a. O texto discute quem é Jesus segundo os testemunhos de João Batista e Paulo. Ambos passaram do não-conhecimento ao conhecimento de Jesus através da experiência, vendo nele o Cordeiro de Deus, o santificador que batiza no Espírito Santo e o Filho de Deus.
b. Paulo, como apóstolo de Cristo Jesus, também testemunha sobre a missão de Jesus, que vem do Pai e santifica a comunidade em comunhão com ele.
c. Ser cristão é ser testemunha
1. QUEM É JESUS?
BORTOLINE, Pe. José – Roteiros Homiléticos Anos A, B, C Festas e Solenidades – Paulus, 2007
* LIÇÃO DA SÉRIE: LECIONÁRIO DOMINICAL *
ANO: A – TEMPO LITÚRGICO: 2° DOMINGO TEMPO COMUM – COR: VERDE
I. INTRODUÇÃO GERAL
7.
O texto proposto à reflexão das comunidades cristãs
neste domingo tem como ponto central o testemunho de
João Batista a respeito de Jesus. O testemunho do Batista
reflete a caminhada da comunidade cristã em busca de uma
experiência concreta da presença de Jesus na vida. De fato,
João Batista progride por etapas no conhecimento do Cristo: não o conhece (v. 31), vê nele o Messias sofredor (v.
29), o santificador, ou seja, aquele que batiza no Espírito
Santo (v. 33) e o Filho de Deus (v. 34).
Deus jamais ignorou os anseios da humanidade pela
vida. Pelo contrário, seu projeto é o de dar a todos liberdade e vida em plenitude. Mas nem todos conhecem e aceitam esse projeto. De fato, para que isso se realize, é necessário fazer a experiência de Jesus, saber quem ele é, e procurar testemunhar essa experiência, como João Batista,
como Paulo. Os que mergulham no ser de Deus acabam
aderindo à sua vontade, recebem o Espírito e se tornam
servos, testemunhas e apóstolos. Tal é o desafio que a Pa- a. João Batista não conhecia Jesus (vv. 31.33)
lavra de Deus nos oferece hoje.
8.
O texto insiste nesse aspecto. O não-conhecimento de
Jesus por parte do Batista é uma espécie de refrão, que
II. COMENTÁRIO DOS TEXTOS BÍBLICOS
1ª leitura (Is 49,3.5-6): Deus é liberdade e vida para aparece duas vezes (vv. 31.33). Um pouco antes, ele afirmara que os sacerdotes e levitas — enviados de Jerusalém
todos
pelos fariseus para interrogar João — não conheciam aque2.
Estamos no tempo do exílio em Babilônia. O profeta le que estava no meio deles (v. 26). Constata-se, portanto, o
fala aos seus, alimentando-lhes a esperança de, em breve, absoluto estado de ignorância. Esse estado de carência
serem libertos e voltarem à pátria. A libertação virá pela provoca a busca, o conhecimento, a experiência. De fato,
ação de uma personagem apresentada por Javé como sendo conhecer a Jesus não é somente saber quem é, o que faz,
seu servo. De fato, o texto de hoje é o segundo cântico do onde mora. Conhecer é fazer experiência, é fruto de conviservo de Javé.
vência, de comunhão. Portanto, a partir do que Jesus faz, e
3.
O texto adota o esquema clássico da vocação profética: a partir do compromisso com ele na missão comum, é que
há um chamado que desencadeia o processo (v. 1); esse chegamos a conhecer quem ele é.
chamado tem missão concreta, associada à comunicação de b. Jesus é o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo
algo importante (vv. 2-3); o profeta procura tirar o corpo (v. 29)
fora (v. 4a); Deus confirma o profeta (v. 5) e torna mais
clara a missão que deverá exercer (v. 6). O trecho que le- 9. Pelo fato de estar já comprometido com Jesus, prepamos na liturgia de hoje contém somente aquilo que Javé rando-lhe o caminho mediante o batismo com água, João
Batista vê em Jesus o Cordeiro de Deus, que tira o pecado
fala ao servo (vv. 3.5-6).
do mundo. Não é pura intuição. É reflexo do compromisso
4.
A característica da personagem apresentada é ser servo com ele. A afirmação é muito mais uma conquista na fé
de Javé. Portanto, é executor de uma vontade soberana e que a comunidade primitiva fez, do que mera afirmação
superior. Nesse servo, Javé tornará conhecida sua glória (v. intelectual. O verbo ver, no evangelho de João, tem esta
3). A glória de Javé é sua presença atuante na história, conotação: só vê de fato quem está envolvido na contemconduzindo seu povo à liberdade e à vida. A glória de Deus plação-compromisso do projeto de Deus realizado em Jeé um povo livre de toda forma de opressão interna ou ex- sus.
terna. A glória de Deus são pessoas livres no pleno exercício de suas funções e de sua identidade. Tal é a missão do 10. João afirma que Jesus é o Cordeiro de Deus. Passou do
servo: devolver, em nome de e sob o comando de Javé, a não-conhecimento à experiência. A palavra talya, em aramaico, significa ao mesmo tempo servo e cordeiro. Com
liberdade ao povo oprimido.
essa junção de termos, João sintetiza em Jesus dois temas
5.
