O documento discute os fundamentos e conceitos do Planejamento Estratégico Situacional (PES) de acordo com Carlos Matus. O PES é caracterizado como um método democrático e participativo focado em problemas e resultados. Matus critica métodos tradicionais de planejamento e defende que o planejamento deve lidar com a complexidade da realidade social e ser uma "aposta" sobre o futuro, considerando incertezas. O PES estrutura-se em quatro momentos: explicativo, normativo, estratégico e tático-operacional.
1. Planejamento Estratégico
Situacional (PES)
Fundamentos e conceitos
Texto referência: MATUS, Carlos. O Plano como aposta. In.: Planejamento e
orçamento governamental: coletânea. James Giacomoni e José Luiz
Pagnussat (orgs). Brasília, ENAP. 2006. Pag. 115-144.
2. Introdução:
Essa metodologia têm como característica o planejamento
democrático, participativo, voltado para o enfrentamento
de problemas e com foco em resultados.
A sistemática de elaboração do PPA brasileiro incorporou
os elementos da fundamentação teórica, os princípios e o
enfoque metodológico e valeu-se de uma combinação e
integração de métodos.
O PES é apropriado para reforçar a preocupação com a
visão estratégica, com a gestão e a participação dos
diversos atores sociais. Já a organização dos programas
segue a estrutura do Quadro Lógico, e o processo de
elaboração segue os passos do ZOPP, com a identificação
e a análise de problemas e a seleção dos projetos para
enfrentamento das causas do problema.
3. O autor:
Carlos Matus (19/11/1931,
Santiago, Chile; 21/12/1998,
Caracas, Venezuela)
Economista, formado pela
Universidade do Chile e pela
Universidade de Harvard.
Tem uma vasta produção sobre o
tema do planejamento.
O texto “O plano como aposta”
(1987), sintetiza os principais
fundamentos do método PES.
4. Pressupostos do PES:
O plano e a governabilidade do homem sobre as
situações
“O plano é o produto momentâneo do processo pelo
qual um ato seleciona uma cadeia de ações para
alcançar seus objetivos. Em seu significado mais
genérico, podemos falar de plano de ação como algo
inevitável na prática humana, cuja única alternativa é
o domínio da improvisação.
Esse conceito genérico de plano não depende, por
conseguinte, de sua pertinência a um sistema
econômico-social determinado, mas do uso da razão
técnico-política na tomada de decisões.”
5. Pressupostos do PES:
“Sempre existe, porém, o perigo de confundir esse
processo com um cálculo determinado por leis científicas
precisas, apoiado num diagnóstico preciso da realidade. O
plano, na vida real, está rodeado de incertezas,
imprecisões surpresas, rejeições e apoio de outros atores.
Em consequência, seu cálculo é nebuloso e sustenta-se na
compreensão da situação, ou seja, a realidade analisada
na particular perspectiva de quem planifica. Eventualmente
esse plano conduz à ação, de modo que, para repetir a
frase de John Friedmann, pode-se dizer que o plano é
uma mediação entre o conhecimento e a ação. Tal
mediação, contudo, não se produz através de uma relação
simples entre a
realidade e as ciências, porque o conhecimento da
primeira vai além do âmbito tradicional da segunda.”
6. Pressupostos do PES:
Esse método contrapõe-se (visão crítica) ao
planejamento tradicional e propõe uma
abordagem tecnopolítica do planejamento.
Segundo Matus, planejar está associado à
ideia de preparação e controle do futuro,
considerando a reflexão sistemática sobre a
realidade a enfrentar e os objetivos a atingir.
7. Plano como aposta
Processo
de
Governo
PURO AZAR CERTEZA
ABSOLUTA
PLANO:
combinação de
cálculo e aposta
Absoluto
descontrole,
aposta é caso de
sorte ou azar
Planejamento
tradicional
O jogo da corda e do sino
(sistema semi controlado)
(vida real)
8. Plano como aposta
No jogo social o futuro é incerto e nebuloso, não
predizível. Ingredientes de incerteza:
Ignorância quanto ao futuro;
Criatividade dos jogadores;
Opacidade da linguagem;
O jogo maior (contexto).
