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TIPOS BURLESCOS DESENHADOS POR BRUNO SEABRA

                        Biblioteca portátil
propriedade de Luiz V. Ferreira, Miguel V.Ferreira e Bruno Seabra

                                                                        Ao bacharel Duarte P. Schetel


                               Introdução
                         (no dia dos meus anos)

                  Folguemos coração! Ainda agora
                 Comecei a ser gente na existência!
            Vinte e dois anos só! Sou mesmo um noviço,
                Um jacinto de amor na adolescência!

                  O buço desabrocha levemente,
               Que macio que vem, quão será lindo?!
                Ave! ireis da minha mocidade! —
               Sê benvindo, meu buço, sê benvindo!

              Mas... que é isto? Parece que entristeço?!
              Eh-lá, tristeza — eh-lá! eu te esconjuro!
              No dia dos meus anos... que lembrança!
              De que me lembrei eu? Do meu futuro!

     Do meu futuro...
                       José, traz-me um cigarro,
                 E de passagem o cognac e vinho.
                 ....................................................
               Vai ali perguntar, se é grega ou china
              A palavra — futuro, — ao meu vizinho.

                 ...................................................
                      É coisa, que há de vir?!...
                                Eu seja frade,
           Se em coisas que hão de vir tenho esperanças!
               Nasci... hei de viver!... sou fatalista,
              Não creio em contos de ninar crianças!

                Meu futuro é dormir sonos de fadas
              Sobre a grama dos prados e boninas, —
                  Andar aí com fome pelas ruas
              Mendigando os amores das meninas! —

                       Amor... falo em amor?...
                          Lembro-me agora,
               Eu já tive uns amores; — há dois anos,
                Amei uma donzela... inocentinha...
                Ela amava, comigo, a três maganos!

               Dois rivais para um? Não fui covarde,
                  Tive juízo, abandonei a praça:
               Vim para casa, fiz uns versos tristes,
                E d’aí... fui poeta... que desgraça.
Não... não quero na terra os meus amores,
                                        Os duelos às vezes fazem danos...
                                      É tão bom se viver... os dias passam...
                                       No fim de doze meses se faz anos!...

                                       Os amores de céu têm mais poesia,
                                        Ali pode-se amar a rédeas soltas;
                                     Lá no céu não há línguas de intrigantes,
                                     Como as línguas daqui... tão desenvoltas.

                                        A lua é uma cigana, arranja a vida
                                      Com tetéias de amor, se não me engano,
                                        Vale a pena pedí-la em casamento,
                                      Tenho uns modos assim... para cigano!

                                          Fumo cigarros, sei tocar viola,
                                      Canto modinhas, com requebro e graça,
                                         Para ser um cigano de mancheia
                                        Só me falta vender rimas na praça.

                                     Palavra de honra, (que no céu. Deus haja)
                                        Sinto dentro do crânio uma fragura!
                                          Ora, se a lua é fria como dizem,
                                        No colo da cigana... que frescura?!

                                         Ó lá de cima se te apraz um noivo,
                                         Um pobre doidivanas cá debaixo,
                                        Eu me apresento candidato a esposo,
                                        E no leito de amor o nome encaixo!

                                    Sou moço e pobre, — ouço missa às vezes:
                                      Chamo a tod’os ministros de tiranos!...
                                     Detesto o servilismo... (c’est dommage!)
                                       E fiz hoje afinal — vinte e dois anos.

                                        Se não recusas a proposta minha,
                                      Dize ao nédio Mafona e sempre ledo,
                                       Que se lembre da gente cá de baixo,
                                    Do seu mundo, — que vai que mete medo!

                                      Faz-me o favor levar-lhe estes folhetos,
                                       Dize ao profeta-maganão que os leia;
                                       E verá como a terra em sua ausência
                                     É mesmo um ostrum mulundum candeia*.

                                                                                 1859

* Frase plebéia em Maranhão; belo, está bonito, não se tem o que dizer. É um primor etc




                                              O senhor Papa-Suspiros
                                                   Cena cômica
Personagem: O senhor papa-suspiros
Representa um homem de 45 à 50 anos, vestido burlescamente.

A ação passa-se no Rio de Janeiro
Época: atualidade

                                  O teatro apresenta uma pequena praça
             À frente casas em perspectiva! À esquerda, um lampião. — É noite.

               Ao levantar-se o pano a personagem entra em cena pela direita

                                              Cena única

                                     O senhor Papa-Suspiros,
                        (Indo até o lampião cantarolando fanhosamente)

                                     Com jeito se leva o mundo,
                                      De tudo o jeito é capaz,
                                      O caso é ajeitar-se o jeito
                                      Como muita gente faz.1

  (Pára; tira de dentro do chapéu um grande ramo de flores, beija e o cheira com entusiasmo: vem à cena,
                                   torna a beijá-lo; e passeia vagaroso.)

