O documento discute as relações entre a Doutrina Espírita e as ciências ordinárias. Afirma que a Doutrina Espírita mantém independência em relação às teorias científicas, que estão em constante mudança, e foca no elemento espiritual. Recomenda que discussões sobre o assunto usem linguagem acessível e enfatizem a dependência das ciências em relação às teorias.
( Espiritismo) # - ademir l xavier jr - doutrina espírita e as chamadas ciências ordinárias
1. ... Ademir L. Xavier Jr.
> Doutrina Espírita e as chamadas Ciências Ordinárias
Artigos
As fronteiras de contato entre a Doutrina Espírita e as chamadas ciências ordinárias são
compreensivelmente amplas, a demonstrar a existência de um enorne potencial para
trabalhos futuros. Entendemos, porém, que o Espiritismo guarda uma firme
independência em relação a interpretações desta ou daquelas teorias em voga, em parte
porque os rumos que as ciências tomam estão constantemente a se alterar, seja diante de
novos fatos experimentais ou da proposição de novas teorias. O Codificador da
Doutrina Espírita, Allan Kardec, com admirável sabedoria – mesmo para os dias de hoje
– soube muito bem separar a Doutrina Espírita do estado do conhecimento científico de
sua época. Tivesse ele tomado o caminho inverso, de há muito o Espiritismo teria
sucumbido.
O Espiritismo trata em sua essência do elemento espiritual. É seu objetivo fornecer a
nós, Espíritos encarnados em diferentes graus de entendimento, uma visão
suficientemente coesa da vida além túmulo para que possa sustentar os objetivos
maiores da Doutrina que é a reforma – ainda que tardia – do espírito humano em suas
manifestações morais. O Espiritismo parece ter sido feito para os que não se satisfazem
com explicações sustentadas em autoridade ou tradição religiosa. Mas para os que
entendem a essência do pensamento espírita, essa visão certamente é imperfeita, na
medida que virá a ser completada ou suprimida em futuro que hoje ninguém poderia
precisar com certeza absoluta, da mesma forma que as descrições da ciência são revistas
quase que a cada minuto.
O debate que se pode estabelecer entre disciplinas com objetivos diferentes como é o
caso do Espiritismo e da Física, por exemplo, deve acontecer sempre tendo-se em mente
que apenas marginalmente seremos capazes de manipular os conceitos fundamentais em
ambos os lados. Do nosso ponto de vista esse debate satisfaz mais ao intelecto, que se
acostumou – porque foi treinado na área – a lidar com idéias e jeito de pensar das
ciências ordinárias, onde tais conceitos tem alto grau de flexibilidade.
Preocupa-nos porém a utilidade desse debate para os que não tem esse treinamento.
Nesse caso, como soarão em seus ouvidos a descrição dessas extrapolações ou novas
interpretações? Parecem ecoar muito mais absolutas, por isso mesmo despertando vivo
interesse que, às vezes, torna-se exagerado e contraproducente. Por isso que, nós no
Conselho Editorial do Grupo de Estudos Avançados Espíritas - GEAE, procuramos ter o
cuidado de revisar com os autores a exposição dessas idéias não com o objetivo de
censurar, mas muito mais seguindo os moldes das revistas científicas onde as idéias –
antes de serem publicadas – passam por um processo de revisão (as vezes muito lento)
que pode inclusive concluir pela impossibilidade de publicar o texto nos Boletins.
Essa revisão, necessariamente, leva em conta nossa linha editorial, como exposta no
FAQ do grupo, que se preocupa principalmente com a necessidade de promovermos o
2. estudo fraterno da Doutrina sem entrarmos em polêmicas improdutivas ou cairmos em
disputas pessoais.
Gostaríamos assim de sugerir a todos os autores que se propõem a escrever sobre a
relação Espiritismo X Ciência que atentem principalmente para os objetivos de seus
trabalhos, assim como para o impacto que terão frente ao público que não está
familiarizado com a terminologia técnica e com a flexibilidade das concepções
científicas como discutimos acima. Pedimos que – tanto quanto possível - tais textos
sejam escritos em linguagem acessível, pedagógica, que tenham um foco e que sejam
plenamente embasados na concepção maior de que as ciências ordinárias estudam o
princípio material, enquanto que o Espiritismo trata do princípio espiritual. Que
procurem chamar a atenção para a alta dependência das idéias científicas de suas
teorias e que guardem zelo pela Doutrina – como a única que temos haja vista não
existirem provas de que ela hoje tenha que ser suplantada por uma outra.
http://www.geae.inf.br/
Muita paz,
Ademir L. Xavier Jr
... Ademir L. Xavier Jr.
> Vendo o Invisível
Artigos
Uma revisão rápida de alguns métodos de se observar o que não é acessível
aos sentidos comuns
Resumo
Durante séculos, os homens sonharam em observar o invisível, em ter
acesso a coisas ocultas, em devassar aquilo que aparentemente estaria fora
do alcance dos sentidos comuns. Entretanto, a evolução natural da Ciência
mostrou que há fenômenos que nunca podem ser captados por nossos
sentidos ordinários, mas que podem se tornar tangíveis por meio de
transdutores ou meios especiais. O papel desses meios é de ser um
intermediário entre o fenômeno e os sentidos comuns. Nesse texto fazemos
uma revisão comentada de alguns métodos de observação do invisível (a
3. partir de exemplos da física). Em particular, analisamos em detalhes o
fenômeno das fotos Kirlian. Obviamente essa discussão também pode
trazer subsídios ao futuro da pesquisa espírita experimental como discutido
na conclusão deste texto.
Contéudo
1 - Introdução classificatória dos fenômenos naturais
2 - Acessando o "imponderável"
3 - Radiações invisíveis (causas materiais)
· Raio X
· Ondas de Rádio
4 - Fenômenos limiares (causas materiais)
· Câmara de Nuvens
· Câmera Schlieren
· Câmera Kirlian
5 - Comentários finais
6 - Referências
1 - Introdução classificatória dos fenômenos naturais
O universo que vivemos é um tecido de fenômenos distintos, muitos deles
cíclicos, outros esporádicos. Da grande classe de fenômenos existentes
descobriu-se, ao longo do progresso da ciência, que apenas uma parcela
ínfima deles é acessível à observação comum. Podemos dividir os
fenômenos, quanto à acessibilidade pelos sentidos ordinários em grandes
classes:
· Fenômenos observáveis pelos sentidos comuns, faceis de se observar,
cíclicos, facilmente previsíveis e de grande impacto: por exemplo, eclipses
do sol, da Lua, a passagem e o fluxo das coisas da Natureza mais próxima -
são o grupo de fenômenos que forma nossa vizinhança comum e de onde
extraímos nossas principais experiências de vida;
· Fenômenos observáveis pelos sentidos comuns mas no limiar da resolução
de captação desses sentidos. Por exemplo, o ruído dos morcegos (a
freqüências sonoras muito altas - acima de 20KHz, mas modulados de
forma a serem parte audíveis); fenômenos celestes no limite de acuidade
visual;
· Fenômenos observáveis mais muito raros e aperiódicos: são aqueles que
se podem acessar pelos sentidos mas que contam com reduzidas
testemunhas. Por exemplo, os famosos "raios em bola" [6] - descargas
atmosféricas em forma de esferas que surgem durante as tempestades.
