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PRINCÍPIOS BIOMECÂNICOS RELACIONADOS
AO PLANEJAMENTO DE INTERVENÇÕES EM
AMBIENTE OCUPACIONAL
Parte III
Conteudista
Prof.ª Dr.ª ROBERTA DE FÁTIMA CARREIRA M. PADOVEZ
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1. INTRODUÇÃO
A Biomecânica Ocupacional, segundo Chaffin (2001), é o estudo da
interação física entre trabalhadores e seus instrumentos, máquinas e materiais
com o objetivo de aumentar a performance e reduzir os riscos de distúrbios
musculoesqueléticos. Para Iida (2005), a Biomecânica Ocupacional ocupa-se
basicamente da questão das posturas corporais no trabalho e aplicação de
forças as quais estão relacionadas ao tipo de trabalho muscular, estático ou
dinâmico, e aos tipos de alavancas existentes no corpo humano durante a
execução dos movimentos.
Os esforços dinâmicos estão relacionados a deslocamentos, transportes
de cargas e uso de escadas. Ao passo que os esforços estáticos ocorrem
durante sustentação de cargas externas ou por meio da adoção de posturas
inadequadas e com restrições de movimento, podendo ocasionar lesões
articulares e no disco intervertebral.
Durante a realização de trabalhos na postura sentada, a maior parte dos
músculos posturais está relaxada, ocorrendo trabalho muscular estático apenas
na cintura escapular, com o objetivo de mantê-la estável. A postura sentada
determina um aumento da pressão intradiscal e de tensão nos ligamentos que
implica em risco aumentado para o desenvolvimento de hérnia de disco.
Estudos importantes realizados por Marras (1997) demonstraram que as
cargas impostas à coluna, considerando-se o tronco ereto, são sempre maiores
na postura sentada que na em pé.
A maior parte dos casos de lombalgia entre trabalhadores é atribuída à
postura estática e posturas que envolvem uma sobrecarga excessiva pelo
manuseio de cargas associado a movimentos frequentes de flexão do tronco.
Para compreendermos melhor a forma como ferramentas e postos de
trabalhos inadequados provocam estresses musculares, dores e fadiga e
conseguirmos realizar intervenções com maiores chances de sucesso é
necessário dominarmos alguns conceitos básicos, como veremos a seguir.
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2. POSTURA
Postura é a combinação das posições das diferentes articulações do
corpo num dado momento. A postura correta é a posição na qual um mínimo
de estresse é aplicado em cada articulação (MAGEE, 2002).
A postura correta consiste no alinhamento do corpo com eficiência
fisiológica e biomecânica máximas, o que minimiza os estresses e as
sobrecargas impostas ao sistema musculoesquelético devido à ação da
gravidade.
Gardiner define a postura como a atitude assumida pelo corpo, podendo
ser uma postura ativa ou inativa. A postura inativa é aquela que demanda a
mínima ação dos músculos responsáveis pela manutenção das funções
corporais essenciais, tais como a respiração e batimentos cardíacos. Já a
postura ativa é aquela que se mantém por meio da ação coordenada de vários
músculos para conseguir estabilidade.
A postura ativa estática é mantida pela interação de grupos musculares
com o objetivo de estabilizar as articulações contra a gravidade. A postura ativa
dinâmica forma uma base eficiente para o movimento. Nesse caso, a postura é
modificada constantemente como resultado disso, sendo que a intensidade e
distribuição do trabalho muscular necessário dependem do padrão postural e
das características do indivíduo que a assume. A maioria das fibras dos
músculos anti-gravitacionais são do tipo I, ou seja, fibras oxidativas lentas que
são resistentes à fadiga e desempenham contração eficiente com mínimo gasto
enérgetico.
Parado ou em movimento, o corpo mantém sua postura pela ação
dinâmica de forças aplicadas sobre ossos e músculos. A postura ideal é aquela
onde essas forças sustentam e conduzem o corpo sem gerar sobrecargas, com
a máxima eficiência e o mínimo de esforço. A manutenção da postura é o
resultado de ações musculares contínuas que compensam o efeito da
gravidade e de forças externas desequilibradoras, mantêm o equilíbrio e
contribuem decisivamente para a manutenção de nossa consciência têmporo-
espacial. A postura é considerada como ruim ou inadequada quando é ineficaz,
ou seja, quando não atinge a finalidade a que se destinava ou quando uma
grande força muscular é necessária para mantê-la. Isso porque, um mau
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alinhamento dos segmentos corporais requer um trabalho muscular adicional
para manter o equilíbrio.