                                      (Recita; é burlesco até o fim.)

                                                 (Rindo:)

                                  Ah-ah-ah! ah-ah-ah! Forte lembrança!
                                  Ora a gente também tem seus amores?!

                                       (Pára e se dirige à platéia:)

                                 E esta! que massada! pois um homem
                                Não tem alma também como os senhores?

                                                 (Canta)

                                         Amor é como defluxo
                                       De qualquer venta se apossa
                                        Sem dar contas ao nariz;
                                         Seja nariz de visconde,
                                       Ou de ministro ou de moça,
                                        Branco, escuro ou verniz.

                      (Pequena pausa; depois pergunta, cantando desentoadamente:)

                                           Sendo assim pois
                                        Quem se livra destes dois?

                                              (Passeando:)
Ah-ah-ah! ah-ah-ah! forte lembrança!
  Ora a gente também tem seus amores?
       (Beija o ramo com entusiasmo.)

                  (À platéia;)

 Eu me chamo o senhor Papa-Suspiros,
    Que é nome de família deste cujo;
   Já sonhei uma vez com o baronato,
   Apesar de me verem assim tão sujo:
  E moro num quartinho muito estreito,
   E não pago um vintém pela morada!
   Filante não sou eu! porém pergunto,
Há de um homem teimar com a namorada?

                 (Passeando:)

     Ah-ah-Ah! ah-ah-ah! forte lembrança!
     Oh que bela invenção, que bela idéia!

                  (À platéia:)

       Acreditem que a gente vive muito
       Quando sabe viver à custa alheia.

                 (Passeando:)

     Ah-ah-Ah! ah-ah-ah! forte lembrança!
     Oh que bela invenção, que bela idéia!

                  (À platéia:)

    Eu nasci p’ra viver à custa alheia,
   E vivo assim, assim meio contente;
  Pois se a gente nasceu para ser pobre
   É melhor ir vivendo assim a gente!

    Cada qual vai vivendo como pode,
  E porque foi com a gente a sorte avára
    Há de a gente fazer-se de soberba,
     E deixar de viver de meia-casa?!

                 (Passeando:)

     Ah-ah-Ah! ah-ah-ah! forte lembrança!
         Ora a gente tem seus amores!

                  (Á platéia:)

      Eu como, visto e bebo à custa delas,
      Que vida regalada, meus senhores!
(Passeando:)

    Ah-ah-Ah! ah-ah-ah! forte lembrança!
        Ora a gente tem seus amores!

                 (Á platéia:)

      Namoro a rapariga mais galante,
  Que meus olhos já viram sobre a terra;
  Quando penso em casar com a rapariga,
 Meu terno coração no peito (Forte) ber...ra!

                (Passeando:)

    Ah-ah-Ah! ah-ah-ah! forte lembrança!
 Nasce um homem também p’ra ser marido!
Oh que dia feliz! (À platéia) quando me lembro
      Tenho ânsias de ir como perdido!

                   (Canta)

       Com jeito se leva o mundo,
        De tudo o jeito é capaz,
        O caso é ajeitar-se o jeito
         Como muita gente faz.

                (Passeando:)

  Quero agora mandar fazer um fato.

                (Atoleimado:)

E então fui comprar dez réis de flores;

     (Mostrando o ramo para a platéia:)

 O ramo é o capital... o fato os juros,
Que me hão de pagar os meus amores.

       (Beija o ramo com entusiasmo:)

                (Passeando:)

    Ah-ah-Ah! ah-ah-ah! forte lembrança!
  Ora um homem também já compra flores?!

                 (À platéia:)

    Pois o caso é assim, comprei-lhe flores
   Faz-se um mimo de um ramo à rapariga,
    Depois... a gente pede qualquer coisa...
Não tem mais que dizer, — vendeu a espiga!

       Pois amor é assim, o mais é bucha,
         Eu cá sigo os amores desta laia.
       Para paio de amor sou muito pobre,
        Ela é mais rica, seja ela — paia!

                     (Canta:)

           Com jeito se leva o mundo
            De tudo o jeito é capaz,
           O caso é ajeitar-se o jeito
            Como muita gente faz.

      A gente é como é — diz o que pensa,
  Quem não pensa o que diz — faz como a gente,
      Põe-se aí a pregar sermão aos outros
     E pega — vai fazendo o que não sente.