Essa missão faz parte do projeto de Deus. É o próprio de capital importância para o Antigo Testamento. Jesus é o
Deus quem modela seu servo no seio materno (cf. Gn 2,7; servo de Javé de Is 53,7.12 e ao mesmo tempo o cordeiro
Is 42,6). O servo que tem a missão de libertar é, podería- pascal de Ex 12. Isso remete a dois aspectos da vida de
mos dizer, o novo tipo de ser humano, a nova forma de ser Jesus: liberta de escravidão semelhante à do Egito (cordeiro
gente. Deus lhe confere essa nova identidade libertadora, a pascal), e também semelhante à escravidão da Babilônia
fim de que conduza Jacó a Deus e reúna a Javé o povo de (servo).
Israel. Isso tudo porque Deus estima e valoriza seu servo,
11. Jesus é aquele que tira o pecado do mundo (o artigo
associando-o a seu projeto (v. 5).
salienta que há um só tipo de pecado). Qual é esse pecado
6.
Mas a missão do servo não se reduz a um povo somen- único que oprime toda a humanidade? Para João, o pecado
te. Ele tem uma tarefa universal. No v. 6 passa-se do plano é a atitude de rejeição de Jesus enquanto resposta definitiva
nacional ao internacional: o servo torna-se luz das nações, a do amor do Pai. Aqueles que não o reconhecem (cf. 1,10)
fim de que a salvação de Deus seja atuante até os confins estão no pecado e nas trevas. Desse pecado único e fundada terra. É, portanto, uma missão que visa implantar vida e mental é que nascem os demais pecados, que são frutos da
liberdade no mundo inteiro, porque esta é a vontade de rejeição de Jesus e sua prática libertadora enquanto cordeiDeus.
ro e servo. A passagem do não-conhecimento ao conhecimento de Jesus se caracteriza, portanto, pela proclamação
Evangelho (Jo 1,29-34): Quem é Jesus?
da fé em Jesus cordeiro-servo, e pela adesão e compromisso com ele. A vida e a morte de Jesus destroem "o pecado
1.
2. do mundo", ou seja, são a derrota definitiva da injustiça que veu, consultando-o sobre questões importantes que exigiam
impede ao povo viver de acordo com o projeto de Deus, maior esclarecimento. Por meio dessas informações Paulo
percebe que há conflitos na comunidade como, por exemque é liberdade e vida para todos (cf. Jo 10,10).
c. Jesus é o santificador, batizando no Espírito Santo (vv. plo, as divisões internas, o caso do incesto, os processos em
tribunais pagãos, a fornicação. De Éfeso, no ano 57, ele
32-33)
escreve à comunidade, procurando ler os conflitos à luz da
12. Jesus é ungido pelo Espírito Santo para a missão. A prática de Jesus e orientando em relação a questões polêdescida do Espírito sobre ele representa sua unção como micas, como a das carnes sacrificadas aos ídolos, a ordem
Messias. O simbolismo da pomba que desce e permanece nas celebrações, a ressurreição dos mortos e a coleta que
em Jesus tem este significado: Jesus é a morada do Espíri- deveria ser feita para ajudar a comunidade empobrecida de
to, seu lugar natural e querido. A pomba representa o amor Jerusalém.
do Pai, que faz de Jesus sua habitação estável e definitiva.
Portanto, o amor do Pai em relação a Jesus o leva a pôr no 17. O texto de hoje é a introdução da carta, com endereço
Filho a plenitude do seu ser. Tudo o que Jesus vai realizar (v. 1), destinatários (v. 2) e saudação (v. 3). Mas não deno evangelho de João (os sete sinais da vida), ele o fará vemos ver nisso mero cabeçalho da carta, pois Paulo aí
impulsionado pelo Espírito que está permanentemente com inseriu alguns temas que irá desenvolver ao longo do texto.
ele. E, depois de ressuscitado, Jesus comunica esse mesmo De fato, já no endereço, ele se autodefine apóstolo de Cristo Jesus por vontade de Deus. Ele foi o fundador da comuEspírito à comunidade.
nidade. Sabe-se que em Corinto a autoridade de Paulo en13. A experiência que João Batista fez de Jesus leva-o, quanto apóstolo fora questionada e posta de lado (cf. cap.
pois, ao testemunho (v. 32). Sintetizando as etapas percor- 9). Ele, então, se apresenta na qualidade de apóstolo de
ridas, temos o seguinte resultado: passa-se do não- Cristo Jesus por vontade de Deus. Não é só uma questão
conhecimento (vv. 31.33) à experiência de quem é Jesus polêmica que ele introduz. Abandonar o evangelho que ele
(vv. 29.32-33), e daí ao testemunho (vv. 32-34) de que em anunciou seria desvirtuar o ser cristão.
