Slides usados em palestra ministrada em 15/12/2015 na ASTE - Associação de Seminários Teológicos Evangélicos, por ocasião do SImpósio Anual, este ano realizado em São Paulo, SP
Educação Teológica e Novas Mídias: Um Novo Paradigma
1. A Tecnologia e a Educação Teológica:
Sustentação, Suplementação ou Suplantação
do Paradigma?
Eduardo Chaves
[Ph.D. (Filosofia), University of Pittsburgh, 1972; M.Div., Pittsburgh Theological
Seminary, 1970; B.Div., Pittsburgh Theological Seminary, 1967]
[Professor Titular de Filosofia da Educação (Aposentado), Universidade Estadual de
Campinas (UNICAMP), 1972-2006; Professor de Educação, Centro Universitário
Salesiano de São Paulo (UNISAL), 2009-presente; Professor de História da Igreja,
Faculdade de Teologia da IPIB (FATIPI), 2014-presente]
2. A Educação Teológica e as Novas Mídias
• Tema do simpósio: Educação Tecnológica e Novas Mídias
• Não é meu objetivo discutir, nesta palestra, o possível impacto das
novas mídias:
• Na teologia como disciplina acadêmica
• Na vida profissional do egresso do curso de teologia, pastor ou não
• Na gestão da igreja ou de outras instituições em que o egresso do
curso de teologia possa vir a atuar
• Meu objetivo geral é discutir se as novas mídias terão impacto
significativo na educação teológica - e, em caso positivo, qual seria
esse impacto
• Meu objetivo específico é discutir se as novas mídias sustentam,
suplementam ou suplantam (subvertem) o paradigma vigente na
educação teológica atual
3. Dois Pressupostos
• Não é possível discutir o possível impacto das novas mídias na
educação teológica sem discutir, antes, o seu possível impacto
na educação, em geral, da qual a educação teológica é caso
particular
• Não é possível discutir a educação, hoje, e, por conseguinte, a
educação teológica, sem introduzir a questão do paradigma, ou
modelo mental, que temos dela
4. Três Teses
• A educação atual, e, a fortiori, a educação teológica atual, são
governadas por um paradigma, ou modelo mental, bem definido,
o qual, por ser tão enraizado, o mais das vezes nem é percebido
como tal
• Tecnologias, como é o caso das novas mídias, frequentemente
são fatores de mudança, mas como condições necessárias (sem
as quais não), nunca como condições suficientes (que, por si só,
as concretizam, como se fosse ex opere operato), porque o ser
humano é o único real agente de mudança
• A característica mais importante das novas mídias é seu caráter
interativo, que torna possível que pessoas entrem em contato
com pessoas de forma instantânea, em qualquer momento (any
time), a partir de (quase) qualquer lugar (anywhere), em várias
modalidades de comunicação (anyhow)
5. O Paradigma da Educação Atual - 1
• Características básicas:
• Textocêntrico
• Magistrocêntrico
• Escolacêntrico
6. O Paradigma da Educação Atual - 2
• Textocentrismo: a educação é um processo de transmissão dos
conteúdos principais de uma cultura letrada, preexistentes na
forma de textos, de uma geração para a outra, de modo a garantir
sua aceitação geral e perpetuidade ou, então, durabilidade
• Magistrocentrismo: Para alcançar o maior número de pessoas, a
educação precisa ser organizada no modelo um-para-muitos,
ficando a cargo de mestres que se responsabilizam por classes de
certo número de alunos e lhes ensinam (expõem e explicam) o
material a ser aprendido, os mestres se organizando em escolas
• Escolacentrismo: Nas escolas o conteúdo a ser ensinado é dividido
em matérias que, por sua vez, são divididas em séries, e os alunos
são agrupados por faixa etária e colocados na série mais adequada
à sua maturidade ou aos seus conhecimentos, tudo debaixo da
coordenação de diretores e supervisores
7. Contexto do Surgimento do Paradigma
• A cultura letrada, baseada na escrita e no texto impresso como
produto de massa, que começou a aparecer na
• Renascença (século XV):
• Um recomeço, ênfase na retomada da cultura clássica escrita
• Invenção da prensa de tipo móvel de Gutenberg (1455) permitiu a
distribuição de cópias idênticas de livros e outros textos em massa
• O livro é o primeiro produto de massa da história (Marshall McLuhan)
• Reforma (século XVI):
• Tradução da Bíblia para a língua do povo
• Desintermediação do acesso à Bíblia: o sacerdócio universal do crente
lhe dá o direito de interpretar a Bíblia sem o magisterium da Igreja
• Para isso o crente precisa ser capaz de ler e compreender a Bíblia
• Para que isso aconteça é necessário que haja instituições capazes de
promover o letramento do povo: as escolas ao lado das igrejas
• Assim surge a escola moderna, que introduz o paradigma ainda vigente
8. Consequências desse Paradigma
• Sistematização das línguas vernáculas
• Surgimento de literaturas no vernáculo
• Fortalecimento no povo que compartilha a língua, a literatura e a
cultura de um sentimento de nacionalidade e de uma consciência
nacional que vão se tornar importantes no aparecimento posterior
dos estados nacionais modernos
• Aumento da comunicação entre intelectuais, facilitando a troca de
ideias, o surgimento da ciência moderna e, oportunamente, o
aparecimento do “Iluminismo” e a crítica à religião dita revelada
• Criação do clima intelectual / emocional que foi essencial para a
ocorrência da Revolução Americana e Francesa, o aparecimento de
uma literatura de político-filosófica que acabou por alimentar o
surgimento dos estados nacionais modernos
9. O Paradigma da Educação Teológica
• Há pouca dúvida de que a Educação Teológica segue, no essencial,
o paradigma vigente na educação geral, apresentando todas as
características que foram sublinhadas
• Ou nossas Faculdades de Teologia e Seminário não são centradas
em disciplinas acadêmicas, nas quais os professores buscam se
especializar?
