1. Adérito Esteves
Urbanismo: conjunto das
ques tões relativas à organiza-ção
e ao planeamento das ci-dades
e à sua evolução, incluin -
do a adaptação destas às ne-cessidades
dos seus habitantes.
Esta é a definição dada pelo di-cionário
da língua portuguesa
para uma palavra inventada
no final do século XIX.
Mais tarde, em 1949, foi insti-tuído
o Dia Mundial do Urba-nismo.
De forma a assinalar a pas-sagem
dos 65 anos da criação
deste dia – que se celebra ama-nhã
-, o Diário de Aveiro foi ten-tar
perceber a importância que
SEXTA-FEIRA | 7 NOV 2014 | 13
o urbanismo assume na socie-dade.
A iniciativa de se começar a
assinalar esta data partiu da
Organização Internacional do
Dia Mundial do Urbanismo, se-diada
em Buenos Aires (Argen-tina),
com o objectivo de alertar
a população para a importân-cia
de atingir um equilíbrio en-tre
a “trilogia de elementos na-turais
essenciais à vida huma -
na: o sol, a vegetação e o ar –
patentes no símbolo criado
para o efeito.
José Carlos Mota, docente da
Universidade de Aveiro muito
Destaque
ligado a questões de planea-mento
do território, não tem
dúvidas: “cada vez mais im-portante”
discutir questões re-lacionadas
com o urbanismo
(ver entrevista).
O mesmo docente acredita
que” faz falta discutir o que
queremos das cidades”, defen-dendo
a necessidade de a po-pulação
deixar de ser “reactiva”
e “tentar perceber de que for -
ma conseguimos criar condi-ções
para poder sonhar com a
cidade que queremos e quais
os valores e princípios que
queremos que ela tenha”. |
“A regeneração do centro da cidade
devia ser uma das prioridades”
Diário de Aveiro: A palavra
urbanismo remonta ao final
do século XIX. Que mudan-ças
surgiram entretanto?
José Carlos Mota: A palavra
“urbanismo” tem dois sentidos
distintos: surge como a ciência
que planeia e ordena as cida-des;
e também surge associada
à actividade de transformação
física das cidades. Centran do-me
no conceito de urbanismo
enquanto a ciência que pensa
as cidades, houve uma inter-venção
muito ligada à edifica-ção
e ao espaço público. Nas
últimas décadas houve gran de
investimento na infra-estrutu-ração
física da cidade – na
construção de equipamentos
culturais, desportivos, etc. – e,
sobretudo, uma grande expan-são
da cidade. A forma como a
cidade foi crescendo marcou
muito o urba nismo dos últimos
anos. Hoje, temos um dilema:
o que fazer com esta expansão
urbana. O facto de a cidade ter
crescido, fez-nos desvalorizar
os centros mais antigos, e as
pré-existências. E, do ponto de
vista económico e social, a frag-mentação
tornou estes centros
mais debilitados e frágeis. Mui-tas
vezes, ficaram ali as funções
menos nobres, as pessoas com
mais dificuldades económicas
e os grupos sociais mais des-favorecidos.
E há a necessidade
de repensar o que queremos
da cidade co mo um todo. Hoje,
discute-se como nos podemos
organizar colectivamente para
dar vida social e económica às
cidades. E isto implica outras
mudanças.
A que tipo de mudanças se
refere?
Uma mudança na forma como
se faz o planeamento das cida-des.
Mais do que investir e
construir infra-estruturas físi-cas,
deve investir-se na organi-zação
das instituições e das co-munidades
para tirar partido
daquelas que criámos. Vamos
ter de nos organizar para valo-rizar
os recursos de que dispo-mos
nos centros das cidades e
para os tornar mais saudáveis,
ricos e vividos. Ou seja, fazer
um reencontro com aquilo que
era a importância destes pon-tos
no passado, para lhes dar-mos
vida outra vez.
Qual a importância de se as-sinalar
este dia?
A data serve, sobretudo, para
chamar a atenção para a im-portância
de cuidar bem das
cidades e daquilo que é a con-vivência
em comunidade. A
forma como usamos as cida-des
tem mostrado que elas não
têm sido bem tratadas. E isso
vê-se também no facto de cada
vez usarmos menos o espaço
público e mais o espaço pri-vado.
