2. Porque todo mundo gosta de histórias e de
poesias. Não há sociedade sem narrativa. O
homem é um animal narrativo. Homo
narrador. Todo mundo quer ouvir histórias.
Contamos histórias desde o amanhecer até a
hora de dormir. Senta num ônibus, história;
briga com o namorado, história; chega na
escola, mais histórias. Todas as situações da
vida propiciam acontecimentos narráveis e
vivemos desse entrelaçamento de narrativas.
3. O CONTO
O conto é uma narrativa ficcional, mais curta que o
romance, porém mais densa que a crônica. Com esses
dois gêneros, tem em comum os elementos
constituintes da narrativa: narrador, enredo, há poucos
personagens, e espaço e tempo limitados. Trata-se de
um texto conciso, com um único conflito que se
encaminha rápido para o desfecho.
O conto não tem compromisso ou relação com a
realidade, com a crônica. Normalmente, costuma ser
publicado em livros (antologias) e, às vezes, em
revistas.
4. Há outros gêneros narrativos que apresentam as
mesmas características do conto, como a notícia; ela tem
como base manter o compromisso com a verdade, sendo
imparcial, e não-ficcional.Todos os contos são
ficcionais, exceto as narrativas policiais, contos que são
baseados em fatos reais, e os que queiram demonstrar
algo cotidiano, como a reportagem e o editorial.
5. A ESTRUTURA DO ENREDO
Introdução: geralmente coincide com o começo
da história; é o momento em que o narrador
apresenta os fatos iniciais, as personagens e, às
vezes, o tempo e o espaço.
Complicação ou desenvolvimento: é a parte do
enredo em que é desenvolvido o conflito.
6. Clímax: é o momento culminante da história, ou
seja, aquele de maior tensão, no qual o conflito
atinge seu ponto máximo.
Desfecho, conclusão ou epílogo: é a solução do
conflito, que pode ser
surpreendente, trágica, cômica, etc., e
corresponde ao final da história; que não significa
um final feliz.
7. O NARRADOR E OS TIPOS DE DISCURSO
NARRADOR – Um importante elemento dentro do texto
8. O FOCO NARRATIVO
A narração pode ser feita em 1ª pessoa ( eu, nós)
ou 3ª pessoa (ele, ela, eles, elas), de acordo com a
ótica do narrador, isto é, de sua posição diante dos
fatos.
Quando o narrador participa dos
acontecimentos, relata os fatos, ele é chamado de
narrador- personagem, portanto, a narração é em
1ª pessoa.
9. Já aquele que não participa dos
acontecimentos, mas observa tudo de fora
da trama, recebe o nome de narrador-
observador ou onisciente , pois ele se limita
em apenas nos informar sobre todos os
acontecimentos. Neste caso, a narração é
em 3ª pessoa.
10. Narração Objetiva e Narração Subjetiva
Na narração objetiva, o narrador não se envolve
emocionalmente com as personagens, contando de
forma impessoal e direta os fatos. Podemos ver isso
em textos jornalísticos, em que os redatores
procuram ser objetivos na divulgação da notícia.
11. Na narração subjetiva, o texto é escrito em
1ª pessoa, e o narrador participa dos
acontecimentos (narrador-personagem). Há
envolvimento emocional do narrador, ou
seja, ele conta os fatos de forma pessoal e
subjetiva, mostrando-se sensível ao que ver.
12. Esse procedimento feito pelo narrador recebe
um nome específico, denominado de “discurso”, e
de acordo com o modo em que ele desempenha
esta função, pode receber três classificações
distintas. É o que conheceremos a seguir:
Discurso direto – É aquele em que o narrador
reproduz as falas dos personagens de uma
maneira fiel, como elas realmente aconteceram.
Observe um exemplo:
13. Durante o jantar, o garoto perguntou à sua
mãe:
- Mamãe, posso convidar alguns amigos para
virem assistir filme aqui em casa amanhã ?
