1. Product: OGlobo PubDate: 02-04-2012 Zone: Nacional Edition: 1 Page: PAGINA_G User: Schinaid Time: 04-01-2012 20:14 Color: K
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Segunda-feira, 2 de abril de 2012 OPINIÃO • 7
O GLOBO
Pegaram o PAULO GUEDES
estrangeiro!
PAULO DELGADO O caminho da prosperidade
É A
cada vez mais descontínua e vo- disponibilidade abundante de O regime fiscal, expansionista há dé- empregos sem melhorar a produtivi-
látil a percepção da realidade recursos naturais sempre asse- cadas, trouxe uma trajetória de juros dade não aumenta o padrão de vida
pelos políticos franceses. Os gurou ao Brasil uma vantagem
dez candidatos a presidente da explosivos e câmbio sobrevalorizado. dos trabalhadores e a competitivi-
República nas eleições cujo primeiro comparativa clássica na expor- O manicômio tributário aumentou a ta- dade das empresas”, adverte Micha-
turno será no fim deste mês pegaram o tação de commodities. Exportamos, xa de mortalidade das pequenas e mé- el Porter, especialista em estratégia
estrangeiro para Cristo. As pessoas e na verdade, terra, água e sol, em for- dias empresas. Excessivos encargos competitiva.
as mercadorias, tudo que vem de fora
anda mal falado no país do iluminismo.
ma de produtos minerais e agrícolas. sociais e trabalhistas condenaram ao Enquanto se perdem macroeconomis-
Nação mais visitada do mundo, com Temos matérias-primas essenciais à desemprego a mão de obra menos qua- tas puxando alavancas de política mo-
produtos cobiçados nos cinco conti- formação de cadeias produtivas in- lificada. A insuficiência de investimen- netária, em meio à grande crise contem-
nentes, a França reage com mau humor dustriais de amplo alcance, da agroin-
ao mal-estar da política e da economia, tos públicos e a regulamentação inade- porânea, Porter atualiza a mensagem
estas atividades movidas por oportuni- dústria aos manufaturados, dos pe- quada tornaram deficientes a infraes- dos economistas clássicos: “Precisa-
dades e oportunismos. troquímicos ao aço. trutura e a logística, emperrando as ca- mos de instituições políticas efetivas,
A campanha presidencial está um Mas começam aí as dificuldades das deias produtivas. As fontes de capital um regime fiscal sensato, um ambiente
panfleto de um único objetivo: achar empresas brasileiras. Estão ameaçadas
um culpado. Os franceses tinham tan- de risco e a qualificação do capital hu- de negócios que estimule o empreende-
ta consciência de que o debate sobre mesmo indústrias convencionais de mano são insatisfatórias para setores dorismo e a inovação. Investimentos na
os imigrantes e as minorias estava tão baixo valor agregado: têxtil, de sapa- mais especializados. infraestrutura de transporte, comuni-
agressivo e racista que, sintomatica- tos, de móveis, de brinquedos, de cons- “Aumentar a produtividade de uma cação, logística e informação. Merca-
mente, quando se deram conta da sé-
rie de assassinatos no Sul do país, não
trução e outras mais que empregam economia a longo prazo deveria ser dos de capitais eficientes. E educação
saía de suas cabeças o massacre de mão de obra pouco qualificada. Isso o principal objetivo da política eco- de qualidade em todos os níveis.”
Oslo no ano passado, onde um neona- porque as vantagens competitivas em nômica. Esforços do governo para O aumento da produtividade é que ga-
zista trucidou dezenas de pessoas in- uma economia moderna dependem,
defesas. Quando a polícia descobriu estimular a demanda a curto prazo rante os aumentos de salário dos traba-
que o massacre de Toulouse e região fundamentalmente, da qualidade das não garantem a prosperidade do pa- lhadores, a maior competitividade das
fora feito por um fanático “deles”, de políticas públicas. ís a longo prazo. A tentativa de criar empresas e a prosperidade de um país.
descendência árabe, um certo alívio
tomou conta da maioria. “Afinal não
Ataque à Constituição A hora de
somos tão ruins assim, enquanto eles,
que tanto criticamos, continuam os
donos das atrocidades.”