       Namorar, namorar como eu namoro,
        Isto sim fica bem e a todos cabe;
        Não é andar aí quebrando cantos.

                (Rindo burlesco:)

     Suspirando de amor por quem não sabe!

            (Dentro batem 10 horas.)

          (Depois de contar as horas:)

      Já dez horas, Jesus! Não tarda a bicha!

                   (À platéia:)

       Ai! que tenho ciúmes dos senhores!

(Olhando com atenção para a platéia e camarotes.)

       Tanta gente... e que olhos curiosos
       Para a cena gentil de meus amores!

       Mas senhores, desejo a sós com ela,
      A minha namorada, os meus amores,
      Um momento ficar, para entregar-lhe.

                  (Mostrando:)

        Este raminho de inocentes flores.

      Como podem porém nos seus juízos,
     De nós — ambos fazer — idéia injusta,
       Eu lhes passo a contar um episódio
     Para que vejam — quanto a moça custa.

       (Canta ou recita ao som da música:)
A moça que eu amo
    Tem olhos de gata
     A cor da mulata,
      Cabelos de lã;
 Seus dentes são brancos,
  Seus lábios vermelhos,
 Que lembram dos velhos
      A calva louçã.

           **

   Só veste os vestidos
    À moda da França,
  Seu nome é ‘Sperança,
     Negaça de amor;
    ‘Svelta e gorducha
     Tem fina cintura,
     Na boca doçura,
      No hálito odor.

  Dez vezes lhe tenho
   Um beijo pedido,
  Não é meu marido,
— Responde, — e não dá!
  Se intento agarrá-la
   Me foge sorrindo,
   E eu fico fingindo,
 Dizendo-lhe que má!

           **

  Mas, amo esta moça,
 Que nega-me um beijo,
  E foge, e tem pejo,
  Se teimo em pedir;
   A moça, que fácil
  Consente o amante
  Beijá-la... adiante...
   Promete — cair.

           **

    Há dias, a furto,
   Beijei-a na orelha,
  Se fez tão vermelha
 Qual brasa em fogão!
 Que mal faz na orelha
 Beijar minha amante?
 Tornou-me — tratante,
Cachorro... vilão! (Forte)

           **

Que mal? Pois não sabe...
  Não sabe e calou-se!
A moça engasgou-se
       Com o fim da oração
        Fitou-me nos olhos
       — Em chamas ardidos;
         Os meus atrevidos
         Fitei-os no chão!

                **

       Já vem que essa moça
         ‘Stá fora de moda,
      Não cabe, não se engoda
       Com choros de amor!
      Já vêem meus senhores,
      Que a moça é inocente,
          Palavra da gente
           É toda pudor.

                **

Eu me chamo o senhor Papa-Suspiros
  Porque tenho vivido deste modo,
 Suspirando d’amor pela Esperança,
Criada a mais gentil do mundo todo!

          (Retirando-se:)

Ah-ah-Ah! ah-ah-ah! forte lembrança!
Ora a gente também tem na esperança!
1 Note-se que, na grafia da época, século XIX, jeito e ajeita-se grafavam-se com a letra gê, com o que o autor faria uma
sugestão psicológica entre “geito”, “ageita-se” e gente.

