Este documento apresenta uma antologia poética de Maria da Penha Boina, organizada em três partes denominadas "Memento". A antologia contém poemas de temáticas variadas como cegueira, teatro, sonhos, ódio, amor, entre outros. A autora reflete sobre experiências e sentimentos humanos de forma concisa por meio da poesia.
2. OLHOS NUS, CARMIM
Onde vês o espiritual
Sou laica
Onde vês o uno
Sou dicotômica
Onde vês o passional
Observo consumação
Onde vês a interação
Enxergo recusa
Onde vês ódio
Percebo excitação
Onde vês o latente
Descortino o manifesto.
Veem os olhos antagônicos
A maneira que se vê,
É atração Shekespeariana
Dos olhos cinza e belos
Contra os meus olhos
Nus, carmim.
OLHOS NUS, CARMIM
Antologia Poética
3.
4. MARIA DA PENHA BOINA
OLHOS NUS, CARMIM
Antologia Poética
MPAC DESIGN EDITORA
Espírito Santo, 2013
6. ...olhos nus, carmim, o título, é homenagem aos meu
momentos de copos de vinho em meu metro quadrado,
de frente para o mar, lugar único.
7. 7
SUMÁRIO
Introdução 13
Memento I 19
A cegueira 19
Teatro 21
O sonho 22
Mente demente 23
Odeio 24
Eu e a mariposa 25
Voo 26
Oculto 27
Mané 28
Sem destino 29
Odisseia 30
Bem-te-vi 31
Fuga a esmo 32
Insignificância 33
Lembranças perfeitas I 34
Lembranças perfeitas II 35
Lembrança perfeitas III 37
Metáforas 38
Descarte 39
O homem avestruz 40
Máscaras 41
Indecisão 42
Esquecimento 43
Compreensão 45
Romantismo 46
Escrevo 47
Passado e futuro 48
Maria da Penha Boina - Autoestima 49
Virtualidade 50
Eles e as mulheres 51
Pernambuco 52
Amor reverso 53
Sem destino I 54
8. 8
Sem destino II 55
Psicopata 56
A crise do lamento 57
Assalto ao coração 58
Telefone 59
Ódio 60
Paixão 61
Perdi 62
Aconchego 64
Meus homens 65
Lápide 66
Memento II 67
Omissão 67
Amor amigo 68
Insatisfação 69
Quem tu és? 70
Sonhos de menina mulher 71
Tatuagem 72
Amor 73
Fera domada 74
É Tarde (16/08/01) 75
Memento III 77
Novos tempos 77
Setembro de 2003 em Portugal 78
Meu Amigo Pedro (03/1998) 80
Testamento do Amor de uma Mulher(02/2001) 81
Sofrimento Virtual (10/1999) 82
Condenação (03/2001) 84
Telefone (03/2001) 85
Poetisa Ferida (03/2001) 86
Paulo (07/1989) 87
Josino o gênio (1980) 88
Tempo (1979) 89
Pertencer (05/1979) 90
9. 9
Mestre
Um mestre instila informações nos seus discípulos, os
bons discípulos serão aqueles capazes de contextualizar
tais informações numa estrutura não elementar e, através
de suas ações passarão a ter conhecimento, mas, para
se tornarem mestres, terão de discernir o axiomático,
transcendendo a sua máxima, e assim alçarem sabedoria.
11. 11
INTRODUÇÃO
Canto 0.
Um dia me perguntaram quem você é? Como você se vê?
Eis a minha humilde resposta.
Sou uma pessoa que adota certa severidade para
comigo.
A estranheza que tenho é a máscara do meu ser, o ser
que é sempre acolhido pelos outros como um convidado, e
que, todos tratam com amabilidade, sem nenhum sentimento,
usando as suas máscaras da educação.
Não tenho felicidade e nem infelicidade, nenhuma das
situações podem me constranger, não tenho ânsia no trato por
estes sentimentos.
O que os outros querem de mim? Querem que o meu
habitat e estilo estejam no modelo social, à imitação, portanto,
não o serei, pois carrego o que me prometo, mas o que a mim
faço, não posso muitas vezes cumprir pelo desejo. Desejar é um
momento muito volátil e nesta inconstância do ambicionar não
cumpre o que se desprende da alma e o corpo mente.
Abstraio-me dos olhos dos outros, das ações de que
necessitam transfigurar-se para a vivência que o natural lhes
delineia, assim, corrompo com os estilos com o factual.
Tenho a capacidade de abandonar uma vida material
concreta e segura para passar anos distantes dos entes que
julgo queridos na busca de novos valores para quando voltar.
Procuro a cada dia aprender com a vida e com isso construir
valores para alimentar a minha sabedoria.
O meu desejo não é tentar compreender o
incompreensível. Tenho como verdade que a menor porção de
algo quando bem analisado e compreendido, pode explicar o
todo complexo.
Não sou inteiramente a favor do cartesianismo, mas
Descarte na sua lógica procurou explicar deveras bem o que
hoje à ciência se faz coçar em pelo. Fica assim claro que,
12. 12
dependendo do objeto em causa, aplicar modestamente um
argumento e tê-lo verdadeiro, cumpre somente explicá-lo dentro
desta verdade, o que vem a ser também bastante aristotélico.
Poupo-me do óbvio, a religião já a faz por si há milênios
com o objetivo da doutrina. Os livros de autoajuda já são muitos
para consolidar as opiniões fracas, se posso dizer que mentes
fracas têm alguma opinião e condição de crítica. Obstante
a sua característica doutrinaria, são deveras importantes
os pilares para a sustentabilidade à massa dominada que
creem no livre arbítrio para depois se consultarem com os
ícones personificados no subconsciente, salvaguardando uma
idolatria que massageia o ego com o perdão imaginário.
Brilhantes são as regras explicitas que comovem nações
e povos, discorrendo regras conceituais de amor, ódio, perdão,
caos, e tudo o mais, que traduz uma época, uma necessidade
política, econômica e social para e pelo poder.
O poder é o método capaz de controlar o caos que
poderia acontecer sem a regulamentação doutrinária. A
preguiça cerebral da humanidade propõe o melhor para cada
ser. Não ter que pensar é a forma mais simples de passar pela
vida, sofre-se menos por não conhecer, acreditando em tudo que
é experienciado e viver pela fé, e assim estarão todos a salvos
dos males. A leveza pela purificação das almas doutrinadas
suplanta quaisquer obstáculos do mundo. Almas perfeitas e
lavadas, os ícones pensam por essas almas, assim não existe
nada de melhor para viver pensando que existe o livre arbítrio.
O alívio das almas pela preguiça, pela ignorância,
destitui grande parte da humanidade do compromisso de si e
do outro. Suas almas já estão regulamentadas e controladas
por suas crenças “vazias”, por significados não compreendidos,
mas com fé.
Acredito que na ignorância não se é capaz do
autoconhecimento, e o que permanece é um objeto, o corpo
biológico que acredita por ter nascido com um cérebro evoluído,
já não é mais um ser limitado. Diante desse pensamento,
não corroboro com o que os gregos antigos e os escolásticos
acreditavam afirmando que, as coisas existem simplesmente
porque precisam existir, ou porque assim deve ser.
13. 13
Concluo este tema tão complexo de como sou e me
vejo, tentando elucidar como analiso o meu eu no contexto
social, nomeadamente como ser sociável e uno que se julga
num contexto de crença puramente científica. Sucintamente
e de forma mais simples, eu me vejo como um ser que admite
internalizar as externalidades, mas com uma barreira de fogo
bastante bem implementada.
