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«Classe média: a coluna vertebral dos regimes democráticos»




por Beja Santos
08.03.2012, site do Movimento Cívico «Vidas Alternativas»

http://movimento.vidasalternativas.eu/index.php/temas-beja-santos/4585-um-livro-de-elisio-
estanque.html

O ensaio intitula-se “A Classe Média: Ascensão e Declínio”. O seu autor é Elísio Estanque, um
doutor em Sociologia que tem obra feita em áreas como as desigualdades sociais, movimentos
sociais e classes; o livro aparece publicado nos ensaios da Fundação Francisco Manuel dos
Santos, e vende-se a preço módico.

O investigador, com justeza, antes de lançar o seu olhar sobre o nosso rincão e diagnosticar o
estado da nossa classe média, recorda ao leitor que há um ecrã que não devemos ignorar quando
falamos de classes e desigualdades sociais e a evolução da classe média. O assunto é muito sério:
sem a mobilidade social que surgiu, estuante, depois do 25 de Abril, o nosso regime político
seria necessariamente outro. São os diferentes grupos da classe média que funcionam como a
charneira entre os núcleos possidentes, abastados e altamente acumuladores, de um lado, e o
cortejo social onde podem caber franjas da pequena burguesia, o proletariado e os pobres de toda
a espécie. Uma classe média que se transformou no azimute que indica o Norte das sociedades
centradas no consumo, baseadas na secularização, no individualismo, na meritocracia e no
granjeio de estatuto. Por isso, mesmo sob pena de muitos dos leitores passarem a correr sobre a
exposição da origem desta classe e as teorias sociológicas que lhes emprestam moldura, o autor
expõe com meridiana clareza como esta classe contribuiu para o funeral do marxismo dogmático,
como serve de tampão aos anseios da direita radical e gera permanentemente equívocos entre as
ideologias liberais e sociais-democratas. Porque a classe média é de facto uma zona de
amortecimento dos conflitos, o sal das sociedades de consumo, é a permanente espiral de anseios
e expectativas, é, em suma, a classe que tem a primazia de acicatar o desejo de imitação das
elites, nas diferentes fases ascensionais, é dali que partem muitos dos futuros quadros
universitários, membros dos aparelhos partidários do chamado “arco da governação”, é
igualmente a classe que possui uma dinâmica de demarcação e distinção onde se reproduzem
todas as esferas da vida, da produção ao consumo. É esta a classe média que contraria o ímpeto
revolucionário e que deixa os nostálgicos, os nacionalistas e os inimigos do Estado-providência
numa permanente solidão, pois a classe média, à cautela, a classe média não lhes estende a mão.

Assim se torna compreensível, no quadro desta exposição, o que Elísio Estanque escreve sobre a
instabilidade em que vive hoje a camada de chefias e quadros subalternos que vêm cada vez mais
difícil ascender ao topo das suas aspirações. Entrou-se num período de enorme tensão em que
esta classe média vê alargar-se o fosso entre os rendimentos mais elevados e os intermédios,
estes grupos estão a ser afetados pela intensificação das desigualdades salariais, não será
exagerado dizer-se que a classe média começa a duvidar se este neoliberalismo de mercado,
descartável e de feroz competitividade, não vá saldar-se na sua pauperização. E se a mobilidade
ascendente for destruída, temos à vista uma comoção social de dimensão imprevisível. Esta a
advertência solene que o sociólogo deixa a pairar no excurso teórico.

Temos depois a classe média em Portugal, classe que começou a ser catapultada na
industrialização dos anos 60 do século passado; o ensaio explica por números como ocorreu esse
fenómeno que fez descer o setor primário, aumentar o setor secundário e o setor terciário até se
ter chegado ao ponto em que o terciário passou para a dianteira. Com o 25 de Abril abriram-se
novos anseios de desenvolvimento que, escreve o autor, “iria proporcionar a mais profunda
recomposição da estrutura de classes dos últimos 100 anos e induzir um processo de mudança
que, em muitos aspetos, aproximou o nosso país dos padrões de vida vigentes na Europa
desenvolvida”. Ou seja, esta nova classe média está em estreita consonância com o projeto
democrático nascido a 25 de Abril.