Outro exemplo é a queda de meteoritos. Em geral, esses fenômenos são de
difícil descrição teórica justamente porque não ocorrem sempre, por isso a
aceitação geral deles é tardia ou limitada;
4. · Fenômenos não observáveis pelos sentidos comuns e cíclicos. A imensa
maioria dos fenômenos naturais encontra-se nessa classe: emissão de ondas
de raio, raios X pelo Sol, estrelas e corpos celestes, o ruído em infrasom
dos insetos, os ruídos supersônicos além do limiar audível, radiações e
partículas invisíveis que banham a Terra vindas do espaço ou de corpos
radioativos;
· Fenômenos não observáveis pelos sentidos comuns e aperiódicos. São os
fenômenos mais difíceis aparentemente. A ciclicidade dos fenômenos está
fortemente ligada as causas dos mesmos. Em geral, fenômenos cíclicos tem
causas concebivelmente simples: o farfalhar das folhas de uma árvore se
deve a ação do vento, a mudança das estações à mudança da altura aparente
do sol ao longo do ano etc. Já os fenômenos aperiódicos são de mais difícil
explicação. Fenômenos não acessíveis aos sensos comuns, aperíodicos e
raros formariam a classe mais difícil de teorização. Os fenômenos espíritas
pertencem a classe dos fenômenos não acessíveis aos sentidos comuns,
aperiódicos mas não raros. Estão fora do alcance dos sentidos ordinários
(ainda que possam ser acessados por um aperfeiçoamento desses sentidos -
a mediunidade) mas sua aciclicidade não se deve a uma causa
necessariamente complexa mas sim inteligente.
A fig. 1 mostra um quadro resumo dos tipos existentes de fenômenos
segundo essa classificação
Fig. 1 Esboço de uma classificação geral dos fenômenos naturais segundo a
acessibilidade aos sentidos ordinários, freqüência de ocorrência e causa.
2 - Acessando o "imponderável"
O fato de um determinado fenômeno tornar-se acessível por meio de uma
transformação natural (por exemplo, numa reação química entre dois
reagentes incolores produzindo um outro com uma cor muito viva) ou de
um dispositivo intermediário - um médium - cerca o executor da operação
ou o próprio dispositivo de uma aura de mistério. Isso porque, muitas
vezes, a teoria por detrás do fenômenos é desconhecida. Sabemos que
grande parte do conhecimento científico está na forma teórica - o que
significa que fenômenos devem estar harmonicamente ligados às teorias
que os pretendem explicar. Assim sendo, abrir os sentidos humanos a esses
fenômenos (aqueles de difícil aceitação por interagirem fracamente com
nossos sentidos) também abre perpectivas teóricas antes inimagináveis
pois, muitas vezes, esses fenômenos inacessíveis são regidos por leis
particulares distintas dos fenômenos ordinários. A história das ciências está
repleta de muitos exemplos nesse sentido. De modo geral, todos os
5. fenômenos ou ocorrências não ordinárias (para além dos limites sensoriais),
para se tornarem conhecidos, envolvem algum tipo de meio ou sistema
intermediário que é responsável por acessar diretamente os sentidos
humanos. E não poderia ser de outra forma uma vez que nosso vínculo com
o mundo externo está ligado exclusivamente a posse desses sentidos (fig.
2). As teorias científicas devem não só explicar os fenômenos naturais mas
também prover subsídios para que possamos compreender como tais
fenômenos podem influenciar nossos sentidos (quais os meios para isso,
ainda que indiretos). De acordo com a Fig. 2, podemos ver que não temos
acesso diretamente aos fenômenos, mas sim aos sinais por eles gerados.
Nesse processo de transmissão de sinais, há obviamente interferências
externas e atenuações que modificam o quadro aparente dos fenômenos
para o observador.
Assim sendo, para "acessar o imponderável" precisamos de um dispositivo
ou meio que faça a conversão entre os sinais característicos da ocorrência
"não-sensorial" e os nossos próprios sentidos. Precisamos, antes disso, de
uma ciência que nos permita entender como isso é possível. Analisemos
brevemente aqui o mecanismo de alguns desses dispositivos - com origem
material - para depois inferir regras gerais para a busca e pesquisa dos
fenômenos espíritas em particular sobre a possibilidade de se dispensar o
mecanismo humano - os médiuns com instrumentos por excelence da
pesquisa espírita. Para tanto vamos examinar resumidamente a descoberta
de algumas radiações e o mecanismo de funcionamente de dispositivos que
servem à pesquisa da matéria que não impressiona os sentidos ordinários
mostrados na Fig. 2.
3 - Radiações invisíveis (causas materiais)
Raio X
A 8 de Novembro de 1895, o professor alemão Wilhelm Conrad Röntgen
(1845-1923), enquanto trabalhava em seu laboratório em Wurzburg,
prestou atenção a irradiações luminosas que partiam de uma tela
emulsionada com platinocianeto de bário, todas as vezes que ligava um dos
seus "tubos de Crookes", um dispositivo de raios catódicos inventado por
William Crookes (1832-1919). A tela estava localizada longe do tubo e
sempre reluzia ainda que qualquer outro objeto fosse colocado na linha que
a ligava ao tubo. Röntgen foi capaz de mostrar a propriedade de penetração
desses raios, fornecendo ao mundo a primeira "radiografia" e um método
eficaz de pesquisa médica e física.
6. A descoberta de Röntgen foi totalmente acidental pois os raios emitidos
pelo tubo de Crookes são completamente invisíveis. Hoje sabemos que se
devem à colisões de minúsculas partículas (elétrons) na parede do tubo que
os gera. Na época de Röntgen a realidade dessas partículas (igualmente
invisíveis) era absolutamente desconhecida. Atentando para o desenho da
Fig. 3, vemos que a “realidade” (no sentido de sua impressão a um sentido
ordinário – a visão) foi inferida indiretamente por meio da placa
emulsionada com o sal de bário que tem a propriedade de emitir luz toda
vez que atingida pelos raios X. Acidentalmente também, Röntgen
descobriu que esses raios não eram barrados por obstruções materiais.
Trocando a placa por uma chapa fotográfica e o objeto por um membro do
corpo humano, a radiografia médica estava inventada.
Fig. 3 Esquema da descoberta de Röntgen (Raios X)
Ondas de Rádio
A base teórica para compreensão e previsão da existência de ondas de rádio
foi feita por James Clerk Maxwell em 1873 em seu artigo "A dynamical
theory of the electromagnetic field" publicado na Royal Society. De acordo
com [1], David Hughes em 1878 mostrou que sua balança de indução
provocava ruídos em um telefone construído em casa por ele. Na época,
sua descoberta foi desqualificada como sendo efeito de indução de
correntes. Entre 1886 e 1888, Heinrich R Hertz validou a teoria de
Maxwell por experimentação, demonstrando que a radiação gerada por ele
tinha característica de ondas. No Brasil, o padre Landell de Moura
conduziu experimentos por volta de 1893 sobre um dispositivo de rádio
primitivo.