15. 15
Memento I
Canto 1.
A CEGUEIRA
Olha, olha não consegue ver.
Você sabe que não ficou cego
Mas não entende porque não enxerga
Mas você sabe que está sobre a ponte
E sabe que o mar azul está adiante
Existem navios no horizonte
Você tem consciência de tudo
Mas não consegue ver
Ei? Não tente abrir mais os olhos
Você não vê por falta da visão
O muro é muito mais alto
Faça o esforço para subir até o topo
É muito alto, e você não suporta mais o cansaço?
Tente mais uma vez.
Sente-se fraco
Não tem mais tempo?
Dê mais uma gota do seu sangue
Sei que é a última gota
Está quase, vai.
Sente-se melhor agora?
Você chegou ao topo.
Mas o seu corpo é só dor
Você demorou demais
O muro é alto
E não teve tempo de ver os navios
A correnteza mudou a cor do mar.
Não salte agora.
Use a sua imaginação.
Tente enxergar assim mesmo.
16. 16
CONSCIÊNCIA
Você achou que o tempo não passaria?
Tentou se convencer de que nada aconteceria?
Fez com que o seu cérebro queimasse no alto-forno?
Esqueceu-se de que o fogo queima?
Mas o produto escorreu
Petrificou com o ar
Tentou a picareta para quebrar e nada
Tentou um componente químico
Mas a química não permitiu que se liquidificasse novamente
Pronto, você envelheceu e ficou pronto.
Nada mais é capaz de modificar
Nem os vermes conseguirão devorar.
E você ainda nem percebeu
Que o tempo passou e se foi para bem longe
Nem é capaz de processar lembranças e a dor aumenta
Mas o que solidificou nem pensa
Só sofre e nem sabe discernir em que consiste.
17. 17
TEATRO
O relacionamento acabou, mas existe amor?
O ódio, a vingança se apresenta.
E o vazio? Que tormenta!
E chora-se e ri-se.
O corpo fica esquálido.
Os olhos não veem os campos, as ruas e as cidades.
Não se escuta os cumprimentos, são sussurros desnexos.
Quer-se a amizade?
Não, não existe possibilidade – É amor.
Sente-se a senhora de cetim negro, mais próxima.
Caminha junto a todos os passos.
Então o que é melhor?
Lembrar-se que a vida é uma peça de teatro,
E o vivido não foi mais que meio ato.
18. 18
O SONHO
Você corre, corre atrás de um sonho.
Mas você não conhece o sonho
Então, você vaga de um lado para o outro,
Considerando as coisas pontuais como realizadas
Mas você volta para casa
Fica ali calado
Frio
Embutido
Imundo
Moribundo
Chora e ri embriagado
A noite cai
O estomago enjoado
Adormece
E o sonho que sequer foi sonhado
Morre com o sono
O dia nasce novamente
E você volta a correr e corre atrás do sonho.
19. 19
MENTE DEMENTE
O corpo não mente
O que mente é a mente
Vergar-se na mente que mente
Tem-se a mente demente
E na noa que vai além da hora por ora
A mente que mente
Estagna na imensidão do céu noturno
Na recordação do momento divino
No sorriso amigo
Na sensibilidade do choro ou sorriso
No amor e na fé
Mente que mente indeterminadamente
No decifrar os enigmas das emoções
Os pensamentos abstratos
A consciência.
Absurdo de mente demente.
20. 20
ODEIO
Odeio o sorriso pálido
Odeio os bons dias sem nexo
Odeio os muito obrigados
Odeio o silêncio alheio
Odeio quem muito fala
Odeio a voz meiga massageada
Odeio quem desfila sem palco
Odeio aceitar o imperdoável
Odeio as sanguessugas
Odeio as juras secretas
Odeio o cheiro das flores mortas
Odeio a política
Odeio religião
Odeio a falta de espiritualidade
Odeio quem reverencia
Odeio a inércia destemida
Odeio carros e casas de outros
Odeio gente fedorenta
Odeio o perfeccionismo
Odeio compromissos indigestos
Odeio gente
Odeio quem dissimula o ódio
Odeio com todo o meu ódio
Ódio de quem sabe odiar.
21. 21
EU E A MARIPOSA
Estou hoje de frente ao oceano cinzento,
Lindo
Dentro deste apartamento com o físico esquálido
Observei novamente a mariposa que na parede da sala,
Estava há mais de semanas pousada
Imaginei que ela, como eu
Estava meio morta
Ao remexê-la
Ela se apossou de outro sítio.
A expressão da mariposa e a minha
Deveria ser retratada em um filme.
22. 22
VOO
Se alçares voo
Deverá ser para chegares o mais alto dos ares
Para ver com outros olhos os mares,
E sonhares.
Mesmo que esteja longe a terra
Não tenhas medo da queda
Que um dia estará por vir.
Se não conseguires pousar
Então permaneça na correnteza quente dos ares
Com as asas paradas
E irás a outros lugares
Sem te cansares.
A vista de cima é das mais belas
É lúdica, é singela.
E quando conseguires um bom pouso
Pousa suave
Outros voos assim
São seculares.
23. 23
OCULTO
Fartei-me de mostrar o meu encanto
De cair em pranto
De elucidar minha ternura.
Hoje sei de que nada adianta
O que me é sentimental.
O que eleva o meu feitio e
Coloca noutro coração
A minha galhardia
É o meu intencional.
24. 24
MANÉ
Nasceu ignorante
Sem berço para levá-lo adiante.
Sem esforço,
Descambou para a vida errante.
Teve muitas amantes.
Sua felicidade?
Deitar-se com as Maneias,
Eram as suas odisseias.
Pensava só com o falo
O que de mais honroso tinhas,
Só poderia se tornar inábil.
E agora Mané, que o seu corpo,
Chegou ao desmonte?
Desmoronou.
Mas, o caminho já foi percorrido,
A herança é da inconsequência,
Restando os poucos fragmentos
Da vida que você traçou.
25. 25
SEM DESTINO
Você deseja chegar?
Você sabe que o caminho é longo
E sabe que existe várias formar de ir.
Mas não será assim tão fácil.
Traça os objetivos e as metas para cada ato
E você vê que é sofrível.
Busque, o projeto está traçado.
Já está em exaustão?
Ou é medo da ação?
Potencialize as energias
Deixa de lado a aflição.
Não será mais um decadente
Juntando angústias e inquietação.
Sei, o esforço é hercúleo,
A ânsia é muita
Que causa náuseas
E ainda nem deu o primeiro passo.
Vai de bote?
Decidiu,
Fico aqui a ver da praia.
Você foi,
Vejo você distante
A sumir no horizonte.
26. 26
ODISSEIA
Levantou
Alçou voo
Viu com encanto
Todos os recantos
As maravilhas dos campos
As luzes das metrópoles
Os índios, as florestas,
As acrópoles
Os oceanos.
Aterrissou.
Viu a guarda inimiga
O sangue e a falta de comida
A doença, a má sorte.
27. 27
BEM-TE-VI
Bem-te-vi, bem-te-vi...
Bem me viu e eu não te vejo?
Não quero este bem, não o desejo,
Que me vês e eu não o vejo.
Abra as tuas asas
Pouse na minha arcada
Saia do anonimato.