Agora, temos nuvens no horizonte, assiste-se a uma progressiva redução de direitos laborais e
sociais com impacto na insegurança e no risco. Sabe-se que o fenómeno é transfronteiras, está
ligado ao desemprego à austeridade e ameaça a função do sector público e a missão do Estado-
providência tal como ela foi ditada no termo da II Guerra Mundial. Na recomposição dos últimos
40 anos o consumo transformou-se na imagem exterior, enformou o carácter e ditou os princípios
da classe média. Daí o frenesim do crédito, na facilidade do endividamento, de naturalidade
como se vive e convive com o entretenimento e a volúpia de ilusões. O autor refere a
precariedade e a precarização no trabalho, a vida contingente das relações e como se estão a
instituir, nas últimas décadas, as desigualdades de rendimento. O espectro da pobreza anda a par
do suporte que a classe média dá aos seus membros mais fracos, os filhos que auferem entre 500
a 1000 euros. Enfim, a mobilidade social está claramente comprometida, e se é facto que nas
últimas décadas a recomposição foi rápida e houve um crescimento da classe média, temos agora
indicadores de que essa classe média está a perder mobilidade, competências e a aproximar-se,
em certas franjas, da pobreza e do proletariado. Todos os pacotes de austeridade e toda a
contenção de despesas estão a empurrar para baixo enquanto a riqueza se concentra na mão de
muito poucos e engrossa a legião dos excluídos. Mas que não se perca a lucidez: na observação
social: a classe média perdeu a aura do passado mas não entrou definitivamente em dissolução,
há sinais de declínio mas está tudo ainda em aberto para a sua reconfiguração ou recomposição.
Importa estar atento com a movimentação dos novos setores precários e as reivindicações
juvenis, as democracias ocidentais estão a ser postas à prova e Portugal não é exceção. E o autor
sentencia: “A classe média é expressão direta da sociedade. Mesmo sabendo que não constitui
um corpo homogéneo, é notórios que os diferentes segmentos que dela fazem parte enfrentam
atualmente enormes dificuldades. Não apenas no momento presente, devido aos custos da crise
do endividamento externo, mas este parece ser um momento culminante de uma tendência que se
vem desenhando desde há cerca de 10 anos, atingindo em especial os trabalhadores e categorias
da classe média”. E conclui assim: “Vale a pena alertar que, do mesmo modo que no passado o
entusiasmo em torno da classe média arrastou consigo sector sociais muitos mais amplos, o atual
cenário de iminente afogamento (económico) destes mesmos setores pode também acentuar os
medos e inseguranças (tão recorrentemente apontados aos portugueses) e agravar a tradicional
tendência para o saudosismo, a lamúria e o autoflagelo. Uma tal possibilidade terá sem dúvida
graves consequências na economia e na vida democrática em geral. E um outro cenário,
porventura não menos inquietante, será o cenário da instabilidade e contestação social
generalizada. Mas esse pode ser o preço a pagar para obrigar à mudança de paradigma de que
Portugal e a Europa precisam”.

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Uma critica construtiva ao sindicalismo
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Middle class rebellions_2015
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Classe média coluna vertebral democracias

