Concurso público: candidato aprovado impedido de tomar posse
1. ACÓRDÃO N°
SECRETARIA DA 1ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA
COMARCA DE CASTANHAL/PA
REEXAME NECESSÁRIO E APELAÇÃO CÍVEL N° 2011.3.001958-7
SENTENCIADO/APELANTE: MUNICÍPIO DE CASTANHAL – PREFEITURA MUNICIPAL DE CASTANHAL
SENTENCIADO/APELADO: ANTÔNIO AUGUSTO LIMA PINHEIRO
RELATOR: DES. LEONARDO DE NORONHA TAVARES
EMENTA: DIREITO ADMINISTRATIVO – REEXAME NECESSÁRIO E APELAÇÃO CÍVEL –
MANDADO DE SEGURANÇA – CONCURSO PÚBLICO – CANDIDATO APROVADO E
IMPEDIDO DE TOMAR POSSE – EDITAL IMPÕE RESTRIÇÃO NÃO EXIGIDA EM LEI –
PARECER JURÍDICO DESFAVORÁVEL À INVESTIDURA NO CARGO PARA O QUAL FOI
APROVADO - ATO COATOR VIOLADOR DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO – SENTENÇA
CONFIRMADA.
1- À unanimidade, recurso de Apelação conhecido e desprovido. E Reexame necessário, mantida a
sentença apelada por todos os seus fundamentos.
Acordam os Desembargadores componentes da 1ª Câmara Cível Isolada do Egrégio Tribunal de Justiça do
Pará, à unanimidade, em conhecer do recurso e negar provimento nos termos do voto do Desembargador Relator.
1ª Câmara Cível Isolada do Tribunal de Justiça do Estado do Pará – 20 de outubro de 2014. Exmo. Sr. Des.
Leonardo de Noronha Tavares, Exma. Sra. Desa.Maria do Céo Maciel Coutinho, Exma. Sra. Desa. Marneide Trindade
Pereira Merabet. Sessão presidida pela Exma. Sra. Desa. Marneide Trindade Pereira Merabet.
LEONARDO DE NORONHA TAVARES
RELATOR
RELATÓRIO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR LEONARDO DE NORONHA TAVARES:
Trata-se de REEXAME NECESSÁRIO e APELAÇÃO CÍVEL, apresentados em face da r. Sentença (fls.
129/132) proferida pelo MM. Juízo da 1ª Vara Cível Comarca de Castanhal–PA, nos autos de Ação de Mandado de
Segurança, no qual foi concedida a segurança pleiteada.
Na origem o impetrante ingressou com mandado de segurança visando sua nomeação para o cargo de professor
de inglês, por ter sido preterido por outros candidatos classificados em colocação posterior a sua.
O juízo a quo, à fl. 73, prolatou despacho reservando-se para decidir sobre a liminar após as informações
prestadas pelo impetrado.
O Município de Castanhal apresentou suas informações às fls. 78/92, pugnando pela impugnação ao
deferimento do benefício da justiça gratuita; alegando que o mandado de segurança foi interposto após o prazo decadencial
e que a autoridade apontada como coatora não possui legitimidade passiva.
2. No mérito, ressaltou que o impetrante, nada questionou acerca do ato administrativo de exoneração,
demonstrando conformidade com o mesmo, e que, em patente concordância com o Edital n° 001/2009, tentou novo
concurso público para o cargo anteriormente ocupado, razão pela qual a Comissão do Concurso foi desfavorável à sua
investidura no cargo para o qual foi aprovado. Juntou documentos.
A magistrada singular, à fl.110, indeferiu a liminar pleiteada por não vislumbrar a presença dos requisitos aptos
a sua concessão.
O representante do Ministério Público Estadual apresentou manifestação às fls. 115/127, opinando pela
extinção do feito, sem resolução de mérito, por haver necessidade de dilação probatória e no mérito, pela não concessão do
MS por ausência de direito líquido e certo.
