1. ESTUDO DAS FALHAS
Nomenclatura das Falhas
A determinação do nome a ser utilizado para uma
determinada falha implica no conhecimento da
direção exata e do sentido do movimento relativo
dos compartimentos. Esta determinação é
impossível em duas dimensões e a figura à direita
mostra que uma falha transcorrente pode, num
plano vertical, parecer uma falha vertical.
Neste caso, utiliza-se o termo separação antes do
nome da falha (no exemplo ao lado, falha
transcorrente sinistral com separação vertical),
para caracterizar que se trata de uma classificação
visual da falha, baseada num rejeito aparente.
Terminologia complementar
É possível observar no perfil vertical
à esquerda, que as falhas normais
podem provocar a omissão de
camadas enquanto que as falhas
inversas podem provocar a sua
duplicação. As primeiras são ditas
subtrativas, as últimas sendo
aditivas.
As falhas que provocam uma
diminuição global do comprimento das camadas paralelamente à estratificação são
falhas contracionais e as falhas que provocam um aumento global do comprimento
das camadas paralelamente à estratificação são falhas extensionais.
Quando uma falha inclinada recorta camadas
também inclinadas, a falha é dita conforme
(a) quando o seu plano e a camada
mergulham na mesma direção, e contrária
(b) quando eles mergulham em sentido
oposto.
Falhas que apresentam uma rotação interna (que
caracteriza o movimento relativo dos blocos) e
externa (que caracteriza a rotação das camadas)
idênticas são falhas sintéticas (b). Quando
rotações interna e externa são de sentidos
contrários, as falhas são antitéticas (a).
2. Determinação do sentido do movimento das falhas
A determinação da direção do movimento relativo dos compartimentos de falha é
geralmente possível com a utilização das estrias. O sentido do movimento ao longo
desta direção pode ser identificado utilizando-se vários indicadores. Os principais
critérios que podem ser utilizados com esta finalidade estão representados nas figuras
a seguir.
3. Deslocamento relativo de um marcador: é a situação mais
simples. Observa-se, de cada lado do plano de ruptura, um
mesmo objeto (p. ex. uma camada), deslocado pelo
falhamento, como na figura ao lado, que exibe um seixo
deslocado por uma falha. É, entretanto, necessário ter um
grande cuidado: num plano, observa-se apenas um rejeito
aparente que não pode corresponder à realidade.
Dobras de arrasto (ou drag folds)
As dobras de arrasto são feições que acompanham frequentemente falhas que afetam
materiais de plasticidade limitada (p. ex. ao se aproximar da transição rúptil/dúctil). A
deformação inicia-se por um encurvamento das camadas e evolui posteriormente para
uma ruptura. A forma da dobra de arrasto caracteriza o sentido do deslocamento.
Tectóglifos
Na ausência dos dois critérios anteriores, são utilizadas feições associadas ao plano de
falha: os tectóglifos ou marcas tectônicas. A literatura geológica é rica em exemplos
destas feições; entretanto, elas são de observação às vezes difícil e de interpretação
frequentemente ambígua. A observação de critérios diversificados em vários planos
cogenéticos é recomendada para se chegar a conclusões seguras.
Os tectóglifos podem ser agrupados em várias famílias:
- marcadores ligados a irregularidades do plano de falha: geralmente, a superfície de
falha não é perfeitamente lisa. Em certos casos, ela pode se apresentar mais ou menos
escalonada, com degraus milimétricos a decimétricos. Esses degraus, dependendo da
sua orientação, tendem a ser eliminados pelo deslocamento da falha ou, pelo
contrário, a ser preservados. Passando o dedo ao longo das estrias, a superfície parece
lisa quando o movimento do dedo é idêntico ao da falha e áspera quando ele se
desloca em sentido oposto ao dos blocos de falha.
Frequentemente, os movimentos ao longo de planos irregulares provocam o
aparecimento de aberturas, ou de zonas de superposição. As primeiras podem permitir
a recristalização de lentes de minerais, muitas vezes fibrosos (quartzo, calcita, etc.); já,
4. as zonas de superposição se transformam em zonas esmagadas ou são marcadas pelo
aparecimento de estilólitos.
Os degraus podem corresponder não a irregularidades iniciais do plano de falha, mas a
material arrancado do plano no decorrer do movimento. Os relevos assim formados
têm geralmente uma forma característica, semi-elíptica (meia lua).
Em outros casos, enfim, os degraus podem ser formados a partir da torção da foliação
da rocha quando ela apresenta uma certa obliqüidade em relação ao plano de falha.
Nestas três situações, também, o aspecto dos degraus é característico do sentido do
movimento.