Ela respondeu:
- Claro filho! Vou preparar aquele bolo de
chocolate que você adora.
- Obrigado mamãe, você é sensacional!
14. Discurso indireto – É aquele no qual o narrador
reproduz as falas usando sua própria voz, ou
seja, ele se coloca no lugar dos personagens de uma
maneira indireta. Veja:
No momento em que jantavam, o garoto
pediu permissão à sua mãe para convidar alguns
amigos para assistirem filme em sua casa. Ela
concordou, dizendo que ia preparar um bolo de
chocolate para esperá-los, deixando seu filho
bastante feliz.
15. Discurso indireto livre – É quando ocorre uma
união, tanto das falas dos personagens quanto do
narrador. Como mostra o exemplo:
Quando chegaram, todos foram bem recebidos pelos
pais do garoto. Gostaram tanto que resolveram planejar
outro passeio. O garoto disse:
- No próximo final de semana podemos combinar para
irmos ao clube, o que acham?
Todos responderam:
- Que ideia fantástica!
Ficaram ansiosos à espera do grande dia.
16. OS PERSONAGENS
Quanto ao papel desempenhado no enredo:
a) Protagonista: é a personagem principal.
- herói: é o protagonista com características superiores às de
seu grupo;
- anti-herói: é o protagonista que tem características iguais
ou inferiores às de seu grupo, mas que por algum motivo
está na posição de herói, só que sem competência para
tanto.
17. b) antagonista: é a personagem que se opõe ao
protagonista, seja por sua ação que o atrapalha, seja por
suas características diametralmente opostas às do
protagonista. Enfim, geralmente seria o vilão da história.
c) Personagens secundárias: são personagens menos
importantes na história, isto é, que têm uma participação
menor ou menos frequente no enredo; podem
desempenhar papel de ajudantes do protagonista ou do
antagonista, de confidentes, enfim, de figurantes
18. O TEMPO
A época em que se passa o conto constitui pano de
fundo para o enredo. Nem sempre a época em que se
passa a história narrada coincide com aquela em que
ocorre sua publicação.
Tempo Cronológico: é o tempo em que ocorre na
ordem natural dos fatos do enredo. É o tempo
relacionado ao enredo linear, ou seja, à ordem em que os
fatos ocorrem. Chama-se cronológico porque pode ser
medido em horas, meses, ano, século.
19. Tempo Psicológico: é o tempo em que transcorre
numa ordem determinada pela vontade, pela
memória ou pela imaginação do narrador ou de uma
personagem. De acordo com esse tempo, os fatos
podem ou não aparecer em ordem linear, isto
pé, coincidente com a do tempo cronológico.
Flashback: é um recurso narrativo que consiste em
voltar no tempo.
20. O ESPAÇO
Físico ou geográfico: é o lugar onde acontecem
os fatos que envolvem as personagens:
rua, cidade, cinema, escola, cômodo da
casa, etc. o espaço pode ser descrito
detalhadamente ou suas características podem
aparecer diluídas na narração.
21. Social (ambiente): é o espaço relativo às
condições socioeconômicas, morais e
psicológicas que dizem respeito às
personagens. O espaço social situa as
personagens na época, no grupo social e nas
condições em que se passa a história.
22. Diferença entre conto e crônica
Muitas vezes a crônica confunde-se com o conto.