Não sou assim tão tolerante
Para que fiques de longe
Fustigado a minha alma.
Se assim continuares
Vou armar o meu arco
E a esmo, disparo,
Levando na ponta da flecha de aço
O que será o seu último abraço.
28. 28
FUGA A ESMO
Fez juras que não pode cumprir,
Agiu como se conhecesse o futuro,
Criou expectativas no outro,
Conjeturou promessas em devaneios,
Gritou com sentimento único,
Humilhou-se,
Iludiu-se,
Destituiu-se,
Faltou-lhe o poder de mostrar a própria força,
À sua amante prepotente.
Atuou de fato,
Uniformizou o ato
Tornou-se dependente de haveres.
Impotente, buscou a própria acepção.
Foi certo na escolha,
Estás agora no seu impressionante cenário,
Hilário.
Não tens mais juras a fazer.
Uniu-se a pessoa de iguais atributos,
Num Estado de quinta classe,
No país de terceiro mundo,
Florescendo da história de um passado
Das coisas habituais.
Nada notável,
Escondeu-se.
29. 29
INSIGNIFICÂNCIA
Cura a sua dor meu caro
Assim sai da latência do imaginário,
Honra-te da insignificância.
O trabalho é pouco,
Mas tens um teto com palmos medidos,
A abrigar os teus prazeres.
És tão apoucado
Que esta choça
O torna ancho.
Não lutaste pelo abundante,
E a pouca monta em que tu te apoias
Irá satisfazer-te.
30. 30
LEMBRANÇAS PERFEITAS I
O seu mundo não se move mais pelas lembranças?
Então por que, se sentir assim todo o tempo?
E tenta corromper com esse sentimento de angústia.
Mas não consegue!
É mais forte que você.
Vai ao mar? Estou lá
Vai à montanha? Também estou lá
Vai à beira do rio? Sentes falta de mim.
Deita-se na cama e pela janela vês as estrelas?
Eu sou uma delas.
Atravessou o oceano para sentir a mesma coisa de antes?
Errou. Nada é igual.
O cheiro é diferente
O diálogo é diferente
A música é diferente
E então, a poesia? Bem diferente.
È débil demais, não é?
São muitas as tentativas do esquecimento,
Mas você não consegue me esquecer.
31. 31
LEMBRANÇAS PERFEITAS II
O semáforo da ponte no lugar desconhecido não dá o verde, e
a espera é longa?
Não sabíamos que deveria apertar o botão.
Estamos no carro há horas e temos fome e sem dinheiro?
Comemos pão com chouriça.
A sapateira é só moscas?
Não se come sapateira a beira rio.
Os portais dos castelos e outras obras milenares são magníficos?
Esquecemos novamente da máquina fotográfica.
As idas de férias são cansativas e curtas?
Mas vale a pena o oceano com um espeto de churrasco a pescar,
Ou um mergulho com os corpos equipados a beira mar.
A lida dos dias é exaustiva?
Mas compensa no fim da noite.
O frio é insuportável na serra?
Mas a profissão é o resgate.
Repetimos as idas nos mesmo sítios?
Mas as cores são sempre diferentes.
As músicas no carro podem vir do rádio ou CD e se repetirem?
Mas é a hora de dizer que nos amamos.
A Leiria ficou próxima a Coimbra?
É o prazer da espera.
Cada percebe e ameijoa ingerida?
Tudo sabe bem.
Cada montra apreciada?
É tudo lindo com a loja fechada.
Cada compra realizada para a casa?
Horas e horas de apreciação.
Cada taça de vinho consumida sentados à mesa da cozinha
com os corpos nus?
É o diálogo doravante do delírio dos melhores amantes.
Cada pescaria sem nexo no frio intenso?
32. 32
A melhor das pescarias.
Sentados na areia da praia depois de consumirmos carapau
seco?
Que viagem!
Os bocejos no carro no fim da noite?
Uma praga que pega.
E depois de tudo as lembranças,
E ri-se e ri-se sem parar, das mais fúteis e idolatradas conquistas.
33. 33
LEMBRANÇA PERFEITAS III
É tarde de outono,
O oceano, da janela do apartamento, se apresenta mais
cinzento.
O homem nada todos os dias no mesmo lugar,
Deve ser norma do seu médico, pois água está fria.
Mergulha e, em cada braçada quando,
A cabeça vem à tona para respirar
É você a nadar no meu mar.
Corro à varanda
Fixo bem os olhos para distinguir quem realmente é,
Leva tempo para decifrar.
O cérebro está condicionado
Para enxergar o que desejo
Que deveria além do horizonte estar.
Depois de algumas horas
Com olhos a transmitir ao cérebro a real imagem,
Conscientiza a interpretação,
É outra pessoa a se exercitar e, já caminhando,
Ele sai do meio da nuance preguiçosa da estação.
Achei que seria possível ser você vindo a nado,
Mas você já cá está a nadar em outro mar.
Talvez, mesmo sendo outono,
Seja um mar mais significante e mais brilhante
Que o mar que lhe tenho a ofertar.
34. 34
METÁFORAS
Os galos da Dona Lena
Cantam muito cedo
Uns às vezes morrem
Outros passam a cantar
Noutros terreiros.
Quase não sonho
Passo a ter sonhos confusos e difusos
Com o ator quando ele,
Despe-se de seu papel.
35. 35
DESCARTE
Descarte a carta que te prende ao jogo
A angústia do egoísmo evasivo
Por abnegação o incontestável
A patente vulnerável.
Descarte meu caro
A serenidade do rio onde tu lamentas
A seriedade de como tu gargalhas
O triste riso do palhaço.
Descarte a empáfia
O rigor não excessivo
O ato fastidioso
A clarividência do fato.
Descarte a literatura sem censura
O rito benevolente
O peso ao revés
A desafinação da autoria.
Descarte o lhano
Que de cândido e despretensioso nada tem.
DescARTE
Não, a arte de Descartes.
36. 36
O HOMEM AVESTRUZ
O homem que fortemente criticou o que lhe era desconhecido
Sentia-se o maior dos protegidos
E sem nenhum escrúpulo, julgou o ser amado,
E acabou se acabrunhando no silêncio.
Num momento sequer esperado
Viu-se totalmente desamparado
Teve medo da recusa e de ficar ilhado.
Sua autoconsciência saiu da inércia, da paralisia,
Tudo agora se podia.
O desconhecido que por ora criticado
Torna-se o recanto mais privilegiado, a zona de conforto, a sua
nova ilha.
Como o novo encontrado é o diferente
Tenta a amnésia afetiva para adiar decisões,
Coloca-se em territórios movediços
Criando armadilhas para sua própria dignidade.
O que o move agora é o inconsciente
Com esperança no que lhe é variado,
O que lhe trava a nostalgia.
Para não incorrer no perigo de fazer a história irreconciliável
E por medo da verdade que na ponta de seu nariz se encontra
Cobre a cabeça como a avestruz, sentindo-se protegido.
Criando um inimigo eloquente demais, que para um poeta,
Não existe comentário.
O seu amado, agora o seu inimigo imaginário,
Avança meticulosamente
E quando da sua passagem da opulência e da felicidade à
pobreza e desgraça
Será o único que estará a seguir os seus passos
Para te elevar do seu estado de aflição, do seu infortúnio e
desventura,
Da calamidade em que se encafuou.
37. 37
MÁSCARAS
Eu vivo com as minhas seis máscaras que confeccionei.
