1; 15.8), não tinha ‘acompanhado’ os Doze ‘todo o tempo’ do Seu ministério terrestre e, consequentemente, não era elegível para um lugar entre eles, de acordo com a descrição de Pedro sobre as qualificações necessárias (cf. At 1.22, ARA). Paulo foi comissionado diretamente pelo próprio Senhor, depois de sua ascensão, para levar o Evangelho aos gentios”. Cf. VINE, W. E.; UNGER, M. F.; WHITE Jr., W. (Ed.). Dicionário Vine. Rio de Janeiro: CPAD, p 407. 91 Cf. OLSON, Roger. História da Teologia Cristã. Ed. Vida. São Paulo. p. 25. 92 Cf. WIEDENHOFER, Siegfried. In Manual de Dogmática Vol 2. Eclesiologia. p. 123.
  • 31. Eclesiologia Página 31 Copyright © 2016 Joab Martins de Lima - todos os direitos reservados. joablimateologo@gmail.com os cristãos e das Igrejas da região da Ásia Menor93 . Desta forma, com o desaparecimento dos apóstolos, surgiram os bispos que são os discípulos dos apóstolos, também conhecidos na história da Igreja por “pais apostólicos”94 , pois conheceram um ou mais apóstolos, mas não eram apóstolos. Os Bispos foram nomeados pelos apóstolos e os sucederam diante das Igrejas por eles fundadas, e mantiveram o ensino apostólico diante das heresias cismáticas que ameaçavam e ameaçariam a Igreja nos séculos seguintes. Portanto, após a era apostólica não se empregou mais o título apóstolo e na era patrística permaneceu o entendimento que os apóstolos eram aqueles que foram chamados por Jesus e testemunharam a sua ressurreição95 . Como então a Igreja pode ser apostólica nos dias de hoje? A Igreja é Apostólica por estar “edificada sobre o fundamento dos apóstolos”. É apostólica “por seguir a doutrina dos apóstolos” (cf. At 2,42). É a doutrina da fé. Isso legitima a sucessão apostólica, mas não no sentido episcopal e sim no sentido do depósito da fé, ou seja, o evangelho apostólico (cf. 2Tm 2,2) aquele que os apóstolos pregaram96 . A apostolicidade da Igreja da mesma forma como sua catolicidade, possui aspecto missionário. Esse aspecto missionário relacionado a apostolicidade é o dever de manter a estrutura apostólica no sentido de ser enviada, de ser missionária. A Igreja somente é igreja se ela seguir ao testemunho apostólico e se ela der continuidade perante o mundo, em pregação, culto e comunhão, ao testemunho apostólico que proporciona ao Senhor ressurreto nova forma histórica atual97 . Assim como a Igreja primitiva estava fundamentada no ensino e prática apostólica e transcendeu os limites de onde se originou (Jerusalém), assim deve ser a Igreja hodierna em seu dever de conservar a transmissão do verdadeiro evangelho pregado por Jesus sem, no entanto, limitá-lo em algum local geográfico. 93 Cf. OLSON, Roger. História da Teologia Cristã. p. 25. 94 A categoria de “pais apostólicos” consiste em pessoas e documentos que interpretam e pregaram a mensagem apostólica na primeira geração depois dos apóstolos, que foi cercada de falsos evangelhos e ataques de céticos pagãos. Quem foram os pais apostólicos? A partir do século XVI, os historiadores incluem nessa categoria entre oito e dez autores e documentos anônimos. (Os historiadores tradicionalmente referem-se a certos documentos anônimos como “pais apostólicos”). Entre os aceitos por todos estão Clemente, Inácio, Policarpo, o Didaquê [o ensino dos doze apóstolos], epístola de Barnabé e O pastor de Hermas. Outros comumente citados e descritos como pais apostólicos são a chamada Segunda epístola de Clemente, de autor desconhecido, a Epístola a Diogneto e fragmentos de escritos de Papias. Cf. OLSON, Roger. História da Teologia Cristã. p. 40. 95 Cf. CALDAS, Carlos. Fundamentos da Teologia da Igreja. p. 29. 96 Ibidem. 97 Cf. WIEDENHOFER, Siegfried. In Manual de Dogmática Vol 2. Eclesiologia. p. 123.