Se o autor das sete mortes fosse ou-
tro, o rumo do discurso da campanha
certamente mudaria. E a análise sobre ALESSANDRO MOLON
Alvim julgar
os estrangeiros e sua contribuição pa-
A
ra a história do país encontraria um bancada ruralista da Câmara dos CARLOS ALBERTO DI FRANCO
O
caminho mais equilibrado e justo. Por- Deputados se uniu novamente
que o mais difícil de fazer é defender a em torno de uma bandeira que leitor é sempre o melhor ter-
ideia de que, sob o discurso da bestia- pode levar a um retrocesso que mômetro para medir a tem-
lidade, qualquer um poderia ter feito a anulará décadas de conquistas sociais peratura da sociedade. Em
ignominia, à esquerda e à direita. O em nosso país: a Comissão de Constitui- um de meus últimos artigos
medo de que o assassino fosse um ção, Justiça e Cidadania admitiu a Pro- fiz uma radiografia da corrupção e
francês “legítimo” — descendente co- posta de Emenda Constitucional (PEC) defendi a seguinte prioridade no
mo alguns gostam de dizer de “nossos 215/2000 e de outras dez anexas a ela. combate aos malfeitos: cobrar dos
ancestrais gauleses” — tomou conta Uma decisão contrária à Constituição, à ministros do Supremo Tribunal Fede-
de toda a campanha, pois ela tem sido Justiça, e à Cidadania — exatamente o ral o julgamento do mensalão.
a munição para diferentes tipos de que a Comissão deve proteger. Recebi uma enxurrada de e-mails
ódio e revolta que andam pelos sub- Em síntese, as emendas admitidas, se de leitores de várias cidades brasilei-
terrâneos da Europa. aprovadas pelo Congresso, farão com ras. Um denominador comum esteve
Felizmente em boa hora líderes das que nenhuma reserva indígena, quilom- presente em todas as mensagens: as
comunidades judaica e islâmica na bola ou zona de conservação ambiental pessoas não admitem o não julga-
França dão o exemplo e se unem para a venha a ser criada sem votação no Le- mento do mensalão, com a conse-
luta contra a xenofobia, preconceito e gislativo. Considerando a força da ban- quente consagração da impunidade.
fanatismo que sempre ameaçaram os cada ruralista, isto significa, na prática, Ao mesmo tempo, afirmam que o tra-
dois filhos de Abraão. que não haverá novas reservas indíge- balho investigativo da imprensa deve
Aliás, preconceito que ameaça a to- nas, áreas de conservação ambiental ou continuar e se aprofundar.
dos. Toda forma de fascismo esconde quilombolas. Os defensores destas pro- Em que pé estão as coisas? O pro-
uma grande fraqueza, abrigada nos ar- postas argumentam que, por ser o Le- cesso aguarda a conclusão do traba-
gumentos mais estúpidos, resultando gislativo mais plural e representativo lho de revisão do ministro Ricardo
nas práticas mais agressivas. do que o Executivo, ao se dar àquele es- Lewandowski. Alguns crimes já pres-
Além do isolacionismo cultural, épo- ta atribuição, a proposta seria um avan- creveram. Se o mensalão não for jul-
cas de crise são pródigas em muitas ço democrático. Falso. gado em 2012, a probabilidade de im-
outras formas de segregação e estere- Antes de mais nada, tais propostas der do Executivo representa usurpa- que continuem sendo reconhecidas punidade é total. Em 19 de abril, assu-
ótipos. É o que não percebem os prin- são flagrantemente inconstitucio- ção, uma afronta à separação de Pode- terras indígenas e quilombolas e cria- me a presidência do STF o ministro
cipais candidatos da França ao unifor- nais. Jamais poderiam ter sido consi- res republicanos. Segundo, porque os das zonas de conservação ambiental Ayres Britto. Conhecendo a biografia
mizarem o elogio do protecionismo e deradas admissíveis porque violam o constituintes de 1988 consideraram as parece ser fundamental para quem só do ministro e suas tomadas de posi-
o fechamento das fronteiras. Agora artigo 60, parágrafo 4, da Constitui- terras indígenas direitos originários pensa em derrubar árvores para ga- ção, é praticamente certo que o novo
são os produtos estrangeiros os gran- ção Federal, que estabelece que “não destes povos e, portanto, anteriores à nhar mais dinheiro. Mesmo que isto presidente queira julgar o mensalão
des vilões da crise econômica pela será objeto de deliberação a propos- atual Constituição, que precisam ser represente uma ameaça aos ecossis- durante sua gestão.