O dia da máscara de político para poder lidar com uma
sociedade medíocre.
O dia da máscara de palhaço para fazer rir pessoas que não
conseguem observar a tristeza do meu eu mais profundo.
O dia da máscara da fantasia para consolar os sonhos, alheio.
O dia da máscara da verdade para que duvidem de mim.
O dia da máscara da extravagância para que vejam, a minha
versatilidade, a minha intolerância e a minha sabedoria, para
que assim, eu seja reconhecida.
O dia da máscara da bondade e da feminilidade para que
sintam a minha fragilidade.
São seis máscaras para cada um dos seis dias da semana que
fazem a minha sobrevivência neste mundo insano.
A sétima máscara eu não consegui criar, nesse dia sou eu na
minha performance real e louca que só uma pessoa no mundo
conhece.
38. 38
INDECISÃO
Essas dores!!!
Vou, porque tenho de ir;
Volto por não poder ficar.
Se pudesse, nem iria e nem ficaria.
Dói-me por demais a carne e ossos que compõe a estrutura de
uma alma;
Pasmo sempre, por ir e não voltar.
39. 39
ESQUECIMENTO
O homem que esquece a poesia
Esquece os gestos e as manias
Dilacera com os ancestrais.
O homem que se passa pelo capricho
Esquece a filosofia
Quebra os cristais.
O homem que se derrama em lágrimas
Mas se esquece da sociologia
Dilacera com a dicotomia.
O homem que dramatiza uma história
Esquece que na luta pode-se chegar à vitória
Mortifica a glória.
O homem que foge da realidade
Luta pela unicidade
Difama sentimentos da igualdade.
O homem que utiliza o seu olho cego
Vagueia na hipotética realidade
Rasga as páginas da história.
O homem que se esquece da empatia simbiótica
Relega as variáveis pela ausência do evento
Desvia a relevância.
O homem que rompe com a pintura abstrata
Deseja o que vê
Perde a imaginação.
O homem que a isto demonstra
Acomoda-se na ignorância
Rompe com a esperança.
40. 40
O homem que ignora a realidade
Desconsidera o papel que o caos inevitável tem
Conjectura outra objeção.
O homem que se exime de toda culpa
Extingue a projeção imaginária
Elucubra em si.
O homem que imagina possuir com perfeição destinada
Esquece experiências compartilhadas
Despedaça o brio do porvir.
O homem que assim se coloca
Torna-se acre e esmaece à conquista.
E qualquer paixão lhe diverte.
O homem com essas atitudes
Perde todas as suas posses
E chora desgraçado.
Este homem não pode ser meu.
41. 41
COMPREENSÃO
Existem coisas que não compreendo
Como a morte
Não entendo o romantismo barato pelo telefone
Não compreendo indecisão.
Não consigo entender o verbo amar vazio
Nem o sorriso forçado.
Não compreendo a virtude pelo interesse.
Muito menos as pessoas que deixam de viver
Para viver a vida de alguém.
O que menos entendo mesmo é o silêncio.
Será que morri?
42. 42
ROMANTISMO
Gostaria que soubesse:
O que se vive juntos não passa
Portanto, não diga que eu matei a nós.
Meu ser não consegue assassinar o que abastece o sentimento.
A minha poesia fica guardada em minha alma
Será a você passada pelos meus abraços e beijos aqui
preservados.
Fico lucubrando para reter o estágio de loucura.
Toco na jovial borboleta para sentir a seda da sua pele
Inclino-me à rosa para recuperar o seu cheiro e revivenciar a
sua beleza.
Só não posso dar a você o que não possuo
E o que possuo, talvez não o satisfaça.
Perdão por eu ser tão inferior.
Na minha frágil e inconstante sabedoria
Para não dizer literalmente, ignorância,
Alimento-me deste amor que sinto por você.
Não sou a súcubo como você me intitula e queima na fogueira.
Mate-me de forma mais misericordiosa.
Já que soube matar o seu amor do seu eu
Saiba então matar o seu ódio.
Preserve de nós algo de bom
Se alguma coisa boa realmente existiu para você.
Aprenda ao menos, a não cumprir o seu ritual de horror.
Colocaste-me no túmulo ainda viva.
Desculpa-me, tira-me daqui.
Deixa-me inspirar só um pouco de ar.
Não me mate assim, vivo ainda por respirar você.
43. 43
ESCREVO
Na segunda-feira, escrevo;
Na terça e quarta, também;
Às vezes escrevo na quinta e
Na sexta quando sinto que convém.
Escrevo nos fins de semana
Nos feriados escrevo quando me apetece;
Em momento de orgulho
No mundo que é só meu
Faço a hora de escrever.
Pasmo sempre quando leio
Admito que não seja eu.
Mas escrevo que importa?
Mais me admira quem não o faz,
Nada sente nada pensa, pois
Nada tem por dizer.
Faço sentir nas palavras
Momentos obscuros de reflexão;
De amor e ódio sou cúmplice;
Hoje entendo o que escrevo, amanhã
Talvez, não.
Que importa então?
Não entendo muito das palavras,
Não sou poetisa
E seria muita audácia
Se a quisesse ser.
44. 44
PASSADO E FUTURO
Sem passado o presente não terá futuro.
Quem somente vive intensamente no presente e não examina o
passado não será capaz de prognosticar o futuro.
Passa a pensar o futuro como a possibilidade de tudo e o
passado, como a realidade do nada.
Assim, não tem esperanças nem saudades, e o presente tornará
a vida contrária do que desejaria.
Sem que prevaleça a história no cérebro de um homem, o que
poderá ser a vida amanhã se não a pode presumir?
É através do passado empírico que se mantém o controle do que
se quer, do que acontece de fora, exercendo a própria vontade.
Quem repudia o legado do passado, arreda-se de si, levando ao
desejo inútil de repeti-lo, com a sensação do momento.
A rejeição do passado modifica o espectro da sensibilidade,
pelo fato elementar de consciência provocado pela modificação
de um sentido externo e ou interno.
Sem conhecimento do passado, o presente é um simulacro de
si, vive-se de aparência sem realidade.
O presente descalçado é a ilusão transcendendo as premissas
das incertezas do futuro, o qual vivenciará como já fora um dia.
A simulação do futuro torna-se fantasmagórica e o texto se
repetirá.
E ri-se íncubo.
45. 45
MARIA DA PENHA BOINA - AUTOESTIMA
Sempre achei que fosse censurada pelos meus defeitos
Comecei a mensurá-los para corrigi-los
Não os defeitos físicos, estes são o meu patrimônio.
Quanto mais corrigia as minhas imperfeições morais
Mais repreensão acontecia.
Demorei a compreender tanta condenação
Foi o tempo que me elucidou
Não existiam intrigas sobre as minhas deformidades
A aversão que de mim sentiam
Não eram sob o ponto de mira que eu imaginava
Os agulhões estavam direcionados eram para a minha
excelência.
46. 46
VIRTUALIDADE
A vida, amigos, amantes, exposições,
Tudo virtual.
As músicas, poesias, filosofias, psicologias,
Tudo virtual.
Os sonhos, as flores, as paixões e os amores,
Tudo virtual.
As religiões, as crenças os mitos e ritos,
Também virtual.
Ódios, rancores, dissabores,
Mundo virtual.
E quando tudo isso foi real?
47. 47
ELES E AS MULHERES
Eles são passionais às Joanas, Cristinas e Helenas.