10. As Novas Tecnologias
• As novas tecnologias surgidas com a invenção dos computadores digitais
a partir de 1945 foram inicialmente vistas como ferramentas de cálculo,
especialmente úteis na área de informações numéricas
• Gradativamente, inventaram-se técnicas que tornaram possível a
digitalização de informações textuais, e, posteriormente, gráficas, visuais
(fotografia estática e fotografia dinâmica, ou filme e vídeo) e sonoras,
fazendo com que as novas tecnologias digitais passassem a ser vistas
primariamente como tecnologia da informação (numérica, textual,
gráfica, visual e sonora, que, quando integrada, passou a ser chamada
de multimídia)
• Simultaneamente o telefone, principal meio de comunicação por voz,
passou a digitalizar a voz humana e a desenvolver meios de viabilizar e
baratear a telefonia móvel, fato que, em pouco tempo, tornou a
comunicação digital, especialmente a móvel, a principal das diversas
aplicações da tecnologia digital
11. As Novas Mídias
• Hoje, basicamente todos os meios de distribuição de informação escrita,
como livros, jornais e revistas, bem como todos os meios de
comunicação de massa sonora e visual, como o rádio e a televisão, usam
a tecnologia digital e seus produtos estão disponíveis na Web
• Hoje, também, a comunicação que tradicionalmente se fazia por cartas e
panfletos distribuídos pelos Correios, bem como a que se fazia por
telegramas e telexes, estão substituídas, em grande parte, pela
comunicação digital através de e-mail ou mensagens de texto (que já
incluem fotografias e clips de voz) realizada pela Internet
• Mas nada se compara à substituição dos antigos telefones fixos e
analógicos pelos modernos smartphones digitais móveis, com sua
comunicação um-a-um (ou em conferência) por texto, voz e vídeo,
a qualquer momento e a partir de qualquer lugar, instantânea e
relativamente acessível e barata
12. Um Novo Paradigma Educacional
• As Novas Mídias tornaram possível um novo paradigma na área da
educação que privilegia a personalização da educação feita em escala,
com as seguintes características:
• Não é textocêntrico, centrado na absorção e assimilação de textos, mas, sim,
centrado no desenvolvimento de competências
• Não é magistrocêntrico, centrado no professor, mas, sim, centrado em
múltiplos canais de interação multimídia, que envolvem, entre outros, os
“pares”, em processos de comunicação hoje chamada lateral ou horizontal
• Não é escolacêntrico, centrado na escola, mas, sim, centrado no uso
intensivo das novas mídias, primeiro, para comunicação (interação), e, em
seguida, para acesso às informações que essa interação possa vir a revelar
necessárias
• Contrário ao que acontece no paradigma atual, o acesso a textos
(informações escritas), ou saberes, é transversalizado e o que se torna
essencial é o desenvolvimento de competências
13. Conceitos de Aprendizagem e Competência
• Aprendizagem, em vez de ser vista como o processo de absorver e
assimilar informações e conhecimentos, passa a ser vista (conforme
sugere Peter Senge) como o processo de se tornar capaz de fazer
algo que antes não se conseguia fazer
• Aprender, assim visto, se torna menos um processo de aquisição de
saberes desvinculados de fazeres e mais um processo de construção
de saber-fazeres, vale dizer, de desenvolvimento de competências
• Competência é a capacidade de mobilizar, sempre que necessário
ou recomendável, habilidades (e competências mais simples), bem
como atitudes, valores, conhecimentos e informações, para realizar,
com alto nível de desempenho, e de forma aparentemente fácil e
natural, ações e tarefas requeridas ou desejadas em determinada
área de atividade ou esfera de ação
14. Educação Teológica Neste Paradigma
• A Educação Teológica, vista da ótica deste paradigma, se torna
processo voltado para o desenvolvimento, por parte dos alunos,
com o apoio e a facilitação de professores, em colaboração com