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  • 1. TIPOS BURLESCOS DESENHADOS POR BRUNO SEABRA Biblioteca portátil propriedade de Luiz V. Ferreira, Miguel V.Ferreira e Bruno Seabra Ao bacharel Duarte P. Schetel Introdução (no dia dos meus anos) Folguemos coração! Ainda agora Comecei a ser gente na existência! Vinte e dois anos só! Sou mesmo um noviço, Um jacinto de amor na adolescência! O buço desabrocha levemente, Que macio que vem, quão será lindo?! Ave! ireis da minha mocidade! — Sê benvindo, meu buço, sê benvindo! Mas... que é isto? Parece que entristeço?! Eh-lá, tristeza — eh-lá! eu te esconjuro! No dia dos meus anos... que lembrança! De que me lembrei eu? Do meu futuro! Do meu futuro... José, traz-me um cigarro, E de passagem o cognac e vinho. .................................................... Vai ali perguntar, se é grega ou china A palavra — futuro, — ao meu vizinho. ................................................... É coisa, que há de vir?!... Eu seja frade, Se em coisas que hão de vir tenho esperanças! Nasci... hei de viver!... sou fatalista, Não creio em contos de ninar crianças! Meu futuro é dormir sonos de fadas Sobre a grama dos prados e boninas, — Andar aí com fome pelas ruas Mendigando os amores das meninas! — Amor... falo em amor?... Lembro-me agora, Eu já tive uns amores; — há dois anos, Amei uma donzela... inocentinha... Ela amava, comigo, a três maganos! Dois rivais para um? Não fui covarde, Tive juízo, abandonei a praça: Vim para casa, fiz uns versos tristes, E d’aí... fui poeta... que desgraça.
  • 2. Não... não quero na terra os meus amores, Os duelos às vezes fazem danos... É tão bom se viver... os dias passam... No fim de doze meses se faz anos!... Os amores de céu têm mais poesia, Ali pode-se amar a rédeas soltas; Lá no céu não há línguas de intrigantes, Como as línguas daqui... tão desenvoltas. A lua é uma cigana, arranja a vida Com tetéias de amor, se não me engano, Vale a pena pedí-la em casamento, Tenho uns modos assim... para cigano! Fumo cigarros, sei tocar viola, Canto modinhas, com requebro e graça, Para ser um cigano de mancheia Só me falta vender rimas na praça. Palavra de honra, (que no céu. Deus haja) Sinto dentro do crânio uma fragura! Ora, se a lua é fria como dizem, No colo da cigana... que frescura?! Ó lá de cima se te apraz um noivo, Um pobre doidivanas cá debaixo, Eu me apresento candidato a esposo, E no leito de amor o nome encaixo! Sou moço e pobre, — ouço missa às vezes: Chamo a tod’os ministros de tiranos!... Detesto o servilismo... (c’est dommage!) E fiz hoje afinal — vinte e dois anos. Se não recusas a proposta minha, Dize ao nédio Mafona e sempre ledo, Que se lembre da gente cá de baixo, Do seu mundo, — que vai que mete medo! Faz-me o favor levar-lhe estes folhetos, Dize ao profeta-maganão que os leia; E verá como a terra em sua ausência É mesmo um ostrum mulundum candeia*. 1859 * Frase plebéia em Maranhão; belo, está bonito, não se tem o que dizer. É um primor etc O senhor Papa-Suspiros Cena cômica
  • 3. Personagem: O senhor papa-suspiros Representa um homem de 45 à 50 anos, vestido burlescamente. A ação passa-se no Rio de Janeiro Época: atualidade O teatro apresenta uma pequena praça À frente casas em perspectiva! À esquerda, um lampião. — É noite. Ao levantar-se o pano a personagem entra em cena pela direita Cena única O senhor Papa-Suspiros, (Indo até o lampião cantarolando fanhosamente) Com jeito se leva o mundo, De tudo o jeito é capaz, O caso é ajeitar-se o jeito Como muita gente faz.1 (Pára; tira de dentro do chapéu um grande ramo de flores, beija e o cheira com entusiasmo: vem à cena, torna a beijá-lo; e passeia vagaroso.) (Recita; é burlesco até o fim.) (Rindo:) Ah-ah-ah! ah-ah-ah! Forte lembrança! Ora a gente também tem seus amores?! (Pára e se dirige à platéia:) E esta! que massada! pois um homem Não tem alma também como os senhores? (Canta) Amor é como defluxo De qualquer venta se apossa Sem dar contas ao nariz; Seja nariz de visconde, Ou de ministro ou de moça, Branco, escuro ou verniz. (Pequena pausa; depois pergunta, cantando desentoadamente:) Sendo assim pois Quem se livra destes dois? (Passeando:)