Suas vidas não passam além das que vivem das mesmas penas.
Compartilham compaixões com as Joanas,
Colocam os seus dotes de aparências nas Cristinas,
Fantasiam como mães as Helenas.
Nomes que lembram filhas, netas, enteadas, amigas de seus
círculos virtuosos.
Que indubitavelmente não são mais que as suas amantes e
Que se contorcem em suas camas usando formas sensuais.
Mas no cair da realidade,
As Joanas, que eles acham carismáticas, se encontram nos
bordeis.
As Cristinas, de seus reinos de cuidados têm as almas
disfarçadas de damas da traição.
As Helenas, que imaginam a súbita certeza do seu amor,
São as suas imaculadas serpentes
São seus impérios sem futuro
Seus mantos de amargura
Que na medida exata de suas primeiras fragilidades
Elas os colocam para fora de suas camas
Como um rebuçado desgastado
Baldeando-se em outros méis.
E agora, como pobres desgraçados,
Irão dar glória, glória as suas subestimadas Marias.
48. 48
PERNAMBUCO
Conhecer Pernambuco é giro, como se diz na boa gíria de
Portugal.
Baila-se cavalo marinho pra esquecer-se a lida negreira
Nos batentes dos pandeiros, da rebeca e do ganzá.
Na colheita e na caçada indígena
A velocidade impetuosa do ganzá a arrebentar maracatu.
Pólvora, cachaça e limão.
Mamulengo, que delícia, dá pra ri e pra chorar.
Da quadrilha, do maxixe e do galope, vem o frevo se exaltar.
É alegria da tesoura da pernada do carrossel nos passinhos a
sublimar.
Tem a coco a pastoril a ciranda
É pra tudo o carnavá.
Além da linda Oh! Linda tem Recife
De arrecifes de corá.
49. 49
AMOR REVERSO
Num belo dia eu ouvi falar
Fizeram-te uma imprecação de males
Como prenúncio de morte.
Praga de gente sórdida.
Que nocividade é essa?
Uma árvore nascer dentro de mim?
Para que eu exploda?
Não entendi a malícia.
Fiquei torpe.
Predestinei à aversão.
E o infortúnio aconteceu.
A árvore nasceu, cresceu e criou raízes.
Dissipou dentro de mim.
Gerou frutos maravilhosos
As raízes entranharam-se no coração
Era a praga do amor reverso
De um amante em solidão.
50. 50
SEM DESTINO I
Não, não é assim que você é,
Você é mais, muito mais de tão pouco,
É o verão que está a consumir o seu pensamento.
O outono já vem,
E logo, logo o inverno, para esfriar a sua irreflexão.
Quando fores refletir no inverno
Sentirás como foi o inferno
De como o verão te encolheu.
Não te aflijas por enquanto
O inverno tem os seus encantos
De curar os desencantos,
De um verão discricionário.
Não, não é culpa sua,
Faltou-lhe a decência plena
De um homem que não cresceu.
51. 51
SEM DESTINO II
Viveu e viu as façanhas da vida
Armou-se em seu campo de força
Arrebanhou todas as ovelhas
Caricaturou a própria vida.
Fumou, bebeu, iludiu
Construiu e destruiu
Sem arregaçar as mangas.
Vida fácil, vida bruta,
Enquanto encontrou certezas
Que não fez por merecer.
Agora, homem, chegou a verdade
Das incertezas incondicionais.
Ontem o seu passado
Hoje o seu futuro impensado
Resultando na sua tormenta.
Escreveu a vida e criou os próprios tropeços
Devido o seu desajeito e negligência
Da sua bússola desordenada
Que insistiu seguir.
Não tem como seguir mais caminho
Vai navegar sozinho
No mundo único que construiu.
52. 52
PSICOPATA
Leva anos e anos
Delineando a sua armadilha
Estudando a sua vítima.
Falante, charmoso, simpático, sedutor,
Capaz de impressionar e cativar rapidamente as pessoas.
Bonzinho, educado e inofensivo, é impecável.
É só fachada, um teatro muito bem engendrado,
Que esconde seus atributos perturbadores.
Capaz de enganar com suas mentiras repetidas,
À obtenção de seu lucro ou prazer.
Desrespeitador e imprudente,
Até da sua segurança e a dos outros.
Irresponsável de suas obrigações.
Sem nenhum sentimento de remorso,
Culpa por ferir, maltratar,
Roubar, enganar ou mesmo matar.
Nada disso faz parte do seu íntimo.
Inteligente, mas insensível, frio manipulador.
Fingidor de sentimentos perfeitos.
Quando descoberto? Mestre inversor do jogo.
Agora vítima de convencer
De que foi mal interpretado.
É consciente de todos os seus atos.
Não desiste é incansável e
Com seu charme e bem humorado
Vem o golpe da sua lâmina fatal.
Vai-se embora dissimuladamente
Parte para a próxima ação, sacrificar.
53. 53
A CRISE DO LAMENTO
Apoio os dedos finos
Das mãos enrugadas no teclado
Nenhum, encanto vejo acontecer
Nada surge em palavras
Lá vão dias e noites, adentro
Pescoço cansado
Ombros caídos
E dedilhando com os dedos finos no teclado
Não inspira, nenhum lamento
Será que também há crise
No sentimento?
Que lamento!
54. 54
ASSALTO AO CORAÇÃO
Bateram em minha porta
Eu a abri com um sorriso
E para a minha surpresa
Era um assalto.
Fiquei estarrecida
Numa mistura de êxtase e medo
Mas, durante aqueles momentos
Tentei fazer todas as leituras possíveis.
Mas, quando a porta se fechou
Notei que o meu estômago não mais aceitava a comida
Os meus pulmões já não queriam respirar
O meu coração sangrava.
As minhas pernas paralisavam
Os meus dedos começaram a esfriar.
Mas, na fuga do sentimento a razão sobressaiu
Pensei então…
Cometi um grande erro
Abri a porta desprevenida
Deixei entrar com um sorriso
Quem me era desconhecido.
55. 55
TELEFONE
Estou concentrada e, num disparate, o susto
Um trim, trim, trim
É o telefone a tocar
Esvazia-se momentaneamente o meu cérebro
Inusitadamente, inconscientemente
Como um afogamento é a sensação
Raiva, ódio, sofrimento
Mas tenho que falar
Alô, Oi, Sim, sei lá o quê
Do outro lado, um “como vai você”?
Então reflito, falar
Como vou? Nada mudou
Vou indo, sem pensar
Num presente indecente
Com um muro a minha frente
Mas o que interessa, como vou?
Vou a pé, de trem, de ônibus
Vou como bem me apetecer
Como posso também, não ir
Vou bem, vou mal
Que diferença faz
Que farás por mim
Independente da resposta que receber?
Mas depois que me deixou por um momento, no vazio
Minhas respostas se tornam monossilábicas
Como tu queres ser perfeito
Com seu tosco telefonema?
Atrapalhando o meu estado criativo
Minha concentração perfeita
Meu invólucro intransponível
Quebrado por um telefonema inútil.
56. 56
ÓDIO
Amo alimentar o meu ódio
Quero beber deste ódio eternamente.
É ele que nutre a minha existência
Sem essa lâmina não consigo enxergar a indiferença.
Na indiferença dos outros
Encontro a minha sensatez
A minha filosofia do amor que pensa
Na ciência que investiga
No estudo que analisa.
