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OUTROS CANTOS, Maria Valéria Rezende
Maria cruza o sertão em um ônibus que a leva
a algum ponto isolado do Nordeste e relembra sua
primeira incursão na região agreste, quarenta anos
antes, em condições mais precárias e perigosas,
seguindo um pequeno anúncio num diário oficial
listando municípios onde se necessitavam
alfabetizadores para o Mobral. Maria torna-se, aos
poucos, parte daquela gente sofrida. Engana o
sofrimento com lembranças que desfiam a série de
amores impossíveis encontrados na juventude,
olhares promissores vistos apenas de relance. Com
sutileza, Maria Valéria Rezende compõe um retrato
emocionante de uma mulher determinada, que
sacrifica a própria vida em troca de algo maior.
Sobre a autora Maria Valéria Rezende
Nasceu em 1942, em Santos (SP),
onde morou até os 18 anos. Em 1965 entrou
para a Congregação de Nossa Senhora -
Cônegas de Santo Agostinho. Sempre se
dedicou à educação popular, primeiro na
periferia de São Paulo e, a partir de 1972, no
Nordeste. Viveu no meio rural de
Pernambuco e da Paraíba e, desde 1986,
mora em João Pessoa. Já esteve em Angola,
Cuba, França e Timor, entre outros países,
convidada a falar sobre seus projetos sociais.
Maria Valéria estreou na ficção em 2001,
com o livro de contos Vasto mundo. Depois,
escreveu livros infanto-juvenis e o elogiado
romance O Voo da guará vermelha.
Personagens
Maria: Protagonista. Professora. Chega a Olho
d’Água com a incumbência de alfabetizar jovens e
adultos.
Fátima: Moradora do sertão, mãe
de vários filhos, amiga de Maria.
Antônio: Vaqueiro “encantado”
conquistador de Maria.
Tião: Morador do sertão,
marido de Fátima.
Jonas e Biuzinho: Meninos
filhos de Fátima e Tião.
Espaço
Tempo
Sertão nordestino.
Povoado fictício de Olho d’Água
A história se passa na mente de Maria, personagem central.
Há dois planos que se intercalam durante a narrativa:
1- Linear: Maria segue num ônibus desfiando suas
memórias de 40 anos atrás.
2- Flashback: As memórias de Maria, época da ditadura
militar.
Narrador Narrado em 1ª pessoa pela
própria protagonista, Maria.
Enredo
Maria, narradora-protagonista, faz uma viagem de ônibus ao
sertão para dar uma palestra em um sindicato de agricultores. No
caminho, ela relembra sua primeira ida a esse lugar chamado Olho
d’Água com a desculpa de ministrar aulas do Mobral (Movimento
Brasileiro de Alfabetização), programa de educação para jovens e
adultos do governo militar. A verdade é que Maria era militante de
esquerda enviada para organizar os trabalhadores. O importante era
“conscientizar o povo”.
Durante essa viagem de ônibus, à
noite, as lembranças do tempo passado
em Olho d’Água se cruzam com outras,
entre freiras educadoras na Argélia ou
como viajante no México, deparando-se
com costumes distantes e ao mesmo
tempo com pessoas de coragem e pureza
evidentes que a ajudam a enfrentar as
dificuldades do caminho. Ela, também,
compara o sertão que conhecia com
o sertão de agora. As mesmas lembranças
desfiam a série de amores impossíveis
encontrados na juventude, olhares
promissores vistos apenas de relance e
dos quais ela guarda lembranças
escondidas numa “caixinha dos patuás
posta em sossego lá no fundo do baú”.
Chegando ao povoado, Maria logo se integra ao cotidiano dos
tecelões de redes. Ela não tem salário nem função específica.
O grande trabalho dos moradores de Olho D’Água é o tear,
executado por toda a comunidade, principalmente pelas mulheres, e
Maria logo é auxiliada por Fátima que lhe ensina como tear e como
sobreviver naquele lugar de muito calor e aridez onde vive um povo
esquecido, um lugar onde água é ouro e quem a tem em abundância é
rico, é o Dono, de certa forma até comparado a Deus.
Maria chega antes da escola, do pagamento e dos materiais
prometidos pelo vereador que possibilitou sua vinda ao povoado. Tudo
isso demora meses até chegar.
Enquanto a espera se prolonga, Maria é recebida e orientada
por Fátima, moradora de Olho d’Água, mulher forte cercada de filhos
e com o marido tentando a vida em outra cidade. Maria, então,
começa a compreender a vida sertaneja, organizada por estações e
colheitas acompanhada pelo relógio natural do tempo.