Este dia serve para lem-brar
a importância de questio-narmos
o que queremos das
nossas cidades e discutir o que
podemos fazer para ir ao en-contro
dos nossos desejos.
Actualmente, as autarquias
têm departamentos de urba -
nismo e há cada vez mais cur-sos
superiores nessa área.
Continua a ser importante?
É cada vez mais importante.
Em termos profissionais, ela é
muito importante, porque pre-cisamos
destas competências
e de qualificar as respostas e a
forma como planeamos as ci-dades.
Olhan do para o passa -
do, vemos que cometemos al-guns
erros. E temos de investi-gar
e criar novas metodologias
para responder aos problemas
que fomos criando, e para re-conhecer
que algumas meto-dologias
do passado não foram
as mais eficazes. Nós precisa-mos
de formar pessoas com
qualidade.
Qual é a situação actual do
urbanismo de Aveiro?
O planeamento do urbanismo
da cidade de Aveiro padece de
dois problemas: a inexistência
de recursos financeiros para
poder concretizar muitos dos
projectos que existem; e a ne-cessidade
de os agentes eco-nómicos,
sociais e os do co-nhecimento
se mobilizarem,
em torno da necessidade de se
dar vida, animar e dar quali-dade
aos espaços da nossa ci-dade.
Mais do que intervir no
espaço público e nas infra-es-truturas
é preciso intervir na
forma como podemos, melho-rando
o espaço público, torná-lo
fruído e fazer com que ele
tenha actividades. Por exemplo,
a Rua Direita foi requalificada,
mas hoje precisa de uma vida
– económica, social, de habita-ção.
Isto significa que os ins-trumentos
que tivemos no pas-sado
para transformar a cidade
precisam de ter outro tipo de
preocupações. Essa tarefa vai
exigir tem po e atenção, mas
pode ser mui to rica porque, em
Aveiro, há actores com uma
enorme capacidade – na área
económica, na tecnológica, na
artística, na cívica. Neste mo-mento,
o desafio é sentar os ac-tores
à mesa, dialogar e mobi-lizá-
los para a revitalização da
cidade.
Quais são as mudanças mais
urgentes em Aveiro?
A urgência maior é perceber o
que é que Aveiro pode oferecer
de diferente, relativamente a
outras cidades. Aveiro tem po-tencial
em vários domínios que
a tornam única, e precisamos
de reconhecer quais são esses
domínios. Em Aveiro, temos
um conjunto de recursos na
área das TICE [Tecnologias de
Informação, Comunicação e
Ele ctrónica] que são únicos no
país – a PT Inovação, tudo que
a Universidade oferece relacio-nado
com a investigação e en-sino
na área das telecomuni-cações,
empresas de renome
na área das tecnologias, asso-ciações
empresariais ligadas às
TICE. Dificilmente encontra-mos
em Portugal outra cidade
que tenha estes recursos na
área tecnológica. A cidade po-dia
constituir-se como um es-paço
de valorização do seu po-tencial
de conhecimento e ino-vação
ligada a esta área. E exis-tem
outros potenciais no do-mínio
artístico (ligados ao de-sign)
que começam a ganhar
actividade relevante. E, claro,
no domínio dos projectos em-presariais
ligados à mobilidade
suave. À bicicleta. Este é um do-mínio
que a região e a cidade
podiam explorar, quer pelas
condições que ela tem, quer pe-los
empreendedores que ela
gerou neste domínio.
Como é que esses recursos
podem ajudar a regenerar a
cidade?
O projecto de regeneração do
centro da cidade devia ser uma
das prioridades. Saber o que
queremos fazer com o centro
da cidade. Precisamos de per-ceber
como é que podemos
dotar os espaços físicos de
uma nova vida social e econó-mica,
e fazer com que eles vol-tem
a ser espaços centrais da
cidade. E, depois, temos de per-ceber
co mo podemos mobili-zar
os recursos que são únicos
para valorizar a cidade. Estes
pequenos passos não são mui -
to exigentes do ponto de vista
do investimento público. São
actividades de reflexão, de pla-neamento.
E, em terceiro nível,
tem de se passar para a utili-zação
dos fundos estruturais
que permitam juntar estes dois
exercícios. |
Ainda faz sentido lembrar
o urbanismo no século XXI?
Efeméride 8 de Novembro é o Dia Mundial do Urbanismo. Fomos em busca
das razões para a existência da data
PAULO RAMOS