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FACULDADE DE DIREITO MILTON CAMPOS 
Mestrado em Direito Empresarial 
A SOCIEDADE DE PROPÓSITO ESPECÍFICO NO ÂMBITO DO DIREITO EMPRESARIAL BRASILEIRO 
Margherita Coelho Toledo 
Nova Lima/MG 
2009
Margherita Coelho Toledo 
A SOCIEDADE DE PROPÓSITO ESPECÍFICO NO ÂMBITO DO DIREITO EMPRESARIAL BRASILEIRO 
Dissertação apresentada ao curso de Pós- Graduação Strictu Sensu em Direito, da Faculdade de Direito Milton Campos, como requisito parcial à obtenção do grau de mestre em Direito. 
Área de concentração: Direito Empresarial. 
Orientador: Prof. D.r Jason Soares de Albergaria Neto. 
Nova Lima/MG 
2009
TOLEDO, Margherita Coelho 
T649 s A sociedade de propósito específico no âmbito do direito empresarial brasileiro./ Margherita Coelho Toledo – Nova Lima: Faculdade de Direito Milton Campos / FDMC, 2009 
92 f. enc. 
Orientador: Prof. Dr. Jason Soares Albergaria Neto 
Dissertação (Mestrado) – Dissertação para obtenção do título de Mestre, área de concentração Direito empresarial junto a Faculdade de Direito Milton Campos 
Bibliografia: f. 85 - 91 
1. Sociedade de Propósito Específico. 2. Parceria Público – Privada. 3. Recuperação Judicial. 4. Holding Company. 5. Project Finance. 6. Securitização. I. Albergaria Neto, Jason Soares II. Faculdade de Direito Milton Campos III. Título 
CDU 347. 72 
347.725 
Ficha catalográfica elaborada por Emilce Maria Diniz – CRB – 6 / 1206
Faculdade de Direito Milton Campos - Mestrado em Direito Empresarial 
Dissertação intitulada “A Sociedade de Propósito Específico no Âmbito do Direito Empresarial Brasileiro” de autoria de Margherita Coelho Toledo, para exame pela banca constituída pelos seguintes professores: 
_______________________________________ 
Prof. D.r Jason Soares de Albergaria Neto 
Orientador 
_______________________________________ 
_______________________________________ Orientador 
_______________________________________ 
Nova Lima, ______ de _____________________ de 2009. 
Alameda da Serra, 61- Bairro Vila da Serra - Nova Lima/MG.
Aos meus pais, Nivaldo e Odeti, 
e à minha avó, Eugênia, 
que, desde que eu era bem pequena, 
me ensinaram a importância do estudo.
RESUMO 
Esta dissertação aborda a utilização da Sociedade de Propósito Específico no Direito Brasileiro. A Sociedade de Propósito Específico está prevista no Artigo número 981, parágrafo único, do Código Civil de 2002 e tem como principal característica restringir sua existência à realização de um negócio determinado. A utilização da Sociedade de Propósito Específico nas parcerias público-privadas foi expressamente contemplada no Artigo 9º, da Lei número 11.079, de 30 de dezembro de 2004. Nesta hipótese, o parceiro público e o parceiro privado formam a Sociedade de Propósito Específico, e ambos deverão implantar e gerir o empreendimento objeto da parceria. A Lei número 11.101, de 09 de fevereiro de 2005, previu a utilização da Sociedade de Propósito Específico na recuperação judicial de empresas (inciso XVI, do Artigo número 50). A Sociedade de Propósito Específico é constituída para adjudicar, em pagamento dos débitos, os ativos do devedor, ficando encarregada de honrar o passivo da empresa em recuperação judicial. A Sociedade de Propósito Específico pode, ainda, ser utilizada como holding company, em Project Finance, na securitização de recebíveis ou no financiamento para a construção e comercialização de imóveis. O conceito e a utilização das Special Purpose Companies no Direito Norte-Americano são similares àqueles da Sociedade de Propósito Específico, no Direito Brasileiro. 
Palavras-chave: Sociedade de propósito específico. Parceria público-privada. Recuperação Judicial. Holding Company. Project Finance. Securitização.
ABSTRACT 
The present dissertation comprises the utilization of the Special Purpose Company according to the Brazilian Law. The Special Purpose Company is regulated by the Article Number 981, sole paragraph, of the Brazilian Civil Code of 2002 and is mainly distinguished for having its existence attached to the performance of a particular transaction. The utilization of a Special Purpose Company in public-private partnerships was expressly mentioned in Article 9th of the Law number 11,079, of December 30th, 2004. The Special Purpose Company will then have a public-partner and a private-partner to jointly establish and manage the partnership object. The Law number 11,101, of February 9th, 2005 alludes to the use of the Special Purpose Company in the reorganization of business entities (item XVI of Article 50). The Special Purpose Company is, therefore, created to award debtor assets as debt payment, being responsible for honoring all debt of the business entity subject to reorganization. The Special Purpose Company can also constitute the holding company in transactions such as Project Finance, receivables securitization or real state construction and commercialization financing. The definition and the utilization of the Special Purpose Companies according to the North-American Law are similar to those of the Special Purpose Company according to Brazilian Law. 
Key words: Special Purpose Company. Public-private partnership. Reorganization. Holding company. Project Finance. Securitization.
LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS 
ABS 
Asset-Backed Securities 
BLT 
Build, Lease and Transfer 
BOOT 
Build, Own, Operate and Transfer 
BOT 
Build, Operate and Transfer 
BRT 
Build, Rent and Transfer 
BTO 
Build, Transfer and Operate 
CBO 
Collateralized Bond Obligations 
CC/2002 
Código Civil de 2002 
CGP 
Comitê Gestor de Parcerias Público-Privadas 
CPE 
Companhia de Propósito Específico 
CVM 
Comissão de Valores Mobiliários 
DBFO 
Design, Build, Finance and Operate 
DCMF 
Design, Construct, Maintain and Finance 
EPE 
Entidade de Propósito Específico 
IBDF 
Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Florestal 
LLC 
Limited Liability Company 
LLP 
Limited Liability Partnership 
PPPs 
Parceiras Público-Privadas 
SPC 
Special Purpose Company 
SPE 
Sociedade de Propósito Específico 
SPV 
Special Purpose Vehicle 
TAP 
Transportes Aéreos Portugueses 
UPV 
Unidade Produtiva Varig 
Variglog 
Varig Logística S/A 
VEM 
Varig Engenharia e Manutenções S/A
SUMÁRIO 
INTRODUÇÃO 8 
Capítulo I A SOCIEDADE DE PROPÓSITO ESPECÍFICO 15 
1.1 Conceito 
15 
1.2 Evolução de utilização no Direito Brasileiro 
20 
1.3 Enquadramento no vigente Código Civil 
23 
1.4 Formas societárias 
24 
Capítulo II A UTILIZAÇÃO DA SOCIEDADE DE PROPÓSITO ESPECÍFICO NAS PARCERIAS PÚBLICO-PRIVADAS 32 
2.1 Previsão legal 
32 
2.2 Formas de utilização 
39 
2.3 Vantagens da utilização 
42 
Capítulo III A UTILIZAÇÃO DA SOCIEDADE DE PROPÓSITO ESPECÍFICO NA RECUPERAÇÃO JUDICIAL DE EMPRESAS 46 
3.1 Previsão legal 
46 
3.2 Formas de utilização 
53 
3.3 Vantagens da utilização 
56 
Capítulo IV OUTRAS POSSIBILIDADES DE UTILIZAÇÃO DA SOCIEDADE DE PROPÓSITO ESPECÍFICO 58 
4.1 Holding companies 
58 
4.2 Project Finance 
61 
4.3 Securitização de recebíveis 
65 
4.4 Financiamento de empreendimentos 
67 
Capítulo V A SPECIAL PURPOSE COMPANY 69 
5.1 Conceito segundo o Direito Norte-Americano 
69 
5.2 Principais utilizações no âmbito do Direito Norte-Americano 
72 
CONCLUSÃO 79 
REFERÊNCIAS 85
8 
INTRODUÇÃO 
O comércio, como fato econômico e social, sempre buscou a melhor forma de circular a riqueza, com o intuito de aumentar, em maiores proporções, o que foi produzido. E, em tal busca, as regras atinentes aos negócios humanos evoluíram da mesma forma que a rudimentar economia fundamentada no escambo evoluiu para as transações econômicas mais elaboradas. Ou, nas palavras de Requião (2003): 
a economia de troca (economia de escambo) evoluiu para a economia de mercado (economia monetária). O produtor já não mais produz para a troca, visando o imediato transpasse de sua mercadoria em contraposição com a aquisição da de outro, com quem opera. Passa a produzir para vender, em novo ciclo de produção. Pode, assim, o produtor especializar-se numa só linha de produção, para a qual se considera mais hábil ou que melhor proveito lhe proporciona. Aparelha-se, desta forma, o comércio para desempenhar a sua função econômica e social, unindo indivíduos e aproximando os povos, tornando-se elemento de paz e solidariedade, numa intensa ação civilizadora (p. 4). 
O desenvolvimento econômico demandou a conjugação de esforços entre pessoas para se buscar o fomento das atividades produtivas. Nas palavras do Professor Fran Martins, o desenvolvimento das associações com a finalidade de buscar o objetivo primordial de produzir e circular mercadorias e serviços de forma mais eficiente e lucrativa é assim descrito: 
Inicialmente um só indivíduo podia realizar os atos necessários para a circulação de mercadorias, servindo de intermediário entre o produtor e o consumidor. Desenvolvendo-se o tráfico de mercadorias, tornou-se indispensável a existência de mais de uma pessoa para a realização das atividades intermediárias, nascendo daí as “sociedades empresárias” em que, segundo a concepção primitiva dos Códigos, várias pessoas “negociavam em comum” (Código Comercial, art. 315); só mais tarde foi reconhecida a personalidade jurídica das sociedades, mas, ainda hoje, em alguns
9 
países (Alemanha, Inglaterra), certos tipos de sociedades (em nome coletivo, em comandita) não possuem personalidade jurídica, sendo os seus sócios considerados comerciantes que se agregam apenas para reunir maiores capitais, repartir encargos e usufruir lucros, mas cada um se caracterizando como um comerciante, ou seja, respondendo com seu patrimônio pelas obrigações assumidas. 
Por outro lado, dado o crescimento dos negócios, os comerciantes individuais e as sociedades empresárias passaram a necessitar de uma organização a que se unissem capital e trabalho, para atender às demandas do comércio. Nasceu, aí, a empresa comercial, organismo formado por uma ou várias pessoas com a finalidade de exercitar atos de manufatura ou circulação de bens ou prestação de serviços. A empresa já era conhecida no campo econômico, consistindo na organização de capital e trabalho com a finalidade de produção ou circulação de bens ou prestação de serviços (MARTINS, 2007, p. 13). 
Constata-se, pois, que as sociedades empresárias, desde os seus primórdios e ainda nas suas formas mais rudimentares, surgiram da necessidade de certos indivíduos se agruparem para a consecução de certos objetivos comuns. Isto porque tais objetivos somente são alcançados pelo esforço conjunto, não podendo, pois, ser atingidos pelos indivíduos isoladamente. 
Assim, os ordenamentos jurídicos trataram de conferir a este agrupamento de indivíduos, com a finalidade de alcançar objetivos comuns, certas características para viabilizar a relação entre tais indivíduos. Daí o surgimento das pessoas jurídicas, dotadas de personalidade própria e alheia a dos indivíduos que as compõem. 
As pessoas jurídicas possuem, portanto, capacidade de serem sujeitos de direitos e obrigações, podendo, por conseguinte, praticar todos os atos necessários para sua existência no mundo jurídico. A personalidade das pessoas jurídicas é, nas palavras de Pereira (1997), consequência de requisitos que tornam possível a sua existência no mundo jurídico. 
As pessoas jurídicas que se constituem para o exercício de atividades empresárias são denominadas sociedades empresárias, sendo conceituadas por Mendonça (1953) como 
a organização técnico-econômica que se propõe a produzir, mediante a combinação dos diversos elementos, natureza, trabalho e capital, bens ou serviços destinados à troca (venda), com a esperança de realizar lucros, correndo os riscos por conta do empresário, isto é, daquele que reúne, coordena e dirige esses elementos sob a sua responsabilidade (p. 552). 
Também é válido trazer a lume o conceito de sociedade empresária de Requião (2003):
10 
Denomina-se sociedade empresária a organização proveniente do acordo de duas ou mais pessoas, que pactuam a reunião de capitais e trabalho com um fim lucrativo. A sociedade pode advir de contrato ou de ato correspondente; uma vez criada, e adquirindo personalidade jurídica, a sociedade se autonomiza, separadamente das pessoas que as constituíram. 
O Código Civil descortina o mesmo espírito, conforme artigo 982 do diploma normativo, porém só reconhece o caráter empresarial por meio de registro; sem a respectiva feitura ditas sociedades são consideradas em comum, a teor dos artigos 986 e seguintes do citado Códex. 
Diante da natureza do contrato plurilateral, típico das companhias, o Código intitula as sociedades anônimas empresárias, e as simples, ao lado das cooperativas, frente à natureza e sem a perspectiva específica do lucro, conquanto possam revestir forma comercial (p. 169). 
No entanto, a despeito do aperfeiçoamento das associações de pessoas ter resultado em sociedades empresárias organizadas sob as mais variadas formas, o recrudescimento do comércio, inclusive transnacional, fomentou a formação de associações entre os agentes econômicos. 
A conjugação de esforços entre agentes econômicos resultou ou na constituição de sociedades empresárias ou no surgimento de associações fundamentadas por normatização específica. Em ambos os casos, a finalidade precípua sempre foi a colaboração para consecução de objetivos comuns e específicos. 
Nesse contexto desenvolveram-se, ao longo do tempo, além das sociedades empresárias, negócios tais como: os contratos de agência e de distribuição, os consórcios, as joint ventures, cada qual com suas peculiaridades. 
O contrato de agência (também conhecido como contrato de representação comercial autônoma) e o contrato de distribuição são, atualmente, regulados pela Lei número 10.406, de 10 de janeiro de 2002, que instituiu o Código Civil (“Código Civil de 2002”), no Artigo número 7101. 
A citada norma legal estabelece que, pelo contrato de agência, uma pessoa assume, em caráter não eventual e sem vínculos de dependência, a obrigação de promover, à conta de outra, mediante retribuição, a realização de certos negócios, em zona determinada. Se a pessoa tiver à sua disposição a coisa a ser negociada, estar-se-á diante de um contrato de distribuição. 
Os contratos de representação comercial e de distribuição são essenciais para a circulação de mercadorias produzidas e representam importante mecanismo 
1 “Art. 710. Pelo contrato de agência, uma pessoa assume, em caráter não eventual e sem vínculos de dependência, a obrigação de promover, à conta de outra, mediante retribuição, a realização de certos negócios, em zona determinada, caracterizando-se a distribuição quando o agente tiver à sua disposição a coisa a ser negociada” (BRASIL, 2002).
11 
na comercialização de bens. Nas palavras de Bertoldi e Ribeiro (2006), dissertando sobre os contratos de agência e distribuição: 
Dentre um dos principais colaboradores do empresário, que desempenha a função de escoamento de seus produtos no mercado, cumprindo ofício essencial na cadeia de circulação de mercadorias ao lado do distribuidor, está o representante comercial, cuja atividade está devidamente regulada pela Lei 4.886, de 09.12.1965, que em seu art. 1º conceitua como a pessoa física ou jurídica, sem relação de emprego, que desempenha, em caráter não eventual por conta de uma ou mais pessoas, a mediação para realização de negócios mercantis, agenciando propostas ou pedidos para transmiti-los aos representados, praticando ou não atos relacionados com a execução dos negócios. No Código Civil, a exemplo do Código Civil italiano de 1942, esta espécie contratual é chamada de agência e está regulada, em conjunto com os contratos de distribuição, entre os arts. 710 a 721 (p. 712). 
Os contratos de agência (representação) e distribuição constituem contrato “consensual, pois para seu aperfeiçoamento basta o consentimento das partes; é bilateral, na medida em que cria obrigações para ambos os contratantes; e é oneroso, pois sempre será devida remuneração aos representantes pelos serviços prestados” (BERTOLDI e RIBEIRO, 2006, p. 713). 
O consórcio está disciplinado nos Artigos números 278 e 279, da Lei número 6.404, de 15 de dezembro de 19762 e é assim caracterizado por Borba (2004): 
o consórcio, que também é um contrato entre sociedades, restringe- se à conjugação de empresas para execução de um 
2 “Art. 278. As companhias e quaisquer outras sociedades, sob o mesmo controle ou não, podem constituir consórcio para executar determinado empreendimento, observado o disposto neste Capítulo. 
§ 1º O consórcio não tem personalidade jurídica e as consorciadas somente se obrigam nas condições previstas no respectivo contrato, respondendo cada uma por suas obrigações, sem presunção de solidariedade. 
§ 2º A falência de uma consorciada não se estende às demais, subsistindo o consórcio com as outras contratantes; os créditos que porventura tiver a falida serão apurados e pagos na forma prevista no contrato de consórcio. 
Art. 279. O consórcio será constituído mediante contrato aprovado pelo órgão da sociedade competente para autorizar a alienação de bens do ativo não-circulante, do qual constarão: 
I - a designação do consórcio se houver; 
II - o empreendimento que constitua o objeto do consórcio; 
III - a duração, endereço e foro; 
IV - a definição das obrigações e responsabilidade de cada sociedade consorciada, e das prestações específicas; 
V - normas sobre recebimento de receitas e partilha de resultados; 
VI - normas sobre administração do consórcio, contabilização, representação das sociedades consorciadas e taxa de administração, se houver; 
VII - forma de deliberação sobre assuntos de interesse comum, com o número de votos que cabe a cada consorciado; 
VIII - contribuição de cada consorciado para as despesas comuns, se houver. 
Parágrafo único. O contrato de consórcio e suas alterações serão arquivados no registro do comércio do lugar da sua sede, devendo a certidão do arquivamento ser publicada” (BRASIL, 1976).
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empreendimento determinado. Os membros do consórcio serão quaisquer sociedades, não exigindo a lei que se achem ligadas por relações de participação. A aprovação do contrato de consórcio exigirá a simples manifestação do órgão da sociedade que tem competência para autorizar a alienação de bens do ativo permanente. Na prática empresarial, os contratos de consórcio vêm- se tornando bastante comuns, especialmente para realização de obras de grandes dimensões que, por isso mesmo, requerem esforço conjugado de várias empresas (p. 505). 
Os contratos de joint venture pressupõem a constituição de uma sociedade, organizada sob uma das formas societárias prescritas no Direito Brasileiro, por outras empresas, com o objetivo de desenvolver negócios comuns, ou seja, 
os contratos de joint venture são criados a partir de um acordo-base em torno do qual gravitam os contratos satélites, sendo seus objetivos realizados por um órgão de gestão e controle que pode ser uma pessoa física ou jurídica, mandatária, formal como uma sociedade por ações, ou informal, como o gerente de um consórcio (BAPTISTA, 1981, p. 42/39). 
E, mais recentemente, a demanda por novas formas de associações, para o desenvolvimento de projetos específicos, entre dois ou mais sujeitos, trouxe ao cenário nacional a figura da Sociedade de Propósito Específico. 
A utilização da Sociedade de Propósito Específico no Direito Brasileiro vem evoluindo sob vários aspectos e em vários segmentos, sendo alguns deles melhor desenvolvidos ao longo do presente trabalho. 
Ressalte-se que a Sociedade de Propósito Específico, conhecida pela sigla SPE3, teve como inspiração a forma de Special Purpose Company, adotada no Direito Norte-americano. Nesse sistema jurídico, a Special Purpose Company também é denominada de Special Purpose Entity, Special Purpose Vehicle ou Shell Company. 
Conceitualmente, a SPE é aquela sociedade cujo objeto social é limitado a um só fim específico, ou seja, a razão de existência dessa sociedade é justamente o cumprimento desse propósito específico, findo o qual, a mesma será extinta. 
Destaque-se que a aplicação da SPE, na qualidade de forma de associação, que tem por objetivo o desenvolvimento econômico de negócios específicos, ocorre, atualmente, nos mais abrangentes cenários. É, pois, a SPE utilizada sob a forma de Project Finance, nas parcerias público-privadas, na viabilização de recuperação judicial de empresas. Destarte, é crescente a utilização da SPE no cenário atual, em 
3 A sigla SPE, doravante, será utilizada para nomear a Sociedade de Propósito Específico, ao longo desta dissertação.
13 
diversos meandros. E, desde o advento do Código Civil de 2002, a SPE é agora expressamente permitida no parágrafo único do Artigo número 981, do referido diploma legal (cf. BRASIL, 2002). 
Restou, pois, legalmente estabelecida que a atividade de uma sociedade possa se restringir à realização de uma ou mais atividades determinadas, com vistas à exploração de um só negócio. 
Após essa introdução, que será a primeira parte do presente trabalho, o Capítulo 1 conceituará a SPE, apresentando, também, a evolução de sua utilização no Direito Brasileiro até o advento de seu enquadramento no Código Civil de 2002. Também apresentará as formas societárias nas quais a SPE pode se revestir, já que a SPE não constitui um novo tipo societário na ordem jurídica brasileira. Ela se organiza sempre sob uma das formas societárias previstas pela legislação. 
Após a caracterização da SPE, o Capítulo 2, à luz da previsão contida no Artigo 9º, da Lei número 11.079, de 30 de dezembro de 2004 (cf. BRASIL, 2004a), abordará a utilização da SPE nas parcerias público-privadas. Discorrer- se-á, por conseguinte, a respeito do tratamento legal conferido à SPE nas parcerias público-privadas, apresentando-se as formas de viabilização de tais parcerias através da SPE e abordando-se as vantagens da implementação das referidas parcerias por intermédio da SPE. 
Já o terceiro capítulo, analisando o Artigo número 50, inciso XVI, da Lei número 11.101, de 09 de fevereiro de 2005 (cf. BRASIL, 2005a), apresentará a possibilidade de inserção da SPE na recuperação judicial de empresas, demonstrando as formas de utilização, bem como as vantagens da utilização da SPE em empresas que estejam em recuperação judicial. 
O Capítulo 4 apresentará outras possibilidades de utilização da SPE, através da formação de Holding Companies, da implementação de Project Finance, da securitização de recebíveis e no financiamento para a construção e comercialização de imóveis (cf. BRASIL, 2009). 
Finalmente, o Capítulo 5 apresentará uma breve explanação da Special Purpose Company, estabelecendo o respectivo conceito segundo o Direito Norte- Americano e as principais utilizações de Special Purpose Company no âmbito de tal sistema jurídico.