Na essência do experimento de Hertz estava a produção de um tipo de
radiação invisível que não se poderia explicar usando o paradigma de
indução de correntes (¹). Hoje sabemos que a indução de correntes pode ser
usada na explicação da excitação elétrica provocada nas antenas de rádio
mas acoplada à idéia da propagação das ondas eletromagnéticas. Na época
a realidade dessas ondas não era conhecida, e muito menos que se tratava
de um tipo de radiação da mesma natureza da luz.
7. Fig. 4 Esquema da demostração de Hertz sobre ondas eletromagnéticas
(OEM).
A Fig. 4 traz um desenho muito simplificado do experimento de Hertz.
Usando uma bobina de indução (semelhante a usada por Röentgen), faíscas
são geradas em dois terminais acoplados a um sistema capacitivo (que
armazena eletricidade até ocorrer uma faísca). A faísca gera ondas
eletromagnéticas que se propagam pelo espaço (ondas de rádio). Essas
ondas são detectadas a distância por um outro dispositivo chamado
resonador. O resonador produz faíscas cuja intensidade depende de sua
distância da bobina. Com esse arranjo, Hertz foi capaz de mostrar a
“natureza ondulatória” da radiação eletromagnética, demostrando, inclusive
a existência de polarização nas ondas de rádio (²).
Além da possibilidade de “ver o invisível” presente em todo espectro
eletromagnético (Fig. 5), para além do violeta e abaixo do vermelho,
sistemas de comunicação eficientes foram desenvolvidos com considerável
sofisticação na região das ondas de rádio. O esquema inferior da Fig. 5
(explicando a comunicação via rádio) pode ter todos os constituintes
equivalentes da Fig. 2 plenamente evidenciados. Analisemos os
experimentos de Röntgen e Hertz de acordo com a perpectiva de interação
sensorial explícita na Fig. 2. Tanto o raio X como as ondas de rádio - que
hoje sabemos ter a mesma natureza, a despeito da diferença de uma
propriedade fundamental, o comprimento de onda - não geram fenômenos
registráveis pelos sentidos descritos na Fig. 2. Houve uma longa cadeia de
raciocínios e ponderações (com consideráveis trabalhos teóricos) até que se
concluísse serem os dois experimentos explicáveis por uma mesma causa.
Não se pode dizer que os raios X ou as ondas de rádio tornaram-se
conhecidas para nós por meio desses experimentos, sem levar em
consideração os trabalhos teóricos da época. Podemos dizer que eles
evidenciam hoje, diante de uma teoria consideravelmente aceita e bem
desenvolvida - e de forma totalmente indireta aos nossos sentidos humanos
- a existência de uma causa comum que nos é insensível. Esses arranjos
experimentais (e outros mais sofisticados) são meios que nos possibilitam
hoje interagir com radiações invisíveis, através de sistemas que geram
sinais detectáveis por nossos sentidos ordinários.
8. Fig. 5 Espectro eletromagnético e uma explicação de como funciona o
sistema de comunicação via rádio.
Referências
[1] http://en.wikipedia.org/wiki/Radio
¹ Diz respeito ao aparecimento de correntes em condutores devido a ação
de outras correntes próximas ou magnetos em movimento.
² Fenômeno típico da radiação luminosa que se sabia, na época, ter origem
na natureza ondulatória da luz.
4 - Fenômenos limiares (causas materiais)
Os dispositivos descritos na seção anterior envolvem algum tipo de
radiação invisível. Aqui vamos discutir dispositivos ou sistemas que
permitem “observar” ou inferir a presença de outro tipo de corpo invisível
utilizando propriedades de estado da matéria.
Câmara de Nuvens
O desenvolvimento da câmera de nuvens, também conhecida como câmera
de Wilson, representou um passo importante na física do século XX. Uma
variante da câmera de Wilson é a câmera de bolhas que emprega líquido ao
invés de vapor. O objetivo desse dispositivo é observar traços de partículas
carregadas eletricamente. Naturalmente, partículas elementares são
invisíveis. Por isso, esses dispositivos foram desenvolvidos, pois permitem
observar indiretamente o traçado dessas partículas. Considerando ainda que
existem partículas desconhecidas, muitas delas cuja existência foi prevista
teoricamente muito antes da evidência experimental, a câmera de bolhas foi
um dispositivo eficiente na comprovação experimental de novas
descobertas. Charles T. R. Wilson e Arthur H. Compton receberam o
prêmio Nobel de Física por suas descobertas utilizando a câmara de nuvens
em 1927.
O princípio de funcionamento da câmera de nuvens é bem simples [2][3].
Um gás ou vapor é colocado a uma pressão superior a pressão de ponto de
9. saturação (a partir de onde começa uma transição de fase de vapor para
líquido). Esse tipo de fenômeno é conhecido como “meta-estabilidade”.
Basta uma pequena perturbação para que haja condensação do vapor na
forma líquida que, então, pode ser observada. Essa perturbação pode ser
causada pela presença de íons (partículas carregadas). Uma avalanche de
condensação ocorre ao longo da trajetória da partícula gerando gotas que
ficam em suspensão e que podem ser fotografadas.
O arranjo experimental da câmera de nuvens é mostrado na Fig.6a. A
câmara armazena o vapor à pressão correta. Um campo magnético pode
cobrir a região de observação do fenômeno. Com isso, é possível saber a
carga e medir a energia com que a partícula ou íon atravessa o espaço. Ao
atingir a câmara, o vapor se condensa na trajetória da partícula ou íon, o
que pode ser fotografado ou mesmo visualizado. A Fig. 6b traz uma
imagem negativa de um traçado obtido em uma câmara de nuvens onde se
podem distinguir as trajetórias de diversas partículas facilmente (inclusive
os famosos mésons pi).
A
Fig. 6 Arranjo básico de uma câmera de núvens (a).
B
10. Exemplo de traço de partículas obtido onde se evidencia a existência de
píons e outras partículas elementares.
A câmera de nuvens só funciona porque as partículas carregadas interagem
com o vapor saturado. Partículas neutras não geram traçado algum (como
se pode ver na Fig. 6b nos traçados em branco da partículas lambda e K
que são neutras).
Câmera Schlieren
Hoje sabemos que o som é uma forma de vibração mecânica que se
propaga no ar. Essa vibração tem freqüência particular (³) e impressiona
diretamente nossos ouvidos constituindo o rico universo sonoro. Sabemos
também que a sensação de calor advém das vibrações mecânicas das
moléculas de ar ao nosso redor (que tem uma energia de movimento
superior ao de um ambiente mais frio). O calor também se “propaga” como
radiação: as vibrações moleculares podem ser “excitadas” por um tipo de
luz invisível - a radiação infravermelha distante - que nada mais é do que
um tipo de radiação eletromagética semelhante à luz ordinária mas
invisível. É assim que recebemos o calor diretamente do sol, pois o espaço
entre a Terra e nossa estrela mais próxima não tem densidade de matéria
para possibilitar o transporte de calor por meio mecânico (colisão entre
moléculas).