Conflito de planos e objetivos é fonte de
incertezas.
O problema é sempre relativo a um jogador;
Em síntese o domínio intelectual da complexidade do
jogo semi-controlado tem quatro momentos/desafios:
Saber explicar a realidade do jogo
Delinear propostas de ação
Pensar estratégias
Improvisação subordinada
9. Críticas ao planejamento tradicional:
Para Matus, os métodos tradicionais de planejamento
são impotentes para lidar com a complexidade da
realidade social, são extremamente normativos.
Concebidos como princípios deterministas, esses
métodos observam o futuro como mera consequência
do passado e não levam em consideração a
capacidade de planejamento de outros atores, nem a
ocorrência de surpresas ou a existência de
incertezas.
Na visão do autor, não cabe ao planejamento
predizer o futuro, mas buscar viabilidade para criar o
futuro. Ressalta, ainda, que o planejamento, mais que
predizer o futuro, constitui-se em uma “aposta” com
relação a esse futuro desejado.
10. Pressupostos:
O planejamento é configurado como uma
espécie de “cálculo que preside a ação para criar
o futuro com imaginação, a partir das
possibilidades que sejamos capazes de
descobrir”.
Os planejadores devem levar em consideração
que o jogo social é um jogo aberto, de
contornos nebulosos e, por conseguinte,
carregado de incertezas. O planejamento deve
ser presidido, portanto, pela reflexão antes e
durante a ação.
11. Pressupostos:
Planejamento não é monopólio do Estado pois conta
com a participação de diversos atores;
Iniciativa – resposta de agentes criativos
X
Relação de causa – efeito (sistemas naturais)
12. Premissa principal:
A premissa principal do PES baseia-se no
pressuposto de que a realidade social é
marcada pela complexidade e por
conflitos, porque nessa realidade coexistem
vários atores com objetivos conflituosos e
com diferentes perspectivas para explicar o
contexto em que se inserem.
Cada sujeito explica a realidade
considerando a posição que ocupa no
sistema planejado e age segundo sua
explicação situacional.
13. Premissa principal:
De acordo com Matus, o PES constitui um
instrumento de dupla face: é, ao mesmo
tempo, um método e uma forma de
governo.
Desenhado como instrumento de
planejamento público, colocado à disposição
da alta direção dos governos, é um método e
uma ferramenta que serve ao planejador
governamental; visto pela perspectiva da
articulação governo-sociedade, é ou envolve
uma maneira de governar.
14. Enfoque metodológico:
O método PES caracteriza-se, ainda, pelo enfoque
metodológico, considerando-se alguns elementos
fundamentais: a análise de problemas, a identificação de
cenários, a visualização de outros atores sociais, etc.
É no chamado triângulo de governo, sem dúvida, a
referência que melhor caracteriza o PES.
De acordo com Matus, existem três dimensões,
interdependentes entre si, para aferir a possibilidade de
êxito de um governo. A figura do triângulo representa a
ação do governo que se articula em três vértices de um
sistema complexo, constituído pelo “projeto de governo”,
pela “governabilidade” e pela “capacidade de governo”.
15. Triangulo de Governo
Ambiente do gestor público “Triângulo de Governo”:
Projeto de
Governo
Governabilidade
Capacidade
de Governo
Direção que quer imprimir: refere-se à
existência de projetos e ao conteúdo
da proposta de governo, que começa
pela seleção de problemas e pela
definição de como enfrentá-los.
Competência técnica e
recursos financeiros:
corresponde à capacidade
pessoal e institucional de
governo; ao capital intelectual;
à experiência; à perícia; à
capacidade de formular
projetos, políticas e normas
legais, pelas condições
técnicas e administrativas. Em
síntese, trata-se das condições
que permitem a elaboração de
um projeto de governo
inteligente, a administração da
governabilidade e a criação de
ferramentas de governo.
