O documento analisa as declarações do presidente da CBB sobre as finanças da organização. Em resumo: 1) Parte do dinheiro da Eletrobrás foi usado para pagar juros, mas não foi suficiente para cobrir o déficit; 2) Os empréstimos vencem em 2011, não 2012; 3) As taxas de juros dos empréstimos eram altas demais; 4) Os empréstimos foram usados principalmente para capital de giro, não investimento; 5) A maior parte do dinheiro dos empréstimos não foi para invest
1. Fábio, li atentamente a entrevista do Carlos Nunes. Vamos lá.
1. Uso de dinheiro de órgãos públicos para pagamento de juros e/ou empréstimos.
Isto é uma meia verdade. A parte falsa é que, se olharmos a Demonstração de Resultados, há
uma linha de despesa financeira na coluna Eletrobrás no valor de R$ 57.039. Logo, uma parte
do valor recebido da Eletrobrás foi alocado para pagamento de juros.
Agora a parte verdadeira. Realmente, não foi usado este dinheiro para pagamento de juros
e/ou empréstimos, visto que, mesmo alocando estes R$ 57 mil, o déficit foi MUITO maior do
que isto, batendo na casa de R$ 2 milhões e 400 mil. E a CBB não usou este dinheiro
simplesmente porque não tinha. Olhando o fluxo de caixa, percebe-se claramente que a CBB
teve que ser financiada por empréstimos bancários (item 3 da minha análise), ou seja, os
empréstimos foram apenas “rolados” e não pagos. Logo, como usar verba para pagar algo que
não foi pago?
2. Prazo de pagamento dos empréstimos
O caro presidente da CBB afirma que “A CBB entende que não há problema algum em utilizar
linhas de crédito, uma vez que a situação econômica está estável e as taxas de juros estavam
favoráveis, desde que haja quitação total deste débito no fim de 2012.” Isto é 100% FALSO. Os
empréstimos estão contabilizados no grupo de contas chamado Passivo Circulante, que, por
definição legal, são todas as dívidas contraídas e ainda não quitadas, com vencimento no ano
seguinte ao da demonstração. Como a demonstração é de 31/12/2010, o vencimento da
totalidade dos empréstimos é o ano de 2011 e não 2012. E outra coisa, isto não é um erro
contábil, pois o valor é relevante e, com toda certeza, passou pelo crivo do auditor externo,
que validou o procedimento contábil utilizado. Logo, vence agora em 2011 e não em 2012.
3. Taxa de juros
Utilizando a mesma afirmação acima “A CBB entende que não há problema algum em utilizar
linhas de crédito, uma vez que a situação econômica está estável e as taxas de juros estavam
favoráveis, desde que haja quitação total deste débito no fim de 2012”. Taxa de juros
favoráveis? Segue novamente a tabela de análise de juros.
Banco Valor Devido ao final de 2010 Taxa de Juros Mensal Taxa de Juros Anual
Itaú R$ 1.213.426 3,5% 51,11%
Itaú R$ 1.056.727 3,0% 42,58%
Bradesco R$ 360.000 2,5% 34,49%
Bradesco R$ 960.000 2,5% 34,49%
2. Se formos fazer uma média ponderada das taxas, temos uma taxa média de juros de exatos 3%
ao mês, o que dá escandalosos 42,58% ao ano. Eu, como pessoa física, não tomaria nunca um
empréstimo com esta taxa. Imagina uma empresa do porte da CBB... Estas são taxas de juros
para empréstimos de alto risco no sistema financeiro brasileiro.
4. Destinação dos empréstimos
Sobre para onde foram os empréstimos, o presidente da CBB afirma que “A CBB decidiu tomar
um empréstimo nesse valor para acelerar seu poder de investimento/crescimento, o que
estava previsto no planejamento orçamentário da entidade.” Senhor presidente, não abuse da
nossa inteligência, por favor. A própria CBB afirma, na Nota Explicativa de número 9 de suas
demonstrações contábeis os destinos dos empréstimos, reproduzidos abaixo:
Banco Valor Devido Destinação
Itaú R$ 1.213.426 Refere-se basicamente ao saldo do limite utilizado para
cobertura de capital de giro (o famoso limite do cheque especial)
Itaú R$ 1.056.727 Refere-se a valores tomados junto às instituições financeiras para
fins de cobertura de capital de giro.
Bradesco R$ 360.000 Refere-se ao empréstimo obtido junto à instituição financeira na
modalidade de Cédula de Crédito Bancário através da abertura
de crédito em conta corrente de depósito (traduzindo, é um
empréstimo para capital de giro que a CBB ganhou por ter aberto
a conta no Bradesco)
Bradesco R$ 960.000 Idem ao anterior
Senhor presidente, a própria CBB afirma que os valores são de limites de cheque especial ou
empréstimo para capital de giro. Por acaso o senhor não sabe o que significa? Capital de giro é
dinheiro para pagamento de contas de curto prazo, não é dinheiro para
investimento/crescimento, portanto, alegação bem para “inglês ver”.
5. Investimentos
Também é falsa a alegação que a CBB utilizou empréstimos para investimento/crescimento.
De acordo com o Fluxo de Caixa, o volume de empréstimos contraídos em 2010 foi de R$
4.284.500, enquanto que o investimento total da CBB foi de R$ 848.440, sendo que neste valor
está o investimento para crescimento e também para reposição de equipamentos. Logo, a
diferença está em R$ 3.436.060,00, que foi para financiar o capital de giro.
3. 6. Objetivo de Lucro
O presidente, quando vai se defender do aumento dos custos, afirma que “Enfatizamos que o
objetivo da entidade não é lucrar com a gestão do esporte.” Isto é fato, mas carrega uma
enorme mentira.
Quando o Código Civil trata de Entidades sem Finalidades Lucrativas (caso da CBB), em
nenhum momento diz que é proibido gerar “lucro”, neste caso chamado tecnicamente de
superávit, mas sim que este superávit não pode ser pago aos membros da entidade, como em
uma empresa privada. Logo, é função sim da CBB apresentar superávit em suas contas, por
uma razão simples, que ensino aos meus alunos de Contabilidade I, no primeiro semestre do
curso de graduação em Ciências Contábeis: uma entidade, como a CBB, só tem 2 formas de
obter recursos para investimento: apresentando superávit, ou seja, sobrando dinheiro pelas
sua boa gestão dos recursos captados, ou buscando dinheiro no mercado financeiro, algo que
a CBB fez sem maestria alguma. No caso da CBB, a situação foi pior ainda, pois este recurso
captado serviu, na sua grande maioria, para cobrir o déficit e uma pequena parcela para
investimento.
7. Sobre o contrato de TV
Este é o único ponto verdadeiro. Se as cotas foram pagas em 2009, realmente não haverá nada
em 2010. Entretanto, uma questão: se o dinheiro de 2010 foi adiantado em 2009, isto significa
que em 2009 a CBB recebeu 2 anos de quotas? Se for verdade, a cota de TV rende à CBB a
estrondosa quantia de R$ 241.639,00 por ano ou pouco mais de R$ 20.000,00 por mês. Como a
CBB vai conseguir gastar esta fortuna? Este valor é irrisório, logo, aparentemente, o contrato
foi bem mal feito.
Atenciosamente,
Professor Doutor Jorge Eduardo Scarpin
Doutorado em Ciências Contábeis e Administração - FURB
http://professorscarpin.blogspot.com
http://www.twitter.com/jorgescarpin