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OPINIÃO                                                                 O sr. do lixo fala por nós?


                                       Luís António Santos
                              Professor da Universidade do Minho


             Li há dias que o administrador de uma empresa conflitos mundiais, a Europa encontra para si um
             municipal de recolha de resíduos – Pedro Mes- caminho autónomo, sustentado em fundamentos
             quita, da Braval – quer a implementação de um social-cristãos ancorados num sentido de equilí-
             sistema de multas para as pessoas que “roubem” brio.
             lixo dos contentores na via pública. Diz aquele res- O que vivemos, sobretudo de 2009 para cá, é um
             ponsável que os resíduos recolhidos pela entidade processo paulatino de desmantelamento desse edi-
             que gere diminuíram de 2011 para 2012 e que isso fício complexo. E começou-se pelo mais importan-
             leva a um aumento nos custos do                                      te – pela quebra de confiança entre
             serviço. Assim sendo, os munícipes O que vivemos,                    o indivíduo e o Estado. Ao primei-
PÁG.         deveriam chamar as autoridades a sobretudo de 2009                   ro disse-se que não deve ser lame-


06
             intervir sempre que se deparassem para cá, é um                      chas e que deve ser empreendedor
             com um destes “crimes”.               processo paulatino             (sendo que tudo o que de mal lhe
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                                                   de desmantelamento
             ser uma anomalia. É, antes, sinal                                    segundo retiraram-se tarefas e/ou
             de um tempo de desvalorização desse edifício                         competências em áreas vitais da
             da dignidade humana, de menori- complexo. E                          vida comum (a Saúde, o Ensino, a
             zação da solidariedade. A Europa começou-se pelo mais                Segurança, a Justiça), em nome da
             já viveu tempos semelhantes e o importante – pela                    “agilização” e da “competitivida-
             que se lhe seguiu não deveria ser                                    de” do país, ao mesmo tempo que
                                                   quebra de confiança
             esquecido.                                                           se lhe aumentava o caráter fiscali-
             Numa altura em que o capitalis- entre o indivíduo e o                zador/penalizador.
             mo sem regra estava em expansão Estado                               O sr. da Braval, que podia ter usa-
             (início do século XIX), o então Pri-                                 do o seu tempo nos média para
             meiro-ministro britânico, William Pitt, respondia anunciar um inovador programa de monitoriza-
             aos industriais descontentes com o “alto valor do ção/auxílio das situações limite que levam cada
             custo do trabalho” (resultante de jornadas de 18 vez mais pessoas a procurar no lixo migalhas de
             horas) dizendo-lhe que contratassem crianças. O sobrevivência escolheu, em vez disso, apelar ao
             respeito pela vida humana era ínfimo e a necessi- “contribuinte martirizado” que há em cada um de
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             riqueza para muito poucos dominava a vida políti- querem taxas (ainda) mais altas ponham-se à ja-
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             Abusando de uma generalização excessiva por ra- lixo e a ligar de imediato para o 112!”.
             zões de economia de texto poderia dizer-se que é O problemático é que cada nova medida estrutu-
             esta deriva social que cria condições para o apare- ral para nos afastar de espaços comuns dá “calor”
             cimento das ideias de Karl Marx e que é com base ao surgimento de mais propostas como a do Sr. da
             num processo de interação entre estas duas visões Braval. E o assustador, mesmo, é que não tarda
             tão distintas que, na sequência de dois grande nada estamos todos a apresentar uma.



           Educação
           Nuno Crato na China “a trabalhar para o futuro”
           O ministro português da Educação e Ciência, Nuno Cra-      criação será formalmente acordada na quinta-feira em
           to, iniciou, esta manhã, uma visita oficial de cinco dias   Hangzhou, capital da província de Zhejiang, leste da
           à China, que ficará marcada pela criação de um centro       China.
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           “Estamos a trabalhar para o futuro”, comentou à agên-      cia Lusa que “o centro estará operacional muito em
           cia Lusa o embaixador de Portugal na China, José Tadeu     breve”. “É uma questão de semanas. Vamos assinar o
           Soares. O diplomata referia-se ao Centro de Inovação       memorando e a partir daí fica operacional esta coope-
           sino-português na área de materiais avançados, cuja        ração”, disse.