Sobreveio a r. sentença ora atacada, às fls. 129/132, na qual o juízo singular rejeitou a preliminar de
ilegitimidade passiva e a prejudicial de decadência e no mérito, concedeu a segurança pretendida a fim de determinar a
nomeação e investidura do impetrante no cargo de professor PEB III – Inglês – zona urbana e determinou o
encaminhamento dos autos a este Tribunal para reexame necessário, nos termos do que preceitua o art. 14, § 1° da Lei n°
12.016/2009.
Irresignado o Município de Castanhal interpôs o presente recurso de apelação alegando que a sentença não pode
prevalecer, por não ter dado a solução jurídica adequada ao caso.
Aduz que o prazo previsto em lei para impetração de mandado de segurança é de 120 (cento e vinte) dias, sob
pena de decadência e que já estaria vencido, já que o marco inicial para contagem do prazo decadencial se dá com a
publicação do Decreto n° 480/2008 que exonerou o impetrante, com base no art. 190, II da Lei Municipal n° 003/99, tendo
sido ultrapassado o prazo para questionamento da demissão.
Ressalta que o impetrante, no mérito do writ, questiona o item III, 7 do Edital do Concurso Público 001/2009 e
que o mandado de segurança se presta para salvaguardar direito líquido e certo. Que o pretenso questionamento ao Edital
conta-se da sua publicação ou retificação, que há muito já ultrapassou o prazo de 120 (cento e vinte) dias previsto em lei,
devendo ser reformada a decisão a quo ante a incidência da decadência.
Destaca que o impetrante/apelado não preencheu os requisitos contidos no Edital que conduz o concurso
público, limitando a Administração e seus servidores à sua estrita observância que deverá se pautar nos princípios da
publicidade e da isonomia, conferindo aos interessados a possibilidade de conhecerem as exigências requeridas e a
segurança necessária durante todo o certame.
Argui que o Edital deixou claro, ao tratar no item “Dos Requisitos para Investidura no Cargo” ser indispensável
ao candidato aprovado não ser ex servidor da Prefeitura Municipal de Castanhal, dispensado por justa causa, citando as
hipóteses de demissão previstas no art. 190 da Lei Municipal 003/1999, entre as quais consta o abandono de cargo, situação
não observada pelo impetrante.
Pugna, assim, pelo provimento do apelo, para que seja reformada a sentença recorrida, com a denegação da
segurança pretendida.
Sem contrarrazões, conforme certidão à fl. 154.
Instado a se manifestar o Ministério Púbico do 2° Grau opinou pela confirmação do decisum fustigado e pelo
desprovimento do recurso voluntário.
Este é o relatório que foi submetido à douta revisão, para possíveis considerações.
3. EMENTA: DIREITO ADMINISTRATIVO – REEXAME NECESSÁRIO E APELAÇÃO CÍVEL –
MANDADO DE SEGURANÇA – CONCURSO PÚBLICO – CANDIDATO APROVADO E
IMPEDIDO DE TOMAR POSSE – EDITAL IMPÕE RESTRIÇÃO NÃO EXIGIDA EM LEI –
PARECER JURÍDICO DESFAVORÁVEL À INVESTIDURA NO CARGO PARA O QUAL FOI
APROVADO - ATO COATOR VIOLADOR DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO – SENTENÇA
CONFIRMADA.
1- À unanimidade, recurso de Apelação conhecido e desprovido. E Reexame necessário, mantida a
sentença apelada por todos os seus fundamentos.
VOTO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR LEONARDO DE NORONHA TAVARES:
Presentes os pressupostos de admissibilidade recursal, conheço do recurso de apelação e reexamino a sentença
por estar sujeita ao duplo grau de jurisdição obrigatório.
Inicialmente, alega o apelante, como prejudicial do mérito, que o prazo decadencial para impetração do
mandamus estaria esgotado.
Compulsando os autos, verifico que essa prejudicial foi devidamente enfrentada pelo juízo a quo no teor da
sentença, não restando configurada a decadência, uma vez que o apelado tomou ciência do ato considerado ilegal em
05/5/2010 (documento às fls. 27/28) e o mandado de segurança foi interposto no prazo legal, em 13/5/2010, pelo que afasto
a prejudicial.
