Este documento discute as "fomes" e incertezas de uma artista que está prestes a concluir vários ciclos acadêmicos e profissionais. A autora reflete sobre os jejuns e alimentos que experimentou em sua arte e educação, e como isso a leva a buscar constantemente um "alimento certo" que possa saciá-la. Ela encerra afirmando que outros ciclos virão, trazendo novas reinvenções e incertezas, mas que seguirá em sua busca artística e sua "fome".
1. Um artista da fome, (In) pressões e (Ex) pressões
Marlise do Rosário Machado1
O texto de Kafka permite múltiplas interpretações, posso dizer que
enquanto o lia, percebia de forma desorganizada o quanto estas me
inquietavam. Ler “este artista” me permitiu ler a mim mesma, pensar a mim
mesma e nas “fomes” que minha arte tem.
As (in) pressões as quais me refiro são aquelas que de alguma forma
me ligam ao artista esfomeado, este artista que sabia que podia manter seu
jejum pela ausência do encontro com o alimento certo. Seria melhor contentar-
se com o jejum, ou manter a busca pelo alimento que poderia saciá-lo? E
quanto a mim? Qual o “alimento” que busco com minha arte? Onde o busco?
Desejo encontrá-lo ou sigo caminhando através de meu jejum, esperando
poder mantê-lo, ao invés de querer aquele “certo alimento”?
São perguntas simbólicas e extremamente importantes, pois contém em
si a (ex) pressão de muitas outras, que ficam ali metamorfoseadas com os
signos da linguagem. Me vejo envolvida numa série de incertezas e também
muitos sonhos neste momento. Estou prestes a concluir vários ciclos. O curso
de Teatro está na reta final, vivencio meu último estágio em uma escola pública
de Montenegro e mesmo o Pibid, que mostrou um alento no caminho da
licenciatura, aos poucos ruma para a inevitável despedida.
Quais foram meus jejuns neste período, o que faço agora com todos os
alimentos que experimentei, como os (re) combino e saio por aí na busca por
“aquele alimento”? É um período de incerteza, eu reafirmo, mas ao mesmo
tempo, é também um momento de possibilidades.
Certezas e possibilidades não tendem a andar juntas e não seguirei
esta frase citando alguém que me possa embasar a este respeito. Pois vejo
nesta apenas a (ex) pressão de uma ideia, uma entre muitas. Minha, na
medida em que pode ser. Sabendo eu que outras pessoas através de suas
1
Acadêmica do sétimo semestre do curso de Graduação em Teatro: Licenciatura da
Universidade Estadual do Rio Grande do Sul. Bolsista do PIBID (Programa de Incentivo Bolsa
de Iniciação a Docência). Membro do grupo de pesquisa “Arte, Criação, Interdisciplinaridade e
Educação” (CNPq/Uergs).
2. próprias vivências, já pensaram o mesmo. O mesmo só que a sua maneira,
regada de outros alimentos, vazios, jejuns e risos.
Uma coisa apenas eu posso gritar: Tenho fome! Quero que as pessoas
a acompanhem, que a conheçam, quero também eu, penetrar na fome dos
outros. Dividir o anseio e o regozijo do pão. Sou uma artista, uma educadora...
Isto tudo dá medo. Mas, a busca pelo “alimento”, pela troca e pela partilha
deste, me impele a caminhar. E caminhando meu medo se dissipa, vira
incerteza de um momento qualquer, que provavelmente se repetirá
igual/diferente/insaciável.
É isto, outros ciclos virão, serão como ecos destes que se vão... Não
uma repetição, mas uma reinvenção que se propaga e (ex) “pressa”, pedindo
calma em tempos velozes. Pedindo apenas que eu siga em minha fome.