Ao me alimentar do ódio
Estudo a paixão que desequilibra
O orgulho que enlouquece as pessoas
O sensualismo que envenena.
Necessito do ódio para saber
Lidar com a indiferença.
Pode vir de terno, vir com olhos, boca, coração e cérebro
Nada, nada mesmo dará conta dessa presença
Muito menos da ausência.
Por isso preciso beber mais ódio
Pois é neste ódio que preciso de um coração
De uma frieza, de um raciocínio
Mesmo que doente.
Preciso aprender, e o ódio é a matéria-prima dessa ânsia que
alimento.
Este alimento está no objeto do ódio
Alimenta o meu rancor, a minha ira
O meu pouco humor e
A minha pouca sabedoria para entender
E aturar.
Quero o ódio para mim, dessa forma
Nunca serei indiferente.
57. 57
PAIXÃO
Sê como amigo,
O mais verdadeiro.
Sê por gratidão,
com a maior vontade.
Sê por justiça,
bem feita.
Sê por teimosia,
com orgulho.
Sê por caridade,
de coração.
Sê por ganância,
para valer o esforço.
Sê por obrigação,
para o certo.
Sê por paixão,
a mais intensa.
Sê por impulso,
sem arrependimentos.
Sê por amor,
irás ao céu
Sê assim,
que com o manto de minha paixão
te doutrinarei.
58. 58
PERDI
Perdi
Sei que é minha culpa
Não contemplei e não mensurei as consequências
Deduzi que todos seriam fortes como eu.
Sempre fui dura para suportar
Dores, ódios, amarguras e saudades.
Mas hoje sinto o pranto em minha face
Pois perdi o amor maior que Deus me deu.
Para mim o tempo sempre foi e será relativo
Nunca me acomodo pelo tempo perdido
Mas sinto que ninguém pensa assim.
Vou cortar meus pulsos ou tomar aquela caixa de comprimidos
Por deixar a emoção dominar a razão
E sufocar pela morte a dor que sinto em meu coração.
Tenho culpa, não escondo
Deixei-te só e sofrido
E o tempo foi capaz de trazer-te novos caminhos.
Viva, então, seja feliz
Pois não sou nenhuma imperatriz
Sou comum, uma reles infeliz
Que confiou em ti e num horrendo erro
Cai do pedestal, para os servis.
Algo me dizia, que eu ouviria somente de ti
A desistência da luta da nossa união.
Mas, em pelo, em febre e em duras penas
Outros dedos foram os que teclaram
Para dizer que estavas afastado
Dos nossos sonhos, amor e paixão.
O teu adeus não precisava ser assim
Podias ter confiado em mim
Pois quem julga e o indicador aponta
Esquece de ver que os outros dedos para si confrontam.
Errei e bato em meu peito
59. 59
Mas fui sincera e continuo a ser
Jamais apontarei um erro seu
Pois nunca fizestes por merecer.
Fostes e agora estou só
Sem chão, com pés descalços
Por perder o meu amor maior,
Que se foi sorrateiro e apático.
O gosto de fel em minha boca é doce
Perante a facada dissimulada que recebi.
60. 60
ACONCHEGO
Que belo o que ousas proclamar,
Mesmo que seja em nome alheio
De ti, nunca vou me separar
Pois um grande amor é sempre verdadeiro.
Se sou rosa e tenho espinhos
Tu és um cravo macio em que posso me aconchegar.
61. 61
MEUS HOMENS
Estou cansada das reverências
Tenho como liberdade
O antissocial
A minha própria forma de pronunciar.
Não quero nada que seja comedido.
Quero a relevância do meu próprio ato.
Quero os meus homens
E desejo amá-los a todos.
E nada que seja singular e exclusivista.
Nada de domínio público
Que exaurem os meus recursos mentais.
Não os quero fisicamente
Desejo-os de pés assentes
Mas sem muita intelectualidade.
Imagino-os com as suas esposas e amantes
Suas ternurinhas errantes e eu,
Os quero pelas suas melhores partes,
Aos meus pés pela minha genialidade
Na libertinagem de pensamentos,
Para que tenham sonhos
De um dia possuir, a mim,
A mulher intensidade.
E que ambicionem a minha extravagância,
Para que não morram as minhas nostalgias
E alimente as suas agonias
Daquilo que lhes é imparcial.
Que minha autenticidade
Sempre os deixem na busca
Da minha real personalidade.
62. 62
LÁPIDE
Lapidei durante toda uma vida
As coisas mais coloridas
Nas artes que criei.
Hoje, já quase morta,
Em preto e branco vou tentar
deixar em minha futura porta
Os dizeres que nunca pronunciarei.
- Aqui jaz uma niilista agnóstica que
almas fez sofrer e nem se deu por isso-.
Nenhum dizer será mais importante
Incrustado no granito frio
Que também da natureza vem.
E se abrirem a minha nova porta
Não terei como recebê-los, pois
em nenhum lugar estarei.
63. 63
Memento II
Canto 2.
OMISSÃO
Proibiu as suas palavras de me visitarem,
teus olhos de me enxergarem,
teus ouvidos de me escutarem.
Improvisou outra voz mísera
que descarinhosamente negou,
escondendo de mim o que vivias.
As promessas não falam por mim
e já trouxe o amanhã para o hoje
confessando que pela compleição débil o destino errou.
Desisto de lutar pela faculdade de perceber.
Prendi a palavra,
fechei os olhos.
O que há mais de existir?
Um mundo desbotado e sem pessoas,
uma ave que não voa
nada mais de mim..., nada!
64. 64
AMOR AMIGO
Amor amigo é aquele que existe sem interesse,
sem querer nada em troca.
É o amor perfeito
não anedota.
Amor amigo não aconselha
Não se envolve no âmago
do que mais belo o seu dito amigo já construiu.
Amor amigo é participação exponencial.
Amor amigo não chora mágoas
pela compaixão.
Amigo não aceita por devoção
tudo que lhe é dito.
Amor amigo discute se defende,
possuem pontos de vista diferentes,
combatem os seus princípios
e vontades.
Ser seletivo na amizade
é o estado da arte.
O amigo não é só meu,
É da vida pelo amor da amizade.
65. 65
INSATISFAÇÃO
O teu elogio não cura mais a minha insatisfação.
As tuas ideias consomem a minha alegria.
O teu juízo desapareceu sem harmonia.
Os teus gestos declaram sempre falta de emoção.
Tudo em ti é insosso.
Tudo que praticas não é natural.
Tudo o que demonstras é em razão de um esforço hercúleo.
Tu não tens opinião.
Tu és um fantoche.
Não possuis uma personalidade definida.
Um adulto cheio de mentiras.
Não és capaz de atuar com a razão.
És um ser sem atitude, mas cheio de malícias.
És uma criatura que esconde sentimentos.
És o que trai na defensiva.
És sempre a vítima em cada situação.
Ser imundo que não satisfaz.
Verme maldito do pecado.
Traidor dos que o amam,
Fere sem compaixão.
66. 66
QUEM TU ÉS?
Quem és tu?
Em que mundo tu vives?
Quais são os teus sonhos?
O que queres?
Porque tropeças tanto?
Porque não pulas os obstáculos?
Não vês que estás a cair
A definhar e a sumir!
Fala alguma coisa
Diga o que queres
Mate o teu medo
Estirpe o teu ódio.
Não mates a mim
É o que fazes um pouco a cada dia.
Sejas menos cruel.
Dá-me mais alegria.