Mas, que fique bem entendido, não é qualquer crônica
que se assemelha ao conto. Quando a crônica recebe um
tratamento literário em relação ao texto jornalístico, como
o uso de várias figuras de linguagem, quando um pequeno
enredo é desenvolvido, principalmente com diálogo; é
que ela traça fronteiras muito próximas do conto. Tão
próxima, que muitas vezes, é difícil estabelecer uma linha
divisória. No entanto, podemos enumerar algumas
características da crônica que podem ser confrontadas
com as do conto
23. O PERSONAGEM
Enquanto o contista mergulha de ponta-cabeça na construção da
personagem, o cronista age de maneira mais solta. As personagens
não têm descrição psicológica profunda; são levemente
caracterizadas (uma ou duas características), suficientes para
compor seus traços genéricos, com os quais, qualquer pessoa pode
se identificar: Fulano é distraído, Beltrano é mau-caráter e
nacionalista xenófobo (que tem aversão a estrangeiros). Em geral, as
personagens não têm nomes: é a moça, o menino, a velha, o
senador, a mulher, a dona de casa. Ou, se têm, são nomes
comuns, como: dona Nena, seu Chiquinho, seu Bonifácio, para só
citar esses nomes. Às vezes, o cronista cria personagens, mas
sempre a partir de uma matriz real, isto é, pessoas reais que se
tornam personagens.
24. O NARRADOR
Enquanto no conto o narrador (protagonista ou
observador) é um personagem. Na crônica, o cronista
sequer tem a preocupação de colocar-se na pele de um
narrador-personagem ou observador. Assim, quem narra
uma crônica é o seu autor mesmo; pois, o cronista parte
de experiências próprias, de fatos que testemunhou (com
certo envolvimento) ou dos quais participou. Por isso, a
crônica tem, quase sempre, um caráter autobiográfico.
25. O ASSUNTO
O assunto de uma crônica é quase sempre fruto daquilo que
o cronista colhe em suas conversas, em sua vida cotidiana.
Portanto, o assunto da crônica é vindo da experiência
diária, ao passo que o assunto do conto, não raro, é produto
da imaginação, da ficção.
O DESFECHO
No conto há um conflito e, geralmente, um desfecho para
ele. Como a finalidade da crônica é analisar as circunstâncias
de um fato e não concluí-lo, o desfecho é praticamente
inexistente.
26. A LINGUAGEM
O cronista procura trazer para suas crônicas a oralidade das
ruas, isto é, ser oral no escrito. Daí ser predominante nas
crônicas a linguagem coloquial e até popular, para introduzir
um linguajar de bate-papo (do botequim, da esquina), de
conversa-fiada; todos carregados de gírias.
O DIÁLOGO
É a presença do diálogo na crônica, que faz com que ela se
aproxime do conto. Mas, na crônica, o diálogo é forma de
interação, que cria uma importante cumplicidade com o
leitor, principalmente, através de perguntas lançadas ao ar;
ou então, para manter um clima de descontração, sua
característica marcante.
27. A conclusão
A crônica tem, hoje, uma linguagem própria, um
espaço definido e independente - no jornal ou em
qualquer outro veículo de comunicação. Não é
superior ou inferior ao conto, como dizem alguns.
29. Diz que era uma vez um homem que tinha tantos filhos que não achava
mais quem fosse seu compadre. Nascendo mais um filhinho, saiu para
procurar quem o apadrinhasse e depois de muito andar encontrou a Morte a
quem convidou. A Morte aceitou e foi a madrinha da criança. Quando acabou
o batizado voltaram para casa e a madrinha disse ao compadre:
- Compadre! Quero fazer um presente ao meu afilhado e penso que é
melhor enriquecer o pai. Você vai ser médico de hoje em diante e nunca
errará no que disser. Quando for visitar um doente me verá sempre. Se eu
estiver na cabeceira do enfermo, receite até água pura que ele ficará bom. Se
eu estiver nos pés, não faça nada porque é um caso perdido.
O homem assim fez. Botou aviso que era médico e ficou rico do dia para
a noite porque não errava. Olhava o doente e ia logo dizendo:
- Este escapa!
Ou então:
30. - Tratem do caixão dele!
Quem ele tratava, ficava bom. O homem nadava em dinheiro.