“Encontrei ofício e família naquele canto escondido. Podia
ficar, preenchida de estranha euforia, e, subitamente livre de uma
espécie de cegueira frente ao desconhecido, comecei a ver cada um,
cada coisa, cada movimento na sua unidade e seu sentido. Pelas
mãos de Fátima cheguei ali de verdade.” Pág. 24
Os meses passam correndo e Maria começa se sentir
insegura. Percebe-se conquistada por aqueles que a acolheram tão
bem. Sente medo de ter sido esquecida pelos companheiros
militantes, medo também de não se cumprir a promessa do
vereador e ela não se tornar a professora prometida àquele povo tão
necessitado de tudo, inclusive das letras. Além disso, sem a escola,
seu objetivo militante se distancia ainda mais.
Pleno dezembro e nenhuma notícia do vereador: “ O vereador
não dava sinal de vida... O pretexto para minha presença naquele
lugar começava a perder a consistência, o que não parecia ser um
problema para o povo, eu já parte deles, quase natural. Mas havia o
Dono, seus prepostos e sabe Deus quem mais por trás dele, a
indagar, talvez, quem era e o que viera ali fazer aquela mulher assim
tão diferente e solta no mundo.” Pág. 104
A única fonte de escapar daquele
desânimo era a caixinha de patuás
escondida no fundo do baú. Mexia e
remexia os objetos relacionados a
uma figura meio mítica, de um
homem, que surgira em diferentes
épocas de sua vida com nomes e
funções bem diferentes. O que havia
de comum entre eles eram o mesmo
olhar fixo e postura de autoridade.
No sertão o tal homem atende pelo nome de Antônio, um
vaqueiro respeitado. Em São Paulo é Mauro, líder estudantil durante
a ditadura. No Rio , um adolescente motoqueiro que atende pelo
apelido de Harley. No México um viajante chamado Miguel, a
caminho de Cuba. Em todas as aparições, encara a narradora fixa e
silenciosamente e lhe entrega um amuleto, os quais ela guarda nessa
caixinha: Um bilhete, uma estrela do chapéu de vaqueiro, um ojo de
Dios, Um broche da União Estadual dos estudantes, uma mão de
Fatma em metal amarelo, um emblema esmaltado arrancado de uma
Harley-Davidson.
Muitas histórias e causos se entrelaçam nesse romance.
Algumas narradas por Maria, outras pelo povo. Engraçadas e tristes,
em prosa ou versos embaixo das estrelas do sertão.
Alguns desses contos são conhecidos como:
• A história da velha e a criança
• A história de Alzira e o filho Candinho
• A história de Luizinho
• A história de Lázaro
• A história de Parafuso, amigo de Manoel de seu Tito
“Quantas histórias possuíam! Algumas tão
extraordinárias e imaginativas que eu
muitas vezes pedia de novo, compondo
assim minha biblioteca mental talvez mais
rica do que a outra, de papel, trazida na
minha exígua mochila.” Pág. 87
Alguns momentos importantes desse período ficarão para
sempre tatuados na vida da protagonista que vai vivendo na pele as
dores e crenças do povo desse sertão.
*Maria adoece e é cuidada por Fátima e seu filhos, moleques de
pés surrados da terra, que nem sabiam o que fazer com lápis de cor.
“Quando ofereci um lápis vermelho para Biuzinho e um verde para
Jonas, receberam-nos nas mãos em concha e ficaram a olhá-los com
um misto de respeito e espanto. Só então me ocorreu que talvez não
soubessem o que fazer com eles e lhes disse para os guardarem com
cuidado até o dia seguinte, quando eu mostraria como se divertir
com aquilo”. Pág. 55
*A procissão de Nossa Senhora do Ó. Foi um período encantador
para Maria que ao se recuperar da tontura e fraqueza desperta com
os fogos e animações daquele povo. A procissão acontecia antes do
amanhecer e todos participavam em caminhadas com velas e
candeeiros, cantando benditos e rezando todos juntos.
“Fátima foi me descrevendo com entusiasmo tudo o que perdi da
mais bela festa vista ali desde que a avó dela era criança.” Página 75
* O parto que a narradora ajuda fazer a obriga cruzar lembranças de
um outro parto que também ajudou acontecido em lugar bem
distante e diferente. Compara costumes e crenças dos lugares. “ A
duras penas eu aprendia a dor de nascer e de dar à luz uma vida
naquele deserto.” Pág. 114
*A violência doméstica também aparece nesse romance num
episódio de total surpresa e incompreensão da forma como aquele
fato era encarado pelas própria mulheres. Um dia depois de aprontar
o trabalho no tear, Maria saiu a desvendar outros cantos, outras
veredas, quando ouviu gritos de uma mulher pedindo socorro. O
marido estava agarrado a seus cabelos: “ ‘ Para, para, seu covarde!’.