  • 32. Eclesiologia Página 32 Copyright © 2016 Joab Martins de Lima - todos os direitos reservados. joablimateologo@gmail.com 2.2 Atos fundamentais da Igreja A Igreja é estabelecida em sua existência e missão em atos fundamentais como: pregação e testemunho; culto divino, sacramentos e oração; e serviço do amor e comunhão fraterna. A Igreja é resultado desses atos, pois na sua missão de evangelizar, a Igreja testemunha, anuncia e proclama o evangelho de Jesus Cristo, porque ela própria é criação da palavra de Deus. A Igreja também celebra o culto divino e os sacramentos, pois celebra e rememora o sacrifício de Cristo e volta a ser constituída novamente. A Igreja tem a incumbência da diaconia e comunhão, porque a mesma é resultado do amor–serviço de Jesus e de todos os que o seguiram98 . 2.2.1 Pregação e testemunho A Igreja por ter acolhido, através dos apóstolos, a palavra de Cristo, ou seja, a boa nova anunciada, recebe a incumbência de dar continuidade a esse testemunho e anuncio. Não poderá existir fé salvadora, ou seja, a fé que conduz a Cristo se não houver anuncio e testemunho. A palavra anunciada e testemunhada pela Igreja deve gerar na mesma comunhão e experiência com Deus, pois esse anuncio e testemunho só se tornará vivo e eficaz nos ouvintes do evangelho se tiver vida e eficácia no anunciante, a Igreja. 2.2.2 Culto divino, sacramentos e oração A Igreja tem a missão e a incumbência de no culto divino anunciar a palavra da conciliação, inserir novos crentes através do Batismo dentro da comunidade conciliadora, orar e prestar ações de graças nesta comunidade conciliadora e através da Eucaristia celebrar a memória da morte e ressurreição de Cristo. Tudo isto deve acontecer com fé e responsabilidade por toda a comunidade eclesial99 . Culto divino, sacramentos e oração, como uma incumbência da Igreja, devem ocorrer por causa da experiência dos membros da Igreja com Deus através do sacrifício vicário de Cristo. Os membros da Igreja são pessoas reconciliadas com Deus (cf. Rm 5,10; 2Cor 5,18; Col 1,20-22) e por isso o cultuam, celebram a morte e ressurreição de Cristo e oram exercendo a sua comunhão comunitária e individual. 98 Cf. WIEDENHOFER, Siegfried. In Manual de Dogmática Vol 2. Eclesiologia. p. 104. 99 Ibidem. p. 105.
  • 33. Eclesiologia Página 33 Copyright © 2016 Joab Martins de Lima - todos os direitos reservados. joablimateologo@gmail.com 2.2.3 Diaconia e comunhão fraternal A Igreja, como uma comunidade, tem a incumbência da diaconia e comunhão fraterna. Estas são consequência da experiência prévia, vivida por seus membros, no amor de Deus. É nesta diaconia ou serviço do amor e na comunhão fraterna em que a Igreja deve empenhar-se na incumbência de discípular os seus membros para que haja comunhão fraterna através do amor – serviço. No entanto, deve-se ter consciência de que isto só será possível se houver por parte da comunidade eclesial a responsabilidade e a fé100 . 100 Cf. WIEDENHOFER, Siegfried. In Manual de Dogmática Vol 2. Eclesiologia. p. 106.