Vai um dia adoeceu o filho do rei e este mandou buscar o
médico, oferecendo uma riqueza pela vida do príncipe. O homem foi e viu a
Morte sentada nos pés da cama. Como não queria perder a fama, resolveu
enganar a comadre, e mandou que os criados virassem a cama, os pés
passaram para a cabeceira e a cabeceira para os pés. A Morte, muito
contrariada, foi-se embora, resmungando.
O médico estava em casa um dia quando apareceu sua comadre e o
convidou para visitá-la.
- Eu vou, disse o médico - se você jurar que voltarei!
- Prometo! - disse a Morte.
Levou o homem num relâmpago até sua casa.
31. Tratou muito bem e mostrou a casa toda. O médico viu um salão cheio-
cheio de velas acessas, de todos os tamanhos, uma já se apagando, outras
vivas, outras esmorecendo. Perguntou o que era:
É a vida do homem. Cada homem tem uma vela acessa. Quando a vela
acaba, o homem morre.
O médico foi perguntando pela vida dos amigos e conhecidos e vendo o
estado das vidas. Até que lhe palpitou perguntar pela sua. A Morte mostrou
um cotoquinho no fim.
- Virgem Maria! Essa é que é a minha? Então eu estou, morre-não-
morre!
A Morte disse:
- Está com horas de vida e por isso eu trouxe você para aqui como amigo
mas você me fez jurar que voltaria e eu vou levá-lo para você morrer em
casa.
32. O médico quando deu acordo de si estava na sua cama rodeado pela
família. Chamou a comadre e pediu:
- Comadre, me faça o último favor. Deixe eu rezar um Padre-Nosso. Não
me leves antes. Jura?
- Juro -, prometeu a Morte. O homem começou a rezar o Padre-Nosso
que estás no céu... E calou-se. Vai a Morte e diz:
- Vamos, compadre, reze o resto da oração!
- Nem pense nisso, comadre! Você jurou que me dava tempo de rezar o
Padre-Nosso mas eu não expliquei quanto tempo vai durar minha reza. Vai
durar anos e anos...
A Morte foi-se embora, zangada pela sabedoria do compadre.
33. Anos e anos depois, o médico, velhinho e engelhado, ia passeando nas
suas grandes propriedades quando reparou que os animais tinham furado a
cerca e estragado o jardim, cheio de flores. O homem, bem contrariado
disse:
- Só queria morrer para não ver uma miséria destas!...
Não fechou a boca e a Morte bateu em cima, carregando-o. A gente
pode enganar a Morte duas vezes mas na terceira é enganado por ela.
36. ― Negativo. Já usei todas as formas discretas que podia.
Falei com você, expliquei, avisei. Nada. Você fazia de conta que
nada tinha a ver com o assunto. Minha paciência foi se
esgotando, até que não me restou outro recurso: vou ficar
aqui, carregando este cartaz, até você saldar sua dívida.
Neste momento começou a chuviscar.
― Você vai se molhar ― advertiu ela. ― Vai acabar ficando
doente.
Ele riu, amargo:
― E daí? Se você está preocupada com minha saúde, pague
o que deve.
― Posso lhe dar um guarda-chuva...
― Não quero. Tenho de carregar o cartaz, não um guarda-
chuva.
37. Ela agora estava irritada:
― Acabe com isso, Aristides, e venha para dentro.
Afinal, você é meu marido, você mora aqui.
― Sou seu marido ― retrucou ele ― e você é minha
mulher, mas eu sou cobrador profissional e você é devedora. Eu
avisei: não compre essa geladeira, eu não ganho o suficiente
para pagar as prestações. Mas não, você não me ouviu. E agora
o pessoal lá da empresa de cobrança quer o dinheiro. O que
quer você que eu faça? Que perca meu emprego? De jeito
nenhum. Vou ficar aqui até você cumprir sua obrigação.
Chovia mais forte, agora. Borrada, a inscrição tornara-se
ilegível. A ele, isso pouco importava: continuava andando de um
lado para outro, diante da casa, carregando o seu cartaz.
Moacyr Scliar