14 
Em suma, o presente trabalho discorrerá sobre a análise dos aspectos jurídicos da SPE e de suas diversas aplicações no âmbito do Direito Brasileiro. Melhor conhecer os aspectos da SPE ensejará o desenvolvimento e a sedimentação da utilização da SPE no cenário nacional, na medida em que o tema proposto pretende abranger os aspectos da SPE à luz do Direito Brasileiro, a sua utilização prevista no ordenamento positivo pátrio, bem como outras utilizações possíveis, ainda que não positivadas.
15 
CAPÍTULO I 
A SOCIEDADE DE PROPÓSITO ESPECÍFICO 
1.1 Conceito 
As sociedades empresárias são organizações econômicas dotadas de personalidade jurídica. São constituídas, em regra, por mais de uma pessoa e têm como objetivo a produção ou comercialização de bens ou serviços, visando ao lucro. Para ser considerada empresária, nas palavras de Lobo (2004), 
é mister que a sociedade preencha o modelo imaginado por ASQUINI, segundo o qual a empresa é um fenômeno poliédrico, que representa quatro perfis: o perfil subjetivo; o perfil funcional; o perfil objetivo e o perfil corporativo, assim sintetizado por EVARISTO DE MORAES FILHO: 
„a) subjetivo, empresa = empresário; 
b) funcional ou dinâmico, empresa = atividade do empresário (imprenditizia); 
c) patrimonial ou objetivo, empresa = patrimônio comercial e estabelecimento e 
d) corporativo, empresa = instituição‟. 
Por isso, se a sociedade tem um ou mais sócios controladores (perfil subjetivo), dedica-se a uma atividade econômica (perfil funcional ou dinâmico), possui um patrimônio comercial ou estabelecimento (perfil patrimonial ou objetivo) e um contingente de empregados e prestadores de serviços (perfil corporativo), ela é empresária; se faltar um ou alguns desses elementos, a sociedade é simples (p. 31). 
A constituição de uma sociedade empresária, em geral, dá-se por escrito, através de um contrato social. Nas palavras do Martins (2007): 
As sociedades empresárias, regra geral, se constituem por escrito, seja por instrumento público ou particular, a teor do Artigo 997 do Código Civil. No entanto a legislação brasileira admitia e reconhecia a existência de sociedade sem o instrumento específico, desde que os interessados tivessem meios de provar por todos os gêneros de provas admitidos em lei comercial, consoante Artigos 122 e 304 do Código Comercial, havendo presunção sempre que alguém praticasse atos societários próprios.
16 
Sobreditas sociedades, conquanto provadas, são consideradas de fato e não de direito, motivo pelo qual o Código Civil as denomina sociedade em comum (art. 986), desprovida de personalidade jurídica, por não se coadunar com a formação de sociedade empresária (p. 174). 
O contrato de constituição de sociedades empresárias é, por sua vez, dotado de características essenciais aos contratos em geral e de características particulares àqueles relativos às sociedades empresárias. Requião (2003), dissertando sobre o contrato de sociedade empresária, desdobra-lhe as características em: 
(i) elementos comuns a todos os contratos: Os contratos, na sua formação, como negócios jurídicos que são, pressupõem consenso, objeto lícito e forma prescrita e não defesa em lei (p. 384). 
(ii) elementos específicos, que dizem respeito ao contrato típico de sociedade empresária: Além dos elementos que informam o contrato em geral, para os contratos sociais surgem requisitos específicos próprios das sociedades comerciais, de que podemos enumerar os seguintes: a) pluralidade de sócios; b) constituição do capital; c) affectio societatis; d) participação nos lucros e nas perdas (p. 387). 
Deve também o contrato de constituição de sociedade empresária atender aos requisitos previstos na legislação, sendo os requisitos essenciais previstos no Artigo número 997, do Código Civil de 20021. A possibilidade de formação de SPE está, por sua vez, prevista no parágrafo único do Artigo número 981, do mesmo Código Civil de 20022. 
A referida norma permitiu, expressamente, a criação de uma sociedade empresária, cuja constituição dá-se por ato escrito, dotado de elementos comuns 
1 “Art. 997. A sociedade constitui-se mediante contrato escrito, particular ou público, que, além de cláusulas estipuladas pelas partes, mencionará: 
I - nome, nacionalidade, estado civil, profissão e residência dos sócios, se pessoas naturais, e a firma ou a denominação, nacionalidade e sede dos sócios, se jurídicas; 
II - denominação, objeto, sede e prazo da sociedade; 
III - capital da sociedade, expresso em moeda corrente, podendo compreender qualquer espécie de bens, suscetíveis de avaliação pecuniária; 
IV - a quota de cada sócio no capital social, e o modo de realizá-la; 
V - as prestações a que se obriga o sócio, cuja contribuição consista em serviços; 
VI - as pessoas naturais incumbidas da administração da sociedade, e seus poderes e atribuições; 
VII - a participação de cada sócio nos lucros e nas perdas; 
VIII - se os sócios respondem, ou não, subsidiariamente, pelas obrigações sociais. 
Parágrafo único. É ineficaz em relação a terceiros qualquer pacto separado, contrário ao disposto no instrumento do contrato” (BRASIL, 2002). 
2 “Art. 981. Celebram contrato de sociedade as pessoas que reciprocamente se obrigam a contribuir, com bens ou serviços, para o exercício de atividade econômica e a partilha, entre si, dos resultados. 
Parágrafo único. A atividade pode restringir-se à realização de um ou mais negócios determinados” (BRASIL, 2002, grifo nosso).
17 
aos contratos em geral e de elementos peculiares aos contratos de sociedades empresariais. O ato constitutivo da SPE deve, também, conter os requisitos enumerados no Artigo número 997, do Código Civil de 2002. 
A principal característica da SPE é a sua existência estar adstrita à realização de um negócio determinado, mantendo, por conseguinte, a SPE interesses próprios e absolutamente destacados dos interesses de seus controladores. Conceitua-se, pois, a SPE como uma sociedade empresária constituída única e exclusivamente para cumprir um negócio específico. Em outras palavras, o surgimento e o fim de uma SPE está adstrito a um projeto ou ação específico, cujo desenvolvimento está ligado à necessidade empresarial de suas controladoras. Borba (2004), discorrendo sobre a SPE, afirma: 
A S.P.E. não tem interesse próprio, não cumpre um objeto social próprio, não se destina a desenvolver uma vida social. Trata-se do que se poderia chamar uma sociedade ancilar, mero instrumento de sua controladora. 
A rigor, essas sociedades nascem para prestar um serviço a sua controladora, para cumprir uma simples etapa de um projeto, ou até mesmo para desenvolver um projeto da controladora. Normalmente, cumprido esse projeto, o seu destino é a liquidação. Nascem, normalmente, já marcadas para morrer (p. 518). 
Assim, a SPE decorre da celebração de um contrato de sociedade, em que a sociedade empresária, dotada de personalidade jurídica e autonomia patrimonial, é constituída especificamente para uma ação ou projeto. Diz-se, pois, que a SPE possui um objeto determinado, sendo que a determinação do objeto pode ocorrer no aspecto temporal e funcional. No entanto, nem o aspecto temporal, nem o funcional podem, isoladamente, caracterizar a SPE. Isto porque o aspecto temporal, ou seja, a determinação do tempo de duração de uma SPE, previsto, eventualmente, no seu contrato de constituição, pode ser descaracterizada por possibilidade de prorrogação do contrato. 
No âmbito da SPE, dependendo do objeto específico delineado, existe a possibilidade e a necessidade de ser prever a possibilidade de extensão do prazo inicialmente ajustado para duração da SPE. Tal possibilidade de prorrogação do lapso temporal de duração da SPE é, por exemplo, prevista na Lei número 11.079/2004, que versa sobre as Parcerias Público-Privadas3 (cf. 
3 A previsão de utilização de SPE, tal como é abordada na referida Lei, será discutida adiante, neste trabalho.
18 
BRASIL, 2004). O Artigo Quinto4, da Lei número 11.079/2004 permite que os contratos de parcerias público-privadas, os quais, de acordo com a mesma lei, são antecedidos por uma SPE para estruturação de parcerias público-privadas5, tenham prazo de vigência compatível com a amortização dos investimentos realizados. 
4 “Art. 5o. As cláusulas dos contratos de parceria público-privada atenderão ao disposto no art. 23 da Lei no. 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, no que couber, devendo também prever: 
I – o prazo de vigência do contrato, compatível com a amortização dos investimentos realizados, não inferior a 5 (cinco), nem superior a 35 (trinta e cinco) anos, incluindo eventual prorrogação; 
II – as penalidades aplicáveis à Administração Pública e ao parceiro privado em caso de inadimplemento contratual, fixadas sempre de forma proporcional à gravidade da falta cometida, e às obrigações assumidas; 
III – a repartição de riscos entre as partes, inclusive os referentes a caso fortuito, força maior, fato do príncipe e álea econômica extraordinária; 
IV – as formas de remuneração e de atualização dos valores contratuais; 
V – os mecanismos para a preservação da atualidade da prestação dos serviços; 
VI – os fatos que caracterizem a inadimplência pecuniária do parceiro público, os modos e o prazo de regularização e, quando houver, a forma de acionamento da garantia; 
VII – os critérios objetivos de avaliação do desempenho do parceiro privado; 
VIII – a prestação, pelo parceiro privado, de garantias de execução suficientes e compatíveis com os ônus e riscos envolvidos, observados os limites dos §§ 3º e 5º do art. 56 da Lei no. 8.666, de 21 de junho de 1993, e, no que se refere às concessões patrocinadas, o disposto no inciso XV do art. 18 da Lei no. 8.987, de 13 de fevereiro de 1995; 
IX – o compartilhamento com a Administração Pública de ganhos econômicos efetivos do parceiro privado decorrentes da redução do risco de crédito dos financiamentos utilizados pelo parceiro privado; 
X – a realização de vistoria dos bens reversíveis, podendo o parceiro público reter os pagamentos ao parceiro privado, no valor necessário para reparar as irregularidades eventualmente detectadas. 
§ 1o As cláusulas contratuais de atualização automática de valores baseadas em índices e fórmulas matemáticas, quando houver, serão aplicadas sem necessidade de homologação pela Administração Pública, exceto se esta publicar, na imprensa oficial, onde houver, até o prazo de 15 (quinze) dias após apresentação da fatura, razões fundamentadas nesta Lei ou no contrato para a rejeição da atualização. 
§ 2o Os contratos poderão prever adicionalmente: 
I – os requisitos e condições em que o parceiro público autorizará a transferência do controle da sociedade de propósito específico para os seus financiadores, com o objetivo de promover a sua reestruturação financeira e assegurar a continuidade da prestação dos serviços, não se aplicando para este efeito o previsto no inciso I do parágrafo único do art. 27 da Lei no. 8.987, de 13 de fevereiro de 1995; 
II – a possibilidade de emissão de empenho em nome dos financiadores do projeto em relação às obrigações pecuniárias da Administração Pública; 
III – a legitimidade dos financiadores do projeto para receber indenizações por extinção antecipada do contrato, bem como pagamentos efetuados pelos fundos e empresas estatais garantidores de parcerias público-privadas” (BRASIL, 2004, grifo nosso). 
5 “Art. 9o Antes da celebração do contrato, deverá ser constituída sociedade de propósito específico, incumbida de implantar e gerir o objeto da parceria. 
§ 1o A transferência do controle da sociedade de propósito específico estará condicionada à autorização expressa da Administração Pública, nos termos do edital e do contrato, observado o disposto no parágrafo único do art. 27 da Lei no 8.987, de 13 de fevereiro de 1995. 
§ 2o A sociedade de propósito específico poderá assumir a forma de companhia aberta, com valores mobiliários admitidos a negociação no mercado. 
§ 3o A sociedade de propósito específico deverá obedecer a padrões de governança corporativa e adotar contabilidade e demonstrações financeiras padronizadas, conforme regulamento. 
§ 4o Fica vedado à Administração Pública ser titular da maioria do capital votante das sociedades de que trata este Capítulo. 
§ 5o A vedação prevista no § 4o deste artigo não se aplica à eventual aquisição da maioria do capital votante da sociedade de propósito específico por instituição financeira controlada pelo Poder Público em caso de inadimplemento de contratos de financiamento” (BRASIL, 2004, grifo nosso).
19 
Entretanto, tais contratos não podem ter prazo de vigência inferior a 5 (cinco) anos e nem superior a 35 (trinta e cinco) anos, incluindo eventual prorrogação. 
Assim, uma SPE constituída para implantar e gerir o objeto da parceria pode ter o seu prazo de duração inicial dilatado para acomodar determinada necessidade decorrente da execução do objeto. Obviamente, que o prazo inicial da SPE não poderá, ex vi legis, ser inferior a 5 (cinco) anos, mas poderá ser prorrogado até o limite de 35 (trinta e cinco) anos, pois como a SPE implantará e gerirá projeto de parceria público-privada deverá ter o mesmo prazo de duração do contrato que estabeleceu tal projeto. 
A função da SPE pode ser caracterizada a partir da atividade que será desempenhada pela SPE. Ou, em outras palavras, função é o motivo de criação, existência e encerramento de uma SPE. No entanto, a função da SPE não é seu aspecto característico, eis que outras sociedades empresárias podem ter funções similares a uma SPE e não serem caracterizadas como tal. Assim é que a junção de vários aspectos (tempo de duração, função a ser exercida, local onde a SPE atuará e partes que formam a SPE) caracteriza uma SPE. 
Por outro lado, a impossibilidade de alteração do objeto é uma característica intrínseca à SPE. É que, uma vez delimitado o objeto, o propósito, a finalidade da SPE, não pode haver a alteração ou a ampliação de referido objeto da SPE, sob pena de descaracterizá-la. 
É certo que o direito empresarial tem como fundamento a vontade das partes de se associarem, o que poderia, precipitadamente, ensejar que essa mesma vontade das partes, da qual decorreu a criação da SPE, poderia ampliar ou alterar o objeto de tal sociedade. Não obstante o respeito à vontade das partes, foram as próprias partes que constituíram a SPE que, voluntariamente, determinaram que tal sociedade teria um objeto específico e determinado. É assim que a impossibilidade de alteração do propósito da SPE decorre da vontade das partes instituidoras, no ato de criação da referida sociedade. 
E, sendo a impossibilidade de alteração do objeto da SPE que enseja o propósito específico de tal sociedade, tem-se que qualquer alteração ou ampliação do propósito da SPE desnatura-a como tal.
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1.2 Evolução de utilização no Direito Brasileiro 
As previsões legais de utilização da SPE, no Brasil, em diversas situações ocorreram antes da menção expressa contida no Código Civil de 2002 (cf. BRASIL, 2002). Guimarães (2002) informa que 
a primeira referência de uma norma cogente prevendo a criação de uma estrutura símile à SPE no Brasil se encontra consubstanciada na Portaria 107, emitida pelo Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Florestal – IBDF, a qual institui o chamado consórcio societário, determinando que a conjugação empresarial visando a venda, no exterior, das mercadorias ali elencadas se fizesse mediante a criação de um ente, dotado de “personalidade jurídica, revestindo a forma de sociedade comercial, organizada por instrumento público ou particular e com seus atos constitutivos arquivados na repartição ou órgão competente” (art. 11) (p. 135). 
Verifica-se, pois, que a referida portaria, na verdade, dispôs sobre a criação de um tipo societário assemelhado a uma SPE, ao regular sobre a venda de madeiras para o exterior. Isto porque o chamado consórcio societário, dotado de personalidade jurídica, revestindo a forma de sociedade comercial, previsto pela mencionada portaria, não pode ser qualificado como consórcio, na acepção técnica. Sabe-se, nesse sentido, que uma das principais características de um consórcio é não ter personalidade jurídica. Na verdade, o consórcio é um contrato feito por uma companhia com outras sociedades, para viabilizar um empreendimento, sendo que cada consorciada responde pelas obrigações assumidas no referido contrato. Ou, nas palavras de Martins (2007): 
Consórcio é o contrato feito pela companhia e outras sociedades com a finalidade de executar determinado empreendimento. Deve esse contrato ser aprovado pelo órgão da sociedade que tiver competência para autorizar a alienação de bens do ativo permanente, e dele constarão a designação do consórcio, se houver, o empreendimento que constituir o seu objeto, a duração, o endereço e foro, as obrigações e responsabilidades e as prestações específicas de cada sociedade consorciada. [...] 
O consórcio não tem personalidade jurídica; as consorciadas respondem apenas pelas obrigações assumidas, sem presunção de solidariedade (pp. 400-401). 
Também a Lei número 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, ao disciplinar a concessão e a permissão de serviços públicos estabelecidos no Artigo número 175, da Constituição Federal, facultou ao órgão público concedente que determinasse aos concessionários e permissionários que estabelecessem uma sociedade
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especificamente para contratar com o ente concedente6. Tal sociedade, tendo como propósito específico a concessão e/ou permissão outorgadas pelo Poder Público, nada mais seria que uma SPE. 
Constata-se, ainda, no Decreto número 3.000, de 26 de março de 1999, que estabelece o Regulamento do Imposto de Renda, que há menção expressa à SPE constituída pelos Estados, Municípios ou Distrito Federal para contribuir para o saneamento das finanças dos respectivos controladores. Destarte, o Artigo número 4327, do aludido Regulamento do Imposto de Renda, ao dispor sobre a tributação de ganhos de capital decorrentes de alienação de participações acionárias em sociedades criadas por Estados, Municípios ou Distrito Federal, no âmbito de Programas de Privatizações, especificamente se referiu à SPE. 
Também é cabível citar a Instrução Normativa CVM número 408, de 18 de agosto de 2004, na qual a Comissão de Valores Mobiliários prevê expressamente a existência de SPE no âmbito de controle de companhias abertas. Tal Instrução Normativa prevê a existência de entidades de propósito específico – EPE, que estejam sob o controle, societário ou econômico, de uma companhia aberta8. 
Além das referências legislativas já referidas, deve-se mencionar a expressa referência à SPE na sobredita Lei número 11.079/2004, que dispõe sobre as parcerias público-privadas (cf. BRASIL, 2004a) e na Lei número 11.101/2005, que 
6 “Art. 20. É facultado ao poder concedente, desde que previsto no edital, no interesse do serviço a ser concedido, determinar que o licitante vencedor, no caso de consórcio, se constitua em empresa antes da celebração do contrato” (BRASIL, 1995). 
7 “Art. 432. Os ganhos de capital na alienação de participações acionárias de propriedade de sociedades criadas pelos Estados, Municípios ou Distrito Federal, com o propósito específico de contribuir para o saneamento das finanças dos respectivos controladores, no âmbito de Programas de Privatização, estão isentos do imposto de renda (Lei nº 9.532, de 1997, art. 79). 
Parágrafo único. A isenção de que trata este artigo fica condicionada à aplicação exclusiva do produto da alienação das participações acionárias no pagamento de dívidas dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios (Lei nº 9.532, de 1997, art. 79, parágrafo único)” (BRASIL, 1999). 
8 “Art. 1º. Para fins do disposto na Instrução CVM nº 247, de 27 de março de 1996, as demonstrações contábeis consolidadas das companhias abertas deverão incluir, além das sociedades controladas, individualmente ou em conjunto, as entidades de propósito específico – EPE, quando a essência de sua relação com a companhia aberta indicar que as atividades dessas entidades são controladas, direta ou indiretamente, individualmente ou em conjunto, pela companhia aberta. 
Parágrafo único. Considera-se que existem indicadores de controle das atividades de uma EPE quando tais atividades forem conduzidas em nome da companhia aberta ou substancialmente em função das suas necessidades operacionais específicas, desde que, alternativamente, direta ou indiretamente: 
I. a companhia aberta tenha o poder de decisão ou os direitos suficientes à obtenção da maioria dos benefícios das atividades da EPE, podendo, em conseqüência, estar exposta aos riscos decorrentes dessas atividades; ou 
II. a companhia aberta esteja exposta à maioria dos riscos relacionados à propriedade da EPE ou de seus ativos” (BRASIL, 2004b).
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regula a recuperação judicial, a extrajudicial e a falência do empresário e da sociedade empresária (cf. BRASIL, 2005a)9. 
Algumas outras normas legais, embora não expressamente mencionem a SPE, podem ser citadas como referências que se aproximam da mesma. Assim é o caso da Lei número 8.666, de 21 de junho de 1993, que estabelece que empresas participantes de determinada licitação sob a modalidade de consórcio, deverão, caso sejam vencedoras do certame, constituir um consórcio operacional10. E, muitas das vezes, o órgão licitante, com espeque nas normas previstas pela Lei número 9.074, de 7 de julho de 199511, que disciplina a outorga e prorrogações das concessões e permissões de serviços públicos e dá outras providências, prevê a constituição, pelas empresas consorciadas que venceram a licitação, de um consórcio empresarial, que, como se viu acima, nada mais é que uma SPE. Isto porque, segundo Carvalhosa (2003a), 
9 As referências à SPE contidas nas aludidas Leis números 11.079/2004 e 11.101/2005 serão discorridas alhures no presente trabalho 
10 “Art. 33. Quando permitida na licitação a participação de empresas em consórcio, observar-se-ão as seguintes normas: 
I - comprovação do compromisso público ou particular de constituição de consórcio, subscrito pelos consorciados; 
II - indicação da empresa responsável pelo consórcio que deverá atender às condições de liderança, obrigatoriamente fixadas no edital; 
III - apresentação dos documentos exigidos nos arts. 28 a 31 desta Lei por parte de cada consorciado, admitindo-se, para efeito de qualificação técnica, o somatório dos quantitativos de cada consorciado, e, para efeito de qualificação econômico-financeira, o somatório dos valores de cada consorciado, na proporção de sua respectiva participação, podendo a Administração estabelecer, para o consórcio, um acréscimo de até 30% (trinta por cento) dos valores exigidos para licitante individual, inexigível este acréscimo para os consórcios compostos, em sua totalidade, por micro e pequenas empresas assim definidas em lei; 
IV - impedimento de participação de empresa consorciada, na mesma licitação, através de mais de um consórcio ou isoladamente; 
V - responsabilidade solidária dos integrantes pelos atos praticados em consórcio, tanto na fase de licitação quanto na de execução do contrato. 
§ 1o No consórcio de empresas brasileiras e estrangeiras a liderança caberá, obrigatoriamente, à empresa brasileira, observado o disposto no inciso II deste artigo. 
§ 2o O licitante vencedor fica obrigado a promover, antes da celebração do contrato, a constituição e o registro do consórcio, nos termos do compromisso referido no inciso I deste artigo” (BRASIL, 1994, grifo nosso). 
11 “Art. 21. É facultado ao concessionário incluir no plano de conclusão das obras, referido no inciso I do artigo anterior, no intuito de viabilizá-la, proposta de sua associação com terceiros na modalidade de consórcio empresarial do qual seja a empresa líder, mantida ou não a finalidade prevista originalmente para a energia produzida. 