- marcadores ligados à elementos estriadores: objetos duros (minerais, fragmentos de
rocha) podem provocar uma estriação do plano de falha. O objeto pode continuar
preso no sulco que ele cavou ou pode ser progressivamente triturado e eliminado. Nos
dois casos, a forma do sulco é característica do sentido do movimento.
- fraturas de segunda ordem: associados aos planos de cisalhamento principais,
desenvolvem-se frequentemente planos de cisalhamento de segunda ordem (Riedel e
Skempton) e fendas de tração. A disposição destas feições, quando comprovadamente
cogenéticas da falha, permite a delimitação do sentido do seu movimento.
Muitas outras feições podem ser utilizadas como indicadoras para o sentido de
cisalhamento, sempre com o devido cuidado.
As rochas formadas nas zonas de falha
A movimentação dos blocos, no decorrer do falhamento, pode provocar profundas
alterações nos materiais afetados, levando à formação de uma categoria específica de
rochas, as rochas cataclásticas, enquadradas no conjunto das rochas metamórficas
(metamorfismo dinâmico).
Essas rochas se formam por evolução de um
microfraturamento inicial. A coalescência das
microfraturas provoca uma partição da rocha em blocos
angulosos de tamanho variável. Com o adensamento da
rede de fraturas, o tamanho dos blocos tende a
diminuir. Essa diminuição pode ser acompanhada de
arredondamento progressivo dos elementos, induzido
pela sua rotação em conseqüência da movimentação
dos blocos de falha. Esse processo de trituração
(crushing), totalmente frágil (rúptil), chamado
cominuição ou cataclisação, leva à formação de rochas
constituídas por uma matriz englobando fragmentos
(clastos) da rocha inicial, conforme a figura ao lado.
5. As rochas formadas nessas condições podem ou não sofrer uma litificação,
apresentando-se coesas ou não. Em função da intensidade da deformação, tanto a
proporção fragmentos/matriz como o tamanho dos fragmentos varia.
No caso de falhas sísmicas (falhas ligadas a
terremotos, acompanhadas de uma
movimentação muito rápida), a energia
liberada pelo atrito dos blocos pode ser
suficiente para provocar uma fusão parcial
limitada nas rochas encaixantes ao longo
do plano de falha. O material líquido assim
formado, geralmente em volume pequeno,
provoca um aumento de pressão que pode
gerar um fraturamento hidráulico das
encaixantes. Esse material é injetado
nas fraturas assim formadas, onde ele
se resfria imediatamente, adquirindo
uma textura vítrea. Por conta da
semelhança com os taquilitos (vidros
vulcânicos), como observado na figura
acima, estas rochas são chamadas
pseudotaquilitos.
As rochas cataclásticas, agrupadas na
série cataclástica, podem ser
classificadas de acordo com a sua
coesão, tamanho dos seus clastos e
percentagem relativa clastos/matriz.
Esta classificação dá uma ideia
aproximada da intensidade da
deformação.
Observe, ao lado, a classificação das
rochas formadas em zonas de falha,
segundo Sibson.
O ESTUDO DAS FALHAS
De um ponto de vista estrutural aplicado, as falhas podem ser consideradas
descontinuidades quaisquer e serem descritas como tais. A maior parte das
observações aplicáveis às juntas podem também ser aplicadas às falhas.
Algumas características, entretanto, são peculiares:
- irregularidades características na superfície do plano (estrias, degraus, meia luas
etc.);
- associação frequente com rochas cataclásticas;
6. - intensificação das juntas nas proximidades do plano de falha que se comporta como
um corredor de fraturamento;
- persistência e espaçamento geralmente maiores do que no caso das juntas;
- geometria geralmente mais clara e analisável.
Representação Cartográfica das Falhas
Para tornar mais fácil a leitura e a interpretação das informações oferecidas pelos
mapas e perfis geológicos, tornou-se necessária a utilização de uma simbologia
complexa e rica.
Não existe, para representar feições estruturais em mapa, uma simbologia
normalizada universalmente aceita, mas, no caso das falhas, alguns símbolos são de
uso consagrado. Os principais deles estão representados na figura abaixo.
A figura abaixo mostra exemplos da utilização destes símbolos.
7. No caso dos perfis, a situação é mais complexa: a simbologia não é específica do tipo
de falha e indica apenas, por setas, o sentido do deslocamento relativo dos blocos
(figura abaixo – a). A figuras b e c mostram que esta prática pode levar a leituras
dúbias (na figura c, um trecho de falha inversa com movimento relativo a favor do
mergulho pode ser interpretado como uma falha normal. O prolongamento do traçado
da falha em linha tracejada acima da topografia, como foi feito na figura b, elimina
qualquer dúvida).