O homem baixou o relho e soltou a mulher, mas ficou lá estático. Ela,
porém, em poucos segundos refeita da surpresa, agarrou a tranca
de madeira encostada à parede junto à porta dos fundos e avançou
contra mim: ‘Não se meta, sua enxerida, fora daqui. É meu marido,
eu sou a mulher dele, ele me bate quanto quiser, e você não se meta
nisso.’” Pág.125
Essa situação narrada aproxima a narradora de Outros
Cantos/Contos do narrador Riobaldo, de Guimarães Rosa. A difícil
compreensão da vida misturada do povo do sertão. Maria se
surpreende ainda mais quando conta tudo a Fátima e a amiga
defende o direito do marido espancador:
“Calei-me, e ali fiquei, escorada na parede, um nó doloroso
apertando minha cabeça e meu coração, a cortina idealista que me
tapava os olhos e só me permitia ver a dor infligida pela exploração
do Dono e a inclemência do sol, mais a beleza dos gestos e saberes
do povo, rasgando-se mais um pouco e revelando que tudo era
muito mais misturado e complicado do que eu pensava”. Pág. 125
*A descoberta de uma
menina morrendo desidratada deixa
Maria desesperada. Ela tenta livrar a
menina da morte a alimentando com
água de coco, mas de nada adianta, a
criança morre e esse fato comove
imensamente a narradora: “Não
pude suportar ver a pequena
procissão rumo ao cemitério, o
caixãozinho carregado apenas por
outras crianças, como a fazê-las
acostumar-se desde cedo com o
destino final à espreita de qualquer
descuido, a qualquer hora. Chorei,
encolhida na capela, durante todo o
tempo em que soou o sino rouco e
triste...” Pág. 129
*Outro episódio que desperta curiosidade e espanto a Maria é
presenciar, sem querer, os penitentes se castigando durante a
quaresma. Fátima procura acalmá-la explicando que aquilo é costume
e crença de alguns homens e que ela deve esquecer e não comentar
com ninguém, pois não se deve saber quem são os penitentes e por
isso que eles cobrem as cabeças. Conta também que: “Andam pela
noite adentro rezando, cantando benditos e se batendo pra pagar os
pecados, visitam os cruzeiros, qualquer resto de capelinha ou cova
de morto... Se ferir pra sentir um pouco da dor de Nosso Senhor
Jesus Cristo...” Pág. 131
“Fevereiro chegou logo ao fim de sua curta vida e o mês de março
entrou trazendo uma excitação geral, misto de alegria e apreensão.
Descobri então a importância sagrada do dia de são José,... ”
Todo o povo do sertão vai
trabalhar no preparo das covas
para plantar. “ Trabalhava-se
cantando, rindo e brincando à
luz da lua e das estrelas. Tudo
pronto para receber a bênção
do santo.” Pág. 133
Ela narra a subida do povo até o cruzeiro e a espera, cheia de fé, pela
chuva no dia de são José. “ ’É certo que dia 19 vem água! Olhe pro
lado de lá, já está bonito pra chover’, repetiam convictos, embora a
história do passado, que desmentia o absoluto dessa certeza,
estivesse na memória de todos.” Pág. 134
No dia esperado, 19 de março, começam subir o cruzeiro
passaram o dia à espera da chuva, rezando e olhando o céu, todos
firmes na certeza de que são José não iria decepcioná-los. Enquanto o
povo gritava dando vivas ao santo, Maria cética, observava as nuvens
vindo e indo com o vento. MAS de repente... “Errei eu. Pelas quatro
horas da tarde, como de repente, ajuntaram-se todas, escureceram,
baixaram lentamente e despejaram-se em tempestade sobre nós.
(...) Choveu uma semana inteira, encharcando a terra, ...” Pág. 135
Depois de tanta espera o vereador, enfim, chega e com ele a
esperança de se fazer cumprir o sonho de Maria: conscientizar
aqueles que nem ler e escrever sabiam. O material era sucateado e
em pouca quantidade, entretanto a vontade de Maria de começar seu
ofício era enorme. “(...) encontrei o homem com um maço de papéis
e um envelope nas mãos (...) outros homens que descarregavam de
uma caminhonete umas tantas cadeiras e mesinhas, todas
estropiadas, sucata de alguma velha escola, (..) Aquilo seria minha
escola, e tive a tentação de protestar ou desanimar e recusar-me,
mas um ruído de motor me deteve e, milagre!, acendeu-se uma
lâmpada elétrica na minha agora luxuosa sala de aula.” Pág. 138
O método orientado para a alfabetização era uma versão muito
reduzida do método criado por Paulo Freire “ O caderno de
orientações ao professor, porém, reduzia tudo à mera técnica de
decompor uma palavra em sílabas, modificá-las com novas vogais,
recompô-las em novas palavras. Eu, porém, sabia muito bem como
proceder para tirar daquilo mais do que o simples beabá, ir muito
mais longe, despertar, eu acreditava, a consciência e a força do povo
para mudar aquele mundo de injustiças.” Maria vê que a primeira
palavra a ser trabalhada é “TIJOLO”, e percebe, então, a ironia e “ (...)