                                                                                   r/com renascença comunicação multimédia, 2013

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  • 1. OPINIÃO O sr. do lixo fala por nós? Luís António Santos Professor da Universidade do Minho Li há dias que o administrador de uma empresa conflitos mundiais, a Europa encontra para si um municipal de recolha de resíduos – Pedro Mes- caminho autónomo, sustentado em fundamentos quita, da Braval – quer a implementação de um social-cristãos ancorados num sentido de equilí- sistema de multas para as pessoas que “roubem” brio. lixo dos contentores na via pública. Diz aquele res- O que vivemos, sobretudo de 2009 para cá, é um ponsável que os resíduos recolhidos pela entidade processo paulatino de desmantelamento desse edi- que gere diminuíram de 2011 para 2012 e que isso fício complexo. E começou-se pelo mais importan- leva a um aumento nos custos do te – pela quebra de confiança entre serviço. Assim sendo, os munícipes O que vivemos, o indivíduo e o Estado. Ao primei- PÁG. deveriam chamar as autoridades a sobretudo de 2009 ro disse-se que não deve ser lame- 06 intervir sempre que se deparassem para cá, é um chas e que deve ser empreendedor com um destes “crimes”. processo paulatino (sendo que tudo o que de mal lhe A história é real e está longe de aconteça é apenas culpa sua) e ao de desmantelamento ser uma anomalia. É, antes, sinal segundo retiraram-se tarefas e/ou de um tempo de desvalorização desse edifício competências em áreas vitais da da dignidade humana, de menori- complexo. E vida comum (a Saúde, o Ensino, a zação da solidariedade. A Europa começou-se pelo mais Segurança, a Justiça), em nome da já viveu tempos semelhantes e o importante – pela “agilização” e da “competitivida- que se lhe seguiu não deveria ser de” do país, ao mesmo tempo que quebra de confiança esquecido. se lhe aumentava o caráter fiscali- Numa altura em que o capitalis- entre o indivíduo e o zador/penalizador. mo sem regra estava em expansão Estado O sr. da Braval, que podia ter usa- (início do século XIX), o então Pri- do o seu tempo nos média para meiro-ministro britânico, William Pitt, respondia anunciar um inovador programa de monitoriza- aos industriais descontentes com o “alto valor do ção/auxílio das situações limite que levam cada custo do trabalho” (resultante de jornadas de 18 vez mais pessoas a procurar no lixo migalhas de horas) dizendo-lhe que contratassem crianças. O sobrevivência escolheu, em vez disso, apelar ao respeito pela vida humana era ínfimo e a necessi- “contribuinte martirizado” que há em cada um de dade de alimentar um sistema de acumulação de nós por meio de uma ameaça – “Vejam lá! Se não riqueza para muito poucos dominava a vida políti- querem taxas (ainda) mais altas ponham-se à ja- ca por completo. nela a tirar fotos a esses incapazes que pilham o Abusando de uma generalização excessiva por ra- lixo e a ligar de imediato para o 112!”. zões de economia de texto poderia dizer-se que é O problemático é que cada nova medida estrutu- esta deriva social que cria condições para o apare- ral para nos afastar de espaços comuns dá “calor” cimento das ideias de Karl Marx e que é com base ao surgimento de mais propostas como a do Sr. da num processo de interação entre estas duas visões Braval. E o assustador, mesmo, é que não tarda tão distintas que, na sequência de dois grande nada estamos todos a apresentar uma. Educação Nuno Crato na China “a trabalhar para o futuro” O ministro português da Educação e Ciência, Nuno Cra- criação será formalmente acordada na quinta-feira em to, iniciou, esta manhã, uma visita oficial de cinco dias Hangzhou, capital da província de Zhejiang, leste da à China, que ficará marcada pela criação de um centro China. de investigação conjunto. Ainda em Lisboa, o ministro português adiantou à agên- “Estamos a trabalhar para o futuro”, comentou à agên- cia Lusa que “o centro estará operacional muito em cia Lusa o embaixador de Portugal na China, José Tadeu breve”. “É uma questão de semanas. Vamos assinar o Soares. O diplomata referia-se ao Centro de Inovação memorando e a partir daí fica operacional esta coope- sino-português na área de materiais avançados, cuja ração”, disse. r/com renascença comunicação multimédia, 2013