  • 34. Eclesiologia Página 34 Copyright © 2016 Joab Martins de Lima - todos os direitos reservados. joablimateologo@gmail.com 3 Sacramentos da Igreja 3.1 Significado de sacramento e sua abordagem histórica Os sacramentos ocupam uma posição de destaque, pois fazem parte da liturgia da Igreja. O termo sacramento não é encontrado na Bíblia no sentido como empregamos hoje. Este é a tradução do grego musth,rion (mysterion)101 , traduzido para o latim na Vulgata Latina102 , como sacramentum103 . O termo mysterion na cultura grega era empregado em sentido cultico. Tem o significado de fechar os olhos ou a boca, refletindo uma reação que não se pode explicar em palavras. Há no Novo Testamento este entendimento em algumas passagens: “o poder da ilegalidade (cf. 2Ts 2,7); a transformação dos seres humanos por ocasião da parusia104 (volta) de Cristo (cf. 1Cor 15,51); a futura história de Israel (cf. Rm 11,25s)”. 101 O termo grego musth,rion (mysterion) ocorre 17 vezes (cf. Mc 4,11; Rm 11,25; 1Cor 2,1; 15,51; Ef 1,9; 3,3; 5,32; 6,19; Cl 1,26; 4,3; 2Ts 2,7; 1Tm 3,9,16; Ap 1,20; 10,7; 17,5; 17,7). 102 “No século I d.C., os livros bíblicos já circulavam em latim, pois era a língua do Império romano. As versões bíblicas nesta língua ficaram conhecidas como Vetus Latina que seguia uma tradução do AT, a partir do texto grego da LXX. A Vetus Latina é uma expressão usada pelos estudiosos, para falar das várias tradições da versão latina da Bíblia que circularam durante os séculos I-VIII d.C. A Vetus Latina é anterior à Vulgata e continuou circulando depois dela. A sua tradução baseia-se, para o AT, na versão dos LXX. Após o século XVI, uma versão latina da Bíblia tornou-se o texto oficial da Igreja Católica Romana ou do rito Ocidental, conhecida como Vulgata. A Vulgata deve-se ao interesse do Papa Damaso I (366- 384), que queria fazer uma revisão da Bíblia em latim, a partir dos manuscritos em hebraico, aramaico e grego. Tal tarefa foi confiada a um ilustre personagem, São Jerônimo, que se transferiu para a Palestina, instalando-se em Belém, numa gruta próxima daquela que se acredita ter sido o local onde nasceu Jesus Cristo. São Jerônimo levou mais de vinte anos para fazer as traduções. A Vulgata foi oficializada, solenemente, pelo magistério da Igreja Católica durante o Concílio de Trento (1545-1563), após uma nova revisão do texto, para corrigir os erros que, sucessivamente, foram cometidos pelos copistas. A versão oficial, texto padrão estampado na Bíblia de Gutemberg, entre os anos 1452-1455, servirá de base para as várias traduções que serão feitas nas diferentes línguas. A Vulgata, para o NT, totaliza 27 livros e 46 para o AT”. Cf. FERNANDES, Leonardo Agostini. A Bíblia e a sua mensagem. Introdução à leitura e ao estudo da Bíblia. pp. 28-29. 103 O termo sacramentum ocorre na vulgata latina dez vezes, sendo quatro vezes no Antigo Testamento (cf. Tb 12,7; Dn 2,30, 47; 4,6) e no Novo Testamento ocorre seis vezes (cf. Ef 1,9; 3,3; 5,32; 1Tm 3,6; Ap 1,20; 17,7). 104 “O vocábulo grego parousia (de páreimi: estar presente, estar aí, chegar) é originalmente referido tanto para a descida ou manifestação de pessoas divinas na terra (por ocasião de uma festa religiosa ou por uma intervenção milagrosa), quanto para as visitas que reis e príncipes fazem às cidades submetidas ao seu império. O sentido principal do termo, conforme a cultura Grega, é de visita, chegada, advento de um soberano ou de uma divindade. Serve tanto para ser empregado como conceito político, quanto religioso. Esta identificação entre o profano e o sagrado deve-se ao fato de que em ambiente helenístico as figuras reais são consideradas com acentos divinos. O que sempre de destaca para a parousia é o seu caráter triunfal e glorioso. Trata-se de uma manifestação em poder e glória, que tem um acento explicitamente jubiloso e festivo. No Novo Testamento, o conceito é utilizado para descrever a futura vinda de Cristo, Senhor de tudo e de todos (Pantocrátor) do final dos tempos. As descrições desse advento valem-se das imagens da manifestação gloriosa do imperador romano. Na época imperial, a parusia do César podia inclusive dar lugar a uma nova era, comportando uma virada determinante da história. O imperador era aclamado em sua parusia como senhor e portador da salvação. O povo aguardava com expectativa a sua vinda, porque da mesma se esperava conseguir benefícios excepcionais. Cf. BRUSTOLIN, Leomar Antônio. Quando Jesus vem...: a parusia na escatologia cristã. São Paulo-SP. Ed. Paulus. 2001. p. 17.