contradições daquele mundo de taipas, madeira rústica, telhas
tortas e palha.” Pág. 139
“Eu devia matricular apenas jovens e adultos, coisa nunca imaginada
por ali onde nunca houvera escola de espécie alguma, ...” Pág. 140
Todavia o que aconteceu fugiu
das expectativas de Maria. As
mães não queriam estudar, o
que elas queriam mesmo era
alfabetizar os filhos pequenos:
“(...) ansiosas para ver seus
pirralhos aprenderem a ler e
escrever, ou ‘pelo menos
desasnar, saber cantar a carta
do abecê’. Pág. 140
Sem saber o que fazer, Maria pede ajuda a Fátima. A amiga orienta
que dê aulas para os meninos em troca de alunos jovens e adultos
para forma a turma dos estudos noturnos. Assim, Maria fez e formou,
também, uma turma infantil clandestina.
Os obstáculos enfrentados por Maria, na
tarefa de conscientizar os interessados em
aprender, não eram pequenos. Seus esforços
esbarravam sempre nas frases feitas incutidas
naquelas cabeças: “ ’A vida é assim mesmo, o
que Deus fez a gente tem de aceitar, Ele sabe o
por que a gente nasceu pobre para viver pobre
até chegar no céu.’ ” Pág. 143
A saída encontrada foi
estudar o Evangelho junto
com eles na busca de tirar da
cabeça de todos essa
conformidade com a
exploração dos pobres em
nome da vontade de Deus
Com as eleições se
aproximando, Maria se arriscou a
iniciar a conscientização dos alunos
através de reflexões políticas como: “
‘Quem é o candidato a prefeito? Já o
conhecem?’ Claro que sim, filho e neto
de prefeitos, era o candidato pela
segunda vez. ‘ Lembram quem foi que
ele nomeou, da primeira vez, para os
cargos importantes da prefeitura?”
Claro, como eu previa, a mulher, o
sogro, a filha, o cunhado, o afilhado...
‘ E vocês acham que isso está certo?’
Certíssimo, achavam todos, as cabeças
assentindo convictas, pois ‘se ele não
ajudar nem a família dele, a quem
mais é que vai ajudar?’. Eu esmorecia,
...” Pág. 143
Maria percebe que o caminho é muito longo, mas continua lutando
contra a ignorância dos marginalizados. Apontar novos horizontes era
seu maior objetivo.
“Mas eu queria, sim,
ficar ali, cumprindo o
papel que me deram
eles de lhes contar
histórias, ou o que me
tinham dado os
companheiros, de
mudar a História, sob
a máscara da
professora que o
governo mandou para
ensinar gente grande a
ler, ...” Pág. 144
Maria se preparava para mandar um sinal
para os companheiros avisando que estava
tudo caminhando, mas com passos muito
lentos. Apesar dos problemas a mudança
ocorreria.
A possibilidade de um futuro melhor para aquele povo existia
nos sonhos de Maria, até a noite em que acordou e ouviu conversas
confusas sobre perseguições e mortes: “ Nem houve tempo para
que a dúvida, a dor e o medo me dominassem, já batiam à minha
porta e eu sabia o que me diriam. ‘Maria, corra, junte suas coisas. O
caminhão das redes sai às quatro, corra, pelo amor de Deus.’ Eles
sabiam, sem saber, muito mais sobre mim do que eu imaginava.
Parti, deixando para trás, na escuridão, os vultos que me
acompanharam até as portas traseiras do caminhão. (...) Ninguém
viria para aquele canto depois de mim.” Pág. 145
As coisas não correram como Maria esperava em Olho
d’Água. O projeto de iniciar uma célula revolucionária foi
interrompido pela ditadura. O vaqueiro Tonho também terminou
mal. Ela teve de fugir para sobreviver em outros cantos distantes: “
O que eu imaginava ser o lugar de minha vida por muitos anos não
fora senão uma escala, uma passagem de poucos meses, uma
mudança de rumo. Compensava-me uma musculatura mais forte,
por fora e por dentro, e a pequena trouxa contendo a rede, novinha
a primeira que saiu do tear de Fátima”. Pág. 145
Maria volta ao sertão 40 anos depois e percebe que o sertão
que ela deixou não é mais o mesmo. Agora é outro canto com
meninos de bonés e fones ouvindo música fora da tradição local,
mas que é denominada “sertanejo”. Esses meninos estão, como ela
diz, com sintomas do autismo digital. Observa as casa modificadas
se distanciando cada vez mais daquela época que lhe traz saudades.
