1. INTERPRETAÇÃO CONSTITUCIONAL
Expositor:
Ricardo Maurício Freire Soares
Doutor em Direito Público e
Mestre em Direito Privado-
Universidade Federal da Bahia.
Pós-Doutor em Direito
Constitucional - Università
Degli Studi di Roma. Professor
da Faculdade Baiana de
Direito, da Faculdade de
Direito da Universidade
Federal da Bahia e da Estácio
de Sá – FIB. Professor do
Curso JUSPODIVM e da Rede
LFG. Membro do Instituto dos
Advogados Brasileiros e do
Instituto dos Advogados da
Bahia.
E-mail: ric.mauricio@ig.com.br
2. Hermenêutica e interpretação do direito
Hermenêutica: as raízes da
palavra hermenêutica
residem no verbo grego
hermeneuein e no
substantivo hermeneia.
Trata-se do saber que
problematiza a
interpretação (o mito de
Hermes)
Interpretação: a etimologia
registra que a palavra
interpretação provém do
termo latino interpretare. È
uma atividade de mediação
comunicativa que define o
sentido e o alcance de um
objeto do conhecimento.
3. Métodos de interpretação do direito
Gramatical
Lógico-sistemático
Histórico
Sociológico
Teleológico
Savigny
4. Subjetivismo x Objetivismo
Subjetivismo
a primazia da vontade do legislador
a ênfase à interpretação literal do direito
o compromisso com a segurança jurídica
A neutralização axiológica do intérprete
Objetivismo
a primazia da vontade da lei
a interpretação substancial do direito
o compromisso com a justiça
A valorização do papel do intérprete
6. A interpretação constitucional
A Constituição como Lei de
Organização Fundamental
do Estado e da Sociedade
As características das
normas constitucionais:
conteúdo político, abertura
semântica e supremacia
formal-material
Necessidade de uma
interpretação
constitucional
7. Métodos de interpretação constitucional
Tópico-problemático:
O Direito é um sistema aberto de regras e
princípios, admitindo distintas e cambiantes
interpretações;
Um problema é toda questão que, aparentemente,
permite mais de uma resposta;
A tópica é a técnica do pensamento problemático;
Os instrumentos hermenêuticos tradicionais não
resolvem as aporias emergentes da interpretação
concretizadora desse modelo jurídico;
A interpretação deve partir do problema para o
sistema e não da norma para o problema;
8. Métodos de interpretação constitucional
Hermenêutico-concretizador:
O seu ponto de partida é a constatação de que
a leitura de qualquer texto normativo começa
pela pré-compreensão do intérprete;
Intérprete cabe concretizar a norma a partir
de uma dada situação histórica;
Pressupostos: subjetivo (criador) e objetivo
(contexto)
Konrad Hesse
9. Métodos de interpretação constitucional
Normativo-estruturante:
Desenvolvido em plena vigência das idéias de
Heidegger e Gadamer: interpretação entendida como
aplicação;
Interpretação consiste em concretizar a lei em cada
caso;
Parte-se da premissa de que existe uma implicação
necessária entre o programa normativo e o âmbito
normativo, entre os preceitos jurídicos e a realidade
que eles intentam regular;
a imperatividade da norma não é produzida pelo seu
texto, antes resulta de dados extralingüísticos ligados
ao efetivo funcionamento da ordem jurídica;
Friedrich Müller
10. Pós-Positivismo Jurídico
Revisão do Positivismo:
concepção mais
propriamente axiológica
do direito
objetivação de certos
valores sócio-políticos
subsistentes
abertura aos fatos
sociais
11. Pós-Positivismo Jurídico
Valorização dos princípios jurídicos:
Releitura do corte epistemológico da Teoria Pura do
Direito
Princípios fundamentais expressos ou não no Direito
Positivo
Princípios representam determinados valores
transcendentais ao ordenamento jurídico-positivo do
Estado
Princípios como elementos meta-jurídicos e
reguladores do Direito Positivo
Eticidade mínima da principiologia permeando todo o
ordenamento jurídico
12. Regras e Princípios Constitucionais
Direito como regras e
princípios:
Princípios: prescrevem
valores e diretrizes,
encerrando mandados
de otimização.
Regras: normas que
descrevem em sua
estrutura lógico deôntica
uma hipótese fática e
uma conseqüência
jurídica. All or nothing.
13. Regras e Princípios Constitucionais
Direito como regras e princípios:
O sistema jurídico ideal se consubstancia em
uma distribuição equilibrada de regras e
princípios.