11. Tanto o som como o calor são acessíveis aos sentidos humanos por meio
de sentidos distintos da visão. Entretanto existe um meio de tornar tanto o
som como o calor visíveis. Essa é a tarefa de um dispositivo conhecido
como câmera Schlieren [4] (do alemão “estrias”), que gostaríamos de
comentar como próximo exemplo. O princípio de funcionamento e
esquema de uma câmara Schlieren é mostrado na Fig. 7. Uma fonte de luz
pontual é colocada no foco (ponto de convergência de raios do infinito) de
uma lente convexa L1. Há uma certa distância de L1 uma outra lente
convexa L2 (que pode ser idêntica a L1) é colocada de tal forma que seu
foco coincida com a posição de um anteparo em forma de lâmina.
Fig. 7 Esquema óptico de funcionamento de uma câmera Schlieren
Um objeto é colocado entre as lentes L1 e L2. Esse objeto está colocado há
uma certa distância de L2 de tal forma que sua imagem (se não existisse o
anteparo em canto) é formada sobre o anteparo ou câmera fotográfica.
Porque o anteparo em canto é colocado exatamente sobre o foco da lente
L2, qualquer variação na posição do canto causa o obscurecimento da tela e
nenhuma imagem é observada. O mesmo efeito acontece se houver uma
variação nas propriedades ópticas do meio onde o objeto é colocado. Uma
pequena variação nessa propriedade (conhecida como “índice de refração”,
que mede o grau com que a luz é desviada pela matéria - sendo uma
propriedade da matéria e da cor da luz) é amplificada pelo arranjo óptico e
localização do anteparo. Assim, se na região de teste (onde se coloca o
objeto) fizermos som se propagar a uma freqüência e intensidade definida
(usando um gerador de som) podemos observar no anteparo as variações de
pressão causadas pelas ondas sonoras que também podem ser descritas
como ondas de pressão. O som torna-se visível! A câmera Schlieren é
utilizada em laboratórios mundiais na pesquisa de sistemas de
aquecimento, combustão de gases, sistemas aerodinâmicos e outros [5].
Fotos desse tipo permitem visualizar fenômenos que acontecem em meios
transparentes (o que inclui líquidos).
Além disso, qualquer variação térmica no fluído da região de teste torna-se
visível no anteparo da câmera. A Fig. 8 trás duas fotos Schieren
particularmente interessantes. Na Fig. 8(a) uma pessoa tosse. O fluido
expelido (a uma temperadura maior que ambiente) produz eflúvios
térmicos fácilmente visíveis. Pode-se notar também que o calor que emana
da cabeça da pessoa provoca ondas de convecção que sobem por serem
menos densas. Na Fig. 8(b) uma foto Schlieren de uma mão “recém-aberta”
mostra eflúvios térmicos emanando da palma extendida.
12. (a)
Fig. 8 Imagens Schlieren mostrando eflúvios térmicos de uma pessoa
tossindo (a)
(b)
e de uma mão “recém aberta” (b). Crédito: Dr. Gary Settles/ Science photo
libray.
Os dois exemplos mostrados mostram como explorando propriedades de
mudança de estado de sistemas pode-se amplificar perturbações muito
pequenas e tornar acessível aos sentidos comuns objetos ou coisas
relacionados as causas das perturbações pequenas. No caso da câmera de
bolhas, a metaestabilidade do líquido permite rastrear íons carregados
tornando “visíveis” partículas ínfimas. No caso Schlieren, a região de foco
onde se coloca o anteparo em canto é para onde convergem todos os raios
da fonte luminosa que foram colimados pela lente L1. Portanto, qualquer
variação da área provocada pela colocação de um anteparo provoca grandes
oscilações no nível de luz no anteparo final. Variações pequenas no índice
13. de refração do meio transparente são assim amplificadas permitindo a
visualização tanto de fenômenos sonoros como térmicos.
Referências
3. Na verdade qualquer som, a menos que seja “puro”, tem uma
distribuição de freqüências típicas.
Câmera Kirlian
Propositalmente incluímos no final desse texto uma breve análise de um
fenômeno ou técnica fotográfica que se tornou bastante popular nas
décadas de 70 e 80, sendo utilizada para realização de diagnósticos
médicos, a despeito de soar suspeita à comunidade acadêmica. Trata-se do
método de fotografia elétrica (eletrografia) descoberto por Semyon Kirlian,
um técnico de eletrônica russo, por volta de 1939.
Antes de analisar as explicações e os propósitos da foto Kirlian, vamos
descrever com algum detalhe a técnica fotográfica Kirlian.
Fig. 9 Esquema com os elementos básicos de uma câmera Kirlian clássica
Na técnica clássica de fotografia Kirlian, um objeto “biológico” ou amostra
com razoável condutividade elétrica (obviamente pode-se colocar um
objeto não vivo, por exemplo, uma moeda) é colocado sobre o filme que
toca a superfície de uma placa metálica. Essa placa é conectada a um
gerador de alta tensão alternada (que pode ser um bobina de Tesla,
transformador de alta tensão, isto é, a voltagem elétrica final é uma função
oscilante no tempo com uma certa distribuição de frequências).
Freqüências típicas giram em torno de 70KHz. Os potenciais envolvidos
são bastante elevados, mas a corrente total que circula no circuito da Fig. 9
é regulada de forma a ser pequena (para evitar choque elétrico ou
descaracterização da amostra). A amostra biológica é conectada a um fio
terra para reduzir seu potencial. O objeto biológico (que pode ser o dedo de
uma pessoa) toca a superfície onde o material sensível à luz é depositado.
Ao se ligar o gerador de alta tensão por alguns segundos (o tempo de
14. exposição depende da sensibilidade do filme), uma imagem da descarga
elétrica é revelada (Fig. 10).
a)
b)
Fig. 10 Exemplo de fotos Kirlian (a) um negativo preto e branco do efeito
corona em torno de uma moeda,
(b) Foto Kirlian em filme fotográfico do dedo de uma pessoa revelando
tonalidade de cores bem diferentes do efeito corona
É possível observar a vista desarmada o surgimento de uma coroa de raios,
por isso o nome “descarga corona”, em torno do objeto. Essa coroa tem a
cor azulada, típica de fenômeno elétrico de alta tensão. Deve-se a ionização
de gases presentes em torno do objeto, isto é, o campo de rádio frequência
(RF) “excita” o ar em torno do objeto. Muitos dos constituintes do ar tem
moléculas que se tornam ionizadas, isto é, perdem elétrons tornando-se
carregadas positivamente. Os elétrons oscilam “livremente”, isto é de
acordo com o campo elétrico, eventualmente encontrando íons positivos e
se ligando a eles. Esse processo gera luz visível, ou seja, a descarga corona
é um mecanismo pouco eficiente de conversão de energia eletromagnética
em luz. Se pudessemos computar o total de energia por segundo (em Watts)
envolvido no fenômeno (fornecido pelo gerador de alta tensão) diríamos
que uma parte é transformada em luz, outra em calor (colisão de elétrons
com a rede cristalina do metal a potencial oscilante, que gera calor) e a
imensa quantidade está presente no próprio campo de RF, ou seja, nunca
deixa de ser energia elétrica mesmo e é carregada pelos elétrons. A cor azul
15. que se vê a vista desarmada - como a que se vê na Fig. 10 (b) - é
característica do tipo de gás que envolve o objeto, o ar, na imensa maioria
nitrogênio e oxigênio ionizados e compostos, a mesma cor que se pode ver
nas chamas de fogão ou nos relâmpagos das tempestades.