Por fim, Maria está indo palestrar em um sindicato de agricultores,
exatamente o que ela e seu “vaqueiro encantado” queriam fundar. O
tempo é outro e ela sabe, no entanto, acredita ter, ainda, mesmo 40
anos depois, “uma missão, infindável mas impossível de
abandonar, alicerçada na paciência e na esperança a resistir...”
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Outros cantos

  • 1. OUTROS CANTOS, Maria Valéria Rezende Maria cruza o sertão em um ônibus que a leva a algum ponto isolado do Nordeste e relembra sua primeira incursão na região agreste, quarenta anos antes, em condições mais precárias e perigosas, seguindo um pequeno anúncio num diário oficial listando municípios onde se necessitavam alfabetizadores para o Mobral. Maria torna-se, aos poucos, parte daquela gente sofrida. Engana o sofrimento com lembranças que desfiam a série de amores impossíveis encontrados na juventude, olhares promissores vistos apenas de relance. Com sutileza, Maria Valéria Rezende compõe um retrato emocionante de uma mulher determinada, que sacrifica a própria vida em troca de algo maior.
  • 2. Sobre a autora Maria Valéria Rezende Nasceu em 1942, em Santos (SP), onde morou até os 18 anos. Em 1965 entrou para a Congregação de Nossa Senhora - Cônegas de Santo Agostinho. Sempre se dedicou à educação popular, primeiro na periferia de São Paulo e, a partir de 1972, no Nordeste. Viveu no meio rural de Pernambuco e da Paraíba e, desde 1986, mora em João Pessoa. Já esteve em Angola, Cuba, França e Timor, entre outros países, convidada a falar sobre seus projetos sociais. Maria Valéria estreou na ficção em 2001, com o livro de contos Vasto mundo. Depois, escreveu livros infanto-juvenis e o elogiado romance O Voo da guará vermelha.
  • 3. Personagens Maria: Protagonista. Professora. Chega a Olho d’Água com a incumbência de alfabetizar jovens e adultos. Fátima: Moradora do sertão, mãe de vários filhos, amiga de Maria. Antônio: Vaqueiro “encantado” conquistador de Maria. Tião: Morador do sertão, marido de Fátima. Jonas e Biuzinho: Meninos filhos de Fátima e Tião.
  • 4. Espaço Tempo Sertão nordestino. Povoado fictício de Olho d’Água A história se passa na mente de Maria, personagem central. Há dois planos que se intercalam durante a narrativa: 1- Linear: Maria segue num ônibus desfiando suas memórias de 40 anos atrás. 2- Flashback: As memórias de Maria, época da ditadura militar. Narrador Narrado em 1ª pessoa pela própria protagonista, Maria.
  • 5. Enredo Maria, narradora-protagonista, faz uma viagem de ônibus ao sertão para dar uma palestra em um sindicato de agricultores. No caminho, ela relembra sua primeira ida a esse lugar chamado Olho d’Água com a desculpa de ministrar aulas do Mobral (Movimento Brasileiro de Alfabetização), programa de educação para jovens e adultos do governo militar. A verdade é que Maria era militante de esquerda enviada para organizar os trabalhadores. O importante era “conscientizar o povo”.
  • 6. Durante essa viagem de ônibus, à noite, as lembranças do tempo passado em Olho d’Água se cruzam com outras, entre freiras educadoras na Argélia ou como viajante no México, deparando-se com costumes distantes e ao mesmo tempo com pessoas de coragem e pureza evidentes que a ajudam a enfrentar as dificuldades do caminho. Ela, também, compara o sertão que conhecia com o sertão de agora. As mesmas lembranças desfiam a série de amores impossíveis encontrados na juventude, olhares promissores vistos apenas de relance e dos quais ela guarda lembranças escondidas numa “caixinha dos patuás posta em sossego lá no fundo do baú”.
  • 7. Chegando ao povoado, Maria logo se integra ao cotidiano dos tecelões de redes. Ela não tem salário nem função específica. O grande trabalho dos moradores de Olho D’Água é o tear, executado por toda a comunidade, principalmente pelas mulheres, e Maria logo é auxiliada por Fátima que lhe ensina como tear e como sobreviver naquele lugar de muito calor e aridez onde vive um povo esquecido, um lugar onde água é ouro e quem a tem em abundância é rico, é o Dono, de certa forma até comparado a Deus. Maria chega antes da escola, do pagamento e dos materiais prometidos pelo vereador que possibilitou sua vinda ao povoado. Tudo isso demora meses até chegar.