qual passa o país. Num mundo sem ta de emenda tendente a abolir (III) a reconhecidos e respeitados. Na medi- temas de nosso país e violações aos Chegou a hora do Supremo Tribu-
criatividade e bom-senso, é péssima separação dos Poderes” e “(IV) os di- da em que as propostas de emendas direitos de indígenas e afrodescen- nal Federal. Julgar o mensalão não é
hora para aumentar o prestígio das reitos e as garantias individuais”. De constitucionais criam obstáculos ao dentes. Mesmo que isto signifique fa- uma questão de prazos processuais.
ideias sobre protecionismo comercial uma só vez, as emendas propostas vi- reconhecimento e ao respeito a estes zer a Câmara retroceder décadas. É um dever indeclinável. A cidadania
e industrial e aumentar a confusão so- olam essas duas proibições constitu- direitos, tendem a aboli-los e, portan- Perdeu-se a primeira batalha, mas espera que a Suprema Corte priorize
bre o que querem de fato os franceses. cionais. to, violam, evidentemente, a Consti- não a guerra. Vamos recorrer da deci- o que é, de fato, relevante. Se o STF
Será que não aprenderam alguma coi- Primeiro, porque o ato de demarca- tuição (artigo 60, parágrafo 4,). são, lutar contra este atentado à Cons- carimbar o mensalão com a prescri-
sa com a última grande crise econômi- ção de terras indígenas é administrati- A aprovação da PEC 215/2000 foi tituição e combater este absurdo. Se ção, hipótese gravíssima, concederá,
ca que engolfou a Europa de tal manei- vo e cabe, exclusivamente, ao Executi- mais uma demonstração de força da não for suficiente, rumo ao STF — pa- na prática, um passaporte para a ins-
ra e culminou com uma guerra mundi- vo — conforme entendimento do STF bancada ruralista na Câmara. É a sa- ra impedir esse absurdo retrocesso. titucionalização dos malfeitos.
al ? Comprar só produtos franceses vi- no julgamento da ação popular em tor- nha por mais terras para o agronegó- A desqualificação do mensalão é
rou uma atividade cívica e elemento no da Reserva Raposa Serra do Sol. cio. A nova fronteira, depois da muti- ALESSANDRO MOLON é deputado essencial para aqueles que se apro-
polarizador da campanha. Só que em- Assim, o Congresso tomar esse po- lação do Código Florestal. Impedir federal (PT-RJ). priaram do Estado brasileiro. O pri-
brulhar com ideologia nacionalista as meiro sinal do desmonte do mensa-
Um novo caminho
dificuldades para se enfrentar a crise lão foi dado pelo ex-presidente Luiz
econômica é o mais curto caminho pa- Inácio Lula da Silva. Ao deixar o go-
ra piorar as coisas. verno, ele disse que sua principal
Nos anos 30 a ultraprotecionista lei missão, a partir de janeiro de 2011,
Smoot-Hawley nos EUA exacerbou a seria mostrar que o mensalão “é
depressão no mundo ao forçar politi- RODRIGO MARTINS DE OLIVEIRA endividamento, que infelizmente afeta elaborasse a Resolução n, 125, que ins- uma farsa”. A “farsa” a que se referia
camente todos ao protecionismo, grande parte da população, faz com titui a Política Judiciária Nacional de Lula derrubou ministros do seu go-
A
dentro da lógica da reciprocidade. morosidade crônica que assola que milhares de brasileiros percam Tratamento Adequado dos Conflitos verno, destituiu dezenas de direto-
Não há meio termo que detenha a re- as várias instâncias do Judiciá- seus créditos, sendo colocados à mar- de Interesses. Essa iniciativa estabele- res de estatais e mandou para o es-
gra de que protecionismo gera prote- rio vem causando prejuízos gem da sociedade de consumo. Mas é ce que cabe ao Poder Judiciário orga- paço a cúpula do seu partido. Encur-
cionismo. E a escalada é uma só: todos imensuráveis à sociedade. O possível promover uma reintegração nizar em âmbito nacional, não apenas ralado, o então presidente só não
os países passam a ter regras cada vez “congestionamento” da Justiça brasi- e, acima de tudo, “destravar” o número os serviços prestados nos processo caiu graças ao tamanho da incompe-
piores. Nacionalismo e comércio não leira também gera danos sociais à me- de demandas que esperam por respos- judiciais, mas também a solução de tência da oposição.