Parágrafo único. Aplica-se o disposto neste artigo aos consórcios empresariais formados ou cuja formação se encontra em curso na data de publicação desta Lei, desde que já manifestada ao poder concedente pelos interessados, devendo as concessões ser revistas para adaptá-las ao estabelecido no art. 23 da Lei no. 8.987, de 1995, observado o disposto no art. 20, inciso II e no art. 25 desta Lei” (BRASIL, 1998).
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é mais interessante para o Poder Público que a exploração do objeto da licitação seja feita por uma nova sociedade especificamente constituída. Nesta, a fiscalização e a garantia dos credores são mais amplas que as do consórcio, em que não se presume solidariedade. Essa Exigência (SPE) tanto mais se justifica no caso das “concessões” (Lei n. 9.074, de 1995), tendo em vista o seu longo prazo (geralmente vinte anos) e a complexidade das relações das concessionárias com o Poder Público (agências reguladoras) (pp. 400-401). 
1.3 Enquadramento no vigente Código Civil 
Uma das maiores vantagens de uma SPE, que enseja a sua crescente utilização no âmbito nacional, para efeitos de captação e implementação de investimentos, está no fato de permitir um perfeito isolamento das outras atividades comerciais dos acionistas controladores e um acesso direto e menos complicado aos ativos e recebíveis do empreendimento pelos agentes financiadores, nos casos de inadimplência. Este é, a princípio, o principal mote de utilização da SPE no cenário jurídico brasileiro. 
A possibilidade de formação de SPE está, como se viu, prevista no parágrafo único do Artigo número 981, do Código Civil de 2002 (cf. BRASIL, 2002). A referida norma permitiu, expressamente, que, em um contrato de sociedade, celebrado entre pessoas que, reciprocamente, se obrigam a contribuir, com bens ou serviços, para o exercício de atividade econômica e a partilha, entre si, dos resultados, a atividade social possa se restringir à realização de um ou mais negócios determinados. 
No entanto, o Código Civil de 2002 não estabeleceu à SPE, por si só, a qualidade de sociedade mercantil. Isto porque, a despeito da previsão legal expressa no Código Civil de 2002 da possibilidade de constituição da SPE, para que tenha a qualidade de sociedade mercantil, a SPE deverá adotar umas das formas societárias previstas em lei. 
É, pois, o tipo societário eleito para constituir a SPE que determinará as suas principais características, devendo ser seguidas as normas legais atinentes à constituição de cada tipo societário. Se a SPE constituir-se como uma sociedade limitada ou como uma sociedade em conta de participação, deverão ser respeitadas as regras ínsitas no Código Civil de 2002, relativas a tais tipos societários. Já se a SPE se constituir sob a forma de uma sociedade anônima, deverão ser observadas as regras previstas na Lei número 6.404/1976 (cf. BRASIL, 1976).
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E, uma vez constituída sob uma das formas societárias previstas em lei, a SPE passará a ser dotada de personalidade jurídica própria, podendo, pois, ser sujeito de direitos e obrigações. 
A relação da SPE no âmbito interno – entre os seus sócios ou acionistas – e no âmbito externo – capacidade de se obrigar – será regulada pelo ato constitutivo (contrato social ou estatuto social). As responsabilidades dos sócios da SPE também serão determinadas de acordo com o tipo societário que foi eleito para constituí-la. 
1.4 Formas societárias 
Guimarães (2002), ao tecer considerações sobre a SPE estruturada entre particulares, esclarece que “à SPE, em si, não se pode conferir a qualidade de sociedade mercantil. Ela, na realidade, estará insculpida dentro de uma das formas societárias existentes no direito brasileiro” (p. 134). Pode, pois, a SPE adotar a forma de uma sociedade em conta de participação, prevista no Capítulo II, do Título II, do Subtítulo I, do Livro II, do Código Civil de 2002 (BRASIL, 2002). 
A sociedade em conta de participação forma-se por um contrato, não estando submetida às formalidades de constituição a que estão submetidas as sociedades personificadas. Tal sociedade não possui personalidade jurídica, pelo que alguns doutrinadores sustentam não se tratar de uma sociedade, mas de um contrato participativo ou de associação12. Tais autores negam, pois, à sociedade em conta de participação a natureza de sociedade no sentido técnico do termo. 
Entretanto, deixando-se de lado a discussão acerca da natureza jurídica da sociedade em conta de participação – pois, o Código Civil de 2002 a qualificou como sociedade não-personalizada –, algumas considerações hão de ser feitas a respeito do referido tipo societário. 
As atividades decorrentes do objeto social da sociedade em conta de participação são exercidas pelo sócio ostensivo. O sócio ostensivo exerce as atividades sociais em seu nome individual, carreando para si a exclusiva responsabilidade pelo exercício social. Trata-se, pois, de sociedade despersonificada, na qual os sócios são pessoalmente credores e devedores perante terceiros, não possuindo firma, razão social, sede ou domicílio. Tal sociedade não tem existência perante terceiros, sendo uma reunião de pessoas 
12 Cf. CAMPINHO, 2000, p. 01 (nota 01).
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(físicas ou jurídicas) para a busca de um resultado comum, que é operacionalizado através de um ou mais sócios ostensivos. Nas palavras de Requião (2003), “é uma sociedade interna, oculta, entre o comerciante ou uma sociedade comercial e o sócio ou sócios que não se destacam, permanecendo ocultos e anônimos” (p. 422). 
Admite-se a coexistência de vários sócios ostensivos e vários sócios participantes ou ocultos. Se houver pluralidade de sócios ostensivos, caberá ao contrato da sociedade definir a participação de cada qual no empreendimento, o que não lhes retira a responsabilidade solidária e ilimitada perante terceiros. 
A natureza jurídica da sociedade em conta de participação é de relação obrigacional entre os sócios que a constituíram, posto que não se trata de sociedade com personalidade jurídica para contrair obrigações e responder perante terceiros. 
E, tendo em vista a ausência de personalidade jurídica, a sociedade em conta de participação nada mais é do que um contrato envolvendo os sócios e somente oponível entre os mesmos, na medida em que somente o sócio ostensivo se obriga perante os terceiros que contratam com a sociedade. 
O sócio oculto ou participante, que aporta o capital, apenas tem interesse nos resultados decorrentes da exploração do objeto social, não assumindo os riscos do insucesso do empreendimento perante terceiros. Os riscos assumidos pelo sócio oculto ou participante são restritos à prestação pela qual se obrigou junto ao sócio ostensivo, nos estritos termos contratualmente dispostos. 
Decorre da principal característica da sociedade em conta de participação – a ausência de personalidade jurídica – outra estampada no parágrafo único do Artigo número 991, do Código Civil de 2002: somente o sócio ostensivo obriga-se perante o terceiro, e, exclusivamente perante o sócio ostensivo, o sócio participante. Assim, tal sociedade somente existe entre os sócios e não é oponível a terceiros, posto que, perante a estes, a sociedade não existe (cf. BRASIL, 2002). A despeito de tais características, a sociedade em conta de participação poderá ter um objeto específico e se revestir na forma de uma SPE. 
Constata-se, dessa forma, que a principal característica da sociedade em conta de participação é o fato de não possuir personalidade jurídica capaz de torná- la sujeito de direitos e obrigações, o que não a impede de ter um objeto específico. 
A SPE também pode se revestir sob a forma de uma sociedade limitada, prevista no Capítulo IV, do Título II, do Subtítulo II, do Livro II, do Código Civil de 2002.
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A principal característica da sociedade limitada é a restrição da responsabilidade dos sócios ao valor de suas quotas, sendo, entretanto, que todos os sócios respondem solidariamente pela integralização do capital social, consoante previsão legal contida no Artigo número 1.052, do Código Civil de 200213. 
Não se pode entender, pois, que a responsabilidade solidária dos sócios para integralização do capital possa ser exigida pela sociedade em relação aos referidos sócios, na hipótese de falta de integralização de parcela do capital social por qualquer dos sócios. Isto porque, a responsabilidade solidária pela integralização de quotas é exigível por credores da sociedade como garantia do cumprimento de obrigações societárias e como supedâneo da limitação da responsabilidade dos sócios às quotas do capital social por eles detidas. Nas palavras dos atualizadores da obra “Das Sociedades por Quotas de Responsabilidade Limitada”, de Egberto Lacerda Teixeira, ao comentar a responsabilidade dos sócios na sociedade limitada, em cotejo com as regras que regiam as sociedades por quotas de responsabilidade limitada: 
Continuam válidas as mesmas regras básicas de responsabilidade apontadas pelo autor (i) nas sociedades limitadas, a responsabilidade dos sócios perante terceiros alcança todo o montante não integralizado do capital social, independentemente da participação de cada sócio (art. 1052); (ii) nas sociedades anônimas, a responsabilidade de cada acionista é limitada ao preço de emissão de suas ações (art. 1º da Lei 6.404/76 – “Lei das S.A.”). 
A prática demonstrou ser rara a cobrança, por parte de credores, dos montantes não integralizados pelos sócios de limitada. Do ponto de vista teórico, é perfeita a posição do autor sobre o momento em que se opera a responsabilização, ou seja, quando da falência da sociedade. Afinal, a responsabilidade nesse caso é subsidiária, exigindo, portanto, a liquidação prévia dos ativos da sociedade (TEIXEIRA, 2006, p. 30). 
Restou, também, consignado no Artigo número 1.053, do Código Civil de 2002 que a sociedade limitada rege-se, quando forem omissas as normas ínsitas no capítulo que regula a sociedade limitada, pelas normas atinentes às sociedades simples. O mesmo artigo facultou, ainda, a aplicação subsidiária das normas das sociedades anônimas à sociedade limitada, quando houver previsão no contrato social14. 
13 “Art. 1.052. Na sociedade limitada, a responsabilidade de cada sócio é restrita ao valor de suas quotas, mas todos respondem solidariamente pela integralização do capital social” (BRASIL, 2002). 
14 “Art. 1.053. A sociedade limitada rege-se, nas omissões deste Capítulo, pelas normas da sociedade simples. 
Parágrafo único. O contrato social poderá prever a regência supletiva da sociedade limitada pelas normas da sociedade anônima” (BRASIL, 2002).
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Tal disposição legal difere daquela existente no Artigo número 18, do Decreto número 3.708, de 10 de janeiro de 191915, que regulavas as antigas sociedades por quotas de responsabilidade limitada até a entrada em vigor do Código Civil de 2002. Isto porque, o referido Artigo número 18 determinava a aplicação supletiva da legislação de regência das sociedades anônima às sociedades limitadas, enquanto que o Código Civil de 2002 estabelece a aplicação subsidiária, às sociedades limitadas, das normas relativas às sociedades simples e a aplicação supletiva e facultativa das normas referentes às sociedades anônimas, quando houver previsão no contrato social (cf. BRASIL, 2002). Sobre tal aspecto, assim dissertam os atualizadores da obra de Teixeira (2006): 
Outro ponto que permanece fundamental e controvertido é a regência supletiva da sociedade limitada. Uma das questões enfrentadas pelo autor foi a aplicação de fonte supletiva ao contrato social ou à própria lei das limitadas. Tal questão mudou de figura no CC/2002, que não mais menciona as omissões do contrato, mas, sim, as da lei. Isso decorre inclusive do regime menos flexível agora vigente, que não confere tanta liberdade às partes na elaboração do contrato social. [...] 
Dois aspectos essenciais devem ser considerados atualmente nessa matéria: a interação entre a regência supletiva pelas normas da sociedade simples ou da sociedade anônima e o limite do conceito de omissão. O Artigo 1.053 estipula: “A sociedade limitada rege-se, nas omissões deste Capítulo, pelas normas da sociedade simples. § único: O contrato social poderá reger a regência supletiva da sociedade limitada pelas normas da sociedade anônima”. 
A forma de organização do artigo (regras separadas no caput e no parágrafo único) poderia gerar dúvida de que, mesmo havendo previsão de regência supletiva pela lei das sociedades anônimas, ainda assim valeriam de alguma forma as normas da sociedade simples. Entendemos, contudo, que tal interpretação seria equivocada. A regra que parecia obrigatória no caput do artigo na verdade não é, posto que é imediatamente flexibilizada no parágrafo único como possibilidade de estipulação diversa no contrato social. 
Tanto o caput quanto o parágrafo único do artigo 1.053 dispõem sobre exatamente a mesma matéria, não podendo conviver as duas regras em uma única sociedade. O que existe é apenas uma diferença na forma de redação dos dispositivos. O caput utiliza a linguagem das omissões no capítulo das limitações, enquanto que o parágrafo único menciona diretamente a regência supletiva pelas normas da sociedade anônima. Nos dois casos, entretanto, trata-se de quais serão as normas supletivas aplicáveis nas hipóteses de omissão das normas principais. Assim, parece-nos que a escolha das normas da sociedade anônima para suprir as omissões do 
15 “Art. 18. Serão observadas quanto ás sociedades por quotas, de responsabilidade limitada, no que não for regulado no estatuto social, e na parte applicavel, as disposições da lei das sociedades anonymas” (BRASIL, 1919).
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capítulo das limitadas afasta inteiramente a aplicação das normas da sociedade simples. [...] 
Até em aspectos práticos seria inviável a aplicação obrigatória das regras das sociedades simples nas omissões das limitadas, guardando-se as regras da sociedade anônima como uma terceira fonte de consulta. Estaria, sem dúvida, instalando o caos no direito societário. Aliás, mesmo quando tal tese é defendida, não temos visto nenhuma aplicação razoável de como se daria essa escala de aplicação normativa. Muitas vezes seriam misturados conceitos antagônicos ou de difícil conciliação (pp. 31-33). 
A sociedade limitada constitui-se através do contrato social, levado a arquivamento no Registro de Comércio16, e tem o seu capital estruturado em quotas, indivisíveis em relação à sociedade, nos termos do Artigo número 1.056, do Código Civil de 200217. Ela é gerida por administradores designados em contrato ou em ato separado18. É o tipo societário mais utilizado atualmente, por permitir a segregação do patrimônio dos sócios do alcance de credores, no caso de fracasso da atividade empresarial, posto que a responsabilidade dos sócios, como já explanado, restringe-se ao valor das quotas pelos mesmos detidas. Nas palavras de Coelho (2003): 
A limitação da responsabilidade dos sócios pelas obrigações sociais pode parecer, à primeira vista, uma regra injusta, mas não é. Como o risco de insucesso é inerente a qualquer atividade empresarial, o direito deve estabelecer mecanismos de limitação de perdas, para estimular empreendedores e investidores à exploração empresarial dos negócios. Se o insucesso de certa empresa pudesse sacrificar a totalidade do patrimônio dos empreendedores e investidores (pondo em risco o seu conforto e de sua família, as reservas para futura educação dos filhos e sossego na velhice), é natural que eles se 
16 “Art. 998. Nos trinta dias subseqüentes à sua constituição, a sociedade deverá requerer a inscrição do contrato social no Registro Civil das Pessoas Jurídicas do local de sua sede. 
§ 1o O pedido de inscrição será acompanhado do instrumento autenticado do contrato, e, se algum sócio nele houver sido representado por procurador, o da respectiva procuração, bem como, se for o caso, da prova de autorização da autoridade competente. 
§ 2o Com todas as indicações enumeradas no artigo antecedente, será a inscrição tomada por termo no livro de registro próprio, e obedecerá a número de ordem contínua para todas as sociedades inscritas. 
Art. 999. As modificações do contrato social, que tenham por objeto matéria indicada no art. 997, dependem do consentimento de todos os sócios; as demais podem ser decididas por maioria absoluta de votos, se o contrato não determinar a necessidade de deliberação unânime. 
Parágrafo único. Qualquer modificação do contrato social será averbada, cumprindo-se as formalidades previstas no artigo antecedente” (BRASIL, 2002). 
17 “Art. 1.056. A quota é indivisível em relação à sociedade, salvo para efeito de transferência, caso em que se observará o disposto no artigo seguinte. 
§ 1o No caso de condomínio de quota, os direitos a ela inerentes somente podem ser exercidos pelo condômino representante, ou pelo inventariante do espólio de sócio falecido. 
§ 2o Sem prejuízo do disposto no art. 1.052, os condôminos de quota indivisa respondem solidariamente pelas prestações necessárias à sua integralização” (BRASIL, 2002). 
18 “Art. 1.060. A sociedade limitada é administrada por uma ou mais pessoas designadas no contrato social ou em ato separado. 
Parágrafo único. A administração atribuída no contrato a todos os sócios não se estende de pleno direito aos que posteriormente adquiram essa qualidade” (BRASIL, 2002).
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mostrariam mais reticentes em participar dela. O prejuízo seria de todos nós, já que os bens necessários ou úteis à vida dos homens e mulheres produzem-se nas empresas (p. 157). 
Também pode a SPE adotar a forma de sociedade anônima, sendo aquela cujo capital está dividido em ações, sendo regulada pela Lei número 6.404/1976. Nas palavras de Borba (2004), 
pode-se afirmar que a Lei n. 6.404/76 oferece cinco linhas básicas de orientação, quais sejam: 1ª) a da proteção dos acionistas minoritários; 2ª) a responsabilização do acionista controlador; 3ª) a da ampla diversificação dos instrumentos postos na lei, à disposição dos acionistas, para serem, ou não, adotados pela sociedade; 4ª) a da diferenciação entre companhia aberta e fechada; 5ª) a da definição dos interesses fundamentais que a sociedade anônima representa [...] (p. 135). 
É uma sociedade de capital, cujo capital social é fracionado em ações19. Os títulos representativos do capital social são livremente negociados, inclusive no mercado de valores mobiliários, sendo neste último caso denominada sociedade anônima de capital aberto, em oposição à sociedade anônima da capital fechado, cujos valores mobiliários não são negociados no mercado de valores mobiliários20. 
19 “Art. 11. O estatuto fixará o número das ações em que se divide o capital social e estabelecerá se as ações terão, ou não, valor nominal. 
§ 1º Na companhia com ações sem valor nominal, o estatuto poderá criar uma ou mais classes de ações preferenciais com valor nominal. 
§ 2º O valor nominal será o mesmo para todas as ações da companhia. 
§ 3º O valor nominal das ações de companhia aberta não poderá ser inferior ao mínimo fixado pela Comissão de Valores Mobiliários” (BRASIL, 1976). 
20 “Art. 4o. Para os efeitos desta Lei, a companhia é aberta ou fechada conforme os valores mobiliários de sua emissão estejam ou não admitidos à negociação no mercado de valores mobiliários. (Redação dada pela Lei nº 10.303, de 2001) 
§ 1o Somente os valores mobiliários de emissão de companhia registrada na Comissão de Valores Mobiliários podem ser negociados no mercado de valores mobiliários. (Redação dada pela Lei nº 10.303, de 2001) 
§ 2o Nenhuma distribuição pública de valores mobiliários será efetivada no mercado sem prévio registro na Comissão de Valores Mobiliários. (Incluído pela Lei nº 10.303, de 2001) 
§ 3o A Comissão de Valores Mobiliários poderá classificar as companhias abertas em categorias, segundo as espécies e classes dos valores mobiliários por ela emitidos negociados no mercado, e especificará as normas sobre companhias abertas aplicáveis a cada categoria. (Incluído pela Lei nº 10.303, de 2001) 
§ 4o O registro de companhia aberta para negociação de ações no mercado somente poderá ser cancelado se a companhia emissora de ações, o acionista controlador ou a sociedade que a controle, direta ou indiretamente, formular oferta pública para adquirir a totalidade das ações em circulação no mercado, por preço justo, ao menos igual ao valor de avaliação da companhia, apurado com base nos critérios, adotados de forma isolada ou combinada, de patrimônio líquido contábil, de patrimônio líquido avaliado a preço de mercado, de fluxo de caixa descontado, de comparação por múltiplos, de cotação das ações no mercado de valores mobiliários, ou com base em outro critério aceito pela Comissão de Valores Mobiliários, assegurada a revisão do valor da oferta, em conformidade com o disposto no art. 4o-A. (Incluído pela Lei nº 10.303, de 2001) 
§ 5o Terminado o prazo da oferta pública fixado na regulamentação expedida pela Comissão de Valores Mobiliários, se remanescerem em circulação menos de 5% (cinco por cento) do total das
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Na sociedade anônima, a responsabilidade dos acionistas é limitada ao preço de emissão das ações subscritas ou adquiridas21. Carvalhosa (2003b) aponta as principais características da sociedade anônima: 
Para designar a sociedade anônima usam-se expressões sinônimas: “sociedade anônima” ou “companhia”. 
O seu capital divide-se em partes que não são iguais quanto ao seu valor, permitindo a emissão de ações com valor nominal igual à emissão de ações sem valor nominal. 
A responsabilidade patrimonial dos subscritores ou acionistas, no momento da subscrição, será correspondente ao preço de emissão das ações subscritas. 
As ações são negociáveis na forma da lei, e não mais representadas por certificados. 
O colégio de acionistas pode ser total ou parcialmente substituído ou modificado pela simples transferência das ações. Daí ser anônima uma sociedade unicamente de capitais e não de pessoas. Constitui por subscrição pública ou particular. Pode constitui-se com apenas dois acionistas (art. 80). Por força da lei é sempre comercial, mesmo que os fins sejam civis; sua comercialidade advém da forma e não do objeto. 
O objeto deve ser definido de modo preciso e completo no estatuto (art. 2º), dispensada a indicação dos fins da companhia na denominação. 
Seu fim é lucrativo, havendo obrigação de distribuir lucros aos acionistas (art. 202). 
Possui necessariamente três órgãos: a Assembléia Geral, a Diretoria e o Conselho Fiscal, sendo os dois primeiros de funcionamento permanente e o último, conforme dispuserem os estatutos (art. 161). 
Os acionistas têm obrigações de caráter patrimonial e pessoal perante a sociedade. Patrimonialmente, obrigam-se a integralizar as ações subscritas pelo seu preço de emissão. Não são condôminos do patrimônio social, tendo direito apenas ao que remanescer dele, no caso de liquidação da sociedade. 
Pessoalmente, todo acionista deve abster-se do abuso do direito de voto e de interferir nas decisões em que tenha conflito de interesses com a sociedade. 
Enquanto controladores, os acionistas têm deveres de lealdade para com a comunidade, a companhia, os demais acionistas e os empregados (art. 116). 
