O documento descreve a sanfona, um instrumento musical popular no Brasil e em outras culturas. A sanfona é composta por três elementos principais e tem uma história rica em diferentes regiões do Brasil e do mundo. Embora pesada, a sanfona requer paixão para ser tocada e tem sido usada em diversos gêneros musicais no país.
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SALVADOR
23/6/2014
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ENTREVISTA ACADÊMICO FALA SOBRE
MUDANÇAS DA FESTA DE SÃO JOÃO 3
Divulgação
PERFIL Um instrumento
musical capaz de
traduzir diferentes
culturas, povos e
tradições do Brasil
e do mundo Sanfona
2
Dona
“Ela é tão
desafiadora que
você fica cada
vez mais
apaixonado”
PEDRO VIEIRA, sanfoneiro
“Sem dúvida o
peso da sanfona
é a maior
dificuldade para
tocá-la”
LÍVIA MATOS, sanfoneira
GISLENE RAMOS
Pesada, gorda, parruda. No
Nordeste, ela é a musa dos fes-
tejos juninos, famosa por seu
resfolego no forró. Mas no Sul,
também está presente nas fes-
tas. Até em São Paulo aparece,
em shows de rock e jazz.
Não é qualquer um que se
atreve a tocá-la. É preciso ter
paixão. Custa caro e, para cui-
darbemdela,éprecisodemui-
to trabalho. Além de tudo,
quanto mais velha, melhor.
Chamada de sanfona, acor-
deom sete baixos, gaita e tan-
tos outros, já no nome ela pro-
va o quanto é diversa. Um ins-
trumentomusicalseculardein-
finitaspossibilidadessonorase
que representa inúmeras cul-
turas no Brasil e no mundo.
Pluralidade
Dona Sanfona é composta por
três elementos básicos: o fole,
os baixos e os botões; e as
possibilidades de combinação
entre eles são infinitas. Daí a
sua flexibilidade sonora e a ca-
pacidade de adaptação a di-
ferentes povos e culturas. As-
simexplicaosanfoneiroeapai-
xonado por ela, Pedro Vieira:
"A maneira como se faz o de-
dilhado no teclado influencia,
a maneira como se abre o fole
e a maneira como se usa o
baixo influencia e, por fim, a
combinação entre essas três
características dá uma infini-
dade de sons".
Múltipla,DonaSanfonatem
umricohistóricoemdiferentes
culturas. Seja na Europa, Nor-
deste, Centro-Oeste e Sul do
Brasil. A sua mecânica não di-
fere quase nada em relação às
regiões do país; mas a dife-
rençamesmoestánaformade
tocar. "É uma coisa inexplicá-
vel, 13 quilos vibrando no seu
peito com todos aqueles har-
mônicos. Ela é tão desafiadora
que você fica cada vez mais
apaixonado”, declara Vieira.
Os primeiros gêneros musi-
cais que chegaram ao Brasil
com os imigrantes, como fado,
valsa, polca, bugiu, caijun, re-
tratavam o folclore de portu-
gueses, alemães, italianos,
franceses e espanhóis. Nesse
período, ela ainda se chamava
Concertina.
Já no Nordeste, onde san-
fona é seu nome mais famoso,
o rei do baião, Luiz Gonzaga
popularizou o instrumento e a
forma nordestina de tocar. No
Sul, além de acordeom, san-
fona é chamada de gaita.
Quando chegou ao Sul, a
sanfona estava presente nas
grandes famílias tradicionais e
nos festejos folclóricos. Mas
outras musicalidades também
são exploradas. A exemplo do
Quinteto Persch, do Rio Gran-
de do Sul, que usa o instru-
mento na música de câmara,
demonstrando sua versatilida-
de com o repertório erudito.
Muitos foram ou são discí-
pulos da sanfona. Além dos
mestresSivucaeLuizGonzaga,
há nomes como Domingui-
nhos, Mário Zen, Toninho Fer-
ragutti, com um tom jazzístico,
OswaldinhodoAcordeon,com
a mistura da música popular
mundialeorock,quefazemda
sanfona um instrumento mais
urbano e contemporâneo.
“AsanfonausadanofilmeLuiz
Gonzaga, de Pai pra Filho foi
dessa fábrica aqui no Brasil. Eu
não sabia o quão grande era a
diversidade de aplicação do
acordeom no Brasil. Eu fiquei
impressionado”,dizManoMon-
teiro, o único fabricante de san-
fona no Brasil pela Todeschine.
Em média a sanfona pesa en-
tre 8 e 12 quilos e, em alguns
casos,18quilos.LíviaMatos,que
toca sanfona há 11 anos, conta
as dificuldades: "Coordenação é
a primeira que se pensa para
quem olha de fora. Mas sem
dúvida o peso é a maior".
Não é fácil lidar com Dona
Sanfona. O professor do Con-
servatório de Música de Per-
nambuco, Júlio Cesar, defende
a possibilidade de se estudar a
sanfona com atenção técnica.
"É perfeitamente possível es-
creverumforrónumapartitura,
exatamente como se toca, com
indicação de fole e tudo", diz.
Para ele, o ensino através de
leitura e escritas de partituras e
teoria musical sofre muito pre-
conceitocomautodidatas."Tem
muita gente que acha que es-
tudarteoriaéumacoisaquevai
tirar a intuição, vai desaprender
a tocar forró, e isso é uma coisa
que eu ainda hoje escuto muito
dos meus alunos".
Custa caro. “Eu costumo di-
zer que a primeira e mais com-
plicada questão é ter uma san-
fona”,dizJúlioCésar,jáqueum
instrumento de boa qualidade
sai em média por R$ 8 mil. Na
Itália ainda é onde se fabricam
as melhores sanfonas.
Poroutrolado,sanfonavelha
é que faz música boa. Assim, é
muitocomumsanfoneiroscom-
prarem instrumentos usados,
porém, de boa qualidade.
História e tradição
Surgido há 2.700 anos antes
deCristo,ochengfoiinventado
na China – uma espécie de ór-
gão portátil tocado pelo sopro
da boca, ancestral do acor-
deom.
Odianacionaldosanfoneiro
é o 26 de maio, em home-
nagem a Sivuca. E o dia mun-
dial, 6 de maio.
Mano Monteiro conta que
na,décadade60e70,diversas
fábricas de safona faliram.
Desse período em diante, co-
meçaramachegarnopaíssan-
fonas de produção chinesa,
que, apesar de não serem de
grande qualidade, serviram
para facilitar a compra e po-
pularizar o instrumento.
Para a sanfoneira Lívia Ma-
tos, a sanfona vem se forta-
lecendo, sobretudo entre as
mulheres. "Acredito que cada
vez mais estão aparecendo
sanfoneiras que estão mos-
trando a coragem e serviço
com o instrumento".
Fernando Vivas / Ag. A TARDE