combinam num mundo multipolar, de dida que dificulta o acesso do cidadão ta na Justiça. conflitos por meio de outros mecanis- Está nas mãos da Supremo assumir
cadeias produtivas transnacionais, aos seus direitos fundamentais, ferin- Os números comprovam o sucesso mos, principalmente a conciliação e a o papel histórico de defesa da demo-
nem se harmonizam com a noção de do de morte a Constituição Federal (ar- desse tipo de iniciativa. Segundo o Tri- mediação. cracia e dos valores republicanos ou
balança comercial, um conceito de tigo 5,, inciso XXXV). Do ponto de vista bunal de Justiça de São Paulo, no perío- Não restam dúvidas de que o acor- — Deus não queira — virar as costas
equilíbrio. Depois, com que moral empresarial, os prejuízos são visivel- do de 28 de novembro até 1, de dezem- do decorrente da mediação tem mui- para a cidadania. A sociedade tem o
quem fecha sua economia para os ou- mente expressivos, já que as empresas bro, foram atendidas mais de 30 mil to mais condições de corresponder direito de confiar nos ministros do
tros espera vender alguma coisa no destinam grande parte do seu resulta- pessoas em todo o Estado. Os acordos aos anseios e expectativas dos envol- STF. Eles saberão honrar suas togas e
estrangeiro? do ao provisionamento dessas ações, ultrapassaram R$ 21 milhões, somados vidos, pois estes contam com plenas suas biografias. Os brasileiros espe-
Sentimentos equilibrados andam em comprometendo diretamente o lucro os casos processuais e pré-processu- condições de manifestarem o que ram que os ministros respondam à in-
baixa na admirada França. País de tu- dos acionistas. Em resumo: perdem to- ais. No Rio de Janeiro, o Tribunal de pretendem e esperam. Em decorrên- dignação da sociedade.
ristas deslumbrados finge esquecer dos, inclusive o Judiciário, que tem sua Justiça contabilizou um índice de cer- cia dessa transparência, diversas al- Não podemos mais tolerar que o
que com o comércio livre a sociedade e imagem arranhada por não conseguir ca de 90% de acordos, com uma média ternativas podem ser encontradas. É Brasil seja um país que discrimina os
o desejo se encontram. Coincidência atuar de maneira célere e eficiente. de 4.800 audiências realizadas no total. possível trilhar um novo caminho, seus cidadãos. Pobre vai para a ca-
ou não, no último grande comício de Para um país com perfil contencioso Os resultados comprovam que a me- construir um desfecho diferente e in- deia. Poderoso não só não é punido,
Sarkozy haviam vinte e cinco mil ban- como o Brasil, esse cenário precisa ser diação e os acordos são a maneira cutir no cidadão conhecimento sobre mas invoca presunção de inocência,
deiras francesas e somente uma da revisto e já há ensaios de mudanças mais adequada de resolução de litígi- seus direitos e deveres. submerge estrategicamente, cai no es-
União Europeia. Cada um colhe o que com práticas sustentáveis e importan- os, contribuindo para promover a paz quecimento e volta para roubar mais.
planta e desde o paraíso as maçãs nun- tes implementadas por alguns setores social, que não é exercida apenas com RODRIGO MARTINS DE OLIVEIRA é A ausência de punição é a mola da
ca caem longe da árvore. do segmento, cultuando a conciliação o julgamento das ações propostas, advogado. criminalidade.
em nome da celeridade da engrenagem mas, sobretudo, por meio da concilia-
PAULO DELGADO é sociólogo e foi e com investimentos em mutirões e em ção e da mediação. O GLOBO NA INTERNET CARLOS ALBERTO DI FRANCO é diretor
deputado federal pelo PT de Minas Gerais. acordos que tragam uma resposta sa- A relevância do tema fez com que o OPINIÃO Leia mais artigos do Departamento de Comunicação do
E-mail: contato@paulodelgado.com.br tisfatória e dinâmica aos envolvidos. O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) oglobo.com.br/opinião Instituto Internacional de Ciência Sociais.