A Igreja Católica se consolidou como a única instituição sólida da Idade Média, despontando como um grande senhor feudal dono de terras e do poder espiritual e temporal na Europa. O direito canônico representou a legitimação da autoridade da Igreja ao determinar a interpretação correta dos litígios e a resolução de conflitos, monopolizando a produção jurídica e controlando o que era considerado verdade. O papa personificou o carisma de Cristo e da Igreja, representando a figura paterna pro
A institucionalização da dogmática jurídico-canônica medieval_ppt.
1. UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA
CURSO DE BACHARELADO EM DIREITO
ALUNOS: Andreílson Gonçalves e Eduardo Severo
A INSTITUCIONALIZAÇÃO
DA DOGMÁTICA
JURÍDICO-CANÔNICA
MEDIEVAL
3. De forma condensada, pode-se dizer que
dois foram os institutos legados pela
Igreja Católica para a constituição do
Direito ocidental moderno:
a dogmática
e o inquérito
Galileu diante do Santo Ofício, pintura do século XIX de Joseph-Nicolas
Robert-Fleury.
4. A institucionalização da dogmática é
encarada como elemento de construção,
manutenção e manipulação da verdade,
que legitimou a postura autoritária
imposta pela Igreja Católica na Idade
Média. Destarte, vê-se que a referida
ideologia foi utilizada como mecanismo
de controle e manipulação social,
essencialmente por meio do sistema
jurídico.
5. As invasões germânicas originaram
numerosos
sistemas
de governo
menores e autônomos, organizados
através dos vínculos de subordinação. O
chamado regime feudal, então, veio
como uma junção das características do
regime escravocrata e do regime
comunitário primitivo das tribos
nórdicas. O responsável político por
essa junção foi a Igreja Católica Romana.
6. O Direito derivado da Igreja serviu para
sedimentar o poder institucional através
de fundamentações “racionais” na
interpretação da verdade.
7. Na Idade Média, o Direito germânico foi
de grande influência, uma vez que foi
utilizado
para
resolver
conflitos.
Observa-se que foi marcado pela
ausência de um poder judicial
organizado. Desse modo, o processo
penal, por exemplo, consistia numa
“forma ritual de guerra” entre o ofendido
e o acusado.
8. No que tange à fidelidade na relação
feudal, constata-se um caráter ambíguo,
uma vez que não eram obrigatórios os
deveres de tal relação. No entanto,
alguns deveres contratuais entre senhor
e vassalos são fixos, bilaterais e
obrigatórios.
9.
10. O Direito germânico impunha uma
importante característica ao feudalismo,
tal qual a autoridade baseada no carisma
de um líder guerreiro. Segundo Max
Weber apud Rogério Dultra dos Santos
apud org. por Antonio Carlos Wolkmer,
tal carisma estava ligado à qualidade de
uma personalidade e apresentava certo
caráter “mágico”.
11. Carlos, em sua primeira carta ao Papa São Leão
III (eleito em 795), falou de seu próprio cargo
de protetor da Fé católica nos seguintes
termos, capazes de chamar muito a atenção do
Sumo Pontífice.
“Conforme ao que pactuei com Vosso
Predecessor, quero conservar conVosco uma
aliança inquebrantável de amor e lealdade no
teor seguinte: da Vossa parte me acompanhará
em tudo a Bênção apostólica; e de minha parte
estará protegida sempre a Santa Sé”.
À maneira de Clóvis e Pepino, Carlos propunha ao sucessor de São Pedro um
verdadeiro pacto bilateral, segundo o qual o Papa ficava incumbido de procurar
para Carlos a bênção do Céu, que – como já sabemos – significava para o franco
não só a bem-aventurança eterna, mas a conquista de todos os povos bárbaros
para convertê-los e a obtenção “das coisas boas deste mundo”; e em troca de
tudo isso Carlos Magno defenderia o Papa contra hereges, pagãos, bizantinos e
todos os inimigos temporais.
12. Para o autor, “o fundamento de toda
dominação, e, por conseguinte de toda
obediência, é uma crença: crença no
prestígio do que manda e dos que
mandam”. Tal crença dará origem, no fim
da Idade Média, à utilização do contrato
como fundamento político da existência
do Estado.
13. Assim foram os reis e papas na Idade
Média em uma verdadeira simbiose de
poder. O papado ainda persiste como
autoridade máxima da crença cristã
católica.