67. 67
SONHOS DE MENINA MULHER
Fantasiei quando menina
Casar e ter meus filhos
Um menino e uma menina
De olhos bem clarinhos
Não foi fantasia
Foi um sonho realizado
Tive um casalzinho
De olhos clareados
Sonhei também como mulher
Fantasias até perversas
De viver com o meu companheiro
Como amantes exotéricos
Neste sonho glorioso
Quis conhecer lugares
Fazer coisas loucas
Sem traição, na liberdade
Mas este companheiro? Não tive
Não acompanhou a minha ilusão
Achou melhor a acomodação
Sobre o mesmo colchão
Não cativou a amada
Para viver os mesmos valores
Preferiu afagar os seus sonhos
Com a mulher da vida errada.
Neste caso, só agradeço
Ao sonho que tive com os filhos
Pois o sonho de mulher
Caiu no precipício.
68. 68
TATUAGEM
Vou tatuar o meu corpo
Com um Escorpião
Porque sou racional,
Mas destrutiva de coração.
Não, não - Vou tatuar Ideograma japonês.
Representando a minha índole refinada
Pelo meu bom gosto estético
Fidelidade e amor.
Oras! O Coração em chamas
Para mostrar o meu domínio
Tipificar este poder
Apenas cognitivo do meu ser.
E o Tubarão?
Caminho na solidão
Curiosa por missão
Sem submissão.
Vou, é tatuar um Dragão
Para sentir o meu controle
Meu desejo
Minha autoafirmação.
Ou caio na esparrela
Tatuando os símbolos Tribais
Neste motivo abstrato
Voltar-se-ão olhares que sinto escasso.
Ou uma Lagartixa?
Para manter o meu autocontrole
E a contenção dos sentimentos?
Que lamento! Tatuagem.
70. 70
FERA DOMADA
Nasci fera e fui domada
pelas chicotadas da vida.
E para cada chicotada
Uma literatura inteira foi percebida.
Aprendi comportamentos, ética e filosofia
sociologia social e psicologia.
Mesmo tendo tudo inato, em cada chicotada
os conceitos postos em prática afloraram dia-a-dia.
Reconheço no silêncio alheio
a não cumplicidade,
se não fala é por comodismo
por rancor e por maldade.
Estes seres mal iluminados
utilizam por efeito a alienação
a desculpa depressiva
como doença mental pela preguiça.
Analiso nos seres que se dizem ingênuos,
no abafo da sua sublimar inteligência,
achando que nesta obstinação
será capaz de não transmitir o seu real sentimento.
Oh! Fraqueza mental amadora, Oh! Inteligência fatal
do erro que não tolero
é o ser que é capaz de confundir
conceitos das palavras sem contexto.
As chicotadas me acresceram conhecimentos,
sou seletiva por excelência,
só compreendo
conceitos verdadeiros.
71. 71
É TARDE (16/08/01)
De que adianta seu amor agora
Se quando te amei você nem ligou
O quê me importa seu carinho agora
Se já é tarde para eu te amar
O quê me interessa seu sofrimento agora
Se quando eu lhe quis você nem mesmo soube dar amor
O que me leva a pensar da tristeza em seu olhar
Têm-se mais tristezas no meu
De que valem suas palavras agora
Se quando as disse você nem ouviu
De que valem seus sentimentos agora
Se os meus já se esvaíram
De que vale meu perdão agora
Se não existe mais essência para perdoar
O que me leva ter que sofrer por você agora
Se sempre sofri e você nunca percebeu
O que me vale ser cedo para você agora
Se para mim você já morreu.
72. 72
Memento III
Canto 3.
NOVOS TEMPOS
Acordo e começa o corre-corre
Para chegar, não sei aonde.
Durante o dia, trabalho
A noite também.
Nos pequenos espaços diários
Estudo
Depois o “stress” o cansaço
Por não saber se o dinheiro vem…
As vezes vêm o mal presságio
Será que amanhã vou ter trabalho?
Então, estudo
Mesmo sem o dinheiro para fazer o itinerário.
Não tenho tempo, sem tempo
Mas com tempo
Não concentro
Hoje isso, amanhã aquilo.
Para relaxar, escrevo
Perdendo tempo
Deveria mesmo estar lendo
Reverenciando os mestres.
Mas não me façam críticas
Eu gosto dos novos tempo
Mesmo sem tempo, dê-me tempo
Para ler poesias.
73. 73
SETEMBRO DE 2003 EM PORTUGAL
Está um lindo dia
O sol brilhante o céu sem nuvens
Dá vontade de sair.
Imagino o mar deve estar magnífico
Mas estou presa as raízes
Dos meus sonhos infantis.
Coisas que idealizei
Momentos que revelei
Decisões que tomei
Estão agora reflectidos
Em minha face lânguida
Da perversidade que não imaginei.
Sofro ora agora
Pelo destino que me dei
Que outrora não consegui, livrar-me.
Chora meu coração
Pela empatia que concebe
Pelo outro sofrimento.
O quê deu errado?
Quem foi o culpado?
Que magia negra foi esta?
Que consegue sempre me consternar
Colocando-me com o ego arrependido
Daquilo que não quis fazer?
Foram erros de placenta
Que a regressão não consegue explicar.
Concepção talvez indesejada
Que reflecte na pessoa mal amada
De forma desesperada
Mas não consegue se livrar.
74. 74
Passo agora este mal presságio
Para os entes mais queridos
Que no futuro se acharão esquecidos
Do ventre que os gerou
Moribundos e mal amados
Na mesma cadeia de valor.
75. 75
MEU AMIGO PEDRO (03/1998)
A adolescência conta histórias
E nestas histórias loucas, tem a do Pedro.
Ah! Meu amigo Pedro
Amigo de amores
Incertezas também.
Nada de grandioso
Também nada vulgar
Bom menino
Que mesmo em minha inocência
Já sentia, já sabia que iria afundar.
Não sei se no despreparo da criação
Talvez no gene da transformação
Desvirtuou aquele menino
Desprovido de amor
Não vingou.
Drogas, sexo e muito mais
Desenfreou e quebrou as virtudes
Do homem que se tornou.
Por quê? Por quê?
Eu te avisei e você não acreditou.
Foi-se assim tão cedo e drasticamente
Amigo Pedro, ferro e fogo te feriram
Não amou a ti mesmo
E com isto fizestes sofrer
Pessoas que queriam ver-te florescer
E o carrasco, ferrenho e sem amor
Que te fez sentir no peito o peso da dor
Tenho a satisfação de saber
Que o lugar onde estás
Amigo, será capaz de reflorescer.
76. 76
TESTAMENTO DO AMOR DE UMA MULHER
(02/2001)
Mulher não pode amar
na essência da palavra
Somente pode ser amada
na fadiga doutrinária.
Por isso compreendo agora
o meu grande erro na vida
Erro ou experiência?
Erro, experiência é
a degradante escusa do desacerto.
Amei, então errei
na essência da palavra
No desacerto perdi
o amor da pessoa amada.
Quando a mulher ama
verdadeiramente
Torna-se cúmplice de
um amor decadente.
No âmago do ser amado
depois do alcance da conquista pleiteada
exaure da sua alma todo o amor, e logo depois
vulgariza sua amada.
Quer ele ser o caçador perpétuo
da pureza nunca conquistada
Que desatinado e exasperado é este ser
que jamais poderá ser amado?