As regras desempenham o papel referente à
segurança jurídica, previsibilidade e
objetividade das condutas.
Os princípios, por serem flexíveis, ensejam à
realização da justiça no caso concreto.
14. Ponderação dos Princípios Constitucionais
o conflito entre princípios
será dirimido pela aplicação
da técnica da ponderação
dos valores e interesses
sopesando os bens jurídicos
e determinando a
prevalência em um caso
específico
não se determina uma
superioridade prévia e
absoluta
uso da razoabilidade
15. Eficácia jurídica dos princípios constitucionais
Positiva ou simétrica: pretende assegurar a possibilidade de
efetivar direitos subjetivos diretamente, na via judicial, se
necessário.
Interpretativa: pode-se exigir do Judiciário que as normas de
hierarquia inferior se coadunem com as superiores a elas
vinculadas.
Negativa: autoriza a declaração de invalidez de todas as
normas ou atos que contravenham os efeitos pretendidos pela
norma.
Vedativa do retrocesso: pode-se exigir do Judiciário a
invalidade ou revogação de normas que concedam ou
ampliem direitos fundamentais, sem que a revogação seja
seguida de uma política substitutiva ou equivalente.
Vertical e Horizontal: disciplina tanto a relação entre Estado e
particulares como também a relação mantida entre
particulares.
16. O princípio da dignidade da pessoa humana
Constituição Federal
- Art. 1º, III:
Dignidade da
Pessoa Humana:
centro axiológico do
Estado Democrático
de Direito e de uma
ordem mundial e
nacional pautada
nos direitos
fundamentais.
17. O princípio da dignidade da pessoa humana
Fundamento axiológico e teleológico dos
direitos fundamentais
Reconhecimento do homem como um fim
em si mesmo – tutela e promoção da
integridade física e psíquica
Aplicação no Direito Público e no Direito
Privado
Mínimo existencial x Reserva do possível
18. Princípios instrumentais de interpretação
constitucional
Princípio da supremacia constitucional
Princípio da presunção de
constitucionalidade das leis e atos
normativos
Princípio da interpretação conforme a
constituição
Princípio da unidade
Princípio da máxima efetividade
19. A democratização da interpretação do direito
constitucional
os Intérpretes do direito não são apenas juristas,
mas todos os agentes da sociedade;
A interpretação constitucional deve consubstanciar
um novo senso comum, partilhado por toda a
cidadania;
Entende-se a ordem jurídica como obra aberta e
coletiva, com ampliação do círculo de intérpretes;
Modelo interpretativo plural e progressista, pois o
Direito pertence a toda sociedade;
O conflito com a monopolização da hermenêutica
jurídica: o problema da súmula vinculante
Peter Haberle
20. Hard Cases
Caso 1 - Nascituro: direito a alimentos?
Direito à vida (digna) como pressuposto dos
direitos da personalidade (surgimento ocorre
a partir do nascimento com vida, art. 2°NCC).
Agravo de Instrumento Nº 70006429096, 7a.
Câmara Cível, TJ/ RS, 13/08/2003.
INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE.
ALIMENTOS PROVISÓRIOS EM FAVOR DO
NASCITURO. POSSIBILIDADE. ADEQUAÇÃO
DO QUANTUM.
21. Hard Cases
Caso 2 - Nascituro: direito a danos morais
(lesão a personalidade)?
RESP 399028/SP, 4a. Turma do STJ. RESP
2001/0147319-0, 26/02/2002.
ATROPELAMENTO. COMPOSIÇÃO FÉRREA.
AÇÃO AJUIZADA 23 ANOS APÓS O EVENTO.
NASCITURO. DIREITO AOS DANOS MORAIS.
RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
(...) II - O nascituro também tem direito
aos danos morais pela morte do pai, mas a
circunstância de não tê-lo conhecido em
vida tem influência na fixação do quantum.
22. Hard Cases
Caso 3 - O transexual e o direito à mudança de sexo
(Resolução nº 1.652/02, CFM)
Transexual: existe uma dicotomia entre fenótipo e
biótipo
SENTENÇA ESTRANGEIRA Nº 1.058 - EX
(2005/0067795-4) ALESSANDRO GARCIA DE
OLIVEIRA
(...) a jurisprudência brasileira vem admitindo a
retificação do registro civil de transexual, a fim de
adequar o assento de nascimento à situação
decorrente da realização de cirurgia para mudança de
sexo. Dessa forma, restam atendidos os pressupostos
indispensáveis ao deferimento do pleito; além do
mais, a pretensão não ofende a soberania, a ordem
pública ou os bons costumes (art. 17 da LICC c/c
arts. 5º e 6º da Resolução/STJ nº 9/2005). Posto
isso, homologo a sentença estrangeira.