Em relação à alegação de que o apelado questiona no mandado de segurança a sua demissão e a ilegalidade da
Norma Editalícia, vislumbro que tais argumentos foram citados apenas como forma de demonstrar o equívoco apresentado
no teor do ato ilegal proferido pela autoridade coatora, uma vez que o parecer jurídico que opinou desfavoravelmente à
investidura do então candidato aprovado ao cargo para o qual foi aprovado é que trouxe para discussão o fato do requerente
ter sido demitido por abandono de emprego, Decreto n° 480/08, de 12/11/2008, e não possuir um dos requisitos
indispensáveis para investidura no cargo, conforme o disposto no Título III do Edital 001/2009.
4. Dessa forma, entendo que o cerne da questão é o fato do apelado possuir ou não os requisitos para a investidura
no cargo para o qual foi aprovado em concurso público.
Acerca do provimento dos cargos públicos, assevera o artigo 37, inciso I, da Constituição Federal, com a
redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, que o acesso é extensivo a todos os brasileiros desde que preencham os
requisitos estabelecidos em lei, in verbis:
"Art. 37 - A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos
Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade,
impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: I - os cargos,
empregos e funções públicas são acessíveis aos brasileiros que preencham os requisitos
estabelecidos em lei, assim como aos estrangeiros, na forma da lei.".
O direito de acesso ao serviço público não é desprovido de exigências e deve observar os requisitos
estabelecidos em lei, que são fixados em estrita consideração com as funções a serem exercidas pelo servidor, sob pena de
serem considerados discriminatórios e violadores dos princípios da igualdade e impessoalidade. Esses requisitos para o
cargo só se legitimam se estiver rigorosamente comprovado que foram fixados levando em conta a função a ser exercida
pelo servidor na Administração Pública e se estiverem contemplados em lei.
Segundo José dos Santos Carvalho Filho, em sua obra Manual de Direito Administrativo, 15ª edição, editora
Lumen Juris, Rio de Janeiro, 2006, acerca da exigência para investidura no cargo público:
“(...) os requisitos do cargo são aqueles que o candidato deve preencher para investidura no
cargo público. Dizem respeito, portanto à natureza das funções a serem exercidas, e não ao
procedimento de seleção levado a efeito pelo concurso. Em virtude do princípio da legalidade
(art. 37, CF), esses requisitos devem estar contemplados em lei. Nada impede, contudo, que o
edital os mencione, reproduzindo o que a lei estabelece. O que não é lícito é que tal exigência
seja apenas prevista no edital.”.
Portanto, não há como o Edital n° 001/2009, expedido pela Prefeitura de Castanhal, impor restrição não
prevista em lei, como a trazida no item III, 7- Não ser ex-servidor da Prefeitura Municipal de Castanhal dispensado por
justa causa, que inclusive se encontra tecnicamente elaborado, já que o termo não se aplica a servidores concursados e sim
a celetistas.
Mesmo que por interpretação extensiva se entendesse que se trata da penalidade disposta no art 190, II, § 1° da
Lei Municipal n° 003/99, do Município de Castanhal, apenas os casos de demissão “a bem do serviço público” é que não
permitem o retorno do servidor aos quadros do serviço público, quando se tratar dos casos mais graves, vetando
parcialmente o seu retorno por cinco anos, o que não ocorreu no caso em análise.
Dessa forma, malgrado a obrigatoriedade da vinculação e a obediência à formalidade estabelecida nos certames,
os Tribunais vêm entendendo pela relativização do formalismo procedimental, mormente sobre a sua aplicação em excesso.
Consoante ensinam os juristas, o princípio da vinculação ao Edital não é absoluto, de tal forma que impeça o
Judiciário de interpretá-lo, lhe buscando o sentido e a compreensão e escoimando-o de cláusulas desnecessárias ou que
extrapolem os ditames da lei de regência (STJ, MS nº 5.597/DF, 1ª S., Rel. Min. Demócrito Reinaldo, DJU 01.06.1998).