  • 4. Ah-ah-ah! ah-ah-ah! forte lembrança! Ora a gente também tem seus amores? (Beija o ramo com entusiasmo.) (À platéia;) Eu me chamo o senhor Papa-Suspiros, Que é nome de família deste cujo; Já sonhei uma vez com o baronato, Apesar de me verem assim tão sujo: E moro num quartinho muito estreito, E não pago um vintém pela morada! Filante não sou eu! porém pergunto, Há de um homem teimar com a namorada? (Passeando:) Ah-ah-Ah! ah-ah-ah! forte lembrança! Oh que bela invenção, que bela idéia! (À platéia:) Acreditem que a gente vive muito Quando sabe viver à custa alheia. (Passeando:) Ah-ah-Ah! ah-ah-ah! forte lembrança! Oh que bela invenção, que bela idéia! (À platéia:) Eu nasci p’ra viver à custa alheia, E vivo assim, assim meio contente; Pois se a gente nasceu para ser pobre É melhor ir vivendo assim a gente! Cada qual vai vivendo como pode, E porque foi com a gente a sorte avára Há de a gente fazer-se de soberba, E deixar de viver de meia-casa?! (Passeando:) Ah-ah-Ah! ah-ah-ah! forte lembrança! Ora a gente tem seus amores! (Á platéia:) Eu como, visto e bebo à custa delas, Que vida regalada, meus senhores!
  • 5. (Passeando:) Ah-ah-Ah! ah-ah-ah! forte lembrança! Ora a gente tem seus amores! (Á platéia:) Namoro a rapariga mais galante, Que meus olhos já viram sobre a terra; Quando penso em casar com a rapariga, Meu terno coração no peito (Forte) ber...ra! (Passeando:) Ah-ah-Ah! ah-ah-ah! forte lembrança! Nasce um homem também p’ra ser marido! Oh que dia feliz! (À platéia) quando me lembro Tenho ânsias de ir como perdido! (Canta) Com jeito se leva o mundo, De tudo o jeito é capaz, O caso é ajeitar-se o jeito Como muita gente faz. (Passeando:) Quero agora mandar fazer um fato. (Atoleimado:) E então fui comprar dez réis de flores; (Mostrando o ramo para a platéia:) O ramo é o capital... o fato os juros, Que me hão de pagar os meus amores. (Beija o ramo com entusiasmo:) (Passeando:) Ah-ah-Ah! ah-ah-ah! forte lembrança! Ora um homem também já compra flores?! (À platéia:) Pois o caso é assim, comprei-lhe flores Faz-se um mimo de um ramo à rapariga, Depois... a gente pede qualquer coisa...
  • 6. Não tem mais que dizer, — vendeu a espiga! Pois amor é assim, o mais é bucha, Eu cá sigo os amores desta laia. Para paio de amor sou muito pobre, Ela é mais rica, seja ela — paia! (Canta:) Com jeito se leva o mundo De tudo o jeito é capaz, O caso é ajeitar-se o jeito Como muita gente faz. A gente é como é — diz o que pensa, Quem não pensa o que diz — faz como a gente, Põe-se aí a pregar sermão aos outros E pega — vai fazendo o que não sente. Namorar, namorar como eu namoro, Isto sim fica bem e a todos cabe; Não é andar aí quebrando cantos. (Rindo burlesco:) Suspirando de amor por quem não sabe! (Dentro batem 10 horas.) (Depois de contar as horas:) Já dez horas, Jesus! Não tarda a bicha! (À platéia:) Ai! que tenho ciúmes dos senhores! (Olhando com atenção para a platéia e camarotes.) Tanta gente... e que olhos curiosos Para a cena gentil de meus amores! Mas senhores, desejo a sós com ela, A minha namorada, os meus amores, Um momento ficar, para entregar-lhe. (Mostrando:) Este raminho de inocentes flores. Como podem porém nos seus juízos, De nós — ambos fazer — idéia injusta, Eu lhes passo a contar um episódio Para que vejam — quanto a moça custa. (Canta ou recita ao som da música:)
  • 7. A moça que eu amo Tem olhos de gata A cor da mulata, Cabelos de lã; Seus dentes são brancos, Seus lábios vermelhos, Que lembram dos velhos A calva louçã. ** Só veste os vestidos À moda da França, Seu nome é ‘Sperança, Negaça de amor; ‘Svelta e gorducha Tem fina cintura, Na boca doçura, No hálito odor. Dez vezes lhe tenho Um beijo pedido, Não é meu marido, — Responde, — e não dá! Se intento agarrá-la Me foge sorrindo, E eu fico fingindo, Dizendo-lhe que má! ** Mas, amo esta moça, Que nega-me um beijo, E foge, e tem pejo, Se teimo em pedir; A moça, que fácil Consente o amante Beijá-la... adiante... Promete — cair. ** Há dias, a furto, Beijei-a na orelha, Se fez tão vermelha Qual brasa em fogão! Que mal faz na orelha Beijar minha amante? Tornou-me — tratante, Cachorro... vilão! (Forte) ** Que mal? Pois não sabe... Não sabe e calou-se!
  • 8. A moça engasgou-se Com o fim da oração Fitou-me nos olhos — Em chamas ardidos; Os meus atrevidos Fitei-os no chão! ** Já vem que essa moça ‘Stá fora de moda, Não cabe, não se engoda Com choros de amor! Já vêem meus senhores, Que a moça é inocente, Palavra da gente É toda pudor. ** Eu me chamo o senhor Papa-Suspiros Porque tenho vivido deste modo, Suspirando d’amor pela Esperança, Criada a mais gentil do mundo todo! (Retirando-se:) Ah-ah-Ah! ah-ah-ah! forte lembrança! Ora a gente também tem na esperança!
  • 9. 1 Note-se que, na grafia da época, século XIX, jeito e ajeita-se grafavam-se com a letra gê, com o que o autor faria uma sugestão psicológica entre “geito”, “ageita-se” e gente.