14. Os “Ditames do Papa” e o maior
Papa da Idade Média: São
Gregório.
No ano do Senhor de 1075 foram
incluídos nos registros pontifícios, os
famosos Dictatus Papae, ditames do
papa, I. é, regras, avisos, ordens ou
doutrinas do Papa, redigidos em forma
concisa e penetrante.
Os ditames versam sobre as relações entre a Igreja
(especificamente do Papado) com o Império, e a ordem temporal
em geral.
No ano da inscrição, o Papa reinante São Gregório VII livrava
tremenda batalha contra as indevidas pretensões do Imperador
Henrique IV.
15. Nessa famosa querela ‒ também conhecida como “querela das
investiduras” ‒ Henrique IV teve que pedir perdão a São
Gregório VII, quem o tinha excomungado.
O grande Papa estava no castelo de Canosa, na Toscana.
Henrique IV passou três dias do lado de fora, na neve, vestido
de penitente até receber o perdão. De ali vem a expressão “ir a
Canosa”.
Henrique IV pede perdão a São Gregório VII em CanosaComo
São Gregório VII temia, o arrependimento de Henrique IV não
era sincero. Voltou à Alemanha, montou um exército e assaltou
Roma.
16. São Gregório VII foi assim obrigado a se refugiar no sul da
Itália, morrendo em Gaeta, não muito depois.
Suas últimas palavras foram: “Amei a justiça e detestei a
iniqüidade, por isso morro no exílio”.
Entrementes, os príncipes alemães defensores do
Papado, acabaram liquidando a revolta do imperador
excomungado e deposto.
São Gregório VII, embora na tumba, foi o grande vencedor.
Os Ditames refletem tão bem os ensinamentos desse pontífice
que a ele foram atribuídos. Porém os especialistas discutem a
redação, sem chegarem ainda a uma conclusão.
17. A disputa acadêmica é sobre datas e não sobre a doutrina, que é
a de São Gregório VII, para muitos o maior Papa da Idade
Média.
DICTATVS PAPAE, bula de São
Gregório VII
18. 1 ‒ Que a Igreja Romana foi fundada somente por Deus.
2 ‒ Que somente o Pontífice Romano pode ser chamado de
universal com pleno direito.
3 ‒ Que somente o Pontífice pode depor e restabelecer bispos.
4 ‒ Que os legados do Pontífice, ainda que de grau inferior, em
um concílio estão acima de todos os bispos, e pode contra estes
pronunciar sentença de deposição.
5 ‒ Que o Papa pode depor os ausentes.
6 ‒ Que não se deve ter comunhão ou permanecer na mesma
casa com aqueles que tenham sidos excomungados.
19. 7 ‒ Que só a ele é lícito promulgar novas leis de acordo com
as necessidades dos tempos, reunir novas congregações,
converter uma abadia em casa canônica e vice-versa, dividir
uma diocese rica ou unir pobres.
8 ‒ Que somente ele possui as insígnias imperiais.
9 ‒ Que todos os príncipes devem beijar os pés do Papa.
10 ‒ Que o seu nome deve ser recitado em toda igreja.
11 ‒ Que o seu título é único no mundo.
12 ‒ Que é lícito depor o imperador.
13 ‒ Que a ele é lícito segundo as necessidades transladar os
bispos de uma sede para outra.
20. 14 ‒ Que ele tem o poder de ordenar um clérigo de qualquer igreja
para o lugar que queira.
15 ‒ Que o que foi ordenado por ele pode governar a igreja de
outro, mas não fazer a guerra; não pode receber de outro bispo
um grau superior.
16 ‒ Que nenhum sínodo pode ser chamado de geral se não for
guiado por ele.
17 ‒ Que nenhum artigo ou livro pode ser chamado de canônico
sem sua autorização.
18 ‒ Que nada pode revogar sua palavra, só ele pode fazê-lo.
19 ‒ Que nada pode julgá-lo.
20 ‒ Que nada pode condenar quem apela a Sede Apostólica.
21. 21 ‒ Que as causas de maior importância, de qualquer
igreja, devem ser submetida ao seu juizo.
22 ‒ Que a Igreja Romana não erra e não errará jamais, isto está
de acordo com as sagradas escrituras.