  • 35. Eclesiologia Página 35 Copyright © 2016 Joab Martins de Lima - todos os direitos reservados. joablimateologo@gmail.com No entanto, o termo mysterion não aparece relacionado a atos litúrgicos. Por conseguinte, o entendimento de mysterion faz-se necessário para “descrever a relação de sacramentos com o evento crístico e com o mistério de sua presença na Igreja” 105 . Quanto a palavra latina sacramentum, tomando como base o seu radical sacr em emprego religioso, significa: “destinar algo ou alguém à esfera do sagrado, ‘consagrar’; sacramentum é tanto o ato de consagração como também o meio consagrador”. Etimologicamente é “algo que santifica o que é santo”. No uso linguístico, na Antiguidade Latina, sacramentum é empregado em sentido jurídico como: juramento em um processo civil; juramento a bandeira no exército; e juramento de partidos em litígio em relação a quantia de dinheiro depositada como caução de processo jurídico. Nestes três exemplos, sacramentum tem conotação religiosa, pois “juramento e juramento à bandeira entregam a pessoa ao juízo da divindade, a caução processual é destinada a um santuário no caso de uma derrota” 106 . Com o decorrer da história da Igreja, o significado de sacramento passou por um processo de desenvolvimento, quanto ao seu entendimento. Na patrística107 Santo Agostinho († 430) denomina sacramentos como “sinais dados, sinais sagrados, porque apontam para uma realidade sagrada”. Ou seja, através de coisas visíveis o crente é conduzido a realidade invisível. Nesta definição o batismo é tomado como exemplo, pois, ao ser ministrado, a água “toca o corpo e lava o coração”. A água é o sinal visível que aponta para uma realidade invisível, a purificação. No entanto, só terá esse efeito mediante a palavra que neste caso é a fórmula batismal em nome da Santíssima Trindade. Esta palavra tem fundamentação teológica, pois é “palavra de fé da Igreja, palavra extraída da Bíblia, em última análise, palavra de Cristo. Daí tem seu poder”108 . A ampla conceituação de sacramento na Igreja antiga vai perdurar até o século XII, quando começam a surgir os primeiros tratados sobre os sacramentos. O teólogo 105 Cf. NOCKE, Franz-Josef. In Manual de Dogmática Vol 2. Doutrina Geral dos Sacramentos. pp. 173- 174. 106 Ibidem. pp. 173-178. Cf. OTT, Ludwig. Manual de Teologia Dogmática. Editoral Herder. Barcelona. Espanha. 1966. p. 486. 107 A teologia patrística abarca o período de seis séculos, compreendendo desde a geração imediatamente posterior aos apóstolos até a dos que prepararam a teologia medieval. A teologia patrística viveu fases distintas da seguinte forma: séc. I-II Padres apostólicos (Clemente, Inácio, Policarpo, Didaché); séc. II Apologistas (Justino, Taciano, Teófilo, Carta a Diogneto); séc. II-III Reflexão sistemática (Tertuliano, Orígenes, Irineu, Hipólito); séc. III-IV Escolas teológicas (Alexandria: Atanásio, Cirilo. Capadócia: Basílio, Gregório de Nazianzo, Gregório de Nissa. Antioquia: Teodoro, Cirilo de Jerusalém, João Crisóstomo); séc. IV-V Fase de esplendor: (Agostinho, Jerônimo, Ambrósio, Leão Magno, Efrém); séc. VI-VII Final (Gregório Magno, Isidoro de Sevilha, Boécio, João Damasceno). Cf. LIBÂNIO, J. B; MURAD, Afonso. Introdução à Teologia. Perfil, enfoques, tarefas. Ed. Loyola. São Paulo-SP. pp. 115,124. 108 Cf. NOCKE, Franz-Josef. op.cit. p. 181.