colegas (pares), com a ajuda de contatos relevantes em redes
sociais e comunidades de prática, e valendo-se de recursos, tanto
textuais como audiovisuais, disponíveis na Internet, daquelas
competências básicas exigidas ou esperadas deles no exercício de
suas funções pastorais na igreja ou em outro contexto
institucional
15. Exemplo 1
• Uma competência básica é o chamado “ministério da palavra”
• Dentre as habilidades (ou competências mais simples) exigidas estão:
• Capacidade de expressar-se eficiente e eficazmente no idioma pátrio
• Capacidade de argumentação
• Capacidade de falar em público de forma persuasiva e convincente
• Capacidade de fazer exegese de um texto bíblico que, interpretado
para o presente, contenha uma mensagem relevante e pertinente às
necessidades dos ouvintes
• Capacidade de relacionar a mensagem a questões atuais de interesse dos
ouvintes para ilustrar a sua relevância
• Dentre as posturas e os valores exigidos estão:
• Sensibilidade para com as necessidades, crenças e valores dos ouvintes
• Respeito para com pensamentos ou visões divergentes
• Etc
16. Ainda o Exemplo 1
• Exegese do texto no original é apenas uma habilidade que talvez
seja útil, mas cujo domínio em nível de desempenho que possa
redundar em diferença, dados os inúmeros recursos disponíveis
hoje em formato impresso ou na Internet, pode significar uma
demanda de tempo injustificável, não só face a outras habilidades
importantes dentro da mesma competência (para não falar em
atitudes e valores), como, também, face a outras competências
que são requeridas ou esperadas do pastor
17. Outros Exemplos
• Educação Cristã
• Apologética ou Defesa da Fé (?)
• Fortalecimento da Comunidade Eclesial (Community Building)
• Cuidado / Aconselhamento Pastoral / Visitação
• Ação Social
• Evangelismo
• Comunicação Interna e Externa
• Comunicação com Outras Igrejas / Denominações / Religiões
• Participação na Vida Política da Cidade / Região / Estado / Nação
• Etc.
18. Outras Questões
• Qual a relevância de quatro a seis semestres de História da Igreja
para o desenvolvimento dessas competências?
• Idem, em relação a Teologia Sistemática?
• O que é importante para o desenvolvimento de várias dessas
competências que normalmente não aparece no currículo de
nenhum Curso de Teologia?
• Etc.
19. Concluindo - 1
• Não estou propondo que Faculdades de Teologia e Seminários aqui
representados reformulem seus currículos
• O que sugiro é que reflitam sobre se, diante da revolução que as
Novas Mídias vêm produzindo na área da Educação Geral e em
áreas de Formação Profissional afins, e diante das pressões do
mercado de trabalho a que se dirigirão os egressos de seus cursos,
se devem adotar uma postura:
• Conservadora
• Reformista
• Revolucionária
• Em outras palavras, se devem permitir que as Novas Mídias apenas
sustentem e apoiem o que já se faz, ou controladamente melhorem
e/ou estendam o que já se faz, ou, então, com cuidado, venham a
subverter e suplantar o que ora se faz na direção de algo melhor
20. Concluindo - 2
• As Novas Mídias, enquanto tecnologias que são, estão aqui para
servirem de instrumentos e ferramentas para que nós:
• Se estivermos convencidos de que o que estamos fazendo nos cursos
de teologia pelos quais somos responsáveis é basicamente bom e está
no caminho certo, usemos as novas mídias para apoiar o que fazemos,
quem sabe enriquecer um pouco a forma de trabalhar e estender seu
alcance, mas sem alterar substantivamente o paradigma adotado
• Se, no entanto, não estivermos convencidos disso, ou se a igreja ou
outros stakeholders para os quais preparamos profissionais em nossos
cursos, estiverem a reivindicar mudanças naquilo que fazemos, então
talvez seja o caso de explorar as possibilidades que, com a ajuda das
novas mídias, um novo paradigma educacional pode vir a oferecer
• A decisão está nas mãos de cada um: a tecnologia é “camaleônica” e
se presta a nos ajudar a fazer aquilo que optarmos por fazer