Assim, como consequência das posturas inadequadas, surge a dor que é
ocasionada devido à sobrecarga mecânica gerada sobre o sistema
musculoesquelético. Além da dor, outra consequência prejudicial decorrente da
adoção de posturas inadequadas por períodos prolongados é o
desenvolvimento de desequilíbrios de força e flexibilidade muscular que pode
evoluir para encurtamento adaptativo dos músculos agonistas e fraqueza
muscular dos antagonistas .
Durante a vida adulta as alterações nos tecidos moles ocorrem de forma
adaptativa a fatores ambientais (OLIVER & MIDDLEDITCH, 1998). Tensões
mecânicas como as determinadas por posturas prolongadas assimétricas tem
um efeito marcante sobre os músculos e tecidos moles. Com isso, ocorre
produção aumentada de fibroblastos e de colágeno o que pode ocasionar
perda da elasticidade do músculo. A dor localizada, fraqueza muscular,
estresses ocupacionais e tensão localizada sem finalidade reduzem a eficiência
das contrações musculares e prejudica o desempenho da atividade laboral ou
atlética.
3. EQUILÍBRIO
Em termos mecânicos, pode-se dizer que um corpo está em equilíbrio
quando as diversas forças que agem sobre ele estão em direções opostas e se
anulam. O equilíbrio pode ser estático ou dinâmico.
A condição de equilíbrio estático é atingida quando a resultante e o
momento resultante de todas as forças que atuam sobre ele forem igual a zero.
A aplicação fisiológica do equilíbrio musculoesquelético se manifesta por
meio das respostas biomecânicas do sistema musculoesquelético quando se
está em pé, caminhando, sentando e realizando outros movimentos. A
estabilidade e o equilíbrio estão relacionados com a matemática do centro de
gravidade do corpo.
O equilíbrio consiste em manter o centro de gravidade (CG) dentro de
uma base de suporte que proporcione maior estabilidade nos segmentos
corporais, durante situações estáticas e dinâmicas (FARIA, 2003).
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4. CENTRO DE GRAVIDADE
Definições:
Lehmkuhl & Smith (1989): único ponto de um corpo ao redor do qual
todas as partículas de sua massa estão igualmente distribuídas;
Watkins (2001): ponto através do qual a linha de ação do peso de um
objeto atua, independentemente da posição do objeto;
Okuno & Fratin (2003): local em um corpo onde é aplicado a resultante
das forças peso, como se toda a massa do corpo estivesse concentrada neste
ponto.
Compreensão do Centro de Gravidade (CG)
Para entendermos a aplicabilidade prática do CG podemos utilizar do
racicínio apresentado por Okuno & Fratin (2003) que aponta os 3 seguintes
fatores:
1-) Um corpo pode ser considerado como sendo composto por pequenos
segmentos.
2-) O peso resultante deste corpo corresponde ao somatório das forças
peso que atuam em cada um deste segmentos.
3-) O local onde é aplicada a resultante das forças peso é o centro de
gravidade.
Considerando a posição anatômica, pode-se considerar que o centro de
gravidade do homem está localizado a aproximadamente 54%, de sua
estatura, quando medida a partir do solo. O CG localiza-se sobre a linha
gravitacional, que é definida como a linha imaginária que passa pelo centro de
gravidade no sentido vertical até o solo.
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Fonte:http://edwardcho-sph3u.blogspot.com/2010/09/what-is-centre-of-gravity.html
5. CENTRO DE MASSA
O centro de massa pode ser definido como o ponto de equilíbrio, um
local no qual todas as partículas do objeto estão igualmente distribuídas.
É importante lembrar que o centro de massa nem sempre coincide com
o centro de gravidade. Dependendo da situação, o centro de gravidade pode se
localizar externamente ao corpo ao passo que o centro de massa não.
A diferença essencial entre os dois conceitos está no fato de que o
centro de massa é uma medida da cinética, ao passo que o centro de
gravidade é uma medida da cinemática.
O Centro de Massa dos segmentos corporais pode ser determinado em
função do comprimento segmentar. A tabela abaixo, elaborada pelo Professor
Felipe Carpes, apresenta as porcentagens relativas ao peso corporal total dos
segmentos corporais.
PESOS RELATIVOS (%)
Braune e Fischer
(1889)
Dempster
(1955)
Clauser
et al.