23. Hard Cases
Caso 4 - A autonomia do paciente Testemunha de
Jeová (arts. 46 e 56 do Código de Ética Médica)
RHC 7785/SP; ROHC 198/0051756-1, 6a. Turma
do STJ. TJ/SP 253458-3/1-00
Família Testemunha de Jeová: transfusão em
adolescente
Paciente: médico Testemunha de Jeová que
impediu cirurgia e foi denunciado pelo MP/SP por
homicídio (CP 121, caput)
ACORDAM, em Terceira Tribunal de Justiça do
Estado de majoritária, denegar a ordem, relatório
e voto do Relator, que acórdão - Câmara Criminal
do São Paulo, por votação de conformidade com o
ficam fazendo parte do Acórdão.
24. Hard Cases
Caso 5 – Aborto do Anencéfalo:
STF ADPF 54/04 – CNTS (Confederação Nacional dos
Trabalhadores de Saúde)
Nº 47.371/GO (2005/0143089-7), STJ
André Soares X Desembargador Relator do HC Nº
251264 – TJ/ GO
HC, com pedido de liminar, impetrado em benefício do
nascituro cuja mãe ingressara com pedido de
autorização judicial mediante alvará para interrupção de
gestação por inviabilidade fetal, sob o fundamento de
que o feto possuía anencefalia (ausência de cérebro). A
Juíza de Direito da de Goiânia deferiu o pedido.
Interpretação extensiva da excludente de punibilidade
prevista no inciso I do art. 128 do CP. Autorização
concedida - apelo provido.Na linha dos fundamentos
esculpidos na Súmula nº 691 do Pretório Excelso,
denego a liminar.
25. Hard Cases
Caso 6 – Casamento espírita: liberdade de
crença
Casamento Espírita
Processo N° 34739-8/2005 – Mandado de
segurança
PARECER MP/BA nº. 7540/2005
EMENTA: MANDADO DE SEGURANÇA.
CASAMENTO RELIGIOSO ESPÍRITA.
AUTORIDADE OU MINISTRO RELIGIOSO.
POSSIBILIDADE. PRINCÍPIO DA DIGNIDADE
DA PESSSOA HUMANA E LIBERDADE
RELIGIOSA.
26. Hard Cases
Caso 7 – Liberdade de manifestação X Direito a não
ser incomodado
ADIN 1969-4/DF
PT et al X Governo do DF: Suspendido decreto
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE -
OBJETO - DECRETO. (...) Isso ocorre relativamente a
ato do Poder Executivo que, a pretexto de
compatibilizar a liberdade de reunião e de expressão
com o direito ao trabalho em ambiente de
tranqüilidade, acaba por emprestar à Carta
regulamentação imprópria, sob os ângulos formal e
material. LIBERDADE DE REUNIÃO E DE
MANIFESTAÇÃO PÚBLICA - LIMITAÇÕES. De início,
surge com relevância ímpar pedido de suspensão de
decreto mediante o qual foram impostas limitações à
liberdade de reunião e de manifestação pública,
proibindo-se a utilização de carros de som e de
outros equipamentos de veiculação de idéias.
27. Hard Cases
Caso 8 – Liberdade de expressão X Dignidade
humana
HC 82424 / RS
Siegfried Ellwanger X STJ
EMENTA: HABEAS-CORPUS. PUBLICAÇÃO DE
LIVROS: ANTI-SEMITISMO. RACISMO. CRIME
IMPRESCRITÍVEL. CONCEITUAÇÃO. ABRANGÊNCIA
CONSTITUCIONAL. LIBERDADE DE EXPRESSÃO.
LIMITES. ORDEM DENEGADA. 1. Escrever, editar,
divulgar e comerciar livros "fazendo apologia de
idéias preconceituosas e discriminatórias" contra a
comunidade judaica (Lei 7716/89, artigo 20, na
redação dada pela Lei 8081/90) constitui crime de
racismo sujeito às cláusulas de inafiançabilidade e
imprescritibilidade (CF, artigo 5º, XLII).
28. Hard Cases
Caso 9 – Revista Íntima
RECURSO DE REVISTA. DANO MORAL.