A título de ilustração cito julgado do Tribunal de Justiça de Minas Gerais:
ADMINISTRATIVO. AÇÃO ANULATÓRIA. CURSO TÉCNICO DE SEGURANÇA PÚBLICA DA POLÍCIA
MILITAR. CANDIDATO QUE CONSERVA A IDADE DE 30 ANOS NA DATA DE INÍCIO DO CURSO.
5. RESTRIÇÃO ESTABELECIDA NO EDITAL. ILEGITIMIDADE. RIGOR NÃO PREVISTO NA LEI
ESTADUAL N. 5.301/69. INDEFERIMENTO DA MATRÍCULA. IMPROPRIEDADE. SENTENÇA CONFIRMADA.
- No âmbito da Lei Estadual n. 5.301/69, com a alteração promovida pela LC n. 95/2007, se o candidato tem 30 anos
antes da inclusão na Polícia Militar - que ocorre com a matrícula no curso de formação -, não é lícito que seja excluído
do processo seletivo - O Edital n. 15/2007 restringe os termos da lei e torna mais rigorosa a aferição da idade,
estabelecendo que o candidato deve ter "no mínimo 18 (dezoito) anos e no máximo 30 (trinta) anos de idade,
completáveis até a data de início do curso", disposição que não está prevista na Lei Estadual n. 5.301/69, e institui
requisito ilegal, qual seja, não ter o candidato completado trinta anos na data da matrícula para o CTSP.
(TJ-MG - AC: 10024111466595001 MG, Relator: Alberto Vilas Boas, Data de Julgamento:
06/02/2014, Câmaras Cíveis / 1ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 12/02/2014).
Assim, não assiste razão ao apelante, estando configurada a violação de direito líquido e certo, pressuposto para
a concessão da segurança, uma vez que o apelado foi aprovado em concurso público, dentro do número de vagas, tendo
preenchido os requisitos legais para investidura no cargo ao qual pleiteava.
Por todo o exposto, em consonância como parecer Ministerial, conheço do recurso de Apelação, mas nego-lhe
provimento e em Reexame Necessário confirmo a sentença combatida.
Este é o meu voto.
Belém (PA), 20 de outubro de 2014.
LEONARDO DE NORONHA TAVARES
RELATOR
6. RESTRIÇÃO ESTABELECIDA NO EDITAL. ILEGITIMIDADE. RIGOR NÃO PREVISTO NA LEI
ESTADUAL N. 5.301/69. INDEFERIMENTO DA MATRÍCULA. IMPROPRIEDADE. SENTENÇA CONFIRMADA.
- No âmbito da Lei Estadual n. 5.301/69, com a alteração promovida pela LC n. 95/2007, se o candidato tem 30 anos
antes da inclusão na Polícia Militar - que ocorre com a matrícula no curso de formação -, não é lícito que seja excluído
do processo seletivo - O Edital n. 15/2007 restringe os termos da lei e torna mais rigorosa a aferição da idade,
estabelecendo que o candidato deve ter "no mínimo 18 (dezoito) anos e no máximo 30 (trinta) anos de idade,
completáveis até a data de início do curso", disposição que não está prevista na Lei Estadual n. 5.301/69, e institui
requisito ilegal, qual seja, não ter o candidato completado trinta anos na data da matrícula para o CTSP.
(TJ-MG - AC: 10024111466595001 MG, Relator: Alberto Vilas Boas, Data de Julgamento:
06/02/2014, Câmaras Cíveis / 1ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 12/02/2014).
Assim, não assiste razão ao apelante, estando configurada a violação de direito líquido e certo, pressuposto para
a concessão da segurança, uma vez que o apelado foi aprovado em concurso público, dentro do número de vagas, tendo
preenchido os requisitos legais para investidura no cargo ao qual pleiteava.
Por todo o exposto, em consonância como parecer Ministerial, conheço do recurso de Apelação, mas nego-lhe
provimento e em Reexame Necessário confirmo a sentença combatida.
Este é o meu voto.
Belém (PA), 20 de outubro de 2014.
LEONARDO DE NORONHA TAVARES
RELATOR