(1969)
Zatsiorski
(1988)
Universidade
de Colônia
Cabeça 7,1 8,1 7,3 6,94 7,8
Tronco 46,1 49,7 50,7 43,46 51,0
Braço 3,3 2,8 2,6 2,71 2,7
Antebraço 2,1 1,6 1,6 1,62 1,6
Mão 0,8 0,6 0,7 0,61 0,6
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Antebraço + mão 2,9 2,2 2,3 2,23 2,2
Coxa 10,7 10,0 10,3 14,16 9,7
Perna 4,8 4,6 4,3 4,33 4,6
Pé 1,7 1,5 1,5 1,37 1,4
Perna + pé 6,5 6,1 5,8 5,70 6,0
Fonte: Apresentação Carpes
6. A POSTURA E O CENTRO DE GRAVIDADE
O corpo é continuamente atraído pela força da gravidade. A sustentação
dos segmentos corporais em qualquer postura requer o desempenho de forças
antigravitacionais que são desempenhadas pelos músculos.
O centro de gravidade do corpo humano tem sua localização determinada
pela resultante entre estas forças opostas que atuam sobre os segmentos
corporais.
A localização do centro de gravidade do corpo humano depende da
orientação dos segmentos corporais. Em posição ereta, o centro de gravidade
é central e está situado a uma altura que corresponde a aproximadamente 54%
da altura do indivíduo. Posturas inadequadas deslocam o centro de gravidade e
isso gera uma sobrecarga muscular adicional.
Diagrama do centro de gravidade do corpo em suas diversas posturas. Fonte:
MORAES (1992)
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O núcleo do centro de gravidade do equilíbrio situa-se na região do
tronco. As oscilações do tronco permitem que ele seja mantido acima da base
de sustentação. Controlado pela musculatura tônica, ele se desloca
inconscientemente em todos os planos: horizontal, sagital e frontal.
Fonte:Chaffin, 2001.
A musculatura extensora deve atuar no sentido de equilibrar a tendência à
rotação anterior do corpo que é gerada pela postura apresentada na figura
acima, durante o manuseio da carga. Quanto maior a carga manuseada, maior
será essa tendência à rotação e, portanto, maior a exigência imposta aos
músculos da cadeia posterior, discos intervertebrais e ligamentos.
Para verificar o estado de equilíbrio de um corpo deve-se verificar como a
força peso exerce torque sobre o eixo de rotação (ponto de apoio). No caso da
linha de ação da força peso ser aplicada sobre o eixo de rotação não ocorrerá
movimento, pois sobre o eixo não há torque.
Fonte: Okuno e Fratin (2003)
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7. SÍNTESE PARA APLICAÇÃO PRÁTICA DOS CONCEITOS
APRENDIDOS NA ROTINA OCUPACIONAL
Para os trabalhos realizados na postura sentada, os seguintes fatores
devem ser considerados:
Comparação das diferentes posturas – Sentado. Fonte: Chaffin,2001
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Para os trabalhos realizados na postura em pé, deve-se considerar:
Comparação das diferentes posturas – Em pé. Fonte: Chaffin, 2001.
Vimos que o objetivo principal da Biomecânica Ocupacional é estudar as
interações entre o trabalho e o homem sob o ponto de vista dos movimentos
realizados pelo sistema musculoesquelético e as consequências resultantes
desses movimentos e da exposição determinada pelo ambiente ocupacional
como tensões musculares, dores e fadiga provocados por:
Produtos inadequados,
Postos de trabalho inadaptáveis,
Instrumentos incompatíveis.
A partir de diferentes dimensões de análise, baseada no estudo de:
Posturas Corporais
Aplicação de Forças
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Desta forma, o profissional ergonomista pode atuar buscando atingir os
seguintes objetivos:
Reduzir as exigências biomecânicas das tarefas
Possibilitar uma postura confortável (liberdade de movimentos)
Facilitar a percepção visual (zonas de visão)
Proporcionar o fácil o manuseio dos componentes do posto
(zonas de alcance)
Otimizar o trabalho em grupo e as relações sociais
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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1995.
GRANDJEAN E. Fitting the task to the man. A textbook of occupational
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2ª edição,Manole, 2008.
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São Paulo – SP, 2005.
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Paulo: Manole; 1989. .
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Musculoesquelética. 3ª edição, São Paulo: Manole, 2002, p.105-157.
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OKUNO E, FRATIN L. Desvendando a física do corpo humano:
Biomecânica. Editora Manole, SP, 2003.
MARTINI F. Fundamentals of anatomy and physiology. Simon & Schuster,
1995.
WATKINS J. Estrutura e função do sistema musculoesquelético. ArtMed,
2001.