  • 36. Eclesiologia Página 36 Copyright © 2016 Joab Martins de Lima - todos os direitos reservados. joablimateologo@gmail.com Hugo de São Vitor († 1140), afirma que os sacramentos “contem a graça que sinalizam; portanto, não são apenas sinais, mas também vasos da graça”. Esta figura do vaso tem significado terapêutico na doutrina sacramental da escolástica109 , e a graça sacramental é entendida como remédio contra o pecado e suas consequências. Isto faz dos sacramentos recipientes de medicamento. Hugo de São Vitor dá uma definição mais restrita de sacramento em sua obra sacramentum christianae fidei (sacramento da fé cristã); sacramento é um elemento material, apresentado exteriormente perceptível aos sentidos e que, em virtude de uma semelhança, representa, em virtude da instituição, significa e em virtude de uma consagração santificadora, contém uma graça espiritual invisível110 . Outro teólogo escolástico, Pedro Lombardo († 1160) afirma que sacramento não é somente sinal, mas causa de graça. Já Tomás de Aquino († 1274), defende que sacramentos “são instrumentos na mão de Deus. O próprio Deus permanece sendo o verdadeiro sujeito do agir da graça; no entanto, os sacramentos não são necessários apenas em virtude de uma ordem divina, mas em virtude da causa em si”111 . Entre os teólogos protestantes há um entendimento diferente em relação a sacramento. Este refere-se a fórmula teológica sacramental da escolástica, ex opere operato, que quer dizer, que independente da fé do ministrante e do recebedor, o sacramento não perde a sua eficácia, pois é o agir de Deus que confere ao sacramento a sua eficácia. Esta fórmula “quer deixar claro que nos sacramentos o sujeito da ação não é o ser humano, e, sim, Deus, respectivamente Cristo”112 . A refutação dos teólogos protestantes em relação a fórmula teológica sacramental da escolástica, ex opere operato, está no argumento que os sacramentos necessitam de 109 A teologia escolástica medieval atravessou praticamente oito séculos, marcando ainda presença durante a idade moderna. Pode-se identificar três grandes fases; a transição e gestação da dialética, a grande escolástica e a escolástica tardia. Séc. VII-X gestação da escolástica; séc. XI-XII inícios da escolástica (Anselmo de Cantuária, Pedro Abelardo, Pedro Lombardo); séc. XIII alta escolástica (Escola Dominicana: Alberto Magno, Tomás de Aquino, Mestre Eckart); séc. XIV-XV escolástica tardia (Escola franciscana: Boaventura, Duns Escoto, Guilherme de Ockham, Gabriel Biel). Cf. LIBÂNIO, J. B; MURAD, Afonso. Introdução à Teologia. Perfil, enfoques, tarefas. pp. 127,131. 110 Na época da pré-escolástica ainda proliferam ideias muito divergentes sobre o número dos sacramentos. Os bispos Fulberto de Chartres († 1028) e Bruno de Würzburg († 1153) admitem somente dois: Batismo e Eucaristia, enquanto Bernardo de Claraval († 1153) admite dez (entre eles o lava pés), e o cardeal Pedro Damião († 1072) quer doze (inclusive a unção do rei). Outros se movem entre essas grandezas. Somente com o interesse sistematizante da escolástica primitiva surgem os primeiros tratados sobre os sacramentos, e, com eles, tentativas de definição, bem como (por volta da metade do século XII) a fixação em sete. Cf. NOCKE, Franz-Josef. In Manual de Dogmática Vol 2. Doutrina Geral dos Sacramentos. p. 181. 111 Ibidem. p. 182. 112 Ibidem. pp. 183-184.