Potencial de articulação com
agentes envolvidos nos
ambientes externos e internos:
corresponde ao grau de controle
que o governo possui das
circunstâncias externas, que têm
poder de afetar os resultados do
projeto; à relação entre o peso
das variáveis que o governo
controla e as que não controla; à
capacidade de articular e de
mobilizar alianças e parcerias,
assim como recursos políticos e
estratégicos
16. Triangulo de Governo
“Triângulo de Governo” proposto por Matus pressupõe que
essas variáveis são interdependentes, de tal forma que um
governo não será melhor do que o seu projeto, mas
poderá, sem dúvida ser pior, na medida que não tiver
condições de construir governabilidade ou apoio social e
político a seu projeto, e/ou se for falho na sua capacidade
de governar.
Capacidade de governo deve ser entendida como “o
acervo de técnicas, métodos, destrezas e experiências de
um ator ou equipe de governo, para conduzir o processo
social a objetivos declarados, dados a governabilidade do
sistema e o conteúdo propositivo do projeto de governo”
(MATUS,1993)
17. Estrutura do plano (modular)
A estrutura do plano proposta por Matus é
modular, pois, diante de mudanças de cenário
de cálculo do plano, podem-se introduzir, retirar
ou redefinir algumas operações.
O caráter modular do plano permite seu
ajustamento racional à realidade, o que
possibilita expandi-lo ou restringi-lo, agregar ou
combinar diferentes operações em diferentes
estratégias.
18. Estrutura do plano (modular)
Matus distingue quatro grupos de módulos:
módulos explicativos (macroproblemas,
megaproblemas, problemas, etc.);
módulos de ação (projetos de ação, operações,
ações, etc.);
módulos de gestão (organismos que assumem
responsabilidades por problemas e operações); e
módulos complementares (cenários, planos de
contingência, etc.).
19. Quanto ao tempo:
Quanto aos períodos de tempo, o planejamento opera
com quatro instâncias temporais articuladas e
interdependentes:
o planejamento na conjuntura (como tentativa de
sistematizar, no dia-a-dia, o cálculo que precede e
preside a ação);
o planejamento anual operativo (ou plano de ação
anual);
o planejamento para o período de governo (ou de médio
prazo);
o planejamento de longo prazo (cuja função é antecipar
o futuro que se quer criar).
20. Momentos da dinâmica do processo:
No contexto do PES, momento é a instância
repetitiva de um processo de cadeia contínua
sem começo nem fim.
Os momentos não seguem uma sequência linear
obrigatória, podem ser recursivos em razão da
interação com o contexto, e não são
excludentes, mas cada problema do plano, e o
plano em seu conjunto, desenvolve-se passando
pelos quatro momentos.
21. Momentos da dinâmica do processo:
Desenvolve-se passando pelos quatro momentos:
o momento explicativo - substitui o antigo
diagnóstico, é a fase da identificação, seleção e
priorização de problemas estratégicos, bem como o
debate sobre as causas, sintomas e efeitos;
o momento normativo - é a hora de definir as
propostas do plano;
o momento estratégico - é a fase do desenho da
estratégia;
o momento tático-operacional - é o momento do
fazer, da ação, de finalmente agir sobre a realidade
concreta.
22. Momentos (passos ou fases)
Momento
Estratégico:
viabilidade
estratégia
das ações
(cenários e
atores)
Momento
Normativo:
conjunto de ações
ou operação
(nós-críticos)
Momento
Explicativo:
conceito de
problemas.
Momento
Tático-Operacional:
é o momento
de fazer
23. Passos ou fases
O enfoque participativo e estratégico do PES é
estruturado através de quatro grandes passos ou
fases que podem ser recursivas e não-lineares, mas
que representam um sequenciamento lógico da
elaboração teórica do planejamento:
I . Momento Explicativo: trabalhar com o conceito de
problemas. A realidade é composto de problemas,
oportunidades e ameaças.