Falhas que, pelo seu tamanho, não podem ser representadas no mapa, mas que, pela
sua frequência, são consideradas relevantes, podem ser representadas, como as
juntas, através de projeções estereográficas caracterizando os domínios homogêneos.
É importante diferenciar, através de simbologias diversificadas, nestas projeções, os
tipos básicos de falhas. Podem ser representados tanto os polos de planos de falha
como as estrias, caracterizadas pelo seu sentido de movimento.
Geometria das Falhas em Regime Extensional
Os sistemas extensionais são geralmente geralmente caracterizados por associações
de falhas normais, conjugadas ou não. Duas geometrias básicas de superfícies de
falhas podem ser observadas:
- superfícies planas, correspondendo à geometria
em dominós (a) e
- superfícies curvas, caracterizadas por uma
atenuação do mergulho com o aumento da
profundidade, correspondendo à geometria lístrica
(b).
Nos dois casos, o falhamento implica numa rotação
do bloco falhado.
8. É frequente o plano de falha apresentar
variações locais de mergulho. As parte mais
suaves são os patamares e as partes mais
íngremes são as rampas, como se vê na
figura ao lado
A rampas perpendiculares à direção do
movimento são frontais; as paralelas
são laterais e as demais são oblíquas.
Na ilustração à direita observam-se
rampas frontais associadas a falhas
inversas.
Essas irregularidades locais do plano de falha tendem a ser eliminadas no decorrer do
movimento pelo aparecimento de uma
diverticulação do plano de falha original, um
segmento deste passando a ser inativo. A
imbricação assim formada é um duplex
extensional, limitado por um cisalhamento de
teto e um cisalhamento basal. Os duplexes
podem ser formados por uma ou várias
escamas, ou horses, imbricadas, conforme visto
na figura à esquerda.
Existem feições comuns à maioria dos sistemas
extensionais. A figura abaixo ilustra essas feições.
O limite entre o domínio estirado e o domínio não deformado é marcado por uma
falha principal, o detachment. As falhas do sistema paralelas ao detachment são
sintéticas, as falhas mergulhando em direção oposta são antitéticas.
9. Frequentemente, as falhas formam escamas imbricadas, ou imbricações: os leques
lístricos (que podem ser sintéticos ou antitéticos). As escamas (porção de terreno
incluída entre duas falhas consecutivas) são chamadas risers. Duas falhas com
mergulhos convergentes limitam um bloco rebaixado chamado graben, e duas falhas
divergentes limiam um bloco chamado horst.
Apesar das falhas normais representarem as principais feições encontradas em
sistemas extensionais, elas não são as únicas. É comum, por exemplo, encontrar, ao
longo dos rifts, variações da taxa de extensão.
Estas variações devem ser acomodadas por
feições de transferência que permitem passar
dos domínios mais estirados para domínios
menos estirados. A figura ao lado mostra um
exemplo dessas feições de transferência
(neste caso, trata-se de uma falha
transcorrente, feição extremamente comum
em todo sistema extensional, onde elas
recebem o nome consagrado de falha de
transferência (transfer fault).
Sendo geralmente desenvolvido em regime de cisalhamento puro, os sistemas
extensionais apresentam-se originalmente
quase simétricos. Entretanto, em certos
casos, o sistema é caracterizado de um lado
por um detachment e, do outro, por um
simples arqueamento, formando um meio
graben, conforme se vê na figura á
esquerda.
O afinamento crustal ligado a um regime extensional,
quando acentuado, leva à formação de uma depressão
propícia à deposição de sedimentos e, geralmente, existe
uma estreita associação entre falhamento e sedimentação
nas bacias sedimentares. As falhas ativas durante a
sedimentação são chamadas falhas de crescimetno (growth
fault). A associação dos processos de deposição, de
compactação diferencial, de subsidência e deformacionais
pode levar, no caso destas falhas, à geometrias complexas
(variação de espessura das camadas, discordância angular
progressiva ao longo do plano de falha etc.) A figura ao lado
exemplifica de modo simples a evolução de falha de
crescimento.
Os sistemas extensionais foram detalhadamente estudados no decorrer das últimas
décadas, principalmente em função do seu potencial petrolífero e numerosos são os
exemplos disponíveis na literatura. A figura a seguir mostra alguns desses exemplos.
10. Referência:
Texto extraído e modificado a partir de ARTHAUD, Michel H. Elementos de Geologia
Estrutural. Fortaleza, 1998.