Jesus está a plenitude da vida, pois é aquele que batiza no
Espírito Santo (v. 33). O testemunho pressupõe a comu- 18. A comunidade de Corinto é chamada de Igreja de Deus
nhão com ele na sua morte e ressurreição, pois é no mo- (v. 2a). Já outras comunidades tinham recebido tal denomimento de sua morte que ele entrega o Espírito (v. 33; cf. nação (cf. 1Ts 1,1). A afirmação é forte, pois o povo de
19,30). Jesus, portanto, é o santificador enquanto comunica Deus não é mais a assembléia do Antigo Testamento, e sim
o Espírito que ele próprio recebeu. É esse Espírito quem irá a comunidade cristã. É aí que Deus está presente! A asrecordar aos cristãos a prática de Jesus (14,26). E é fazendo sembléia do Antigo Testamento era chamada de santa. Para
o que Jesus fez que os cristãos recebem o batismo no Espí- Paulo, a verdadeira santidade passa por Cristo Jesus e tem
seu complemento na comunidade cristã (v. 2b). A santidarito Santo.
de, porém, é um processo contínuo, inacabado até que sed. Jesus é o Filho de Deus (v. 34)
jamos tudo em Deus e Deus seja tudo em nós. Aqui Paulo
14. Chegamos ao testemunho por excelência. Jesus é o já alude aos escândalos da comunidade, que deturpam o ser
Filho de Deus porque o Pai o gerou, comunicando-lhe a em Cristo. A comunidade de Corinto não é toda a Igreja,
própria vida, isto é, o Espírito. Jesus possui a plenitude da mas parte em Cristo, pois forma um todo como todos os
vida do Pai, seu amor e fidelidade. Temos aqui também a que em qualquer lugar invocam o nome de Jesus (v. 2c).
máxima explicitação da missão de Jesus: transmitir à hu- Note-se como ele cita constantemente Cristo Jesus e Deus.
manidade a vida divina que ele possui de forma plena, a É uma referência às divisões entre as pessoas, que impefim de que as pessoas consigam realizar o projeto de Deus. dem a Jesus de ser o Senhor da comunidade.
2ª leitura (1Cor 1,1-3): Os cristãos são testemunhas de 19. A saudação (v. 3) é litúrgica. Foi criada por Paulo.
Difere das saudações formais, pois apresenta a benevolênJesus
cia (graça) e a plenitude (paz) das promessas de Deus, con15. Paulo evangelizou Corinto durante um ano e meio,
densadas em Cristo Jesus.
fundando aí uma comunidade cristã (At 18,1-17), composta
de judeus e pagãos. A maioria dos membros dessa comuni- 20. Apesar de utilizar linguagem diferente e se dirigir a
dade era pobre (1Cor 1,26). Havia certamente entre eles outros destinatários, o trecho desta carta está muito próxiescravos, trabalhadores dos cais dos portos da cidade. Ape- mo ao evangelho de hoje. Paulo, enquanto apóstolo de
sar de ser comunidade pequena, era muito ativa, tendo Cristo Jesus, é testemunha à semelhança de João Batista,
fazendo ambos a experiência de Jesus. E o conteúdo do
abraçado com entusiasmo a novidade do evangelho.
testemunho é quase idêntico: ambos se referem à missão de
16. Algum tempo depois, Paulo toma conhecimento da
Jesus, missão esta que vem do Pai e se realiza na comunisituação da comunidade através de informações pessoais dade que está em comunhão com Jesus. Este a santifica e a
(1,11; 16,16) e de uma carta que a comunidade lhe escre- capacita ao testemunho.
III. PISTAS PARA REFLEXÃO
Ser cristão é ser testemunha de Jesus. Cabem, portanto, algumas interrogações à luz da Palavra de Deus: Que tipo de
testemunho é o nosso? De que forma somos servos de Javé? Quem é Jesus para nós? De que forma o conhecemos? Até
que ponto nossa vivência enquanto comunidade cristã reflete o ser e o agir de Jesus? Onde está a santidade de nossas
comunidades? Qual a ação do Espírito na vida de nossas comunidades? Qual é o pecado do mundo que Jesus, servocordeiro, elimina com sua morte e ressurreição?• A comunidade que vive a mensagem de Jesus, como Paulo a viveu,
torna-se missionária pelo fato de não excluir ninguém, principalmente os que já foram excluídos pela sociedade, como
no caso dos pagãos, aos quais Paulo dedica seu tempo e sua vida (2ª leitura, 1Cor 1,1-3).
21.