Os administradores, que poderão ou não ser acionistas, não respondem com o seu patrimônio pessoal pelas obrigações da sociedade, em 
ações emitidas pela companhia, a assembléia-geral poderá deliberar o resgate dessas ações pelo valor da oferta de que trata o § 4o, desde que deposite em estabelecimento bancário autorizado pela Comissão de Valores Mobiliários, à disposição dos seus titulares, o valor de resgate, não se aplicando, nesse caso, o disposto no § 6o do art. 44. (Incluído pela Lei nº 10.303, de 2001) 
§ 6o O acionista controlador ou a sociedade controladora que adquirir ações da companhia aberta sob seu controle que elevem sua participação, direta ou indireta, em determinada espécie e classe de ações à porcentagem que, segundo normas gerais expedidas pela Comissão de Valores Mobiliários, impeça a liquidez de mercado das ações remanescentes, será obrigado a fazer oferta pública, por preço determinado nos termos do § 4o, para aquisição da totalidade das ações remanescentes no mercado. (Incluído pela Lei nº 10.303, de 2001)” (BRASIL, 1976). 
21 “Art. 1º. A companhia ou sociedade anônima terá o capital dividido em ações, e a responsabilidade dos sócios ou acionistas será limitada ao preço de emissão das ações subscritas ou adquiridas” (BRASIL, 1976).
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virtude de atos regulares de sua gestão, arcando, no entanto, com os abusos que cometerem no exercício de sua função (arts. 153 a 159). 
O princípio da publicidade prevalece para todos os demonstrativos de resultados econômicos e financeiros de cada exercício social, bem como para todas as reformas estatutárias e decisões da assembléia geral. 
O princípio da publicidade também informa os negócios de transferência de controle da companhia. Prevalece o mesmo princípio para a constituição de grupos de sociedades (pp. 5-6). 
Em suma, pode-se afirmar que são as principais características da sociedade anônima, sociedade estritamente de capital e tipo societário no qual se pode revestir a SPE: (i) o capital social é dividido em partes denominadas ações; (ii) a responsabilidade dos acionistas limita-se ao preço de emissão das ações subscritas ou adquiridas, não podendo ser responsabilizados por terceiros em decorrência de obrigações contraídas pela companhia; (iii) as ações são livremente negociadas pelos acionistas, inclusive no mercado de valores mobiliários; e (iv) o capital social poderá ser subscrito através de subscrição pública.
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CAPÍTULO II 
A UTILIZAÇÃO DA SOCIEDADE DE PROPÓSITO ESPECÍFICO NAS PARCERIAS PÚBLICO-PRIVADAS 
2.1 Previsão legal 
O crescimento econômico e o desenvolvimento social brasileiros, experimentados no início da década de 1990, ensejaram a necessidade de revisão do papel do Estado nacional. Tais fenômenos decorreram do desenvolvimento da economia mundial, da intensificação das relações comerciais entre as nações, da mudança do regime político e da queda das barreiras protecionistas que, muitas vezes, alijavam o país do cenário de comércio internacional. 
O início da estabilidade econômica e a necessidade de se abandonar o conceito de Estado monopolista deram início à era das privatizações, das regulamentações das atividades exercidas por particulares por meio de concessões e das desregulamentações das atividades econômicas. Nas palavras do ex-Vice- Presidente da República brasileira, Marco Maciel: 
Ao nos livrarmos da inflação, não apenas estamos dando estabilidade à economia, criando condições para ter um desenvolvimento sustentado, como também estabelecendo, se assim se pode dizer, uma nova ética na sociedade. Uma ética do trabalho em detrimento da ética da especulação, uma ética que se volta para melhorar a qualidade do processo de desenvolvimento, fazendo com que desenvolvimento não signifique apenas crescimento econômico, mas signifique também e sobretudo a busca da justiça social (MACIEL, apud WALD, 1996, p. 22). 
Chegou-se, pois, à conclusão, à época, a exemplo de experiências bem sucedidas em outros países da Europa e nos Estados Unidos, que a mudança legislativa no setor de concessões públicas, com maior participação de particulares
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na execução de obras públicas, principalmente de infra-estrutura, seria crucial para se afastar o papel monopolista que o Estado, até então, exercia. 
Em relação ao início do marco regulatório das políticas de concessões, ocorrido nos anos 1990, assim se manifestou o Professor Arnoldo Wald (1996): 
Embora a concessão de obras não constitua, propriamente, um remédio milagroso, nem uma panacéia para todos os problemas, pode atender às necessidades brasileiras de desenvolvimento e modernização da infra-estrutura nos casos e condições seguintes: 
- obras de alta ou razoável rentabilidade assegurada, que admitam o autofinanciamento; 
- garantia de manutenção das tarifas contratualmente fixadas reajustadas; 
- compatibilidade entre essas tarifas e a capacidade financeira do usuário; 
- garantia da não modificação das regras do jogo (eventuais tratados ou acordos de garantia dos investimentos); 
- manutenção do risco econômico por conta do concessionário, que é o empresário, mas assunção pelo Estado dos riscos políticos e sociais (eventual compensação pelo Estado de tarifas reduzidas no interesse social); 
- possibilidade de agrupar concessões distintas numa mesma licitação, para que os recursos decorrentes de uma delas possa constituir o funding da outra. 
Para que se torne factível a implementação das parcerias com o setor privado, o próprio Governo terá de rever a forma de relacionamento com a iniciativa privada, nos projetos de infra- estrutura, de retomada de obras paralisadas e de investimento na modernização dos serviços, deixando de assumir uma postura burocrática, para colocar-se ao lado do parceiro, com vistas à escolha da melhor fórmula, sempre objetivando o mais eficaz atendimento ao interesse público envolvido. 
A recente edição da lei disciplinadora de concessões de obras e serviços públicos (Lei 8.987/95), ao lado da disciplina legislativa da prorrogação das concessões e da reestruturação dos serviços públicos (Lei 9.074/95), representa um primeiro passo decisivo na retomada imediata dessa nova concepção cooperativa das concessões (p. 84)1. 
Destarte, como já exposto anteriormente, a Lei número 8.987/1995, dispôs sobre a concessão e a permissão de serviços públicos estabelecidos no Artigo número 175, da Constituição Federal, podendo ser considerada um dos marcos regulatórios acerca da parceria entre o Estado e o particular (cf. BRASIL, 1995). 
Rememore-se, ainda, que tal diploma legal facultou, no Artigo número 20, ao órgão público concedente, determinar aos concessionários e permissionários que estabelecessem uma sociedade especificamente para contratar com o poder concedente, o que nada mais seria do que uma SPE. Wald (1996), comentando o referido artigo, justifica a previsão legal: 
1 Cf. também JUSTEN FILHO, 2005.
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pelo fato de que a organização societária oferece como vantagem a estabilidade maior nas relações internas entre as diversas consorciadas, que passarão a ser sócias, e, igualmente entre o poder concedente e a sociedade (que consolida os direitos interesses e obrigações de todos os consorciados), tornando, ainda, desnecessário o recurso da previsão da solidariedade, para a responsabilização civil pelas faltas cometidas pela prestação do serviço, cuja reparação será havida diretamente da empresa concessionária (p. 136). 
Também a já mencionada Lei número 9.074/1995, que disciplina a outorga e prorrogações das concessões e permissões de serviços públicos, foi pioneira ao estabelecer as regras de consecução de projetos envolvendo o Poder Público e o particular (cf. BRASIL, 1998). 
Relembre-se, também, que o Artigo número 21, do mencionado diploma legal, prevê a constituição, pelas empresas consorciadas que venceram a licitação, de um consórcio empresarial, que, como também se viu anteriormente, é uma SPE. 
No ano de 2004, veio à baila um diploma legal específico para regular a relação iniciada, como se viu, no início da década, entre a Administração Pública federal2 e o empresário privado. Trata-se da Lei número 11.079/2004 (“Lei das PPPs”), que instituiu normas gerais para licitação e contratação de parceria público- privada no âmbito da administração pública federal. 
Cumpre citar o comentário de Valle (2006) sobre o cenário no qual o novel diploma legislativo acerca das parcerias público privadas foi lançado: 
Em um país de dimensões continentais como o Brasil, a estratégia governamental para implantação da infra-estrutura necessária como suporte ao desenvolvimento é um desafio permanente e, infelizmente, não tem sido sempre bem-sucedida. 
Existem exemplos de decisões equivocadas tomadas pelo Governo brasileiro, como aquela de deixar de investir na construção de ferrovias que repercutiram negativamente na integração das regiões mais remotas do País. 
Por outro lado, na última década do século passado, o Governo brasileiro, após um levantamento das necessidades em infra-estrutura, concluiu pela necessidade de implantação de novos modelos de desenvolvimento, precedendo, com sucesso, à privatização de algumas áreas, entre elas, a do setor de telecomunicações. 
2 Alguns Estados brasileiros, antes da promulgação da Lei 11.079/2004, já haviam instituído, através de diplomas legais próprios, normas de cooperação entre o Estado e o Particular. Podem-se citar, a título exemplificativo, os Estados de Minas Gerais – com a Lei n. 14.868, de 16.10.2003 (MINAS GERAIS, 2003) –, São Paulo – com a Lei n. 11.688, de 19.05.2004 (SÃO PAULO, 2004) –, Santa Catarina – com a Lei n. 12.930, de 04.02.2004 (SANTA CATARINA, 2004) –, Goiás – com a Lei n. 14.910, de 11.08.2004 (GOIÁS, 2004) – e o Distrito Federal – com a Lei n. 3.418, de 04.08.2004 (DISTRITO FEDERAL, 2004).
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Entretanto, ultrapassada a fase dos grandes projetos, que houve um afluxo substancial de investimentos estrangeiros ao Brasil, o desenvolvimento de novos planos viu-se refreado pelo enxugamento dos recursos financeiros em todo o Mundo, sendo importante a criação de novos instrumentos e de um ambiente legal capaz de estimular novamente a realização de obras de infra-estrutura no País. 
A Lei das Parcerias Público-Privadas, recentemente editada, resultou de iniciativas conjuntas de diversos setores do Governo e da iniciativa privada visando, justamente, possibilitar a criação dessa nova etapa de desenvolvimento do país (p. 91). 
Gasparini (2006) assim conceitua parceria público-privada: 
Num sentido amplo, parceria público-privada é todo ajuste que a Administração Pública de qualquer nível celebra com um particular para viabilizar programas voltados ao desenvolvimento socioeconômico do país e ao bem-estar da sociedade, como são as concessões de serviços, as concessões de serviços precedidas de obras públicas, os convênios e os consórcios públicos. Em sentido estrito, ou seja, com base na Lei federal das PPPs, pode-se afirmar que é um contrato administrativo de concessão por prazo certo e compatível com o retorno do investimento privado, celebrado pela Administração Pública com certa entidade particular, remunerando-se o parceiro privado conforme a modalidade de parceria adotada, destinado a regular a prestação de serviços públicos ou a execução de serviços públicos precedidos de obras públicas ou, ainda, a prestação de serviços em que a Administração é a usuária direta ou indireta, respeitado sempre o risco assumido. O art. 2º da lei federal define sucintamente a parceria público-privada como contrato administrativo de concessão, na modalidade patrocinada ou administrativa (p. 36). 
O Artigo Segundo3, da Lei das PPPs, conceitua parceria público-privada, ao passo que o Artigo Quarto, do mesmo diploma legal, estabelece as diretrizes para a contração de parcerias público-privadas por todos os entes da federação, cumprindo-se transcrever as referidas diretrizes, in verbis: 
3 “Art. 2o Parceria público-privada é o contrato administrativo de concessão, na modalidade patrocinada ou administrativa. 
§ 1o Concessão patrocinada é a concessão de serviços públicos ou de obras públicas de que trata a Lei no 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, quando envolver, adicionalmente à tarifa cobrada dos usuários contraprestação pecuniária do parceiro público ao parceiro privado. 
§ 2o Concessão administrativa é o contrato de prestação de serviços de que a Administração Pública seja a usuária direta ou indireta, ainda que envolva execução de obra ou fornecimento e instalação de bens. 
§ 3o Não constitui parceria público-privada a concessão comum, assim entendida a concessão de serviços públicos ou de obras públicas de que trata a Lei no 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, quando não envolver contraprestação pecuniária do parceiro público ao parceiro privado. 
§ 4o É vedada a celebração de contrato de parceria público-privada: 
I – cujo valor do contrato seja inferior a R$ 20.000.000,00 (vinte milhões de reais); 
II – cujo período de prestação do serviço seja inferior a 5 (cinco) anos; ou 
III – que tenha como objeto único o fornecimento de mão-de-obra, o fornecimento e instalação de equipamentos ou a execução de obra pública” (BRASIL, 2004a, grifo nosso).
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I – eficiência no cumprimento das missões de Estado e no emprego dos recursos da sociedade; 
II – respeito aos interesses e direitos dos destinatários dos serviços e dos entes privados incumbidos da sua execução; 
III – indelegabilidade das funções de regulação, jurisdicional, do exercício do poder de polícia e de outras atividades exclusivas do Estado; 
IV – responsabilidade fiscal na celebração e execução das parcerias; 
V – transparência dos procedimentos e das decisões; 
VI – repartição objetiva de riscos entre as partes; 
VII – sustentabilidade financeira e vantagens socioeconômicas dos projetos de parceria. 
Constata-se que as diretrizes elencadas nos incisos I, III, IV e V, do mencionado Artigo 4º, reafirmam a função do Estado, ao passo que as diretrizes positivadas nos incisos II, VI e VII garantem ao particular a atratividade na associação com Estado, na medida em que são privilegiados o respeito aos direitos do parceiro particular, a distribuição equânime dos riscos, a sustentabilidade e a vantagem econômica do empreendimento (cf. BRASIL, 2004a). 
Embora a Lei das PPPs não determine que tipos de empreendimentos podem ser objetos de parceria público-privada, o Decreto Federal número 5.385, de 04 de março de 2005, instituiu o Comitê Gestor de Parcerias Público-Privadas (CGP), cuja atribuição é definir os serviços prioritários para execução sob o regime de parceria público-privada e os critérios para subsidiar a análise sobre a conveniência e oportunidade de contratação sob tal regime4. 
Já o parágrafo quarto, do Artigo 2º, da Lei das PPPs, estabelece as seguintes vedações à celebração de parceria público-privada: (a) contrato cujo seja inferior a R$ 20.000.000,00 (vinte milhões de reais); (b) período de prestação do serviço cujo prazo seja inferior a 5 (cinco) anos; ou (c) projeto cujo objeto único seja o fornecimento de mão-de-obra, o fornecimento e instalação de equipamentos ou a execução de obra pública. 
A Lei das PPPs estabeleceu duas modalidades de parcerias: (a) concessão patrocinada5 e (b) concessão administrativa6. Na primeira modalidade tem-se a concessão de serviços ou obras públicas, na qual, além da tarifa cobrada do usuário, o parceiro público entrega ao parceiro particular uma prestação pecuniária, tendo, nesta 
4 “Art. 3º. Compete ao CGP: 
I -definir os serviços prioritários para execução no regime de parceria público-privada e os critérios para subsidiar a análise sobre a conveniência e oportunidade de contratação sob esse regime; [...]” (BRASIL, 2005b). 
5 Art. 2º, parágrafo primeiro da Lei n. 11.079/2004 (cf. BRASIL, 2004a). 
6 Art. 2º, parágrafo segundo da Lei n. 11.079/2004 (cf. BRASIL, 2004a).
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hipótese, a aplicação supletiva à Lei das PPPs da Lei número 8.987/1995. Já na segunda modalidade, há um contrato de prestação de serviços públicos ou de interesse público, podendo envolver a execução de obras ou o fornecimento ou instalação de bens, para uso direto ou indireto da Administração Pública. As concessões administrativas, além serem regidas pelas normas ínsitas da Lei das PPPs, também o são pelas normas das Leis números 8.987/1995 e 9.074/1995. 
Uma vez definidos, sucintamente, os aspectos básicos das parcerias público- privadas, passa-se à normatização da utilização da SPE nas referidas parcerias. 
O Capítulo IV da Lei das PPPs dispõe, em um Artigo (9º) sobre a utilização da SPE no âmbito das parcerias público-privadas7. Verifica-se, portanto, da análise do Artigo 9º, da Lei das PPPs, que é obrigatória, na implantação e gestão de um projeto de parceria público-privada, a constituição e a manutenção de uma SPE. 
Embora o texto legal não seja claro acerca da identificação dos sócios da SPE, da interpretação do diploma legal ressai que a composição societária da SPE será, em princípio, entre o parceiro público e o parceiro privado. Tais parceiros serão associados em decorrência da conclusão de processo licitatório8 ou da inexigibilidade ou dispensa de licitação e terão como papel a implantação e gestão, por intermédio de uma SPE, do empreendimento. 
O parágrafo quarto do sobredito Artigo 9º veda que a maioria do capital votante pertença ao parceiro público, ressalvada a possibilidade de tal ocorrer no caso de eventual aquisição da maioria do capital votante da sociedade de propósito específico por instituição financeira controlada pelo Poder Público, em caso de inadimplemento de contratos de financiamento. 
7 “Art. 9º Antes da celebração do contrato, deverá ser constituída sociedade de propósito específico, incumbida de implantar e gerir o objeto da parceria. 
§ 1º A transferência do controle da sociedade de propósito específico estará condicionada à autorização expressa da Administração Pública, nos termos do edital e do contrato, observado o disposto no parágrafo único do art. 27 da Lei no. 8.987, de 13 de fevereiro de 1995. 
§ 2º A sociedade de propósito específico poderá assumir a forma de companhia aberta, com valores mobiliários admitidos a negociação no mercado. 
§ 3º A sociedade de propósito específico deverá obedecer a padrões de governança corporativa e adotar contabilidade e demonstrações financeiras padronizadas, conforme regulamento. 
§ 4º Fica vedado à Administração Pública ser titular da maioria do capital votante das sociedades de que trata este Capítulo. 
§ 5º A vedação prevista no § 4º deste artigo não se aplica à eventual aquisição da maioria do capital votante da sociedade de propósito específico por instituição financeira controlada pelo Poder Público em caso de inadimplemento de contratos de financiamento” (BRASIL, 2004a). 
8 “Art. 10. A contratação de parceria público-privada será precedida de licitação na modalidade de concorrência, estando a abertura do processo licitatório condicionada a: [...]” (BRASIL, 2004a).
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Faculta-se, também, a constituição da SPE através de companhia aberta, com valores mobiliários negociados no mercado, admitindo-se, por conseguinte, o ingresso de outros sócios na sociedade, com aporte de capital. 
O parceiro privado pode, também, ex vi legis, transferir o controle da SPE para terceiro, conquanto que haja prévia e expressa autorização do parceiro público e tal possibilidade esteja prevista no edital de licitação e no próprio contrato de parceria público-privada. Ademais, deve ser observado o disposto no Artigo número 27, da Lei número 8.987/19959. 
Independentemente da forma societária adquirida, a SPE, relativa a projetos de parcerias público-privadas, deve cumprir as regras de governança corporativa, adotando demonstrações financeiras padronizadas, conforme venha a ser estabelecido em regulamento. Rigolin (2008), ao comentar tais exigências, assim se posiciona: 
O § 3º, aqui fora de ordem em face de sua matéria, e por fim neste art. 9º, estabelece em duplo comando: 
a) que a SPE deverá obedecer a padrões de governança corporativa, e isso significa que esteja enquadrada em alguma forma ou espécie de sociedade disciplinada e fiscalizada por entidade fiscalizadora de exercício profissional, como ordens ou conselhos, ou dizendo de outro modo, integrante de algum ramo suficientemente disciplinado como corporação, com regras específicas de atuação e sob controle igualmente disciplinado, e 
b) que a SPE adote contabilidade e demonstrações financeiras padronizadas conforme regulamento, e tal previsão tem eficácia contida até que seja editado o regulamento a que se refere, ou, se já existente, sempre na sua restrita conformidade deve ser realizada a contabilidade das SPEs. 
Regulamentos de contabilidade privada são matéria para conselhos de contabilidade, seja o federal, seja os estaduais, que são os entes autárquicos controladores da profissão de contabilista, e de empresas desse ramo. O que ressalta é que, sendo empresas as SPEs, sua contabilidade é privada e nunca pública, como é pública a dos entes 
9 “Art. 27. A transferência de concessão ou do controle societário da concessionária sem prévia anuência do poder concedente implicará a caducidade da concessão. 
§ 1º Para fins de obtenção da anuência de que trata o caput deste artigo, o pretendente deverá: (Renumerado do parágrafo único pela Lei nº 11.196, de 2005) 
I - atender às exigências de capacidade técnica, idoneidade financeira e regularidade jurídica e fiscal necessárias à assunção do serviço; e 
II - comprometer-se a cumprir todas as cláusulas do contrato em vigor. 
§ 2º Nas condições estabelecidas no contrato de concessão, o poder concedente autorizará a assunção do controle da concessionária por seus financiadores para promover sua reestruturação financeira e assegurar a continuidade da prestação dos serviços. (Incluído pela Lei nº 11.196, de 2005) 
§ 3º Na hipótese prevista no § 2º deste artigo, o poder concedente exigirá dos financiadores que atendam às exigências de regularidade jurídica e fiscal, podendo alterar ou dispensar os demais requisitos previstos no § 1o, inciso I deste artigo. (Incluído pela Lei nº 11.196, de 2005) 
§ 4º A assunção do controle autorizada na forma do § 2º deste artigo não alterará as obrigações da concessionária e de seus controladores ante ao poder concedente. (Incluído pela Lei nº 11.196, de 2005)” (BRASIL, 1995).
39 
que integram a administração pública direta e autárquica. A lei das PPPs, quanto a isso, passou longe de pretender inovar (p. 20). 
2.2 Formas de utilização 
Restou exposto acima que a parceria público-privada é o contrato administrativo de concessão, na modalidade patrocinada ou administrativa, cujo objetivo é atrair investimentos privados para a realização de obras e para a prestação de serviços na área de infra-estrutura. 
Também foi explanado que o contrato de parceria público-privada deverá ser precedido da constituição de uma SPE, que será a responsável pela implantação e gestão do empreendimento objeto do referido contrato. 
A utilização da SPE, previamente à celebração de um contrato de parceria público-privada, decorre da necessidade de se dissociar o patrimônio e as obrigações dos sócios que compõem a SPE (órgão da administração direta ou indireta da esfera municipal, estadual, do Distrito Federal ou federal e parceiro privado) do patrimônio e das obrigações da SPE, constituída para implantar e gerir o empreendimento decorrente do contrato de parceria público-privada. Em outras palavras: a utilização da SPE nas parcerias público-privadas tem por objetivo isolar o patrimônio, a gestão e as obrigações da empresa, que, como já se viu, pode adotar quaisquer das formas societárias previstas no ordenamento jurídico brasileiro, do patrimônio, da gestão e das obrigações dos sócios, público e privado. 