  • 8. Enquanto a espera se prolonga, Maria é recebida e orientada por Fátima, moradora de Olho d’Água, mulher forte cercada de filhos e com o marido tentando a vida em outra cidade. Maria, então, começa a compreender a vida sertaneja, organizada por estações e colheitas acompanhada pelo relógio natural do tempo. “Encontrei ofício e família naquele canto escondido. Podia ficar, preenchida de estranha euforia, e, subitamente livre de uma espécie de cegueira frente ao desconhecido, comecei a ver cada um, cada coisa, cada movimento na sua unidade e seu sentido. Pelas mãos de Fátima cheguei ali de verdade.” Pág. 24
  • 9. Os meses passam correndo e Maria começa se sentir insegura. Percebe-se conquistada por aqueles que a acolheram tão bem. Sente medo de ter sido esquecida pelos companheiros militantes, medo também de não se cumprir a promessa do vereador e ela não se tornar a professora prometida àquele povo tão necessitado de tudo, inclusive das letras. Além disso, sem a escola, seu objetivo militante se distancia ainda mais.
  • 10. Pleno dezembro e nenhuma notícia do vereador: “ O vereador não dava sinal de vida... O pretexto para minha presença naquele lugar começava a perder a consistência, o que não parecia ser um problema para o povo, eu já parte deles, quase natural. Mas havia o Dono, seus prepostos e sabe Deus quem mais por trás dele, a indagar, talvez, quem era e o que viera ali fazer aquela mulher assim tão diferente e solta no mundo.” Pág. 104 A única fonte de escapar daquele desânimo era a caixinha de patuás escondida no fundo do baú. Mexia e remexia os objetos relacionados a uma figura meio mítica, de um homem, que surgira em diferentes épocas de sua vida com nomes e funções bem diferentes. O que havia de comum entre eles eram o mesmo olhar fixo e postura de autoridade.
  • 11. No sertão o tal homem atende pelo nome de Antônio, um vaqueiro respeitado. Em São Paulo é Mauro, líder estudantil durante a ditadura. No Rio , um adolescente motoqueiro que atende pelo apelido de Harley. No México um viajante chamado Miguel, a caminho de Cuba. Em todas as aparições, encara a narradora fixa e silenciosamente e lhe entrega um amuleto, os quais ela guarda nessa caixinha: Um bilhete, uma estrela do chapéu de vaqueiro, um ojo de Dios, Um broche da União Estadual dos estudantes, uma mão de Fatma em metal amarelo, um emblema esmaltado arrancado de uma Harley-Davidson.
  • 12. Muitas histórias e causos se entrelaçam nesse romance. Algumas narradas por Maria, outras pelo povo. Engraçadas e tristes, em prosa ou versos embaixo das estrelas do sertão. Alguns desses contos são conhecidos como: • A história da velha e a criança • A história de Alzira e o filho Candinho • A história de Luizinho • A história de Lázaro • A história de Parafuso, amigo de Manoel de seu Tito “Quantas histórias possuíam! Algumas tão extraordinárias e imaginativas que eu muitas vezes pedia de novo, compondo assim minha biblioteca mental talvez mais rica do que a outra, de papel, trazida na minha exígua mochila.” Pág. 87
  • 13. Alguns momentos importantes desse período ficarão para sempre tatuados na vida da protagonista que vai vivendo na pele as dores e crenças do povo desse sertão. *Maria adoece e é cuidada por Fátima e seu filhos, moleques de pés surrados da terra, que nem sabiam o que fazer com lápis de cor. “Quando ofereci um lápis vermelho para Biuzinho e um verde para Jonas, receberam-nos nas mãos em concha e ficaram a olhá-los com um misto de respeito e espanto. Só então me ocorreu que talvez não soubessem o que fazer com eles e lhes disse para os guardarem com cuidado até o dia seguinte, quando eu mostraria como se divertir com aquilo”. Pág. 55
  • 14. *A procissão de Nossa Senhora do Ó. Foi um período encantador para Maria que ao se recuperar da tontura e fraqueza desperta com os fogos e animações daquele povo. A procissão acontecia antes do amanhecer e todos participavam em caminhadas com velas e candeeiros, cantando benditos e rezando todos juntos. “Fátima foi me descrevendo com entusiasmo tudo o que perdi da mais bela festa vista ali desde que a avó dela era criança.” Página 75
  • 15. * O parto que a narradora ajuda fazer a obriga cruzar lembranças de um outro parto que também ajudou acontecido em lugar bem distante e diferente. Compara costumes e crenças dos lugares. “ A duras penas eu aprendia a dor de nascer e de dar à luz uma vida naquele deserto.” Pág. 114
  • 16. *A violência doméstica também aparece nesse romance num episódio de total surpresa e incompreensão da forma como aquele fato era encarado pelas própria mulheres. Um dia depois de aprontar o trabalho no tear, Maria saiu a desvendar outros cantos, outras veredas, quando ouviu gritos de uma mulher pedindo socorro. O marido estava agarrado a seus cabelos: “ ‘ Para, para, seu covarde!’. O homem baixou o relho e soltou a mulher, mas ficou lá estático. Ela, porém, em poucos segundos refeita da surpresa, agarrou a tranca de madeira encostada à parede junto à porta dos fundos e avançou contra mim: ‘Não se meta, sua enxerida, fora daqui. É meu marido, eu sou a mulher dele, ele me bate quanto quiser, e você não se meta nisso.’” Pág.125