  • 1. «Classe média: a coluna vertebral dos regimes democráticos» por Beja Santos 08.03.2012, site do Movimento Cívico «Vidas Alternativas» http://movimento.vidasalternativas.eu/index.php/temas-beja-santos/4585-um-livro-de-elisio- estanque.html O ensaio intitula-se “A Classe Média: Ascensão e Declínio”. O seu autor é Elísio Estanque, um doutor em Sociologia que tem obra feita em áreas como as desigualdades sociais, movimentos sociais e classes; o livro aparece publicado nos ensaios da Fundação Francisco Manuel dos Santos, e vende-se a preço módico. O investigador, com justeza, antes de lançar o seu olhar sobre o nosso rincão e diagnosticar o estado da nossa classe média, recorda ao leitor que há um ecrã que não devemos ignorar quando falamos de classes e desigualdades sociais e a evolução da classe média. O assunto é muito sério: sem a mobilidade social que surgiu, estuante, depois do 25 de Abril, o nosso regime político seria necessariamente outro. São os diferentes grupos da classe média que funcionam como a charneira entre os núcleos possidentes, abastados e altamente acumuladores, de um lado, e o cortejo social onde podem caber franjas da pequena burguesia, o proletariado e os pobres de toda a espécie. Uma classe média que se transformou no azimute que indica o Norte das sociedades centradas no consumo, baseadas na secularização, no individualismo, na meritocracia e no granjeio de estatuto. Por isso, mesmo sob pena de muitos dos leitores passarem a correr sobre a exposição da origem desta classe e as teorias sociológicas que lhes emprestam moldura, o autor expõe com meridiana clareza como esta classe contribuiu para o funeral do marxismo dogmático, como serve de tampão aos anseios da direita radical e gera permanentemente equívocos entre as ideologias liberais e sociais-democratas. Porque a classe média é de facto uma zona de amortecimento dos conflitos, o sal das sociedades de consumo, é a permanente espiral de anseios e expectativas, é, em suma, a classe que tem a primazia de acicatar o desejo de imitação das elites, nas diferentes fases ascensionais, é dali que partem muitos dos futuros quadros universitários, membros dos aparelhos partidários do chamado “arco da governação”, é igualmente a classe que possui uma dinâmica de demarcação e distinção onde se reproduzem
  • 2. todas as esferas da vida, da produção ao consumo. É esta a classe média que contraria o ímpeto revolucionário e que deixa os nostálgicos, os nacionalistas e os inimigos do Estado-providência numa permanente solidão, pois a classe média, à cautela, a classe média não lhes estende a mão. Assim se torna compreensível, no quadro desta exposição, o que Elísio Estanque escreve sobre a instabilidade em que vive hoje a camada de chefias e quadros subalternos que vêm cada vez mais difícil ascender ao topo das suas aspirações. Entrou-se num período de enorme tensão em que esta classe média vê alargar-se o fosso entre os rendimentos mais elevados e os intermédios, estes grupos estão a ser afetados pela intensificação das desigualdades salariais, não será exagerado dizer-se que a classe média começa a duvidar se este neoliberalismo de mercado, descartável e de feroz competitividade, não vá saldar-se na sua pauperização. E se a mobilidade ascendente for destruída, temos à vista uma comoção social de dimensão imprevisível. Esta a advertência solene que o sociólogo deixa a pairar no excurso teórico. Temos depois a classe média em Portugal, classe que começou a ser catapultada na industrialização dos anos 60 do século passado; o ensaio explica por números como ocorreu esse fenómeno que fez descer o setor primário, aumentar o setor secundário e o setor terciário até se ter chegado ao ponto em que o terciário passou para a dianteira. Com o 25 de Abril abriram-se novos anseios de desenvolvimento que, escreve o autor, “iria proporcionar a mais profunda recomposição da estrutura de classes dos últimos 100 anos e induzir um processo de mudança que, em muitos aspetos, aproximou o nosso país dos padrões de vida vigentes na Europa desenvolvida”. Ou seja, esta nova classe média está em estreita consonância com o projeto democrático nascido a 25 de Abril. Agora, temos nuvens no horizonte, assiste-se a uma progressiva redução de direitos laborais e sociais com impacto na insegurança e no risco. Sabe-se que o fenómeno é transfronteiras, está ligado ao desemprego à austeridade e ameaça a função do sector público e a missão do Estado- providência tal como ela foi ditada no termo da II Guerra Mundial. Na recomposição dos últimos 40 anos o consumo transformou-se na imagem exterior, enformou o carácter e ditou os princípios da classe média. Daí o frenesim do crédito, na facilidade do endividamento, de naturalidade como se vive e convive com o entretenimento e a volúpia de ilusões. O autor refere a precariedade e a precarização no trabalho, a vida contingente das relações e como se estão a instituir, nas últimas décadas, as desigualdades de rendimento. O espectro da pobreza anda a par do suporte que a classe média dá aos seus membros mais fracos, os filhos que auferem entre 500 a 1000 euros. Enfim, a mobilidade social está claramente comprometida, e se é facto que nas últimas décadas a recomposição foi rápida e houve um crescimento da classe média, temos agora indicadores de que essa classe média está a perder mobilidade, competências e a aproximar-se, em certas franjas, da pobreza e do proletariado. Todos os pacotes de austeridade e toda a contenção de despesas estão a empurrar para baixo enquanto a riqueza se concentra na mão de muito poucos e engrossa a legião dos excluídos. Mas que não se perca a lucidez: na observação social: a classe média perdeu a aura do passado mas não entrou definitivamente em dissolução, há sinais de declínio mas está tudo ainda em aberto para a sua reconfiguração ou recomposição. Importa estar atento com a movimentação dos novos setores precários e as reivindicações juvenis, as democracias ocidentais estão a ser postas à prova e Portugal não é exceção. E o autor sentencia: “A classe média é expressão direta da sociedade. Mesmo sabendo que não constitui um corpo homogéneo, é notórios que os diferentes segmentos que dela fazem parte enfrentam
  • 3. atualmente enormes dificuldades. Não apenas no momento presente, devido aos custos da crise do endividamento externo, mas este parece ser um momento culminante de uma tendência que se vem desenhando desde há cerca de 10 anos, atingindo em especial os trabalhadores e categorias da classe média”. E conclui assim: “Vale a pena alertar que, do mesmo modo que no passado o entusiasmo em torno da classe média arrastou consigo sector sociais muitos mais amplos, o atual cenário de iminente afogamento (económico) destes mesmos setores pode também acentuar os medos e inseguranças (tão recorrentemente apontados aos portugueses) e agravar a tradicional tendência para o saudosismo, a lamúria e o autoflagelo. Uma tal possibilidade terá sem dúvida graves consequências na economia e na vida democrática em geral. E um outro cenário, porventura não menos inquietante, será o cenário da instabilidade e contestação social generalizada. Mas esse pode ser o preço a pagar para obrigar à mudança de paradigma de que Portugal e a Europa precisam”.