E, para evitar qualquer confusão entre o objeto da parceria público- privada e a concessão de serviços públicos ou de obras públicas, ou, ainda, entre tal objeto e a prestação de serviços em que a Administração Pública figura como usuária direta ou indireta, a SPE é constituída, sendo o parceiro privado detentor da maioria do capital votante. 
Tal determinação, prevista no quarto parágrafo do Artigo 9º, da Lei das PPPs, pretende, inclusive, desvincular a SPE de uma possível confusão com as sociedades de economia mista, sendo estas últimas pessoas jurídicas de direito privado, que têm por objeto a prestação de serviços públicos ou a exploração de atividade econômica que confira maior eficiência à gestão pública (cf. BRASIL, 2004a). Entretanto, nas sociedades de economia mista, o controle societário pertence, necessariamente, à Administração Pública.
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  • 1. FACULDADE DE DIREITO MILTON CAMPOS Mestrado em Direito Empresarial A SOCIEDADE DE PROPÓSITO ESPECÍFICO NO ÂMBITO DO DIREITO EMPRESARIAL BRASILEIRO Margherita Coelho Toledo Nova Lima/MG 2009
  • 2. Margherita Coelho Toledo A SOCIEDADE DE PROPÓSITO ESPECÍFICO NO ÂMBITO DO DIREITO EMPRESARIAL BRASILEIRO Dissertação apresentada ao curso de Pós- Graduação Strictu Sensu em Direito, da Faculdade de Direito Milton Campos, como requisito parcial à obtenção do grau de mestre em Direito. Área de concentração: Direito Empresarial. Orientador: Prof. D.r Jason Soares de Albergaria Neto. Nova Lima/MG 2009
  • 3. TOLEDO, Margherita Coelho T649 s A sociedade de propósito específico no âmbito do direito empresarial brasileiro./ Margherita Coelho Toledo – Nova Lima: Faculdade de Direito Milton Campos / FDMC, 2009 92 f. enc. Orientador: Prof. Dr. Jason Soares Albergaria Neto Dissertação (Mestrado) – Dissertação para obtenção do título de Mestre, área de concentração Direito empresarial junto a Faculdade de Direito Milton Campos Bibliografia: f. 85 - 91 1. Sociedade de Propósito Específico. 2. Parceria Público – Privada. 3. Recuperação Judicial. 4. Holding Company. 5. Project Finance. 6. Securitização. I. Albergaria Neto, Jason Soares II. Faculdade de Direito Milton Campos III. Título CDU 347. 72 347.725 Ficha catalográfica elaborada por Emilce Maria Diniz – CRB – 6 / 1206
  • 4. Faculdade de Direito Milton Campos - Mestrado em Direito Empresarial Dissertação intitulada “A Sociedade de Propósito Específico no Âmbito do Direito Empresarial Brasileiro” de autoria de Margherita Coelho Toledo, para exame pela banca constituída pelos seguintes professores: _______________________________________ Prof. D.r Jason Soares de Albergaria Neto Orientador _______________________________________ _______________________________________ Orientador _______________________________________ Nova Lima, ______ de _____________________ de 2009. Alameda da Serra, 61- Bairro Vila da Serra - Nova Lima/MG.
  • 5. Aos meus pais, Nivaldo e Odeti, e à minha avó, Eugênia, que, desde que eu era bem pequena, me ensinaram a importância do estudo.
  • 6. RESUMO Esta dissertação aborda a utilização da Sociedade de Propósito Específico no Direito Brasileiro. A Sociedade de Propósito Específico está prevista no Artigo número 981, parágrafo único, do Código Civil de 2002 e tem como principal característica restringir sua existência à realização de um negócio determinado. A utilização da Sociedade de Propósito Específico nas parcerias público-privadas foi expressamente contemplada no Artigo 9º, da Lei número 11.079, de 30 de dezembro de 2004. Nesta hipótese, o parceiro público e o parceiro privado formam a Sociedade de Propósito Específico, e ambos deverão implantar e gerir o empreendimento objeto da parceria. A Lei número 11.101, de 09 de fevereiro de 2005, previu a utilização da Sociedade de Propósito Específico na recuperação judicial de empresas (inciso XVI, do Artigo número 50). A Sociedade de Propósito Específico é constituída para adjudicar, em pagamento dos débitos, os ativos do devedor, ficando encarregada de honrar o passivo da empresa em recuperação judicial. A Sociedade de Propósito Específico pode, ainda, ser utilizada como holding company, em Project Finance, na securitização de recebíveis ou no financiamento para a construção e comercialização de imóveis. O conceito e a utilização das Special Purpose Companies no Direito Norte-Americano são similares àqueles da Sociedade de Propósito Específico, no Direito Brasileiro. Palavras-chave: Sociedade de propósito específico. Parceria público-privada. Recuperação Judicial. Holding Company. Project Finance. Securitização.
  • 7. ABSTRACT The present dissertation comprises the utilization of the Special Purpose Company according to the Brazilian Law. The Special Purpose Company is regulated by the Article Number 981, sole paragraph, of the Brazilian Civil Code of 2002 and is mainly distinguished for having its existence attached to the performance of a particular transaction. The utilization of a Special Purpose Company in public-private partnerships was expressly mentioned in Article 9th of the Law number 11,079, of December 30th, 2004. The Special Purpose Company will then have a public-partner and a private-partner to jointly establish and manage the partnership object. The Law number 11,101, of February 9th, 2005 alludes to the use of the Special Purpose Company in the reorganization of business entities (item XVI of Article 50). The Special Purpose Company is, therefore, created to award debtor assets as debt payment, being responsible for honoring all debt of the business entity subject to reorganization. The Special Purpose Company can also constitute the holding company in transactions such as Project Finance, receivables securitization or real state construction and commercialization financing. The definition and the utilization of the Special Purpose Companies according to the North-American Law are similar to those of the Special Purpose Company according to Brazilian Law. Key words: Special Purpose Company. Public-private partnership. Reorganization. Holding company. Project Finance. Securitization.
  • 8. LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS ABS Asset-Backed Securities BLT Build, Lease and Transfer BOOT Build, Own, Operate and Transfer BOT Build, Operate and Transfer BRT Build, Rent and Transfer BTO Build, Transfer and Operate CBO Collateralized Bond Obligations CC/2002 Código Civil de 2002 CGP Comitê Gestor de Parcerias Público-Privadas CPE Companhia de Propósito Específico CVM Comissão de Valores Mobiliários DBFO Design, Build, Finance and Operate DCMF Design, Construct, Maintain and Finance EPE Entidade de Propósito Específico IBDF Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Florestal LLC Limited Liability Company LLP Limited Liability Partnership PPPs Parceiras Público-Privadas SPC Special Purpose Company SPE Sociedade de Propósito Específico SPV Special Purpose Vehicle TAP Transportes Aéreos Portugueses UPV Unidade Produtiva Varig Variglog Varig Logística S/A VEM Varig Engenharia e Manutenções S/A
  • 9. SUMÁRIO INTRODUÇÃO 8 Capítulo I A SOCIEDADE DE PROPÓSITO ESPECÍFICO 15 1.1 Conceito 15 1.2 Evolução de utilização no Direito Brasileiro 20 1.3 Enquadramento no vigente Código Civil 23 1.4 Formas societárias 24 Capítulo II A UTILIZAÇÃO DA SOCIEDADE DE PROPÓSITO ESPECÍFICO NAS PARCERIAS PÚBLICO-PRIVADAS 32 2.1 Previsão legal 32 2.2 Formas de utilização 39 2.3 Vantagens da utilização 42 Capítulo III A UTILIZAÇÃO DA SOCIEDADE DE PROPÓSITO ESPECÍFICO NA RECUPERAÇÃO JUDICIAL DE EMPRESAS 46 3.1 Previsão legal 46 3.2 Formas de utilização 53 3.3 Vantagens da utilização 56 Capítulo IV OUTRAS POSSIBILIDADES DE UTILIZAÇÃO DA SOCIEDADE DE PROPÓSITO ESPECÍFICO 58 4.1 Holding companies 58 4.2 Project Finance 61 4.3 Securitização de recebíveis 65 4.4 Financiamento de empreendimentos 67 Capítulo V A SPECIAL PURPOSE COMPANY 69 5.1 Conceito segundo o Direito Norte-Americano 69 5.2 Principais utilizações no âmbito do Direito Norte-Americano 72 CONCLUSÃO 79 REFERÊNCIAS 85
  • 10. 8 INTRODUÇÃO O comércio, como fato econômico e social, sempre buscou a melhor forma de circular a riqueza, com o intuito de aumentar, em maiores proporções, o que foi produzido. E, em tal busca, as regras atinentes aos negócios humanos evoluíram da mesma forma que a rudimentar economia fundamentada no escambo evoluiu para as transações econômicas mais elaboradas. Ou, nas palavras de Requião (2003): a economia de troca (economia de escambo) evoluiu para a economia de mercado (economia monetária). O produtor já não mais produz para a troca, visando o imediato transpasse de sua mercadoria em contraposição com a aquisição da de outro, com quem opera. Passa a produzir para vender, em novo ciclo de produção. Pode, assim, o produtor especializar-se numa só linha de produção, para a qual se considera mais hábil ou que melhor proveito lhe proporciona. Aparelha-se, desta forma, o comércio para desempenhar a sua função econômica e social, unindo indivíduos e aproximando os povos, tornando-se elemento de paz e solidariedade, numa intensa ação civilizadora (p. 4). O desenvolvimento econômico demandou a conjugação de esforços entre pessoas para se buscar o fomento das atividades produtivas. Nas palavras do Professor Fran Martins, o desenvolvimento das associações com a finalidade de buscar o objetivo primordial de produzir e circular mercadorias e serviços de forma mais eficiente e lucrativa é assim descrito: Inicialmente um só indivíduo podia realizar os atos necessários para a circulação de mercadorias, servindo de intermediário entre o produtor e o consumidor. Desenvolvendo-se o tráfico de mercadorias, tornou-se indispensável a existência de mais de uma pessoa para a realização das atividades intermediárias, nascendo daí as “sociedades empresárias” em que, segundo a concepção primitiva dos Códigos, várias pessoas “negociavam em comum” (Código Comercial, art. 315); só mais tarde foi reconhecida a personalidade jurídica das sociedades, mas, ainda hoje, em alguns
  • 11. 9 países (Alemanha, Inglaterra), certos tipos de sociedades (em nome coletivo, em comandita) não possuem personalidade jurídica, sendo os seus sócios considerados comerciantes que se agregam apenas para reunir maiores capitais, repartir encargos e usufruir lucros, mas cada um se caracterizando como um comerciante, ou seja, respondendo com seu patrimônio pelas obrigações assumidas. Por outro lado, dado o crescimento dos negócios, os comerciantes individuais e as sociedades empresárias passaram a necessitar de uma organização a que se unissem capital e trabalho, para atender às demandas do comércio. Nasceu, aí, a empresa comercial, organismo formado por uma ou várias pessoas com a finalidade de exercitar atos de manufatura ou circulação de bens ou prestação de serviços. A empresa já era conhecida no campo econômico, consistindo na organização de capital e trabalho com a finalidade de produção ou circulação de bens ou prestação de serviços (MARTINS, 2007, p. 13). Constata-se, pois, que as sociedades empresárias, desde os seus primórdios e ainda nas suas formas mais rudimentares, surgiram da necessidade de certos indivíduos se agruparem para a consecução de certos objetivos comuns. Isto porque tais objetivos somente são alcançados pelo esforço conjunto, não podendo, pois, ser atingidos pelos indivíduos isoladamente. Assim, os ordenamentos jurídicos trataram de conferir a este agrupamento de indivíduos, com a finalidade de alcançar objetivos comuns, certas características para viabilizar a relação entre tais indivíduos. Daí o surgimento das pessoas jurídicas, dotadas de personalidade própria e alheia a dos indivíduos que as compõem. As pessoas jurídicas possuem, portanto, capacidade de serem sujeitos de direitos e obrigações, podendo, por conseguinte, praticar todos os atos necessários para sua existência no mundo jurídico. A personalidade das pessoas jurídicas é, nas palavras de Pereira (1997), consequência de requisitos que tornam possível a sua existência no mundo jurídico. As pessoas jurídicas que se constituem para o exercício de atividades empresárias são denominadas sociedades empresárias, sendo conceituadas por Mendonça (1953) como a organização técnico-econômica que se propõe a produzir, mediante a combinação dos diversos elementos, natureza, trabalho e capital, bens ou serviços destinados à troca (venda), com a esperança de realizar lucros, correndo os riscos por conta do empresário, isto é, daquele que reúne, coordena e dirige esses elementos sob a sua responsabilidade (p. 552). Também é válido trazer a lume o conceito de sociedade empresária de Requião (2003):
  • 12. 10 Denomina-se sociedade empresária a organização proveniente do acordo de duas ou mais pessoas, que pactuam a reunião de capitais e trabalho com um fim lucrativo. A sociedade pode advir de contrato ou de ato correspondente; uma vez criada, e adquirindo personalidade jurídica, a sociedade se autonomiza, separadamente das pessoas que as constituíram. O Código Civil descortina o mesmo espírito, conforme artigo 982 do diploma normativo, porém só reconhece o caráter empresarial por meio de registro; sem a respectiva feitura ditas sociedades são consideradas em comum, a teor dos artigos 986 e seguintes do citado Códex. Diante da natureza do contrato plurilateral, típico das companhias, o Código intitula as sociedades anônimas empresárias, e as simples, ao lado das cooperativas, frente à natureza e sem a perspectiva específica do lucro, conquanto possam revestir forma comercial (p. 169). No entanto, a despeito do aperfeiçoamento das associações de pessoas ter resultado em sociedades empresárias organizadas sob as mais variadas formas, o recrudescimento do comércio, inclusive transnacional, fomentou a formação de associações entre os agentes econômicos. A conjugação de esforços entre agentes econômicos resultou ou na constituição de sociedades empresárias ou no surgimento de associações fundamentadas por normatização específica. Em ambos os casos, a finalidade precípua sempre foi a colaboração para consecução de objetivos comuns e específicos. Nesse contexto desenvolveram-se, ao longo do tempo, além das sociedades empresárias, negócios tais como: os contratos de agência e de distribuição, os consórcios, as joint ventures, cada qual com suas peculiaridades. O contrato de agência (também conhecido como contrato de representação comercial autônoma) e o contrato de distribuição são, atualmente, regulados pela Lei número 10.406, de 10 de janeiro de 2002, que instituiu o Código Civil (“Código Civil de 2002”), no Artigo número 7101. A citada norma legal estabelece que, pelo contrato de agência, uma pessoa assume, em caráter não eventual e sem vínculos de dependência, a obrigação de promover, à conta de outra, mediante retribuição, a realização de certos negócios, em zona determinada. Se a pessoa tiver à sua disposição a coisa a ser negociada, estar-se-á diante de um contrato de distribuição. Os contratos de representação comercial e de distribuição são essenciais para a circulação de mercadorias produzidas e representam importante mecanismo 1 “Art. 710. Pelo contrato de agência, uma pessoa assume, em caráter não eventual e sem vínculos de dependência, a obrigação de promover, à conta de outra, mediante retribuição, a realização de certos negócios, em zona determinada, caracterizando-se a distribuição quando o agente tiver à sua disposição a coisa a ser negociada” (BRASIL, 2002).
  • 13. 11 na comercialização de bens. Nas palavras de Bertoldi e Ribeiro (2006), dissertando sobre os contratos de agência e distribuição: Dentre um dos principais colaboradores do empresário, que desempenha a função de escoamento de seus produtos no mercado, cumprindo ofício essencial na cadeia de circulação de mercadorias ao lado do distribuidor, está o representante comercial, cuja atividade está devidamente regulada pela Lei 4.886, de 09.12.1965, que em seu art. 1º conceitua como a pessoa física ou jurídica, sem relação de emprego, que desempenha, em caráter não eventual por conta de uma ou mais pessoas, a mediação para realização de negócios mercantis, agenciando propostas ou pedidos para transmiti-los aos representados, praticando ou não atos relacionados com a execução dos negócios. No Código Civil, a exemplo do Código Civil italiano de 1942, esta espécie contratual é chamada de agência e está regulada, em conjunto com os contratos de distribuição, entre os arts. 710 a 721 (p. 712). Os contratos de agência (representação) e distribuição constituem contrato “consensual, pois para seu aperfeiçoamento basta o consentimento das partes; é bilateral, na medida em que cria obrigações para ambos os contratantes; e é oneroso, pois sempre será devida remuneração aos representantes pelos serviços prestados” (BERTOLDI e RIBEIRO, 2006, p. 713). O consórcio está disciplinado nos Artigos números 278 e 279, da Lei número 6.404, de 15 de dezembro de 19762 e é assim caracterizado por Borba (2004): o consórcio, que também é um contrato entre sociedades, restringe- se à conjugação de empresas para execução de um 2 “Art. 278. As companhias e quaisquer outras sociedades, sob o mesmo controle ou não, podem constituir consórcio para executar determinado empreendimento, observado o disposto neste Capítulo. § 1º O consórcio não tem personalidade jurídica e as consorciadas somente se obrigam nas condições previstas no respectivo contrato, respondendo cada uma por suas obrigações, sem presunção de solidariedade. § 2º A falência de uma consorciada não se estende às demais, subsistindo o consórcio com as outras contratantes; os créditos que porventura tiver a falida serão apurados e pagos na forma prevista no contrato de consórcio. Art. 279. O consórcio será constituído mediante contrato aprovado pelo órgão da sociedade competente para autorizar a alienação de bens do ativo não-circulante, do qual constarão: I - a designação do consórcio se houver; II - o empreendimento que constitua o objeto do consórcio; III - a duração, endereço e foro; IV - a definição das obrigações e responsabilidade de cada sociedade consorciada, e das prestações específicas; V - normas sobre recebimento de receitas e partilha de resultados; VI - normas sobre administração do consórcio, contabilização, representação das sociedades consorciadas e taxa de administração, se houver; VII - forma de deliberação sobre assuntos de interesse comum, com o número de votos que cabe a cada consorciado; VIII - contribuição de cada consorciado para as despesas comuns, se houver. Parágrafo único. O contrato de consórcio e suas alterações serão arquivados no registro do comércio do lugar da sua sede, devendo a certidão do arquivamento ser publicada” (BRASIL, 1976).
  • 14. 12 empreendimento determinado. Os membros do consórcio serão quaisquer sociedades, não exigindo a lei que se achem ligadas por relações de participação. A aprovação do contrato de consórcio exigirá a simples manifestação do órgão da sociedade que tem competência para autorizar a alienação de bens do ativo permanente. Na prática empresarial, os contratos de consórcio vêm- se tornando bastante comuns, especialmente para realização de obras de grandes dimensões que, por isso mesmo, requerem esforço conjugado de várias empresas (p. 505). Os contratos de joint venture pressupõem a constituição de uma sociedade, organizada sob uma das formas societárias prescritas no Direito Brasileiro, por outras empresas, com o objetivo de desenvolver negócios comuns, ou seja, os contratos de joint venture são criados a partir de um acordo-base em torno do qual gravitam os contratos satélites, sendo seus objetivos realizados por um órgão de gestão e controle que pode ser uma pessoa física ou jurídica, mandatária, formal como uma sociedade por ações, ou informal, como o gerente de um consórcio (BAPTISTA, 1981, p. 42/39). E, mais recentemente, a demanda por novas formas de associações, para o desenvolvimento de projetos específicos, entre dois ou mais sujeitos, trouxe ao cenário nacional a figura da Sociedade de Propósito Específico. A utilização da Sociedade de Propósito Específico no Direito Brasileiro vem evoluindo sob vários aspectos e em vários segmentos, sendo alguns deles melhor desenvolvidos ao longo do presente trabalho. Ressalte-se que a Sociedade de Propósito Específico, conhecida pela sigla SPE3, teve como inspiração a forma de Special Purpose Company, adotada no Direito Norte-americano. Nesse sistema jurídico, a Special Purpose Company também é denominada de Special Purpose Entity, Special Purpose Vehicle ou Shell Company. Conceitualmente, a SPE é aquela sociedade cujo objeto social é limitado a um só fim específico, ou seja, a razão de existência dessa sociedade é justamente o cumprimento desse propósito específico, findo o qual, a mesma será extinta. Destaque-se que a aplicação da SPE, na qualidade de forma de associação, que tem por objetivo o desenvolvimento econômico de negócios específicos, ocorre, atualmente, nos mais abrangentes cenários. É, pois, a SPE utilizada sob a forma de Project Finance, nas parcerias público-privadas, na viabilização de recuperação judicial de empresas. Destarte, é crescente a utilização da SPE no cenário atual, em 3 A sigla SPE, doravante, será utilizada para nomear a Sociedade de Propósito Específico, ao longo desta dissertação.
  • 15. 13 diversos meandros. E, desde o advento do Código Civil de 2002, a SPE é agora expressamente permitida no parágrafo único do Artigo número 981, do referido diploma legal (cf. BRASIL, 2002). Restou, pois, legalmente estabelecida que a atividade de uma sociedade possa se restringir à realização de uma ou mais atividades determinadas, com vistas à exploração de um só negócio. Após essa introdução, que será a primeira parte do presente trabalho, o Capítulo 1 conceituará a SPE, apresentando, também, a evolução de sua utilização no Direito Brasileiro até o advento de seu enquadramento no Código Civil de 2002. Também apresentará as formas societárias nas quais a SPE pode se revestir, já que a SPE não constitui um novo tipo societário na ordem jurídica brasileira. Ela se organiza sempre sob uma das formas societárias previstas pela legislação. Após a caracterização da SPE, o Capítulo 2, à luz da previsão contida no Artigo 9º, da Lei número 11.079, de 30 de dezembro de 2004 (cf. BRASIL, 2004a), abordará a utilização da SPE nas parcerias público-privadas. Discorrer- se-á, por conseguinte, a respeito do tratamento legal conferido à SPE nas parcerias público-privadas, apresentando-se as formas de viabilização de tais parcerias através da SPE e abordando-se as vantagens da implementação das referidas parcerias por intermédio da SPE. Já o terceiro capítulo, analisando o Artigo número 50, inciso XVI, da Lei número 11.101, de 09 de fevereiro de 2005 (cf. BRASIL, 2005a), apresentará a possibilidade de inserção da SPE na recuperação judicial de empresas, demonstrando as formas de utilização, bem como as vantagens da utilização da SPE em empresas que estejam em recuperação judicial. O Capítulo 4 apresentará outras possibilidades de utilização da SPE, através da formação de Holding Companies, da implementação de Project Finance, da securitização de recebíveis e no financiamento para a construção e comercialização de imóveis (cf. BRASIL, 2009). Finalmente, o Capítulo 5 apresentará uma breve explanação da Special Purpose Company, estabelecendo o respectivo conceito segundo o Direito Norte- Americano e as principais utilizações de Special Purpose Company no âmbito de tal sistema jurídico.