  • 17. Essa situação narrada aproxima a narradora de Outros Cantos/Contos do narrador Riobaldo, de Guimarães Rosa. A difícil compreensão da vida misturada do povo do sertão. Maria se surpreende ainda mais quando conta tudo a Fátima e a amiga defende o direito do marido espancador: “Calei-me, e ali fiquei, escorada na parede, um nó doloroso apertando minha cabeça e meu coração, a cortina idealista que me tapava os olhos e só me permitia ver a dor infligida pela exploração do Dono e a inclemência do sol, mais a beleza dos gestos e saberes do povo, rasgando-se mais um pouco e revelando que tudo era muito mais misturado e complicado do que eu pensava”. Pág. 125
  • 18. *A descoberta de uma menina morrendo desidratada deixa Maria desesperada. Ela tenta livrar a menina da morte a alimentando com água de coco, mas de nada adianta, a criança morre e esse fato comove imensamente a narradora: “Não pude suportar ver a pequena procissão rumo ao cemitério, o caixãozinho carregado apenas por outras crianças, como a fazê-las acostumar-se desde cedo com o destino final à espreita de qualquer descuido, a qualquer hora. Chorei, encolhida na capela, durante todo o tempo em que soou o sino rouco e triste...” Pág. 129
  • 19. *Outro episódio que desperta curiosidade e espanto a Maria é presenciar, sem querer, os penitentes se castigando durante a quaresma. Fátima procura acalmá-la explicando que aquilo é costume e crença de alguns homens e que ela deve esquecer e não comentar com ninguém, pois não se deve saber quem são os penitentes e por isso que eles cobrem as cabeças. Conta também que: “Andam pela noite adentro rezando, cantando benditos e se batendo pra pagar os pecados, visitam os cruzeiros, qualquer resto de capelinha ou cova de morto... Se ferir pra sentir um pouco da dor de Nosso Senhor Jesus Cristo...” Pág. 131
  • 20. “Fevereiro chegou logo ao fim de sua curta vida e o mês de março entrou trazendo uma excitação geral, misto de alegria e apreensão. Descobri então a importância sagrada do dia de são José,... ” Todo o povo do sertão vai trabalhar no preparo das covas para plantar. “ Trabalhava-se cantando, rindo e brincando à luz da lua e das estrelas. Tudo pronto para receber a bênção do santo.” Pág. 133 Ela narra a subida do povo até o cruzeiro e a espera, cheia de fé, pela chuva no dia de são José. “ ’É certo que dia 19 vem água! Olhe pro lado de lá, já está bonito pra chover’, repetiam convictos, embora a história do passado, que desmentia o absoluto dessa certeza, estivesse na memória de todos.” Pág. 134
  • 21. No dia esperado, 19 de março, começam subir o cruzeiro passaram o dia à espera da chuva, rezando e olhando o céu, todos firmes na certeza de que são José não iria decepcioná-los. Enquanto o povo gritava dando vivas ao santo, Maria cética, observava as nuvens vindo e indo com o vento. MAS de repente... “Errei eu. Pelas quatro horas da tarde, como de repente, ajuntaram-se todas, escureceram, baixaram lentamente e despejaram-se em tempestade sobre nós. (...) Choveu uma semana inteira, encharcando a terra, ...” Pág. 135
  • 22. Depois de tanta espera o vereador, enfim, chega e com ele a esperança de se fazer cumprir o sonho de Maria: conscientizar aqueles que nem ler e escrever sabiam. O material era sucateado e em pouca quantidade, entretanto a vontade de Maria de começar seu ofício era enorme. “(...) encontrei o homem com um maço de papéis e um envelope nas mãos (...) outros homens que descarregavam de uma caminhonete umas tantas cadeiras e mesinhas, todas estropiadas, sucata de alguma velha escola, (..) Aquilo seria minha escola, e tive a tentação de protestar ou desanimar e recusar-me, mas um ruído de motor me deteve e, milagre!, acendeu-se uma lâmpada elétrica na minha agora luxuosa sala de aula.” Pág. 138
  • 23. O método orientado para a alfabetização era uma versão muito reduzida do método criado por Paulo Freire “ O caderno de orientações ao professor, porém, reduzia tudo à mera técnica de decompor uma palavra em sílabas, modificá-las com novas vogais, recompô-las em novas palavras. Eu, porém, sabia muito bem como proceder para tirar daquilo mais do que o simples beabá, ir muito mais longe, despertar, eu acreditava, a consciência e a força do povo para mudar aquele mundo de injustiças.” Maria vê que a primeira palavra a ser trabalhada é “TIJOLO”, e percebe, então, a ironia e “ (...) contradições daquele mundo de taipas, madeira rústica, telhas tortas e palha.” Pág. 139
  • 24. “Eu devia matricular apenas jovens e adultos, coisa nunca imaginada por ali onde nunca houvera escola de espécie alguma, ...” Pág. 140 Todavia o que aconteceu fugiu das expectativas de Maria. As mães não queriam estudar, o que elas queriam mesmo era alfabetizar os filhos pequenos: “(...) ansiosas para ver seus pirralhos aprenderem a ler e escrever, ou ‘pelo menos desasnar, saber cantar a carta do abecê’. Pág. 140 Sem saber o que fazer, Maria pede ajuda a Fátima. A amiga orienta que dê aulas para os meninos em troca de alunos jovens e adultos para forma a turma dos estudos noturnos. Assim, Maria fez e formou, também, uma turma infantil clandestina.
