1. Docente : Paulo Konzen.
Discentes: Fabiani G. A. L. Lembeck
Sônia Maria de Oliveira.
2. Há duas formas distintas de atuação da censura à
produção e à circulação da literatura, durante o regime
militar e depois dele. Trata-se de dois momentos
diversos, porém complementares, que correspondem,
respectivamente, a uma censura política, durante os
anos 70, seguida do que chamamos censura
econômica, a partir dos anos 80, francamente orientada
pelos ditames do mercado editorial, consolidado
durante a década
anterior, a reboque do projeto de modernização
conservadora da ditadura.
3. A questão da censura à produção cultural
brasileira durante a ditadura militar vem, aos
poucos, cristalizando-se em matéria histórica que
tem encontrado analistas e intérpretes interessados
em decifrar o seu peso, significado e importância,
em inúmeros ensaios, artigos e também trabalhos
de maior fôlego, publicados desde meados da
década de 80, justamente quando se encerra o
período em
questão.
4. Chamado “padrões de criação” imposto pela
censura instituída ,iniciou o processo cortando,
apagando, proibindo ou engavetando incontáveis
peças, filmes, canções, novelas de TV, artigos de
jornal, romances e contos.
5. Na verdade, um dos aspectos mais importantes
para uma visão ampliada do problema aqui posto
refere-se à consolidação dos esquemas mercantis de
produção cultural e literária, ou seja, à consolidação de
uma indústria cultural brasileira. Acentuou-se durante
o “milagre econômico”, do início dos anos 70, e, nesse
contexto, a censura funcionou como uma espécie de
expressão ideológica de um tipo de orientação que o
Estado pretendia imprimir à cultura.
6. O que as ondas captadas por tal antena sinalizam é
uma situação bastante específica: o que houve, ao
longo da década de 70, foi a impressão do selo do
mercado à criação literária, substituindo um ritmo
lento, que caracterizava a incipiente produção editorial
brasileira de décadas anteriores, ainda com muito de
precário e artesanal, por uma grande pressa editorial,
como estratégia para competir com o crescimento dos
meios de
comunicação de massa, principalmente a televisão,
no atendimento e formação de públicos interessados.
7. Esse funcionamento é cheio de paradoxos: sendo
um setor que sempre se diz “em crise”, os números
que ostenta, todavia, denotam um crescimento
seguro ao longo das três últimas décadas, o qual,
entretanto, não corresponde à duplicação da
população do país no mesmo período; além de o
analfabetismo ter se mantido em níveis muito
altos,
o desenvolvimento desigual concentra as riquezas
no sul do país.
8. A definitiva mercantilização da literatura, aqui
representada pelo funcionamento do mercado
editorial, com sua estratégia de “vender livros
como se vende sabonete”, associada à prévia
alfabetização pela imagem dos futuros leitores, foi
criando esse tipo de censura mais implícita, mais
sutil, mais ambígua que a política, mas não menos
corrosiva que ela, a censura econômica.
9. desde que ela se insere num contexto cercado por
fronteiras que nada têm a ver com estética;
misturados às pressões e limites econômicos,
existem também aqueles ligados a aspectos
específicos da condição “espetacular’’ do mundo
contemporâneo, em que tudo pode se
transformar num evento de mídia.
10. Como a música ou as artes plásticas, por exemplo,
que podem promover grandes shows ou
exposições, ou o cinema, que em si é uma
“exposição”, a literatura presta-se pouco a esse
tipo de “espetáculo”, pois os escritores só podem
aparecer em fotos, em ilustrações de suas obras,
em uma ou outra entrevista por algum canal de
televisão, suplemento de jornal ou revista semanal.
11. “Agora a gente se preocupa também com o perfil
mercadológico do escritor. Damos preferência a gente
que se sai bem em entrevistas, que diz coisas
interessantes, tem um bom comportamento na TV”.
A maioria dos escritores parece adequar-se às
regras desse jogo, pois, analisando mais atentamente
os textos de ficção - com as louváveis exceções de
sempre - podem-se perceber, como traços mais
evidentes, a opção pelos chamados “gêneros de
Massa”.
12. Romances policiais, históricos ou de ficção
científica, além da pressa na fatura, indicada por
uma escrita linear, solta, ligeira, às vezes
entremeada de leve ironia ou humor jocoso,
diluindo de propósito qualquer densidade ou
compromisso.
13. escritos para serem consumidos rapidamente e
repostos com a mesma rapidez, como exige o
tempo do mercado, que não é o mesmo da criação
estética. Sem ideias novas pois não há pausas para
reflexão ou maturação, muitos autores enveredam
pelo pastiche de estilos do passado ou imitam o
estilo da mídia, montado em switchings nervosos,
pisca –pisca-piscando verbos e substantivos numa
rápida sequência de ações, cujo único objetivo é o
entretenimento.
14. A adesão irrestrita às imposições da mídia e do
mercado delimitou as opções da ficção de hoje.
Melhor dizendo, as alternativas que hoje para ela
se
colocam, sob os ditames da censura econômica,
não lhe permitem - ou o fazem com dificuldade -
ser um fator de descoberta e interpretação da
realidade, como sempre pretendeu; são avessas à
função de poderoso instrumento que ela sempre
foi para pensar a História e a si mesma.
15. Ultrapassa questões especificamente estéticas: trata-se
de optar ou não por uma linguagem cujo “valor de
conhecimento” possa levar à crítica negativa da
sociedade contemporânea, deixando de lado uma
outra, cujo “valor de ação”29 tem sido interpretado
exclusivamente como experiência mimética
reduplicadora dessa sociedade. Felizmente, como
nos ensinou nossa própria história, toda censura
pode ser burlada e, às vezes, funcionar à própria
revelia.