  • 16. 14 Em suma, o presente trabalho discorrerá sobre a análise dos aspectos jurídicos da SPE e de suas diversas aplicações no âmbito do Direito Brasileiro. Melhor conhecer os aspectos da SPE ensejará o desenvolvimento e a sedimentação da utilização da SPE no cenário nacional, na medida em que o tema proposto pretende abranger os aspectos da SPE à luz do Direito Brasileiro, a sua utilização prevista no ordenamento positivo pátrio, bem como outras utilizações possíveis, ainda que não positivadas.
  • 17. 15 CAPÍTULO I A SOCIEDADE DE PROPÓSITO ESPECÍFICO 1.1 Conceito As sociedades empresárias são organizações econômicas dotadas de personalidade jurídica. São constituídas, em regra, por mais de uma pessoa e têm como objetivo a produção ou comercialização de bens ou serviços, visando ao lucro. Para ser considerada empresária, nas palavras de Lobo (2004), é mister que a sociedade preencha o modelo imaginado por ASQUINI, segundo o qual a empresa é um fenômeno poliédrico, que representa quatro perfis: o perfil subjetivo; o perfil funcional; o perfil objetivo e o perfil corporativo, assim sintetizado por EVARISTO DE MORAES FILHO: „a) subjetivo, empresa = empresário; b) funcional ou dinâmico, empresa = atividade do empresário (imprenditizia); c) patrimonial ou objetivo, empresa = patrimônio comercial e estabelecimento e d) corporativo, empresa = instituição‟. Por isso, se a sociedade tem um ou mais sócios controladores (perfil subjetivo), dedica-se a uma atividade econômica (perfil funcional ou dinâmico), possui um patrimônio comercial ou estabelecimento (perfil patrimonial ou objetivo) e um contingente de empregados e prestadores de serviços (perfil corporativo), ela é empresária; se faltar um ou alguns desses elementos, a sociedade é simples (p. 31). A constituição de uma sociedade empresária, em geral, dá-se por escrito, através de um contrato social. Nas palavras do Martins (2007): As sociedades empresárias, regra geral, se constituem por escrito, seja por instrumento público ou particular, a teor do Artigo 997 do Código Civil. No entanto a legislação brasileira admitia e reconhecia a existência de sociedade sem o instrumento específico, desde que os interessados tivessem meios de provar por todos os gêneros de provas admitidos em lei comercial, consoante Artigos 122 e 304 do Código Comercial, havendo presunção sempre que alguém praticasse atos societários próprios.
  • 18. 16 Sobreditas sociedades, conquanto provadas, são consideradas de fato e não de direito, motivo pelo qual o Código Civil as denomina sociedade em comum (art. 986), desprovida de personalidade jurídica, por não se coadunar com a formação de sociedade empresária (p. 174). O contrato de constituição de sociedades empresárias é, por sua vez, dotado de características essenciais aos contratos em geral e de características particulares àqueles relativos às sociedades empresárias. Requião (2003), dissertando sobre o contrato de sociedade empresária, desdobra-lhe as características em: (i) elementos comuns a todos os contratos: Os contratos, na sua formação, como negócios jurídicos que são, pressupõem consenso, objeto lícito e forma prescrita e não defesa em lei (p. 384). (ii) elementos específicos, que dizem respeito ao contrato típico de sociedade empresária: Além dos elementos que informam o contrato em geral, para os contratos sociais surgem requisitos específicos próprios das sociedades comerciais, de que podemos enumerar os seguintes: a) pluralidade de sócios; b) constituição do capital; c) affectio societatis; d) participação nos lucros e nas perdas (p. 387). Deve também o contrato de constituição de sociedade empresária atender aos requisitos previstos na legislação, sendo os requisitos essenciais previstos no Artigo número 997, do Código Civil de 20021. A possibilidade de formação de SPE está, por sua vez, prevista no parágrafo único do Artigo número 981, do mesmo Código Civil de 20022. A referida norma permitiu, expressamente, a criação de uma sociedade empresária, cuja constituição dá-se por ato escrito, dotado de elementos comuns 1 “Art. 997. A sociedade constitui-se mediante contrato escrito, particular ou público, que, além de cláusulas estipuladas pelas partes, mencionará: I - nome, nacionalidade, estado civil, profissão e residência dos sócios, se pessoas naturais, e a firma ou a denominação, nacionalidade e sede dos sócios, se jurídicas; II - denominação, objeto, sede e prazo da sociedade; III - capital da sociedade, expresso em moeda corrente, podendo compreender qualquer espécie de bens, suscetíveis de avaliação pecuniária; IV - a quota de cada sócio no capital social, e o modo de realizá-la; V - as prestações a que se obriga o sócio, cuja contribuição consista em serviços; VI - as pessoas naturais incumbidas da administração da sociedade, e seus poderes e atribuições; VII - a participação de cada sócio nos lucros e nas perdas; VIII - se os sócios respondem, ou não, subsidiariamente, pelas obrigações sociais. Parágrafo único. É ineficaz em relação a terceiros qualquer pacto separado, contrário ao disposto no instrumento do contrato” (BRASIL, 2002). 2 “Art. 981. Celebram contrato de sociedade as pessoas que reciprocamente se obrigam a contribuir, com bens ou serviços, para o exercício de atividade econômica e a partilha, entre si, dos resultados. Parágrafo único. A atividade pode restringir-se à realização de um ou mais negócios determinados” (BRASIL, 2002, grifo nosso).
  • 19. 17 aos contratos em geral e de elementos peculiares aos contratos de sociedades empresariais. O ato constitutivo da SPE deve, também, conter os requisitos enumerados no Artigo número 997, do Código Civil de 2002. A principal característica da SPE é a sua existência estar adstrita à realização de um negócio determinado, mantendo, por conseguinte, a SPE interesses próprios e absolutamente destacados dos interesses de seus controladores. Conceitua-se, pois, a SPE como uma sociedade empresária constituída única e exclusivamente para cumprir um negócio específico. Em outras palavras, o surgimento e o fim de uma SPE está adstrito a um projeto ou ação específico, cujo desenvolvimento está ligado à necessidade empresarial de suas controladoras. Borba (2004), discorrendo sobre a SPE, afirma: A S.P.E. não tem interesse próprio, não cumpre um objeto social próprio, não se destina a desenvolver uma vida social. Trata-se do que se poderia chamar uma sociedade ancilar, mero instrumento de sua controladora. A rigor, essas sociedades nascem para prestar um serviço a sua controladora, para cumprir uma simples etapa de um projeto, ou até mesmo para desenvolver um projeto da controladora. Normalmente, cumprido esse projeto, o seu destino é a liquidação. Nascem, normalmente, já marcadas para morrer (p. 518). Assim, a SPE decorre da celebração de um contrato de sociedade, em que a sociedade empresária, dotada de personalidade jurídica e autonomia patrimonial, é constituída especificamente para uma ação ou projeto. Diz-se, pois, que a SPE possui um objeto determinado, sendo que a determinação do objeto pode ocorrer no aspecto temporal e funcional. No entanto, nem o aspecto temporal, nem o funcional podem, isoladamente, caracterizar a SPE. Isto porque o aspecto temporal, ou seja, a determinação do tempo de duração de uma SPE, previsto, eventualmente, no seu contrato de constituição, pode ser descaracterizada por possibilidade de prorrogação do contrato. No âmbito da SPE, dependendo do objeto específico delineado, existe a possibilidade e a necessidade de ser prever a possibilidade de extensão do prazo inicialmente ajustado para duração da SPE. Tal possibilidade de prorrogação do lapso temporal de duração da SPE é, por exemplo, prevista na Lei número 11.079/2004, que versa sobre as Parcerias Público-Privadas3 (cf. 3 A previsão de utilização de SPE, tal como é abordada na referida Lei, será discutida adiante, neste trabalho.
  • 20. 18 BRASIL, 2004). O Artigo Quinto4, da Lei número 11.079/2004 permite que os contratos de parcerias público-privadas, os quais, de acordo com a mesma lei, são antecedidos por uma SPE para estruturação de parcerias público-privadas5, tenham prazo de vigência compatível com a amortização dos investimentos realizados. 4 “Art. 5o. As cláusulas dos contratos de parceria público-privada atenderão ao disposto no art. 23 da Lei no. 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, no que couber, devendo também prever: I – o prazo de vigência do contrato, compatível com a amortização dos investimentos realizados, não inferior a 5 (cinco), nem superior a 35 (trinta e cinco) anos, incluindo eventual prorrogação; II – as penalidades aplicáveis à Administração Pública e ao parceiro privado em caso de inadimplemento contratual, fixadas sempre de forma proporcional à gravidade da falta cometida, e às obrigações assumidas; III – a repartição de riscos entre as partes, inclusive os referentes a caso fortuito, força maior, fato do príncipe e álea econômica extraordinária; IV – as formas de remuneração e de atualização dos valores contratuais; V – os mecanismos para a preservação da atualidade da prestação dos serviços; VI – os fatos que caracterizem a inadimplência pecuniária do parceiro público, os modos e o prazo de regularização e, quando houver, a forma de acionamento da garantia; VII – os critérios objetivos de avaliação do desempenho do parceiro privado; VIII – a prestação, pelo parceiro privado, de garantias de execução suficientes e compatíveis com os ônus e riscos envolvidos, observados os limites dos §§ 3º e 5º do art. 56 da Lei no. 8.666, de 21 de junho de 1993, e, no que se refere às concessões patrocinadas, o disposto no inciso XV do art. 18 da Lei no. 8.987, de 13 de fevereiro de 1995; IX – o compartilhamento com a Administração Pública de ganhos econômicos efetivos do parceiro privado decorrentes da redução do risco de crédito dos financiamentos utilizados pelo parceiro privado; X – a realização de vistoria dos bens reversíveis, podendo o parceiro público reter os pagamentos ao parceiro privado, no valor necessário para reparar as irregularidades eventualmente detectadas. § 1o As cláusulas contratuais de atualização automática de valores baseadas em índices e fórmulas matemáticas, quando houver, serão aplicadas sem necessidade de homologação pela Administração Pública, exceto se esta publicar, na imprensa oficial, onde houver, até o prazo de 15 (quinze) dias após apresentação da fatura, razões fundamentadas nesta Lei ou no contrato para a rejeição da atualização. § 2o Os contratos poderão prever adicionalmente: I – os requisitos e condições em que o parceiro público autorizará a transferência do controle da sociedade de propósito específico para os seus financiadores, com o objetivo de promover a sua reestruturação financeira e assegurar a continuidade da prestação dos serviços, não se aplicando para este efeito o previsto no inciso I do parágrafo único do art. 27 da Lei no. 8.987, de 13 de fevereiro de 1995; II – a possibilidade de emissão de empenho em nome dos financiadores do projeto em relação às obrigações pecuniárias da Administração Pública; III – a legitimidade dos financiadores do projeto para receber indenizações por extinção antecipada do contrato, bem como pagamentos efetuados pelos fundos e empresas estatais garantidores de parcerias público-privadas” (BRASIL, 2004, grifo nosso). 5 “Art. 9o Antes da celebração do contrato, deverá ser constituída sociedade de propósito específico, incumbida de implantar e gerir o objeto da parceria. § 1o A transferência do controle da sociedade de propósito específico estará condicionada à autorização expressa da Administração Pública, nos termos do edital e do contrato, observado o disposto no parágrafo único do art. 27 da Lei no 8.987, de 13 de fevereiro de 1995. § 2o A sociedade de propósito específico poderá assumir a forma de companhia aberta, com valores mobiliários admitidos a negociação no mercado. § 3o A sociedade de propósito específico deverá obedecer a padrões de governança corporativa e adotar contabilidade e demonstrações financeiras padronizadas, conforme regulamento. § 4o Fica vedado à Administração Pública ser titular da maioria do capital votante das sociedades de que trata este Capítulo. § 5o A vedação prevista no § 4o deste artigo não se aplica à eventual aquisição da maioria do capital votante da sociedade de propósito específico por instituição financeira controlada pelo Poder Público em caso de inadimplemento de contratos de financiamento” (BRASIL, 2004, grifo nosso).
  • 21. 19 Entretanto, tais contratos não podem ter prazo de vigência inferior a 5 (cinco) anos e nem superior a 35 (trinta e cinco) anos, incluindo eventual prorrogação. Assim, uma SPE constituída para implantar e gerir o objeto da parceria pode ter o seu prazo de duração inicial dilatado para acomodar determinada necessidade decorrente da execução do objeto. Obviamente, que o prazo inicial da SPE não poderá, ex vi legis, ser inferior a 5 (cinco) anos, mas poderá ser prorrogado até o limite de 35 (trinta e cinco) anos, pois como a SPE implantará e gerirá projeto de parceria público-privada deverá ter o mesmo prazo de duração do contrato que estabeleceu tal projeto. A função da SPE pode ser caracterizada a partir da atividade que será desempenhada pela SPE. Ou, em outras palavras, função é o motivo de criação, existência e encerramento de uma SPE. No entanto, a função da SPE não é seu aspecto característico, eis que outras sociedades empresárias podem ter funções similares a uma SPE e não serem caracterizadas como tal. Assim é que a junção de vários aspectos (tempo de duração, função a ser exercida, local onde a SPE atuará e partes que formam a SPE) caracteriza uma SPE. Por outro lado, a impossibilidade de alteração do objeto é uma característica intrínseca à SPE. É que, uma vez delimitado o objeto, o propósito, a finalidade da SPE, não pode haver a alteração ou a ampliação de referido objeto da SPE, sob pena de descaracterizá-la. É certo que o direito empresarial tem como fundamento a vontade das partes de se associarem, o que poderia, precipitadamente, ensejar que essa mesma vontade das partes, da qual decorreu a criação da SPE, poderia ampliar ou alterar o objeto de tal sociedade. Não obstante o respeito à vontade das partes, foram as próprias partes que constituíram a SPE que, voluntariamente, determinaram que tal sociedade teria um objeto específico e determinado. É assim que a impossibilidade de alteração do propósito da SPE decorre da vontade das partes instituidoras, no ato de criação da referida sociedade. E, sendo a impossibilidade de alteração do objeto da SPE que enseja o propósito específico de tal sociedade, tem-se que qualquer alteração ou ampliação do propósito da SPE desnatura-a como tal.
  • 22. 20 1.2 Evolução de utilização no Direito Brasileiro As previsões legais de utilização da SPE, no Brasil, em diversas situações ocorreram antes da menção expressa contida no Código Civil de 2002 (cf. BRASIL, 2002). Guimarães (2002) informa que a primeira referência de uma norma cogente prevendo a criação de uma estrutura símile à SPE no Brasil se encontra consubstanciada na Portaria 107, emitida pelo Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Florestal – IBDF, a qual institui o chamado consórcio societário, determinando que a conjugação empresarial visando a venda, no exterior, das mercadorias ali elencadas se fizesse mediante a criação de um ente, dotado de “personalidade jurídica, revestindo a forma de sociedade comercial, organizada por instrumento público ou particular e com seus atos constitutivos arquivados na repartição ou órgão competente” (art. 11) (p. 135). Verifica-se, pois, que a referida portaria, na verdade, dispôs sobre a criação de um tipo societário assemelhado a uma SPE, ao regular sobre a venda de madeiras para o exterior. Isto porque o chamado consórcio societário, dotado de personalidade jurídica, revestindo a forma de sociedade comercial, previsto pela mencionada portaria, não pode ser qualificado como consórcio, na acepção técnica. Sabe-se, nesse sentido, que uma das principais características de um consórcio é não ter personalidade jurídica. Na verdade, o consórcio é um contrato feito por uma companhia com outras sociedades, para viabilizar um empreendimento, sendo que cada consorciada responde pelas obrigações assumidas no referido contrato. Ou, nas palavras de Martins (2007): Consórcio é o contrato feito pela companhia e outras sociedades com a finalidade de executar determinado empreendimento. Deve esse contrato ser aprovado pelo órgão da sociedade que tiver competência para autorizar a alienação de bens do ativo permanente, e dele constarão a designação do consórcio, se houver, o empreendimento que constituir o seu objeto, a duração, o endereço e foro, as obrigações e responsabilidades e as prestações específicas de cada sociedade consorciada. [...] O consórcio não tem personalidade jurídica; as consorciadas respondem apenas pelas obrigações assumidas, sem presunção de solidariedade (pp. 400-401). Também a Lei número 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, ao disciplinar a concessão e a permissão de serviços públicos estabelecidos no Artigo número 175, da Constituição Federal, facultou ao órgão público concedente que determinasse aos concessionários e permissionários que estabelecessem uma sociedade
  • 23. 21 especificamente para contratar com o ente concedente6. Tal sociedade, tendo como propósito específico a concessão e/ou permissão outorgadas pelo Poder Público, nada mais seria que uma SPE. Constata-se, ainda, no Decreto número 3.000, de 26 de março de 1999, que estabelece o Regulamento do Imposto de Renda, que há menção expressa à SPE constituída pelos Estados, Municípios ou Distrito Federal para contribuir para o saneamento das finanças dos respectivos controladores. Destarte, o Artigo número 4327, do aludido Regulamento do Imposto de Renda, ao dispor sobre a tributação de ganhos de capital decorrentes de alienação de participações acionárias em sociedades criadas por Estados, Municípios ou Distrito Federal, no âmbito de Programas de Privatizações, especificamente se referiu à SPE. Também é cabível citar a Instrução Normativa CVM número 408, de 18 de agosto de 2004, na qual a Comissão de Valores Mobiliários prevê expressamente a existência de SPE no âmbito de controle de companhias abertas. Tal Instrução Normativa prevê a existência de entidades de propósito específico – EPE, que estejam sob o controle, societário ou econômico, de uma companhia aberta8. Além das referências legislativas já referidas, deve-se mencionar a expressa referência à SPE na sobredita Lei número 11.079/2004, que dispõe sobre as parcerias público-privadas (cf. BRASIL, 2004a) e na Lei número 11.101/2005, que 6 “Art. 20. É facultado ao poder concedente, desde que previsto no edital, no interesse do serviço a ser concedido, determinar que o licitante vencedor, no caso de consórcio, se constitua em empresa antes da celebração do contrato” (BRASIL, 1995). 7 “Art. 432. Os ganhos de capital na alienação de participações acionárias de propriedade de sociedades criadas pelos Estados, Municípios ou Distrito Federal, com o propósito específico de contribuir para o saneamento das finanças dos respectivos controladores, no âmbito de Programas de Privatização, estão isentos do imposto de renda (Lei nº 9.532, de 1997, art. 79). Parágrafo único. A isenção de que trata este artigo fica condicionada à aplicação exclusiva do produto da alienação das participações acionárias no pagamento de dívidas dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios (Lei nº 9.532, de 1997, art. 79, parágrafo único)” (BRASIL, 1999). 8 “Art. 1º. Para fins do disposto na Instrução CVM nº 247, de 27 de março de 1996, as demonstrações contábeis consolidadas das companhias abertas deverão incluir, além das sociedades controladas, individualmente ou em conjunto, as entidades de propósito específico – EPE, quando a essência de sua relação com a companhia aberta indicar que as atividades dessas entidades são controladas, direta ou indiretamente, individualmente ou em conjunto, pela companhia aberta. Parágrafo único. Considera-se que existem indicadores de controle das atividades de uma EPE quando tais atividades forem conduzidas em nome da companhia aberta ou substancialmente em função das suas necessidades operacionais específicas, desde que, alternativamente, direta ou indiretamente: I. a companhia aberta tenha o poder de decisão ou os direitos suficientes à obtenção da maioria dos benefícios das atividades da EPE, podendo, em conseqüência, estar exposta aos riscos decorrentes dessas atividades; ou II. a companhia aberta esteja exposta à maioria dos riscos relacionados à propriedade da EPE ou de seus ativos” (BRASIL, 2004b).
  • 24. 22 regula a recuperação judicial, a extrajudicial e a falência do empresário e da sociedade empresária (cf. BRASIL, 2005a)9. Algumas outras normas legais, embora não expressamente mencionem a SPE, podem ser citadas como referências que se aproximam da mesma. Assim é o caso da Lei número 8.666, de 21 de junho de 1993, que estabelece que empresas participantes de determinada licitação sob a modalidade de consórcio, deverão, caso sejam vencedoras do certame, constituir um consórcio operacional10. E, muitas das vezes, o órgão licitante, com espeque nas normas previstas pela Lei número 9.074, de 7 de julho de 199511, que disciplina a outorga e prorrogações das concessões e permissões de serviços públicos e dá outras providências, prevê a constituição, pelas empresas consorciadas que venceram a licitação, de um consórcio empresarial, que, como se viu acima, nada mais é que uma SPE. Isto porque, segundo Carvalhosa (2003a), 9 As referências à SPE contidas nas aludidas Leis números 11.079/2004 e 11.101/2005 serão discorridas alhures no presente trabalho 10 “Art. 33. Quando permitida na licitação a participação de empresas em consórcio, observar-se-ão as seguintes normas: I - comprovação do compromisso público ou particular de constituição de consórcio, subscrito pelos consorciados; II - indicação da empresa responsável pelo consórcio que deverá atender às condições de liderança, obrigatoriamente fixadas no edital; III - apresentação dos documentos exigidos nos arts. 28 a 31 desta Lei por parte de cada consorciado, admitindo-se, para efeito de qualificação técnica, o somatório dos quantitativos de cada consorciado, e, para efeito de qualificação econômico-financeira, o somatório dos valores de cada consorciado, na proporção de sua respectiva participação, podendo a Administração estabelecer, para o consórcio, um acréscimo de até 30% (trinta por cento) dos valores exigidos para licitante individual, inexigível este acréscimo para os consórcios compostos, em sua totalidade, por micro e pequenas empresas assim definidas em lei; IV - impedimento de participação de empresa consorciada, na mesma licitação, através de mais de um consórcio ou isoladamente; V - responsabilidade solidária dos integrantes pelos atos praticados em consórcio, tanto na fase de licitação quanto na de execução do contrato. § 1o No consórcio de empresas brasileiras e estrangeiras a liderança caberá, obrigatoriamente, à empresa brasileira, observado o disposto no inciso II deste artigo. § 2o O licitante vencedor fica obrigado a promover, antes da celebração do contrato, a constituição e o registro do consórcio, nos termos do compromisso referido no inciso I deste artigo” (BRASIL, 1994, grifo nosso). 11 “Art. 21. É facultado ao concessionário incluir no plano de conclusão das obras, referido no inciso I do artigo anterior, no intuito de viabilizá-la, proposta de sua associação com terceiros na modalidade de consórcio empresarial do qual seja a empresa líder, mantida ou não a finalidade prevista originalmente para a energia produzida. Parágrafo único. Aplica-se o disposto neste artigo aos consórcios empresariais formados ou cuja formação se encontra em curso na data de publicação desta Lei, desde que já manifestada ao poder concedente pelos interessados, devendo as concessões ser revistas para adaptá-las ao estabelecido no art. 23 da Lei no. 8.987, de 1995, observado o disposto no art. 20, inciso II e no art. 25 desta Lei” (BRASIL, 1998).