Ocorre que outros tipos de cores e tonalidades (não visíveis) aparecem no
filme fotográfico, Fig. 10(b). A que se deve isso? Uma quantidade grande
de especulações e teses foram levantadas, na falta de uma teoria que
unifique todos os arranjos experimentais possíveis e forneça uma
explicação para o aparecimento das cores. Em todo ramo do conhecimento
científico onde aparecem fissuras teóricas, é provável também a exploração
de fenômenos pouco conhecidos de forma considerada “pouco científica”.
Por “científico” aqui no referimos tão somente à existência de uma teoria
bem desenvolvida. No caso da foto Kirlian, a deficiência teórica está
localizada na dificuldade de se unir duas grandes áreas da ciência: a física
e a química. Existem lacunas consideráveis na explicação de reatividade
química de gases submetidos à potenciais oscilantes elevados [6], como
eles interagem com um depósito de sais fotosensíveis e como esses sais
eventualmente interagem com esse mesmo campo elétrico oscilante. Além
disso físicos e químicos utilizam linguagens e abordagens bem diferentes
para tratar um mesmo fenômeno. Para químicos, reações químicas
complexas ocorrem no ar excitado pelo campo elétrico (que aumenta a
reatividade química dos constituintes do ar) enquanto que, para físicos, a
descarga corona é um tipo de plasma frio (4). Isso aliado ao pouco interesse
acadêmico das fotos Kirlian, contribui para tornar a situação ainda mais
desoladora.
Nesse ambiente de aridez teórica surgem então explicações dos mais
variados tipos, algumas que pretendem “esgotar” completamente o tópico,
outras meramente ligadas a aspectos comerciais que exploram outras
hipóteses. Uma rápida busca na internet levanta explicações como citadas
abaixo:
1. Uma câmera que coloca sua aura ou campo de energia no filme
instantaneamente. Descubra sua freqüência vibracional pessoal através da
fotografia Kirlian. [7]
2. A fotografia Kirlian é uma ferramenta valiosa que produz fotos, videos
ou imagens computadorizadas do fluxo de energia. [8]
3. “...o que é ionizado pelas descargas elétricas são os gases e/ou vapores
exalados pelas papilas digitais. Como esses gases e/ou vapores são
produzidos pelo metabolismo celular, está claro que indicarão como se
encontra o estado de saúde orgânica e psíquica da pessoa, inclusive, até
mesmo, sua sexualidade, devido à exalação dos feromônios.”[9]
4. …Um método de investigação de objetos biológicos, baseado na
interpretação da imagem em descarga corona obtida durante exposição a
um campo de alta freqüência, de alta voltagem, que é gravado seja em
filme fotográfico ou por equipamentos de gravação de vídeo modernos. Seu
16. principal uso é fornecer um meio rápido, barato e relativamente não
invasivo de diagnóstico de estados fisiológicos e psicológicos.
Pode-se dividir os tipos de explicações para as fotos Kirlian em dois tipos:
a) explicações não físicas b) explicações físico-patológicas. O primeiro tipo
pretende dizer que as cores ou mesmo a própria imagem de raios corona
está ligado “a aura” do indivíduo, sendo uma imagem desta. Obviamente
esse tipo de “explicação” tem nítidos objetivos comerciais - em (1) e (2) o
objetivo é vender “máquinas Kirlian” - sendo uma maneira de se explorar
indiscriminadamente a idéia que se capturar com máquinas objetos de
natureza “não material”. Naturalmente, isso não causa prejuízos a
existência do fenômeno de avistamento de halos ou figuras luminosas em
torno de pessoas ou Espíritos, que é bastante comum na literatura espírita
ou mesmo religiosa antiga. Trata-se esse último de um tipo de fenômeno
relacionado ao estado de vidência mediúnica e de natureza muito distinta
do que estamos analisando aqui.
Particularmente em (2) fala-se em um “fluxo de energia”. É de certa forma
correto dizer que uma foto Kirlian representa um impressão fotográfica “do
campo de energia”, apenas devendo-se acrescentar “energia elétrica”. O
potencial elétrico alternado em torno do objeto nas proximidades da placa
metálica energizada tem seus valores mais elevados justamente na região
vizinhas ao objeto, um potencial suficiente para que haja ruptura das
moléculas (excitação) e conversão em luz. O efeito corona é assim um
mapa das regiões de maior intensidade desse campo, que não se limita a
essas regiões entretanto, semelhantemente ao que ocorre com a câmara de
nuvens e Schlieren descritas anteriormente. Em (2) a palavra “energia” é
utilizada sem referência alguma ao tipo, explorando uma possível falta de
conhecimento do leitor do real significado dessa palavra. Além disso a
expressão “freqüência vibracional pessoal” carece de qualquer significado.
Definitivamente, fotos Kirlian não são um mecanismo de se acessar o
invisível dessa maneira.
Explicações “físico-patológicas” tiveram início com o próprio Kirlian e se
desenvolveram na extinta União Soviética através da criação da idéia de
“bioplasma”. Em “Photography by means of high-frequency currents” [11],
Semyon Kirlian e Valentina Kh. Kirlian descrevem:
“Um organismo vivo (por exemplo, a folha de uma planta) que foi colocada
em um campo elétrico de um oscilador distorce o campo de acordo com sua
natureza dielétrica. Não importa quantas espécies de plantas são
fotografadas sob as mesmas condições, cada espécie dará uma imagem de
caráter único.”
A seguir ainda comenta:
“Podemos concluir que a condição biológica dos objetos vivos, quando
fotografados com a corrente de alta freqüência, é representada em
17. magnitudes elétricas que esse sistema eletro-óptico é capaz de gravar essa
topografia.
Estabelecendo-se a conexão entre a mudança no estado elétrico e a
anatomia e fisiologia do objeto vivo, o método da fotografia de altas
freqüências pode ter aplicações científicas variadas. Por exemplo, em
agricultura, ela pode ser usada para determinar o grau de maturidade de
uma planta, a produtividade de uma plantação, processos patológicos etc."
A origem da aplicação de Kirlian (que se tornou a razão de suas pesquisas)
foi a relação que existe entre as constantes dielétricas (5) e impedância
superficial a altas freqüências dos materiais (no caso seres animados) e seu
estado interno. Naturalmente, é concebível que o efeito corona seja
modificado se essas propriedades se alterem. Assim, ao se fotografar uma
folha de um vegetal recém cortado, folha que contem razoável quantidade
de água, pode-se observar uma redução do efeito corona ao longo do
tempo, a medida que a água ou outras substâncias abandonam a folha em
estado de decomposição. Da mesma forma, o efeito Kirlian observado ao
redor do dedo de uma cadáver, deve evoluir no tempo na direção de um
padrão comum à medida que o estado de decomposição se acelera, uma vez
que, com o fim do metabolismo, muitas substâncias deixam de ser
produzidas, outras passam a existir, o tecido se modifica, causando uma
conseqüente variação nas constantes dielétricas. Essa variação na
luminosidade do padrão de um corpo vivo em decomposição, não pode de
forma alguma ser interpretada como o “abandono do Espírito” desse corpo,
como muitos interpretaram. A essência da interpretação físico-patológica é
correta, uma vez que existe uma ligação clara prevista em teoria entre as
propriedades elétricas dos materiais e o efeito Kirlian.