REVISTA VEXATÓRIA. A atividade patronal,
qualquer que seja, não justifica expor o
empregado a revista vexatória, apalpando-o
e, até mesmo, despindo-o; prática esta
abusiva que excede o poder diretivo do
empregador, pois atinge a intimidade e
dignidade do ser humano, direitos pessoais
indisponíveis, previstos nos incisos III e X
do artigo 5º da Lei Maior. Recurso conhecido
e provido” (TST RR 735991).
29. Hard Cases
Caso 10 - Levantamento de FGTS em caso de
penúria (TRF 3)
CONSTITUCIONAL - PROCESUUAL - APELAÇÃO
CÍVEL - EXPEDIÇÃO DE ALVARÁJUDICIAL -
LEVANTAMENTO DO SALDO DO PIS-PASEP -
ESTADO DE PENÚRIADA AUTORA - PRINCÍPIO
DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA 1. As
hipóteses de levantamento do saldo do PIS-
PASEP são taxativas, porém, não se exaurem.
2. A nova ordem constitucional coroou como
um dos fundamento da República Federativa
do Brasil o Princípio da Dignidade da Pessoa
Humana. 3. O estado de penúria da Autora
justifica o levantamento de seu benefício,
ainda que sua situação não esteja
expressamente prevista.4. Apelação improvida
30. Hard Cases
Caso 11 – O abandono afetivo
TJMG: “EMENTA – INDENIZAÇÃO DANOS
MORAIS – RELAÇÃO PATERNO-FILIAL –
PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA
HUMANA – PRINCÍPIO DA AFETIVIDADE
- A dor sofrida pelo filho, em virtude do
abandono paterno, que o privou do
direito à convivência, ao amparo afetivo,
moral e psíquico, deve ser indenizável,
com fulcro no princípio da dignidade da
pessoa humana”.
31. Hard Cases
Caso 12 – dignidade do Mestre-
cervejeiro
“Culpa da empresa de cervejas, que
submeteu o seu mestre- cervejeiro a
condições de trabalho que o levaram ao
alcoolismo, sem adotar qualquer
providência recomendável para evitar o
dano à pessoa e a incapacidade
funcional do empregado” (STJ, RE
242598).
32. Hard Cases
Caso 13 – O transporte de pessoas
Decisão(TRT-RO)
EMENTA: DANOS MORAIS. TRANSPORTE
INADEQUADO. AUSÊNCIA DE OFENSA À
DIGNIDADE HUMANA.
Poder-se-ia questionar no âmbito administrativo
uma mera infração das normas de trânsito do
Código de Trânsito Brasileiro quanto ao transporte
inadequado de passageiros em carroceria de
veículo de transporte de cargas, o que não é da
competência da Justiça do Trabalho. Mas se o
veículo é seguro para o transporte de gado
*também o é para o transporte do ser humano, não
constando do relato bíblico que Noé tenha
rebaixado a sua dignidade como pessoa humana e
como emissário de Deus para salvar as espécies
animais, com elas coabitando a sua Arca em meio
semelhante ou pior do que o descrito na petição
inicial (em meio a fezes de suínos e de bovinos).
33. Hard Cases
Caso 14 – A impenhorabilidade do bem de família
“A Lei n.8009/90 precisa ser interpretada consoante o sentido
social do texto. Estabelece limitação à regra draconiana de o
patrimônio do devedor responder por suas obrigações
patrimoniais. O incentivo à casa própria busca proteger as
pessoas, garantindo-lhes o lugar para morar. Família, no
contexto, significa instituição social de pessoas que se
agrupam, normalmente por laços de casamento, união estável
ou descendência. Não se olvidem os ascendentes. Seja o
parentesco civil, ou natural. Compreende ainda a família
substituta. Nessa linha, conservada a teleologia da norma, o
solteiro deve receber o mesmo tratamento. Também o
celibatário é digno dessa proteção. E mais. Também o viúvo,
ainda que seus descendentes hajam constituído outras
famílias, e como, normalmente acontece, passam a residir em
outras casas. ‘Data venia’, a Lei n.8.009/90 não está dirigida a
número de pessoas. Ao contrário – à pessoa. Solteira, casada,
viúva, desquitada, divorciada, pouco importa. O sentido social
da norma busca garantir um teto para cada pessoa. Só essa
finalidade, ‘data venia’, põe sobre a mesa a exata extensão da
lei. Caso contrário, sacrificar-se-á a interpretação teleológica
para prevalecer a insuficiente interpretação literal”(STJ, Ac.
6ªT., REsp.182.223-SP, rel. Min. Luiz Vicente Cernicchiaro, j.
19.09.1999, DJU 10.05.1999.)