  • 25. 23 é mais interessante para o Poder Público que a exploração do objeto da licitação seja feita por uma nova sociedade especificamente constituída. Nesta, a fiscalização e a garantia dos credores são mais amplas que as do consórcio, em que não se presume solidariedade. Essa Exigência (SPE) tanto mais se justifica no caso das “concessões” (Lei n. 9.074, de 1995), tendo em vista o seu longo prazo (geralmente vinte anos) e a complexidade das relações das concessionárias com o Poder Público (agências reguladoras) (pp. 400-401). 1.3 Enquadramento no vigente Código Civil Uma das maiores vantagens de uma SPE, que enseja a sua crescente utilização no âmbito nacional, para efeitos de captação e implementação de investimentos, está no fato de permitir um perfeito isolamento das outras atividades comerciais dos acionistas controladores e um acesso direto e menos complicado aos ativos e recebíveis do empreendimento pelos agentes financiadores, nos casos de inadimplência. Este é, a princípio, o principal mote de utilização da SPE no cenário jurídico brasileiro. A possibilidade de formação de SPE está, como se viu, prevista no parágrafo único do Artigo número 981, do Código Civil de 2002 (cf. BRASIL, 2002). A referida norma permitiu, expressamente, que, em um contrato de sociedade, celebrado entre pessoas que, reciprocamente, se obrigam a contribuir, com bens ou serviços, para o exercício de atividade econômica e a partilha, entre si, dos resultados, a atividade social possa se restringir à realização de um ou mais negócios determinados. No entanto, o Código Civil de 2002 não estabeleceu à SPE, por si só, a qualidade de sociedade mercantil. Isto porque, a despeito da previsão legal expressa no Código Civil de 2002 da possibilidade de constituição da SPE, para que tenha a qualidade de sociedade mercantil, a SPE deverá adotar umas das formas societárias previstas em lei. É, pois, o tipo societário eleito para constituir a SPE que determinará as suas principais características, devendo ser seguidas as normas legais atinentes à constituição de cada tipo societário. Se a SPE constituir-se como uma sociedade limitada ou como uma sociedade em conta de participação, deverão ser respeitadas as regras ínsitas no Código Civil de 2002, relativas a tais tipos societários. Já se a SPE se constituir sob a forma de uma sociedade anônima, deverão ser observadas as regras previstas na Lei número 6.404/1976 (cf. BRASIL, 1976).
  • 26. 24 E, uma vez constituída sob uma das formas societárias previstas em lei, a SPE passará a ser dotada de personalidade jurídica própria, podendo, pois, ser sujeito de direitos e obrigações. A relação da SPE no âmbito interno – entre os seus sócios ou acionistas – e no âmbito externo – capacidade de se obrigar – será regulada pelo ato constitutivo (contrato social ou estatuto social). As responsabilidades dos sócios da SPE também serão determinadas de acordo com o tipo societário que foi eleito para constituí-la. 1.4 Formas societárias Guimarães (2002), ao tecer considerações sobre a SPE estruturada entre particulares, esclarece que “à SPE, em si, não se pode conferir a qualidade de sociedade mercantil. Ela, na realidade, estará insculpida dentro de uma das formas societárias existentes no direito brasileiro” (p. 134). Pode, pois, a SPE adotar a forma de uma sociedade em conta de participação, prevista no Capítulo II, do Título II, do Subtítulo I, do Livro II, do Código Civil de 2002 (BRASIL, 2002). A sociedade em conta de participação forma-se por um contrato, não estando submetida às formalidades de constituição a que estão submetidas as sociedades personificadas. Tal sociedade não possui personalidade jurídica, pelo que alguns doutrinadores sustentam não se tratar de uma sociedade, mas de um contrato participativo ou de associação12. Tais autores negam, pois, à sociedade em conta de participação a natureza de sociedade no sentido técnico do termo. Entretanto, deixando-se de lado a discussão acerca da natureza jurídica da sociedade em conta de participação – pois, o Código Civil de 2002 a qualificou como sociedade não-personalizada –, algumas considerações hão de ser feitas a respeito do referido tipo societário. As atividades decorrentes do objeto social da sociedade em conta de participação são exercidas pelo sócio ostensivo. O sócio ostensivo exerce as atividades sociais em seu nome individual, carreando para si a exclusiva responsabilidade pelo exercício social. Trata-se, pois, de sociedade despersonificada, na qual os sócios são pessoalmente credores e devedores perante terceiros, não possuindo firma, razão social, sede ou domicílio. Tal sociedade não tem existência perante terceiros, sendo uma reunião de pessoas 12 Cf. CAMPINHO, 2000, p. 01 (nota 01).
  • 27. 25 (físicas ou jurídicas) para a busca de um resultado comum, que é operacionalizado através de um ou mais sócios ostensivos. Nas palavras de Requião (2003), “é uma sociedade interna, oculta, entre o comerciante ou uma sociedade comercial e o sócio ou sócios que não se destacam, permanecendo ocultos e anônimos” (p. 422). Admite-se a coexistência de vários sócios ostensivos e vários sócios participantes ou ocultos. Se houver pluralidade de sócios ostensivos, caberá ao contrato da sociedade definir a participação de cada qual no empreendimento, o que não lhes retira a responsabilidade solidária e ilimitada perante terceiros. A natureza jurídica da sociedade em conta de participação é de relação obrigacional entre os sócios que a constituíram, posto que não se trata de sociedade com personalidade jurídica para contrair obrigações e responder perante terceiros. E, tendo em vista a ausência de personalidade jurídica, a sociedade em conta de participação nada mais é do que um contrato envolvendo os sócios e somente oponível entre os mesmos, na medida em que somente o sócio ostensivo se obriga perante os terceiros que contratam com a sociedade. O sócio oculto ou participante, que aporta o capital, apenas tem interesse nos resultados decorrentes da exploração do objeto social, não assumindo os riscos do insucesso do empreendimento perante terceiros. Os riscos assumidos pelo sócio oculto ou participante são restritos à prestação pela qual se obrigou junto ao sócio ostensivo, nos estritos termos contratualmente dispostos. Decorre da principal característica da sociedade em conta de participação – a ausência de personalidade jurídica – outra estampada no parágrafo único do Artigo número 991, do Código Civil de 2002: somente o sócio ostensivo obriga-se perante o terceiro, e, exclusivamente perante o sócio ostensivo, o sócio participante. Assim, tal sociedade somente existe entre os sócios e não é oponível a terceiros, posto que, perante a estes, a sociedade não existe (cf. BRASIL, 2002). A despeito de tais características, a sociedade em conta de participação poderá ter um objeto específico e se revestir na forma de uma SPE. Constata-se, dessa forma, que a principal característica da sociedade em conta de participação é o fato de não possuir personalidade jurídica capaz de torná- la sujeito de direitos e obrigações, o que não a impede de ter um objeto específico. A SPE também pode se revestir sob a forma de uma sociedade limitada, prevista no Capítulo IV, do Título II, do Subtítulo II, do Livro II, do Código Civil de 2002.
  • 28. 26 A principal característica da sociedade limitada é a restrição da responsabilidade dos sócios ao valor de suas quotas, sendo, entretanto, que todos os sócios respondem solidariamente pela integralização do capital social, consoante previsão legal contida no Artigo número 1.052, do Código Civil de 200213. Não se pode entender, pois, que a responsabilidade solidária dos sócios para integralização do capital possa ser exigida pela sociedade em relação aos referidos sócios, na hipótese de falta de integralização de parcela do capital social por qualquer dos sócios. Isto porque, a responsabilidade solidária pela integralização de quotas é exigível por credores da sociedade como garantia do cumprimento de obrigações societárias e como supedâneo da limitação da responsabilidade dos sócios às quotas do capital social por eles detidas. Nas palavras dos atualizadores da obra “Das Sociedades por Quotas de Responsabilidade Limitada”, de Egberto Lacerda Teixeira, ao comentar a responsabilidade dos sócios na sociedade limitada, em cotejo com as regras que regiam as sociedades por quotas de responsabilidade limitada: Continuam válidas as mesmas regras básicas de responsabilidade apontadas pelo autor (i) nas sociedades limitadas, a responsabilidade dos sócios perante terceiros alcança todo o montante não integralizado do capital social, independentemente da participação de cada sócio (art. 1052); (ii) nas sociedades anônimas, a responsabilidade de cada acionista é limitada ao preço de emissão de suas ações (art. 1º da Lei 6.404/76 – “Lei das S.A.”). A prática demonstrou ser rara a cobrança, por parte de credores, dos montantes não integralizados pelos sócios de limitada. Do ponto de vista teórico, é perfeita a posição do autor sobre o momento em que se opera a responsabilização, ou seja, quando da falência da sociedade. Afinal, a responsabilidade nesse caso é subsidiária, exigindo, portanto, a liquidação prévia dos ativos da sociedade (TEIXEIRA, 2006, p. 30). Restou, também, consignado no Artigo número 1.053, do Código Civil de 2002 que a sociedade limitada rege-se, quando forem omissas as normas ínsitas no capítulo que regula a sociedade limitada, pelas normas atinentes às sociedades simples. O mesmo artigo facultou, ainda, a aplicação subsidiária das normas das sociedades anônimas à sociedade limitada, quando houver previsão no contrato social14. 13 “Art. 1.052. Na sociedade limitada, a responsabilidade de cada sócio é restrita ao valor de suas quotas, mas todos respondem solidariamente pela integralização do capital social” (BRASIL, 2002). 14 “Art. 1.053. A sociedade limitada rege-se, nas omissões deste Capítulo, pelas normas da sociedade simples. Parágrafo único. O contrato social poderá prever a regência supletiva da sociedade limitada pelas normas da sociedade anônima” (BRASIL, 2002).
  • 29. 27 Tal disposição legal difere daquela existente no Artigo número 18, do Decreto número 3.708, de 10 de janeiro de 191915, que regulavas as antigas sociedades por quotas de responsabilidade limitada até a entrada em vigor do Código Civil de 2002. Isto porque, o referido Artigo número 18 determinava a aplicação supletiva da legislação de regência das sociedades anônima às sociedades limitadas, enquanto que o Código Civil de 2002 estabelece a aplicação subsidiária, às sociedades limitadas, das normas relativas às sociedades simples e a aplicação supletiva e facultativa das normas referentes às sociedades anônimas, quando houver previsão no contrato social (cf. BRASIL, 2002). Sobre tal aspecto, assim dissertam os atualizadores da obra de Teixeira (2006): Outro ponto que permanece fundamental e controvertido é a regência supletiva da sociedade limitada. Uma das questões enfrentadas pelo autor foi a aplicação de fonte supletiva ao contrato social ou à própria lei das limitadas. Tal questão mudou de figura no CC/2002, que não mais menciona as omissões do contrato, mas, sim, as da lei. Isso decorre inclusive do regime menos flexível agora vigente, que não confere tanta liberdade às partes na elaboração do contrato social. [...] Dois aspectos essenciais devem ser considerados atualmente nessa matéria: a interação entre a regência supletiva pelas normas da sociedade simples ou da sociedade anônima e o limite do conceito de omissão. O Artigo 1.053 estipula: “A sociedade limitada rege-se, nas omissões deste Capítulo, pelas normas da sociedade simples. § único: O contrato social poderá reger a regência supletiva da sociedade limitada pelas normas da sociedade anônima”. A forma de organização do artigo (regras separadas no caput e no parágrafo único) poderia gerar dúvida de que, mesmo havendo previsão de regência supletiva pela lei das sociedades anônimas, ainda assim valeriam de alguma forma as normas da sociedade simples. Entendemos, contudo, que tal interpretação seria equivocada. A regra que parecia obrigatória no caput do artigo na verdade não é, posto que é imediatamente flexibilizada no parágrafo único como possibilidade de estipulação diversa no contrato social. Tanto o caput quanto o parágrafo único do artigo 1.053 dispõem sobre exatamente a mesma matéria, não podendo conviver as duas regras em uma única sociedade. O que existe é apenas uma diferença na forma de redação dos dispositivos. O caput utiliza a linguagem das omissões no capítulo das limitações, enquanto que o parágrafo único menciona diretamente a regência supletiva pelas normas da sociedade anônima. Nos dois casos, entretanto, trata-se de quais serão as normas supletivas aplicáveis nas hipóteses de omissão das normas principais. Assim, parece-nos que a escolha das normas da sociedade anônima para suprir as omissões do 15 “Art. 18. Serão observadas quanto ás sociedades por quotas, de responsabilidade limitada, no que não for regulado no estatuto social, e na parte applicavel, as disposições da lei das sociedades anonymas” (BRASIL, 1919).
  • 30. 28 capítulo das limitadas afasta inteiramente a aplicação das normas da sociedade simples. [...] Até em aspectos práticos seria inviável a aplicação obrigatória das regras das sociedades simples nas omissões das limitadas, guardando-se as regras da sociedade anônima como uma terceira fonte de consulta. Estaria, sem dúvida, instalando o caos no direito societário. Aliás, mesmo quando tal tese é defendida, não temos visto nenhuma aplicação razoável de como se daria essa escala de aplicação normativa. Muitas vezes seriam misturados conceitos antagônicos ou de difícil conciliação (pp. 31-33). A sociedade limitada constitui-se através do contrato social, levado a arquivamento no Registro de Comércio16, e tem o seu capital estruturado em quotas, indivisíveis em relação à sociedade, nos termos do Artigo número 1.056, do Código Civil de 200217. Ela é gerida por administradores designados em contrato ou em ato separado18. É o tipo societário mais utilizado atualmente, por permitir a segregação do patrimônio dos sócios do alcance de credores, no caso de fracasso da atividade empresarial, posto que a responsabilidade dos sócios, como já explanado, restringe-se ao valor das quotas pelos mesmos detidas. Nas palavras de Coelho (2003): A limitação da responsabilidade dos sócios pelas obrigações sociais pode parecer, à primeira vista, uma regra injusta, mas não é. Como o risco de insucesso é inerente a qualquer atividade empresarial, o direito deve estabelecer mecanismos de limitação de perdas, para estimular empreendedores e investidores à exploração empresarial dos negócios. Se o insucesso de certa empresa pudesse sacrificar a totalidade do patrimônio dos empreendedores e investidores (pondo em risco o seu conforto e de sua família, as reservas para futura educação dos filhos e sossego na velhice), é natural que eles se 16 “Art. 998. Nos trinta dias subseqüentes à sua constituição, a sociedade deverá requerer a inscrição do contrato social no Registro Civil das Pessoas Jurídicas do local de sua sede. § 1o O pedido de inscrição será acompanhado do instrumento autenticado do contrato, e, se algum sócio nele houver sido representado por procurador, o da respectiva procuração, bem como, se for o caso, da prova de autorização da autoridade competente. § 2o Com todas as indicações enumeradas no artigo antecedente, será a inscrição tomada por termo no livro de registro próprio, e obedecerá a número de ordem contínua para todas as sociedades inscritas. Art. 999. As modificações do contrato social, que tenham por objeto matéria indicada no art. 997, dependem do consentimento de todos os sócios; as demais podem ser decididas por maioria absoluta de votos, se o contrato não determinar a necessidade de deliberação unânime. Parágrafo único. Qualquer modificação do contrato social será averbada, cumprindo-se as formalidades previstas no artigo antecedente” (BRASIL, 2002). 17 “Art. 1.056. A quota é indivisível em relação à sociedade, salvo para efeito de transferência, caso em que se observará o disposto no artigo seguinte. § 1o No caso de condomínio de quota, os direitos a ela inerentes somente podem ser exercidos pelo condômino representante, ou pelo inventariante do espólio de sócio falecido. § 2o Sem prejuízo do disposto no art. 1.052, os condôminos de quota indivisa respondem solidariamente pelas prestações necessárias à sua integralização” (BRASIL, 2002). 18 “Art. 1.060. A sociedade limitada é administrada por uma ou mais pessoas designadas no contrato social ou em ato separado. Parágrafo único. A administração atribuída no contrato a todos os sócios não se estende de pleno direito aos que posteriormente adquiram essa qualidade” (BRASIL, 2002).
  • 31. 29 mostrariam mais reticentes em participar dela. O prejuízo seria de todos nós, já que os bens necessários ou úteis à vida dos homens e mulheres produzem-se nas empresas (p. 157). Também pode a SPE adotar a forma de sociedade anônima, sendo aquela cujo capital está dividido em ações, sendo regulada pela Lei número 6.404/1976. Nas palavras de Borba (2004), pode-se afirmar que a Lei n. 6.404/76 oferece cinco linhas básicas de orientação, quais sejam: 1ª) a da proteção dos acionistas minoritários; 2ª) a responsabilização do acionista controlador; 3ª) a da ampla diversificação dos instrumentos postos na lei, à disposição dos acionistas, para serem, ou não, adotados pela sociedade; 4ª) a da diferenciação entre companhia aberta e fechada; 5ª) a da definição dos interesses fundamentais que a sociedade anônima representa [...] (p. 135). É uma sociedade de capital, cujo capital social é fracionado em ações19. Os títulos representativos do capital social são livremente negociados, inclusive no mercado de valores mobiliários, sendo neste último caso denominada sociedade anônima de capital aberto, em oposição à sociedade anônima da capital fechado, cujos valores mobiliários não são negociados no mercado de valores mobiliários20. 19 “Art. 11. O estatuto fixará o número das ações em que se divide o capital social e estabelecerá se as ações terão, ou não, valor nominal. § 1º Na companhia com ações sem valor nominal, o estatuto poderá criar uma ou mais classes de ações preferenciais com valor nominal. § 2º O valor nominal será o mesmo para todas as ações da companhia. § 3º O valor nominal das ações de companhia aberta não poderá ser inferior ao mínimo fixado pela Comissão de Valores Mobiliários” (BRASIL, 1976). 20 “Art. 4o. Para os efeitos desta Lei, a companhia é aberta ou fechada conforme os valores mobiliários de sua emissão estejam ou não admitidos à negociação no mercado de valores mobiliários. (Redação dada pela Lei nº 10.303, de 2001) § 1o Somente os valores mobiliários de emissão de companhia registrada na Comissão de Valores Mobiliários podem ser negociados no mercado de valores mobiliários. (Redação dada pela Lei nº 10.303, de 2001) § 2o Nenhuma distribuição pública de valores mobiliários será efetivada no mercado sem prévio registro na Comissão de Valores Mobiliários. (Incluído pela Lei nº 10.303, de 2001) § 3o A Comissão de Valores Mobiliários poderá classificar as companhias abertas em categorias, segundo as espécies e classes dos valores mobiliários por ela emitidos negociados no mercado, e especificará as normas sobre companhias abertas aplicáveis a cada categoria. (Incluído pela Lei nº 10.303, de 2001) § 4o O registro de companhia aberta para negociação de ações no mercado somente poderá ser cancelado se a companhia emissora de ações, o acionista controlador ou a sociedade que a controle, direta ou indiretamente, formular oferta pública para adquirir a totalidade das ações em circulação no mercado, por preço justo, ao menos igual ao valor de avaliação da companhia, apurado com base nos critérios, adotados de forma isolada ou combinada, de patrimônio líquido contábil, de patrimônio líquido avaliado a preço de mercado, de fluxo de caixa descontado, de comparação por múltiplos, de cotação das ações no mercado de valores mobiliários, ou com base em outro critério aceito pela Comissão de Valores Mobiliários, assegurada a revisão do valor da oferta, em conformidade com o disposto no art. 4o-A. (Incluído pela Lei nº 10.303, de 2001) § 5o Terminado o prazo da oferta pública fixado na regulamentação expedida pela Comissão de Valores Mobiliários, se remanescerem em circulação menos de 5% (cinco por cento) do total das
  • 32. 30 Na sociedade anônima, a responsabilidade dos acionistas é limitada ao preço de emissão das ações subscritas ou adquiridas21. Carvalhosa (2003b) aponta as principais características da sociedade anônima: Para designar a sociedade anônima usam-se expressões sinônimas: “sociedade anônima” ou “companhia”. O seu capital divide-se em partes que não são iguais quanto ao seu valor, permitindo a emissão de ações com valor nominal igual à emissão de ações sem valor nominal. A responsabilidade patrimonial dos subscritores ou acionistas, no momento da subscrição, será correspondente ao preço de emissão das ações subscritas. As ações são negociáveis na forma da lei, e não mais representadas por certificados. O colégio de acionistas pode ser total ou parcialmente substituído ou modificado pela simples transferência das ações. Daí ser anônima uma sociedade unicamente de capitais e não de pessoas. Constitui por subscrição pública ou particular. Pode constitui-se com apenas dois acionistas (art. 80). Por força da lei é sempre comercial, mesmo que os fins sejam civis; sua comercialidade advém da forma e não do objeto. O objeto deve ser definido de modo preciso e completo no estatuto (art. 2º), dispensada a indicação dos fins da companhia na denominação. Seu fim é lucrativo, havendo obrigação de distribuir lucros aos acionistas (art. 202). Possui necessariamente três órgãos: a Assembléia Geral, a Diretoria e o Conselho Fiscal, sendo os dois primeiros de funcionamento permanente e o último, conforme dispuserem os estatutos (art. 161). Os acionistas têm obrigações de caráter patrimonial e pessoal perante a sociedade. Patrimonialmente, obrigam-se a integralizar as ações subscritas pelo seu preço de emissão. Não são condôminos do patrimônio social, tendo direito apenas ao que remanescer dele, no caso de liquidação da sociedade. Pessoalmente, todo acionista deve abster-se do abuso do direito de voto e de interferir nas decisões em que tenha conflito de interesses com a sociedade. Enquanto controladores, os acionistas têm deveres de lealdade para com a comunidade, a companhia, os demais acionistas e os empregados (art. 116). Os administradores, que poderão ou não ser acionistas, não respondem com o seu patrimônio pessoal pelas obrigações da sociedade, em ações emitidas pela companhia, a assembléia-geral poderá deliberar o resgate dessas ações pelo valor da oferta de que trata o § 4o, desde que deposite em estabelecimento bancário autorizado pela Comissão de Valores Mobiliários, à disposição dos seus titulares, o valor de resgate, não se aplicando, nesse caso, o disposto no § 6o do art. 44. (Incluído pela Lei nº 10.303, de 2001) § 6o O acionista controlador ou a sociedade controladora que adquirir ações da companhia aberta sob seu controle que elevem sua participação, direta ou indireta, em determinada espécie e classe de ações à porcentagem que, segundo normas gerais expedidas pela Comissão de Valores Mobiliários, impeça a liquidez de mercado das ações remanescentes, será obrigado a fazer oferta pública, por preço determinado nos termos do § 4o, para aquisição da totalidade das ações remanescentes no mercado. (Incluído pela Lei nº 10.303, de 2001)” (BRASIL, 1976). 21 “Art. 1º. A companhia ou sociedade anônima terá o capital dividido em ações, e a responsabilidade dos sócios ou acionistas será limitada ao preço de emissão das ações subscritas ou adquiridas” (BRASIL, 1976).