Entretanto, pouco se sabe se essa relação permite utilizar o efeito Kirlian
como um método de diagnóstico médico. Assim na frase (3) da referência
[9] o “está claro que” - grifo nosso - ainda deve ser melhor explorada. Não
está claro que o efeito corona é sensível suficiente para que um sistema
seguro de diagnóstico seja possível. Para estudos recentes nesse sentido ver
[12][13].
O efeito Kirlian pode assim representar um dispositivo capaz de evidenciar
visualmente o estado biológico de seres vivos de acordo com a idéia
original de Kirlian. Essa relação é totalmente material: da mesma forma
que a câmara Schlieren pode revelar os eflúvios térmicos da mão de uma
pessoa viva, o efeito Kirlian também pode (mas de outra forma), o que
seria uma indicação indireta da atividade biológica nesse ser. Entretanto,
poucos estamos autorizados a afirmar que uma ferramente precisa de
diagnóstico existe nas interpretações das imagens Kirlian, ou que seja
possível correlacionar o estado psicológico de indivíduos com esses
padrões.
18. Fig. 11
O quadro resumo da Fig. 11 é uma sumário da atual situação quanto ao
desenvolvimento científico da pesquisa com o efeito Kirlian. Claro está que
se trata de pesquisa multidisciplinar, envolvendo a física, química, biologia
e medicina. Quase nada sabemos da relação entre as constantes elétricas
dos materiais vivos e os constituintes químicos, pois cada um desses
objetos teóricos é descrito por disciplina diferente. Assim a conclusão final
obtida pela cadeia de afirmações em branco na Fig. 11 não pode ser
categoricamente afirmada.
5 - Comentários finais
Os arranjos experimentais aqui descritos são muito simples e existe uma
teoria muito bem desenvolvida para explicá-los (com excessão à câmera
Kirlian). Isso faz parte do jogo da ciência, onde teoria deve antecipar e
prever corretamente fenômenos naturais. O conhecimento da teoria e dos
fenômenos que ocorrem ciclicamente ou não permitem realizar arranjos
que amplifiquem ou tornem visíveis fenômenos não percebidos
sensorialmente por meios normais. Essa mesma teoria que explica os
arranjos (como aqui descritos) também valida resultados de medidas
obtidos por ele. Assim sendo, a teoria óptica valida as images como na Fig.
8(a) e 8(b) não permitindo que sejam interpretadas como meras ilusões de
óptica.
Também é importante considerar que, a despeito das teorias que hoje se
adequam harmonicamente aos arranjos, a geração de sinais sensíveis aos
olhos ou aos sentidos humanos só é possível indiretamente. Assim, existem
elementos transdutores - em todos os exemplos discutidos até aqui - que
fazem a conversão dos sinais não sensoriais em equivalentes sensoriais.
Assim, enfatizamos como corolário:
Em todo e qualquer sistema natural onde tais elementos transdutores
existam garantidos por uma teoria bem desenvolvida, a observação, por
19. meio dos sentidos ordinários, de fenômenos ou ocorrências relacionados a
sinais não sensíveis é possível.
Ressaltamos que isso só é possível se uma teoria completa da comunicação
dos sinais for plenamente desenvolvida. Faz parte da busca técnica pós
teoria o desenvolvimento desses dispositivos, o que consiste uma ciência a
parte. Assim a existência de computadores e telefones celulares só apareceu
muito depois da teoria dos circuitos elétricos, que só apareceram depois
que as leis básicas de fluxo de correntes em condutores foi desenvolvida.
No caso do efeito Kirlian, podemos certamente afirmar que se trata de um
fenômeno que permite observar visualmente variações nas constantes
dielétricas, impedância superficial e outras propriedades de corpos vivos.
Entretanto, resta ainda uma longa pesquisa interdisciplinar para validar
afirmações de que se trata de um método eficaz de diagnóstico ou de
conhecimento do estado psicológico de indivíduos (um meio de se acessar
o “invisível”)
Nosso objetivo aqui foi demonstrar que a existência de transdutores ou
dispositivos que permitem acessar radiações e influências que não existem
para os sentidos ordinários só é possível (isto é, se torna parte integrante da
técnica e da engenharia) quando uma teoria bem desenvolvida existe. Esse
é o caso dos inúmeros equipamentos de pesquisa científica que utilizam
correntes elétricas, luz, substância químicas, arranjos termodinâmicos e
outros para possibilitar inferir quantidades de constituintes da Natureza. A
medida dessas quantidades está sujeita a erros uma vez que outros fatores
também influenciam e é necessário garantir o controle dentro de limites
especificados de todos eles.
Na ausência de uma base teórica sólida, a proposição de equipamentos para
determinados fins como elementos transdutores é seriamente comprometida
pois sempre existirão opiniões e explicações contraditórias que podem
invalidar o propósito para o qual os equipamentos foram construídos.
Esse texto tem como objetivo também motivar o leitor a ponderar sobre
interpretações diversas do famoso “Fenômeno das vozes eletrônicas”
(EVP) ou “Transcomunicação instrumental” (TCI), como ficaram
conhecidas as técnicas eletrônicas de gravação de vozes e imagens vindo
dos desencarnados [14][15]. Trata-se, certamente, de métodos de se acessar
o “invisível”. Deixamos ao leitor uma análise mais detalhada do assunto e a
tarefa de aplicar alguns conceitos discutidos nesse texto ao caso da TCI e
EVP. Para motivar ainda mais perguntamos: é possível descartar a
necessidade de um médium na produção do fenômento TCI ou EVP?
Trataremos desse fenômeno em particular em um texto mais abrangente a
ser publicado em breve.
O autor gostaria de receber críticas e comentários sobre este texto. Envie
suas mensagens para editor@geae.inf.br.
20. Agradecimentos: gostaria de agradecer ao Alexandre de Almeida por
discussões e várias referências sobre o efeito Kirlian.
4. De maneira muito simplificada, um plasma em física caracteriza um
estado físico de elétrons e íons positivos altamente influenciável por
campos eletromagnéticos. O plasma foi reconhecido como um novo estado
da matéria por Sir Willian Crookes, famoso cientista espiritualista inglês.
5. A constante dielétrica é uma variável que descreve a resposta elétrica dos
materiais. Em materiais isolantes ela é responsável pelo aparecimento de
um estado de polariazação elétrica que é utilizado em larga escala na
indústria eletrônica em capacitores e outros dispositivos de armazenagem
de energia. Impedância mede a resposta em potêncial elétrico de um
material, sistema ou superfície frente a um estímulo de corrente elétrica.