23 ‒ Que o Pontífice Romano, se houve sido ordenado em uma
eleição canônica,está indubitavelmente santificado pelos mérito
do Bem Aventurado Pedro como nos testemunha Santo
Ennódio, bispo de Pávia, com o consentimento de muitos Santos
Padres, como se encontra escrito nos decretos do bem
aventurado Papa Símaco.
24 ‒ Que de baixo de sua ordem e com sua permissão é lícito aos
súditos fazer acusações.
22. 25 ‒ Que pode depor e restabelecer os bispos mesmo fora de
reuniões de sínodo.
26 ‒ Que não deve ser considerado católico quem não está de
acordo com a Igreja Romana.
27 ‒ Que o Pontífice pode absolver os súditos de juramento de
fidelidade a iníquos.
Fonte: Gallego Blanco, E., Relaciones entre la Iglesia y el
Estado en la Edad Media, Biblioteca de Política y Sociología de
Occidente, 1973, Madrid, pp. 174-176)
23.
24.
25. Papa Francisco
Francisco, nascido Jorge Mario Bergoglio é o 266º. Papa da Igreja
Católica e atual chefe de estado do Vaticano, sucedendo o Papa Bento
XVI, que abdicou ao papado em 28 de fevereiro de 2013.
26. No contexto da Idade Média, o papa
representará a materialização do carisma
de
Cristo
e
da
Igreja
Católica, estando, assim, vinculado
simbolicamente à figura paterna: ente que
protege e anima os fiéis na sua
crença, encaixando-se no tipo ideal de
dominação carismática.
27. A Igreja se consolidou, certamente, como
única instituição sólida da época medieval.
Ela despontou como se fosse um grande
senhor feudal, proprietário de muitas
terras e do poder espiritual e temporal em
toda Europa.
28. As
regras
jurídico-sagradas
que
determinavam a maneira correta de
interpretação e resolução dos litígios eram
representadas pelos cânones, que por suas
vezes, eram tido como verdades reveladas
por um Ser superior, e a sua
desobediência, era tida como um pecado.
Destarte, por meio destes mecanismos, a
Igreja passou a monopolizar a produção
intelectual judiciária.
29. Do ponto de vista jurídico, tem-se a
descentralização da justiça. A jurisdição
eclesiástica passou a julgar, mediante os
tribunais canônicos, principalmente, os
casos envolvendo o direito de família e os
casos relativos ao casamento.
30. Pode-se dizer que, o direito canônico
enquanto instituição jurídica-se encontra
inafastavelmente associado à questão de
quem proferirá a palavra legítima, ou
seja, de quem terá a premência de dizer o
que é verdade e, com isso, controlar a
instituição da própria realidade. Para além
do lugar de legitimidade, o direito
canônico se arvora em objeto de amor
daqueles a quem subordina com seu
comando.
A
obediência
inquestionada, alçada ao grau de verdade
31. Tal amor incondicional, cujo vacilar impõe
culpa, caracterizará a genialidade do
exercício do poder da igreja medieval e a
sua fundação no processo de veneração
absoluta do papel da autoridade, como
instrumento de reprodução das instâncias
de dominação.
32. Desse modo, por serem os sujeitos que
materializam o saber divino na terra, a
Igreja e o Direito canônico tem o condão de
proceder “a demarcação do lugar ideal
onde reside a palavra que deve governar
não nesse ou aquele aglomerado, mas
realmente todo o gênero humano”.
33. O Direito canônico permite, nesse
sentido, o exercício jurídico do império
católico por meio de rigorosa lógica,
dogmática, que implica na existência de
uma monarquia sacerdotal onipotente na
jurisdição (no dizer o que é o direito): o
Papa será o pontífice católico e Imperador
romano ao mesmo tempo (viva Vox júris).
34. O Direito canônico, portanto, nasce
como discurso que exclui a cultura e o
diferente, na medida em que se
autodenomina único e natural através do
processo
de
“canonização”
das
interpretações
e,
principalmente,
quando, sob esse pretexto, funda e pune o
comportamento herético e também
quando especifica as práticas de
excomunhão e penitência.
35. A lógica dogmática se materializa
enquanto
prática
repressiva
institucionalizada, como formadora do
comportamento humano através da
supressão de quaisquer realidades
simbólicas
distintas
de
“verdade”
codificada.