  • 25. Os obstáculos enfrentados por Maria, na tarefa de conscientizar os interessados em aprender, não eram pequenos. Seus esforços esbarravam sempre nas frases feitas incutidas naquelas cabeças: “ ’A vida é assim mesmo, o que Deus fez a gente tem de aceitar, Ele sabe o por que a gente nasceu pobre para viver pobre até chegar no céu.’ ” Pág. 143
  • 26. A saída encontrada foi estudar o Evangelho junto com eles na busca de tirar da cabeça de todos essa conformidade com a exploração dos pobres em nome da vontade de Deus Com as eleições se aproximando, Maria se arriscou a iniciar a conscientização dos alunos através de reflexões políticas como: “ ‘Quem é o candidato a prefeito? Já o conhecem?’ Claro que sim, filho e neto de prefeitos, era o candidato pela segunda vez. ‘ Lembram quem foi que ele nomeou, da primeira vez, para os cargos importantes da prefeitura?” Claro, como eu previa, a mulher, o sogro, a filha, o cunhado, o afilhado... ‘ E vocês acham que isso está certo?’ Certíssimo, achavam todos, as cabeças assentindo convictas, pois ‘se ele não ajudar nem a família dele, a quem mais é que vai ajudar?’. Eu esmorecia, ...” Pág. 143
  • 27. Maria percebe que o caminho é muito longo, mas continua lutando contra a ignorância dos marginalizados. Apontar novos horizontes era seu maior objetivo. “Mas eu queria, sim, ficar ali, cumprindo o papel que me deram eles de lhes contar histórias, ou o que me tinham dado os companheiros, de mudar a História, sob a máscara da professora que o governo mandou para ensinar gente grande a ler, ...” Pág. 144 Maria se preparava para mandar um sinal para os companheiros avisando que estava tudo caminhando, mas com passos muito lentos. Apesar dos problemas a mudança ocorreria.
  • 28. A possibilidade de um futuro melhor para aquele povo existia nos sonhos de Maria, até a noite em que acordou e ouviu conversas confusas sobre perseguições e mortes: “ Nem houve tempo para que a dúvida, a dor e o medo me dominassem, já batiam à minha porta e eu sabia o que me diriam. ‘Maria, corra, junte suas coisas. O caminhão das redes sai às quatro, corra, pelo amor de Deus.’ Eles sabiam, sem saber, muito mais sobre mim do que eu imaginava. Parti, deixando para trás, na escuridão, os vultos que me acompanharam até as portas traseiras do caminhão. (...) Ninguém viria para aquele canto depois de mim.” Pág. 145
  • 29. As coisas não correram como Maria esperava em Olho d’Água. O projeto de iniciar uma célula revolucionária foi interrompido pela ditadura. O vaqueiro Tonho também terminou mal. Ela teve de fugir para sobreviver em outros cantos distantes: “ O que eu imaginava ser o lugar de minha vida por muitos anos não fora senão uma escala, uma passagem de poucos meses, uma mudança de rumo. Compensava-me uma musculatura mais forte, por fora e por dentro, e a pequena trouxa contendo a rede, novinha a primeira que saiu do tear de Fátima”. Pág. 145
  • 30. Maria volta ao sertão 40 anos depois e percebe que o sertão que ela deixou não é mais o mesmo. Agora é outro canto com meninos de bonés e fones ouvindo música fora da tradição local, mas que é denominada “sertanejo”. Esses meninos estão, como ela diz, com sintomas do autismo digital. Observa as casa modificadas se distanciando cada vez mais daquela época que lhe traz saudades. Por fim, Maria está indo palestrar em um sindicato de agricultores, exatamente o que ela e seu “vaqueiro encantado” queriam fundar. O tempo é outro e ela sabe, no entanto, acredita ter, ainda, mesmo 40 anos depois, “uma missão, infindável mas impossível de abandonar, alicerçada na paciência e na esperança a resistir...”