6 - Referências
[1] http://en.wikipedia.org/wiki/Radio
[2] http://www.lnf.infn.it/kloe/Lectures/wilson.pdf
[3] http://en.wikipedia.org/wiki/Cloud_chamber
[4] G. S. Settles, “Schlieren and shadowgraph techniques - visualizing
phenomena in transparent media”. Springer 2001.
[5] Para uma galeria de fotos Schlieren ver:
http://www1.dfrc.nasa.gov/gallery/photo/Schlieren/HTML/
http://www.sciencephoto.com/html_tech_archive/schlie.html
[6] D.Turner, “The missing science of Ball Lightning”, Journal of
Scientific Exploration, vol. 17, n. 3, p 435 (2003);
[7] http://www.kirlian.org/kirlian_camera.htm
[8] http://www.kirlian.org/kirlian.htm
[9] Newton Milhomens em http://www.kirlian.com.br/
[10] http://www.psy.aau.dk/bioelec/ (não disponível). Texto original: “...a
method of investigation for biological objects, based on the interpretation
of the corona-discharge image obtained during exposure to a high-
frequency, high-voltage electromagnetic field which is recorded either on
photopaper or by modern video recording equipment. Its main use is as a
fast, inexpensive and relatively non-invasive means for the diagnostic
evaluation of physiological and psychological states”.
[11] "The Kirlian Aura, Photographing the galaxies of life”. Editado por S.
Krippner e D. Rubin. Anchor press/Doubleday (1974)
21. [12] P. V. Bundzen, K. G. Korotkov, A. K. Korotkova, V. A. Mukhin, e N.
S. Priyatkin Psychophysiological correlates of athletic success in athletes
training for the olympics. Fiziologia Cheloveka (Human Physiology (in
English) 3, 2005.
[13] P. O. Gagua, E. G. Gedevanishvili, L. G. Georgobiani, K G. Korotkov
KG, S. A. Korotkina, G. G. Achmeteli, E. V. Kriganivski EV.
“Experimental study of the GDV technique application in oncology”.
[14] "Espiritismo e Transcomunicação", Djalma M Argollo, Ed. Mnêmio
Túlio 1994
[15] "Os Espíiritos comunicam-se por gravadores", Peter Bander, Col.
Científica Edicel 4, 2a edição 1976.
Grupo de Estudos Avançados Espíritas
Ano 14 Número 503 a 506
30 de Novembro de 2005
http://www.geae.inf.br/pt/boletins/geae503.html
... Ademir L. Xavier Jr.
> A Informação na Estruturação Inteligente do Universo
Artigos
“Ora, como todo efeito inteligente há de por força derivar de uma causa inteligente,
ficou evidenciado que, mesmo admitindo-se em tais casos, a interveção da eletricidade
ou de qualquer outro fluido, outra causa a essa se achava associada .”
Allan Kardec [1]
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1. Introdução
Quando falamos em materialismo, sempre nos lembramos das idéias que somente
reconhecem a matéria como a única base essencial de constituição do universo. Tal
como apreendemos com nossos sentidos, a matéria é algo bem delimitado no espaço e
22. no tempo, algo que podemos sentir, apalpar, carregar, que impressiona nossos sentidos.
Hoje, contudo, mesmo os materialistas mais ferrenhos são obrigados a aceitar que essa
noção de matéria está longe de ser o constituinte exclusivo do Universo. A física
demonstrou a importância de outros ingredientes dentre os quais destacamos a energia.
Mas a energia é apenas uma forma diferente (dentro das teorias da física) de se
caracterizar a matéria. Pode-se encontrar facilmente o equivalente "energético" de
qualquer quantidade de matéria (definida por uma massa, densidade etc). Nesse texto,
chamamos a atenção para um tipo de ingrediente que apenas recentemente (nos últimos
60 anos) foi reconhecido como de importância fundamental na estruturação do mundo: a
informação. Mas a informação é algo imaterial, portanto, já estamos longe das antigas
proposições materialistas de que o Universo é constituído apenas do que podemos ver,
ou ainda, daquilo que a ciência poderia medir através de seus aparelhos. Esse
reconhecimento é um passo importante na direção da aceitação do ingrediente espiritual
como o terceiro grande constituinte do universo. Aventuramo-nos aqui em imaginar que
a informação é um importante parâmetro capaz de distinguir univocamente o grau de
"vivificação" da matéria, isto é, quanto distante do estado "inanimado" ela se encontra.
Um problema recente é a questão se é possível haver criação de informação a partir de
sistemas puramente físicos (isto é, inanimados). Uma eventual resposta a essa indagação
pode nos levar bem longe de onde estamos conceitualmente.
Antes, porém, de iniciar essa aventura, devemos examinar um pouco mais
detalhadamente o significado do conceito de informação e de como ela se transmite de
um sistema a outro. Os ingrediente básicos de um sistema de comunicação
completamente geral podem ser representados como mostra a figura abaixo:
Fig. 1 Modelo simples de processo de comunicação aplicável a uma ampla gama de
sistemas naturais ou artificiais.
O conteúdo da mensagem é algo imaterial que existe em princípio, na mente
(Espírito). O transmissor é a unidade responsável pela transmissão da mensagem. Ela
faz isso "codificando", isto é, escrevendo sob uma convenção pré estabelecida que pode
ser lida por outros sistemas semelhantes. O meio ou canal de transmissão é o "medium"
no sentido comum, isto é, o subsistema responsável por transmitir aquilo em que foi
codificada a mensagem. O "Receptor" é uma unidade capaz de decodificar a mensagem
e transformá-la em algo compreensível pelo "destino da mensagem". Esse modelo
aplica-se a uma vasta quantidade de sistemas materiais como telefones (celulares ou
fixos), transmissão de dados pela internet, comunicação falada etc. No caso de duas
pessoas conversando o "meio" é o ar pois os sinais imateriais são transformados em
ondas de pressão que emanam do transmissor e se propagam livremente pelo ar. No
caso de comunicações feitas com sinais luminosos (p. ex. transmissão de sinais
marítimos) o meio é a própria luz.
Lembramos que esse modelo também aplica-se às comunicações mediúnicas. Nele
identificamos o conteúdo da mensagem e seu impacto no destino como idéias impressas
na mente dos Espíritos que enviam e dos que recebem as mensagens. O
transmissor/receptor são os Espíritos envolvidos na comunicação, enquanto que o
"meio" é o médium que serve de canal (o conjunto de equipamentos físicos colocados
a disposição). A codificação da mensagem depende do tipo de mediunidade envolvida.
23. Se for de efeitos físicos, a codificação obedece a simbologias convencionadas, a
sistemas tiptográficos etc. Nas mediunidades já desenvolvidas de efeitos inteligentes, a
codificação da mensagem se dá por mecanismos desconhecidos entre as mentes do
médium e do Espírito comunicante.
Fig. 2 Influenciação do ruído no processo de comunicação.
A Fig. 2 mostra exatamente como inserir ruído no modelo. Ruído é qualquer
perturbação no processo de comunicação ou transporte de informação que leva a
degradação do conteúdo da mensagem. O ruído atinge o canal de transmissão.