O momento Explicativo se assemelha a um
diagnóstico da realidade, porém tem algo a mais que
um mero diagnóstico. É neste estágio que o gestor
deve analisar os problemas, observar os custos e
resultados e a possibilidade de enfrentá-los com
êxito.
24. Passos ou fases
II. Momento Normativo: após a identificação, seleção e
priorização de problemas, bem como o debate sobre
as causas, sintomas e efeitos desenha-se o conjunto
de ações ou operações necessárias e suficientes
para atacar as causas fundamentais dos problemas
(Nós Críticos).
O momento Normativo é o período propositivo do
planejamento onde o elaborador deve se perguntar
“Como deve ser a realidade?”, e através dessa
indagação contrapor os problemas já vistos no
momento explicativo e definir as maneiras como
enfrentá-los.
25. Passos ou fases
III. Momento Estratégico: debate sobre a viabilidade
estratégia das ações planejadas. Dois instrumentos-
processos cabem aqui: a análise de cenários e a
análise criteriosa dos demais atores sociais ou
agentes.
Momento Estratégico é a articulação do “dever ser”
com o “poder ser”. Confunde-se com o momento
normativo, mas tem que se ter em conta que há
diferença entre como a realidade é, e como deveria
ser. No momento estratégico há três elementos
relevantes: a análise de cenários, a análise de
outros atores e a análise de viabilidade do plano.
26. Passos ou fases
IV. Momento Tático-Operacional: é o momento de
fazer, de decidir as coisas, de finalmente agir sobre a
realidade concreta. De implementação das ações.
O momento Tático-Operacional consiste no
desdobramento da análise de todos outros momentos
em ação concreta. É onde deve-se organizar a
execução do plano coordenando as organizações
atinentes e determinando o processo de avaliação e
prazos de execução.
28. Abordagem de Matus (1993):
Em síntese o PES, mais que um método em si,
constitui uma oportunidade de aprofundamento
da discussão da importância e do significado do
planejamento para a administração pública.
Na proposta do autor, o planejamento se
constitui no instrumento nuclear da ação de
governo, voltado à transformação do presente na
busca por um futuro diferente.
Dentre os elementos que estão na base do
processo de planejamento, destaca a dificuldade
em articular a pluralidade de atores e interesses
envolvidos.
29. MAPP (Método Altadir de Participação Popular):
Versão simplificada do PES, muito utilizada em
organizações sindicais;
Aplicado ao planejamento tático-operacional e ao
nível local, pois incentiva o comprometimento da
comunidade e lideranças com a análise e o
enfrentamento dos seus problemas.
30. Referências
CARDOSO JR, José Celso (Org.). A reinvenção do Planejamento
Governamental no Brasil. Brasília: Ipea, 2011.
GIACOMONI, James e PAGNUSSAT, José Luiz. Planejamento e Orçamento
Governamental. Brasília: ENAP, 2007
MATUS, C. O Plano como Aposta. Tradução de Frank ou Cintra Ferreira,
São Paulo em Perspectivas, v. 5, n. 4, p. 28-42, out.-dez./1991.
MATUS, C. Política, planejamento e governo. Brasília: Editora IPEA,
1993.
MATUS, C. Adeus, senhor presidente: governantes governados. São
Paulo: Editora FUNDAP, 1996.
PFEIFFER, Peter. Planejamento estratégico municipal no Brasil: uma
nova abordagem. Brasília: ENAP, Texto para Discussão n° 37, 2000.
REZENDE, Flávio da Cunha. Tendências das gestão pública nos países da
OCDE. In: LEVY, Evelyn & DRAGO, Pedro Anibal (org.). Gestão
pública no Brasil contemporâneo. São Paulo: Fundap, 2005.
SILVA, Sérgio Vital; NIERO, José Carlos Coelho; MAZZALI, Leonel. O
Planejamento Estratégico situacional no Setor Público: a
contribuição de Carlos Matus. São Paulo: 2008.