  • 33. 31 virtude de atos regulares de sua gestão, arcando, no entanto, com os abusos que cometerem no exercício de sua função (arts. 153 a 159). O princípio da publicidade prevalece para todos os demonstrativos de resultados econômicos e financeiros de cada exercício social, bem como para todas as reformas estatutárias e decisões da assembléia geral. O princípio da publicidade também informa os negócios de transferência de controle da companhia. Prevalece o mesmo princípio para a constituição de grupos de sociedades (pp. 5-6). Em suma, pode-se afirmar que são as principais características da sociedade anônima, sociedade estritamente de capital e tipo societário no qual se pode revestir a SPE: (i) o capital social é dividido em partes denominadas ações; (ii) a responsabilidade dos acionistas limita-se ao preço de emissão das ações subscritas ou adquiridas, não podendo ser responsabilizados por terceiros em decorrência de obrigações contraídas pela companhia; (iii) as ações são livremente negociadas pelos acionistas, inclusive no mercado de valores mobiliários; e (iv) o capital social poderá ser subscrito através de subscrição pública.
  • 34. 32 CAPÍTULO II A UTILIZAÇÃO DA SOCIEDADE DE PROPÓSITO ESPECÍFICO NAS PARCERIAS PÚBLICO-PRIVADAS 2.1 Previsão legal O crescimento econômico e o desenvolvimento social brasileiros, experimentados no início da década de 1990, ensejaram a necessidade de revisão do papel do Estado nacional. Tais fenômenos decorreram do desenvolvimento da economia mundial, da intensificação das relações comerciais entre as nações, da mudança do regime político e da queda das barreiras protecionistas que, muitas vezes, alijavam o país do cenário de comércio internacional. O início da estabilidade econômica e a necessidade de se abandonar o conceito de Estado monopolista deram início à era das privatizações, das regulamentações das atividades exercidas por particulares por meio de concessões e das desregulamentações das atividades econômicas. Nas palavras do ex-Vice- Presidente da República brasileira, Marco Maciel: Ao nos livrarmos da inflação, não apenas estamos dando estabilidade à economia, criando condições para ter um desenvolvimento sustentado, como também estabelecendo, se assim se pode dizer, uma nova ética na sociedade. Uma ética do trabalho em detrimento da ética da especulação, uma ética que se volta para melhorar a qualidade do processo de desenvolvimento, fazendo com que desenvolvimento não signifique apenas crescimento econômico, mas signifique também e sobretudo a busca da justiça social (MACIEL, apud WALD, 1996, p. 22). Chegou-se, pois, à conclusão, à época, a exemplo de experiências bem sucedidas em outros países da Europa e nos Estados Unidos, que a mudança legislativa no setor de concessões públicas, com maior participação de particulares
  • 35. 33 na execução de obras públicas, principalmente de infra-estrutura, seria crucial para se afastar o papel monopolista que o Estado, até então, exercia. Em relação ao início do marco regulatório das políticas de concessões, ocorrido nos anos 1990, assim se manifestou o Professor Arnoldo Wald (1996): Embora a concessão de obras não constitua, propriamente, um remédio milagroso, nem uma panacéia para todos os problemas, pode atender às necessidades brasileiras de desenvolvimento e modernização da infra-estrutura nos casos e condições seguintes: - obras de alta ou razoável rentabilidade assegurada, que admitam o autofinanciamento; - garantia de manutenção das tarifas contratualmente fixadas reajustadas; - compatibilidade entre essas tarifas e a capacidade financeira do usuário; - garantia da não modificação das regras do jogo (eventuais tratados ou acordos de garantia dos investimentos); - manutenção do risco econômico por conta do concessionário, que é o empresário, mas assunção pelo Estado dos riscos políticos e sociais (eventual compensação pelo Estado de tarifas reduzidas no interesse social); - possibilidade de agrupar concessões distintas numa mesma licitação, para que os recursos decorrentes de uma delas possa constituir o funding da outra. Para que se torne factível a implementação das parcerias com o setor privado, o próprio Governo terá de rever a forma de relacionamento com a iniciativa privada, nos projetos de infra- estrutura, de retomada de obras paralisadas e de investimento na modernização dos serviços, deixando de assumir uma postura burocrática, para colocar-se ao lado do parceiro, com vistas à escolha da melhor fórmula, sempre objetivando o mais eficaz atendimento ao interesse público envolvido. A recente edição da lei disciplinadora de concessões de obras e serviços públicos (Lei 8.987/95), ao lado da disciplina legislativa da prorrogação das concessões e da reestruturação dos serviços públicos (Lei 9.074/95), representa um primeiro passo decisivo na retomada imediata dessa nova concepção cooperativa das concessões (p. 84)1. Destarte, como já exposto anteriormente, a Lei número 8.987/1995, dispôs sobre a concessão e a permissão de serviços públicos estabelecidos no Artigo número 175, da Constituição Federal, podendo ser considerada um dos marcos regulatórios acerca da parceria entre o Estado e o particular (cf. BRASIL, 1995). Rememore-se, ainda, que tal diploma legal facultou, no Artigo número 20, ao órgão público concedente, determinar aos concessionários e permissionários que estabelecessem uma sociedade especificamente para contratar com o poder concedente, o que nada mais seria do que uma SPE. Wald (1996), comentando o referido artigo, justifica a previsão legal: 1 Cf. também JUSTEN FILHO, 2005.
  • 36. 34 pelo fato de que a organização societária oferece como vantagem a estabilidade maior nas relações internas entre as diversas consorciadas, que passarão a ser sócias, e, igualmente entre o poder concedente e a sociedade (que consolida os direitos interesses e obrigações de todos os consorciados), tornando, ainda, desnecessário o recurso da previsão da solidariedade, para a responsabilização civil pelas faltas cometidas pela prestação do serviço, cuja reparação será havida diretamente da empresa concessionária (p. 136). Também a já mencionada Lei número 9.074/1995, que disciplina a outorga e prorrogações das concessões e permissões de serviços públicos, foi pioneira ao estabelecer as regras de consecução de projetos envolvendo o Poder Público e o particular (cf. BRASIL, 1998). Relembre-se, também, que o Artigo número 21, do mencionado diploma legal, prevê a constituição, pelas empresas consorciadas que venceram a licitação, de um consórcio empresarial, que, como também se viu anteriormente, é uma SPE. No ano de 2004, veio à baila um diploma legal específico para regular a relação iniciada, como se viu, no início da década, entre a Administração Pública federal2 e o empresário privado. Trata-se da Lei número 11.079/2004 (“Lei das PPPs”), que instituiu normas gerais para licitação e contratação de parceria público- privada no âmbito da administração pública federal. Cumpre citar o comentário de Valle (2006) sobre o cenário no qual o novel diploma legislativo acerca das parcerias público privadas foi lançado: Em um país de dimensões continentais como o Brasil, a estratégia governamental para implantação da infra-estrutura necessária como suporte ao desenvolvimento é um desafio permanente e, infelizmente, não tem sido sempre bem-sucedida. Existem exemplos de decisões equivocadas tomadas pelo Governo brasileiro, como aquela de deixar de investir na construção de ferrovias que repercutiram negativamente na integração das regiões mais remotas do País. Por outro lado, na última década do século passado, o Governo brasileiro, após um levantamento das necessidades em infra-estrutura, concluiu pela necessidade de implantação de novos modelos de desenvolvimento, precedendo, com sucesso, à privatização de algumas áreas, entre elas, a do setor de telecomunicações. 2 Alguns Estados brasileiros, antes da promulgação da Lei 11.079/2004, já haviam instituído, através de diplomas legais próprios, normas de cooperação entre o Estado e o Particular. Podem-se citar, a título exemplificativo, os Estados de Minas Gerais – com a Lei n. 14.868, de 16.10.2003 (MINAS GERAIS, 2003) –, São Paulo – com a Lei n. 11.688, de 19.05.2004 (SÃO PAULO, 2004) –, Santa Catarina – com a Lei n. 12.930, de 04.02.2004 (SANTA CATARINA, 2004) –, Goiás – com a Lei n. 14.910, de 11.08.2004 (GOIÁS, 2004) – e o Distrito Federal – com a Lei n. 3.418, de 04.08.2004 (DISTRITO FEDERAL, 2004).
  • 37. 35 Entretanto, ultrapassada a fase dos grandes projetos, que houve um afluxo substancial de investimentos estrangeiros ao Brasil, o desenvolvimento de novos planos viu-se refreado pelo enxugamento dos recursos financeiros em todo o Mundo, sendo importante a criação de novos instrumentos e de um ambiente legal capaz de estimular novamente a realização de obras de infra-estrutura no País. A Lei das Parcerias Público-Privadas, recentemente editada, resultou de iniciativas conjuntas de diversos setores do Governo e da iniciativa privada visando, justamente, possibilitar a criação dessa nova etapa de desenvolvimento do país (p. 91). Gasparini (2006) assim conceitua parceria público-privada: Num sentido amplo, parceria público-privada é todo ajuste que a Administração Pública de qualquer nível celebra com um particular para viabilizar programas voltados ao desenvolvimento socioeconômico do país e ao bem-estar da sociedade, como são as concessões de serviços, as concessões de serviços precedidas de obras públicas, os convênios e os consórcios públicos. Em sentido estrito, ou seja, com base na Lei federal das PPPs, pode-se afirmar que é um contrato administrativo de concessão por prazo certo e compatível com o retorno do investimento privado, celebrado pela Administração Pública com certa entidade particular, remunerando-se o parceiro privado conforme a modalidade de parceria adotada, destinado a regular a prestação de serviços públicos ou a execução de serviços públicos precedidos de obras públicas ou, ainda, a prestação de serviços em que a Administração é a usuária direta ou indireta, respeitado sempre o risco assumido. O art. 2º da lei federal define sucintamente a parceria público-privada como contrato administrativo de concessão, na modalidade patrocinada ou administrativa (p. 36). O Artigo Segundo3, da Lei das PPPs, conceitua parceria público-privada, ao passo que o Artigo Quarto, do mesmo diploma legal, estabelece as diretrizes para a contração de parcerias público-privadas por todos os entes da federação, cumprindo-se transcrever as referidas diretrizes, in verbis: 3 “Art. 2o Parceria público-privada é o contrato administrativo de concessão, na modalidade patrocinada ou administrativa. § 1o Concessão patrocinada é a concessão de serviços públicos ou de obras públicas de que trata a Lei no 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, quando envolver, adicionalmente à tarifa cobrada dos usuários contraprestação pecuniária do parceiro público ao parceiro privado. § 2o Concessão administrativa é o contrato de prestação de serviços de que a Administração Pública seja a usuária direta ou indireta, ainda que envolva execução de obra ou fornecimento e instalação de bens. § 3o Não constitui parceria público-privada a concessão comum, assim entendida a concessão de serviços públicos ou de obras públicas de que trata a Lei no 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, quando não envolver contraprestação pecuniária do parceiro público ao parceiro privado. § 4o É vedada a celebração de contrato de parceria público-privada: I – cujo valor do contrato seja inferior a R$ 20.000.000,00 (vinte milhões de reais); II – cujo período de prestação do serviço seja inferior a 5 (cinco) anos; ou III – que tenha como objeto único o fornecimento de mão-de-obra, o fornecimento e instalação de equipamentos ou a execução de obra pública” (BRASIL, 2004a, grifo nosso).
  • 38. 36 I – eficiência no cumprimento das missões de Estado e no emprego dos recursos da sociedade; II – respeito aos interesses e direitos dos destinatários dos serviços e dos entes privados incumbidos da sua execução; III – indelegabilidade das funções de regulação, jurisdicional, do exercício do poder de polícia e de outras atividades exclusivas do Estado; IV – responsabilidade fiscal na celebração e execução das parcerias; V – transparência dos procedimentos e das decisões; VI – repartição objetiva de riscos entre as partes; VII – sustentabilidade financeira e vantagens socioeconômicas dos projetos de parceria. Constata-se que as diretrizes elencadas nos incisos I, III, IV e V, do mencionado Artigo 4º, reafirmam a função do Estado, ao passo que as diretrizes positivadas nos incisos II, VI e VII garantem ao particular a atratividade na associação com Estado, na medida em que são privilegiados o respeito aos direitos do parceiro particular, a distribuição equânime dos riscos, a sustentabilidade e a vantagem econômica do empreendimento (cf. BRASIL, 2004a). Embora a Lei das PPPs não determine que tipos de empreendimentos podem ser objetos de parceria público-privada, o Decreto Federal número 5.385, de 04 de março de 2005, instituiu o Comitê Gestor de Parcerias Público-Privadas (CGP), cuja atribuição é definir os serviços prioritários para execução sob o regime de parceria público-privada e os critérios para subsidiar a análise sobre a conveniência e oportunidade de contratação sob tal regime4. Já o parágrafo quarto, do Artigo 2º, da Lei das PPPs, estabelece as seguintes vedações à celebração de parceria público-privada: (a) contrato cujo seja inferior a R$ 20.000.000,00 (vinte milhões de reais); (b) período de prestação do serviço cujo prazo seja inferior a 5 (cinco) anos; ou (c) projeto cujo objeto único seja o fornecimento de mão-de-obra, o fornecimento e instalação de equipamentos ou a execução de obra pública. A Lei das PPPs estabeleceu duas modalidades de parcerias: (a) concessão patrocinada5 e (b) concessão administrativa6. Na primeira modalidade tem-se a concessão de serviços ou obras públicas, na qual, além da tarifa cobrada do usuário, o parceiro público entrega ao parceiro particular uma prestação pecuniária, tendo, nesta 4 “Art. 3º. Compete ao CGP: I -definir os serviços prioritários para execução no regime de parceria público-privada e os critérios para subsidiar a análise sobre a conveniência e oportunidade de contratação sob esse regime; [...]” (BRASIL, 2005b). 5 Art. 2º, parágrafo primeiro da Lei n. 11.079/2004 (cf. BRASIL, 2004a). 6 Art. 2º, parágrafo segundo da Lei n. 11.079/2004 (cf. BRASIL, 2004a).
  • 39. 37 hipótese, a aplicação supletiva à Lei das PPPs da Lei número 8.987/1995. Já na segunda modalidade, há um contrato de prestação de serviços públicos ou de interesse público, podendo envolver a execução de obras ou o fornecimento ou instalação de bens, para uso direto ou indireto da Administração Pública. As concessões administrativas, além serem regidas pelas normas ínsitas da Lei das PPPs, também o são pelas normas das Leis números 8.987/1995 e 9.074/1995. Uma vez definidos, sucintamente, os aspectos básicos das parcerias público- privadas, passa-se à normatização da utilização da SPE nas referidas parcerias. O Capítulo IV da Lei das PPPs dispõe, em um Artigo (9º) sobre a utilização da SPE no âmbito das parcerias público-privadas7. Verifica-se, portanto, da análise do Artigo 9º, da Lei das PPPs, que é obrigatória, na implantação e gestão de um projeto de parceria público-privada, a constituição e a manutenção de uma SPE. Embora o texto legal não seja claro acerca da identificação dos sócios da SPE, da interpretação do diploma legal ressai que a composição societária da SPE será, em princípio, entre o parceiro público e o parceiro privado. Tais parceiros serão associados em decorrência da conclusão de processo licitatório8 ou da inexigibilidade ou dispensa de licitação e terão como papel a implantação e gestão, por intermédio de uma SPE, do empreendimento. O parágrafo quarto do sobredito Artigo 9º veda que a maioria do capital votante pertença ao parceiro público, ressalvada a possibilidade de tal ocorrer no caso de eventual aquisição da maioria do capital votante da sociedade de propósito específico por instituição financeira controlada pelo Poder Público, em caso de inadimplemento de contratos de financiamento. 7 “Art. 9º Antes da celebração do contrato, deverá ser constituída sociedade de propósito específico, incumbida de implantar e gerir o objeto da parceria. § 1º A transferência do controle da sociedade de propósito específico estará condicionada à autorização expressa da Administração Pública, nos termos do edital e do contrato, observado o disposto no parágrafo único do art. 27 da Lei no. 8.987, de 13 de fevereiro de 1995. § 2º A sociedade de propósito específico poderá assumir a forma de companhia aberta, com valores mobiliários admitidos a negociação no mercado. § 3º A sociedade de propósito específico deverá obedecer a padrões de governança corporativa e adotar contabilidade e demonstrações financeiras padronizadas, conforme regulamento. § 4º Fica vedado à Administração Pública ser titular da maioria do capital votante das sociedades de que trata este Capítulo. § 5º A vedação prevista no § 4º deste artigo não se aplica à eventual aquisição da maioria do capital votante da sociedade de propósito específico por instituição financeira controlada pelo Poder Público em caso de inadimplemento de contratos de financiamento” (BRASIL, 2004a). 8 “Art. 10. A contratação de parceria público-privada será precedida de licitação na modalidade de concorrência, estando a abertura do processo licitatório condicionada a: [...]” (BRASIL, 2004a).
  • 40. 38 Faculta-se, também, a constituição da SPE através de companhia aberta, com valores mobiliários negociados no mercado, admitindo-se, por conseguinte, o ingresso de outros sócios na sociedade, com aporte de capital. O parceiro privado pode, também, ex vi legis, transferir o controle da SPE para terceiro, conquanto que haja prévia e expressa autorização do parceiro público e tal possibilidade esteja prevista no edital de licitação e no próprio contrato de parceria público-privada. Ademais, deve ser observado o disposto no Artigo número 27, da Lei número 8.987/19959. Independentemente da forma societária adquirida, a SPE, relativa a projetos de parcerias público-privadas, deve cumprir as regras de governança corporativa, adotando demonstrações financeiras padronizadas, conforme venha a ser estabelecido em regulamento. Rigolin (2008), ao comentar tais exigências, assim se posiciona: O § 3º, aqui fora de ordem em face de sua matéria, e por fim neste art. 9º, estabelece em duplo comando: a) que a SPE deverá obedecer a padrões de governança corporativa, e isso significa que esteja enquadrada em alguma forma ou espécie de sociedade disciplinada e fiscalizada por entidade fiscalizadora de exercício profissional, como ordens ou conselhos, ou dizendo de outro modo, integrante de algum ramo suficientemente disciplinado como corporação, com regras específicas de atuação e sob controle igualmente disciplinado, e b) que a SPE adote contabilidade e demonstrações financeiras padronizadas conforme regulamento, e tal previsão tem eficácia contida até que seja editado o regulamento a que se refere, ou, se já existente, sempre na sua restrita conformidade deve ser realizada a contabilidade das SPEs. Regulamentos de contabilidade privada são matéria para conselhos de contabilidade, seja o federal, seja os estaduais, que são os entes autárquicos controladores da profissão de contabilista, e de empresas desse ramo. O que ressalta é que, sendo empresas as SPEs, sua contabilidade é privada e nunca pública, como é pública a dos entes 9 “Art. 27. A transferência de concessão ou do controle societário da concessionária sem prévia anuência do poder concedente implicará a caducidade da concessão. § 1º Para fins de obtenção da anuência de que trata o caput deste artigo, o pretendente deverá: (Renumerado do parágrafo único pela Lei nº 11.196, de 2005) I - atender às exigências de capacidade técnica, idoneidade financeira e regularidade jurídica e fiscal necessárias à assunção do serviço; e II - comprometer-se a cumprir todas as cláusulas do contrato em vigor. § 2º Nas condições estabelecidas no contrato de concessão, o poder concedente autorizará a assunção do controle da concessionária por seus financiadores para promover sua reestruturação financeira e assegurar a continuidade da prestação dos serviços. (Incluído pela Lei nº 11.196, de 2005) § 3º Na hipótese prevista no § 2º deste artigo, o poder concedente exigirá dos financiadores que atendam às exigências de regularidade jurídica e fiscal, podendo alterar ou dispensar os demais requisitos previstos no § 1o, inciso I deste artigo. (Incluído pela Lei nº 11.196, de 2005) § 4º A assunção do controle autorizada na forma do § 2º deste artigo não alterará as obrigações da concessionária e de seus controladores ante ao poder concedente. (Incluído pela Lei nº 11.196, de 2005)” (BRASIL, 1995).
  • 41. 39 que integram a administração pública direta e autárquica. A lei das PPPs, quanto a isso, passou longe de pretender inovar (p. 20). 2.2 Formas de utilização Restou exposto acima que a parceria público-privada é o contrato administrativo de concessão, na modalidade patrocinada ou administrativa, cujo objetivo é atrair investimentos privados para a realização de obras e para a prestação de serviços na área de infra-estrutura. Também foi explanado que o contrato de parceria público-privada deverá ser precedido da constituição de uma SPE, que será a responsável pela implantação e gestão do empreendimento objeto do referido contrato. A utilização da SPE, previamente à celebração de um contrato de parceria público-privada, decorre da necessidade de se dissociar o patrimônio e as obrigações dos sócios que compõem a SPE (órgão da administração direta ou indireta da esfera municipal, estadual, do Distrito Federal ou federal e parceiro privado) do patrimônio e das obrigações da SPE, constituída para implantar e gerir o empreendimento decorrente do contrato de parceria público-privada. Em outras palavras: a utilização da SPE nas parcerias público-privadas tem por objetivo isolar o patrimônio, a gestão e as obrigações da empresa, que, como já se viu, pode adotar quaisquer das formas societárias previstas no ordenamento jurídico brasileiro, do patrimônio, da gestão e das obrigações dos sócios, público e privado. E, para evitar qualquer confusão entre o objeto da parceria público- privada e a concessão de serviços públicos ou de obras públicas, ou, ainda, entre tal objeto e a prestação de serviços em que a Administração Pública figura como usuária direta ou indireta, a SPE é constituída, sendo o parceiro privado detentor da maioria do capital votante. Tal determinação, prevista no quarto parágrafo do Artigo 9º, da Lei das PPPs, pretende, inclusive, desvincular a SPE de uma possível confusão com as sociedades de economia mista, sendo estas últimas pessoas jurídicas de direito privado, que têm por objeto a prestação de serviços públicos ou a exploração de atividade econômica que confira maior eficiência à gestão pública (cf. BRASIL, 2004a). Entretanto, nas sociedades de economia mista, o controle societário pertence, necessariamente, à Administração Pública.