Amei, então errei e sofro
na essência da palavra, mas
Sou feliz por ter amado
Mesmo sendo vulgarizada
77. 77
por deixar-me ser conquistada.
SOFRIMENTO VIRTUAL (10/1999)
Nas noites escuras e frias
Não se faz mais barquinhos de papel
Como antigamente se fazia
Para encher de satisfação e alegria
Esta vida de aluguel.
Hoje nas noites, finge-se
Fazer amigos virtuais
Amigos, amantes e tudo mais
Para encher mais de saudade os corações
Pois eles, assim como os barquinhos não voltam jamais.
Ficando no coração
O frio denso de uma ilusão
Que talvez em uma noite de verão
Possa tornar realidade
os sonhos dos amantes virtuais.
Sufocando toda uma vida
Acreditando em curar uma ferida
Que na verdade não será vencida
E cresce cada vez mais
Em cada noite de despedida.
Mas quando se torna realidade
Que satisfação! Até amedronta
Ficando registrado nas faces
78. 78
A alegria do dado impasse
De vencer o que aparecia vencido.
Mas a tormenta não termina
A dor é mais intensa
Quando na despedida
Vendo um amor que fica
Na dura hora da partida.
Quanto arrependimento
E que no íntimo do ser vem o lamento
Sabendo assim que era menor o sofrimento
Da despedida virtual
E a maldita ferida nunca será vencida.
79. 79
CONDENAÇÃO (03/2001)
É ímpar, é demais poder amar
Mas amor é como o satanás
Faz proteger o nome do condenado
Precisando usar codinome para o ser amado
A sociedade não permite
Um amor assim tão alvo
Tão leve, tão solto, tão verdadeiro
Mas que nada tem de arbitrário
O satanás quem criou o dinheiro
Quem criou os valores materiais
Mas Deus criou o amor
Para combater o satanás
Quem é o homem?
Que se julga capaz de condenar
Um amor assim tão presente
No íntimo de um ser?
A liberdade existe
Mas na insensatez
A sociedade
Protege-se com Deus
E ama o satanás
Como um carrasco
Usando sua lâmina afiada
Cravando no coração amante
Mata morbidamente este amor tão presente.
80. 80
TELEFONE (03/2001)
Estou escravizada
Por este aparelho maldito,
Fico constantemente a espera
Que ele me chame do longínquo lugar.
Aquele toque lusitano
Que só eu sei decifrar.
O som mais lindo que já pude ouvir em minha vida,
Sem instrumentos, mas é uma verdadeira sinfonia
Que me faz delirar.
Os prazeres já me tocam
Quando em seu visor maloca
O número além mar.
A prata da voz que sussurra do outro lado,
Transforma em ouro o meu coração.
É uma magia este som de notas poucas
Que atinge um grau de maestria
E transforma-se em melodia
E quando silencia me faz chorar.
81. 81
POETISA FERIDA (03/2001)
Sempre fui poetisa da alegria
Das grandes virtudes e glórias
Como um poeta deve ser.
Mas uma grande decepção
Sem compaixão e com precisão
Feriu as palavras do meu ser.
Neste momento escrevo as tristezas
Que a vida nos prega
De maneira irônica e desprezível.
Os sonhos e realidades incompletas
Por minha insensatez
Pregou-me esta peça.
Que fraqueza a minha
Cai na própria armadilha
De que tanto dava gargalhada e contestava.
Cedo ou tarde
Nunca faltará essa realidade
No íntimo de cada ser.
Esta droga maldita
Que me colocou em delírios
Que não é injetada e nem bebida.
A ânsia me devora
Mas no grito da vitória
Vou me safar dessa agonia.
Mas neste momento
Desafogo em lamentos
Minha dor contraída.
Perdoai então
Meu momento sofrível
De poetisa ferida.
82. 82
PAULO (07/1989)
Paulo Fernando
Na intimidade - Paulo
Que no telefone brincava
E cá, também eu.
Que em um encontro nosso mais tarde
De mentiras escrotas
Um enrolo só, nos envolveu.
Risos e sonhos concebidos
Levou-me a sério
E sofreu.
Eu não tinha consciência
Do sofrimento que lhe causava
Então, seu pai experiente
Colocou Paulo em um avião
Indecente
E na Austrália
Desapareceu.
Encontrei Paulo muito tempo depois
vagando
E de mais nada fiquei sabendo
Do que em sua vida aconteceu.
83. 83
JOSINO O GÊNIO (1980)
Josino pequenino
Josino tão inocente
Aquele moleque trapo
Josino transumano.
Josino cresceu
Pois criança cresce
Homem, Josino continuou maltrapilho.
Mas com o coração de Josino.
E hoje, aqueles
Que brincaram com Josino
Ah! Josino
Brinca com eles.
84. 84
TEMPO (1979)
Mestre e correto é o tempo
Todas as coisas norteiam o tempo
Até o sobrenatural depende
Do tempo
O querer é algo com que sonhamos
O querer é o precisar
O morrer não é o querer
É o ter é o depender.
Maldito tempo
Faz-nos mendigar na vida
E traz-nos o necessitar
Por ser um cruel inimigo em apoiar.
Deveríamos fugir
Do maldito tempo
Pois dele não podemos
Vingar.
85. 85
PERTENCER (05/1979)
Santo, peregrino faceiro
Peco e Tu perdoa-me
Forma que Tu, qualidade divina
Mostras o que és.
Brilhar na vida
Ser faceiro peregrino
É ser Santo?
Ou pertencer a satã?
Com crueldade e pertinência
Usando da nossa inocência
Faz com que sejamos pecaminosos
Talvez para fazer mostrar sua qualidade de Santo.
E nos coloca em uma roda viva
Envolvendo o mundo com justiça
Para ser Rei hoje e amanhã
E em cada manhã seguinte é Santo pelas idiotices.
Como há séculos
Peregrino e Santo faceiro,
Pertenço a Ti
Assim como a humanidade diz pertencer.
De um farsante
Peregrino
Que se diz Cristo
Em cada amanhecer.
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CÓLOFON
Cantos escritos de 1979 a 2013, em estações e sítios bastantes
diferenciados, na tentativa apenas, de compreender o mundo.
Explicit.
Este livro foi composto em fonte Life BT corpo 11, e paginado em
InDesign. A impressão e o acabamento foram feitos por Gráfica
MPAC, em Vitória -ES, O papel utilizado na impressão do livro
é o alcalino original, alto alvura, opacidade 92 e gramatura 90
g/m², na cor branca e com espessura de 110 µm em março de
2013.
87. A cegueira
Olha, olha não consegue ver.
Você sabe que não ficou cego
Mas não entende porque não enxerga
Mas você sabe que está sobre a ponte
E sabe que o mar azul está adiante
Existem navios no horizonte
Você tem consciência de tudo
Mas não consegue ver
Ei? Não tente abrir mais os olhos
Você não vê por falta da visão
O muro é muito mais alto
Faça o esforço para subir até o topo
É muito alto, e você não suporta mais o cansaço?
Tente mais uma vez.
Sente-se fraco
Não tem mais tempo?
Dê mais uma gota do seu sangue
Sei que é a última gota
Está quase, vai.
Sente-se melhor agora?
Você chegou ao topo.
Mas o seu corpo é só dor
Você demorou demais
O muro é alto
E não teve tempo de ver os navios
A correnteza mudou a cor do mar.
Não salte agora.
Use a sua imaginação.
Tente enxergar assim mesmo.