Também as comunicações mediúnicas sofrem com ação do ruído (proveniente da
própria mente do médium ou da ação de outros Espíritos) que obliteram o conteúdo da
mensagem. Em sistemas artificiais (p. ex. comunicação celular), o ruído pode tornar o
processo de comunicação inviável. Nesses casos pode-se falar em eficiência de
transmissão de informação como função da razão entre a intensidade do ruído e a
intensidade do sinal transmitido, a famosa relação sinal-ruído.
2. Uma definição simples de informação
Todos nós temos noção primitiva de informação. Quando alguém nos faz uma pergunta
que só requer um "sim" ou "não" estamos dispostos a passar um conteúdo informativo
em relação à resposta equivalente a uma unidade primitiva de informação (conhecida
como "bit"). Nessa forma muito simples, informação é um conceito passível de
quantificação. Se desejamos saber se a luz do quarto está acesa ou não então são
necessários apenas 1 bit para se adquirir a informação necessária. Semelhantemente,
questões mais complexas requerem quantidades maiores de informação. Importa-nos
aqui lembrar que a "informação" é algo invisível, não palpável, que se pode transportar
de um lugar para outro independentemente do meio material (ou de qualquer meio
imaginável). O reconhecimento do "status" independente da informação veio apenas
recentemente. Informação é algo que se transfere de um lugar para o outro, que se
armazena (logo ocupa volume), que se mede embora sempre relativamente. Podemos
apenas falar em ganho ou perda de informação, nunca em um valor absoluto para o
conhecimento informativo de acordo com essa definição primitiva.
As modernas teorias sobre processamento de informação (sinais) quantificam-na de
tal forma que podemos falar de "pacotes" de informação. Assim para o conjunto de 256
possibilidades de informação é utilizado a designação "bytes". Para quantidades maiores
de informação adiciona-se os prefixos latinos de quantificação Kilo, Mega, Giga, etc
para designiar respectivamente 1000, 1.000.000, 1.000.000.000 etc bytes de informação.
Por que o número 256? Para isso é necessário considerar que a maior parte da
quantificação da informação é feita por meio de uma base que requer sua representação
na forma de respostas simples como "sim" e "não". Como só existem 2 respostas
possíveis, o número 256 vem do número de possibilidades de resposta quando
coexistem 8 "canais" de informação possíveis. Por exemplo, suponha que queiramos
armazenar a quantidade necessária de informação necessária para saber que a luz da sala
de uma casa está acesa e que a porta principal esta fechada. Nesse caso temos 4
24. possibilidades conforme mostra a sequência abaixo:
1) A luz da sala está acesa e a porta está aberta;
2) A luz da sala está acesa e a porta está fechada;
3) A luz da sala está apagada e a porta está aberta;
4) A luz da sala está apagada e a porta está fechada.
Essas possibilidades são armazenas na forma de 2 bits pois podemos considerar cada
uma das afirmação acima como tendo valor "falso" ou "verdadeiro" ("sim" ou "não").
Ora 4 é o resultado de se elevar 2 ao número de "perguntas" existentes (ou número de
bits). Se fizessemos mais uma pergunta, por exemplo, se o cachorro na casa foi
alimentado às 8 horas da manhã, teríamos 3 perguntas e, daí, o conteúdo de informação
necessário para responter satisfatóriamente as 3 inquirições (3 bits) seria 3. Da mesma
forma um gabarito do tipo "falso"/"verdadeiro" com 8 perguntas exige que tenhamos
disponíveis 2^8 possibilidades = 256 ou 1 byte como afirmado acima, e equivalente
portanto a 8 bits de informação. Bits e bytes tornaram-se unidades importantes na
definição e tratamento de informação por sistemas digitais justamente porque
computadores só trabalham fundamentalmente com a base falso/verdadeiro em suas
estruturas internas. Note que a quantidade de informação diz respeito ao número de bits
necessário para armazenar todas as possibilidades uma vez que as sentenças no caso
acima tem respostas não dependentes. Se a resposta de uma já definisse a solução de
outra, então o conteúdo seria obviamente menor.
Essas noções primitivas de informação (totalmente dependentes do tipo de sinal
utilizado para armazená-la) foram formalizadas por Claude Shannon em 1940 através de
um formalismo conhecido como "Teoria da Informação" (também chamada "Teoria
clássica da Informação") [2]. O nome “informação” aqui está mal empregado pois a
teoria de Shannon é, de fato, uma teoria sobre sinais uma vez que o conteúdo
informativo da “informação de Shannon” não é importante. O objetivo principal da
teoria da informação era fornecer subsídios teóricos para o desenvolvimento de uma
teoria geral de comunicações frente a agentes externos de atenuação de sinal e ruído.
Essa teoria finalmente acabou constituindo-se no arcabouço fundamental dos modernos
sistemas digitais e de comunicação "wireless" ou com fio (telefonia celular, redes de
computadores etc). A informação definida segunda a equação (por Shannon) onde log² é
o logaritmo na base 2 e N é o número de possíveis resultados ou símbolos. É um
conceito puramente quantitativo que se presta mais a determinação da quantidade de
espaço de memória necessário para se armazenar um determinada quantidade de dados.
No caso do questionário com 8 questões, existem 256 possibilidades (N=256), logo I=8
bits.
Para o cômputo dessa quantidade de memória, é irrelevante o tipo de informação, muito
menos ainda a qualidade da mesma. Dada duas sentenças:
1) AXGKP TOFFZAXXTAB OPPQ
2)BEATI PAUPERES SPIRITUS
Qual delas tem um significado mais familiar? Certamente a segunda que é a versão
latina de "Bem aventurado os pobres de espírito". Para o conceito de quantidade de
informação de Shannon, as duas sentenças tem o mesmo status, pois correspondem a
mesma quantidade de informação. Assim não existe conexão alguma entre esse conceito
de informação e a qualidade da mesma entendida como conhecimento. Mas a definição
de Shannon é útil pois correponde ao que poderíamos chamar de primeira camada ou
nível de descrição da informação (nível estatístico). Nesse nível, não existe sintaxe nem
semântica. Fala-se apenas na probabilidade de uma determinada letra do alfabeto ou
símbolo aparecer. Para simplificar, consideremos o alfabeto formado pelas seguintes
letras:
25. a b c d e f g h i j k l m n o p q r s t u v x y w z " "
Onde " " representa o espaço em branco. Em uma primeira análise, se quisermos enviar
uma mensagem escrita em um idioma que use esses símbolos, podemos falar que há
probabilidade 1/26 de que a primeira letra da mensagem seja qualquer uma daquelas
acima relacionadas. Dessa forma precisamos de
I = - log2 (1/26) = 4.7 bits de informação/símbolo
para enviar uma mensagem com esse alfabeto. Isso é, para cada letra. Para uma palavra
com 5 letras seria necessário 5 x 4.7 = 23.5 bits de informação e assim sucessivamente.
Note que não interessa para essa idéia quantitativa de "informação" se a mensagem
formada pela seqüência de 5 símbolos representa a palavra "logos" ou "xksiw", o
conteúdo informativo nos dois casos é o mesmo. O que diferencia um idioma de outro
(além do grupo de símbolos que representa a mensagem) é algo imaterial, que não se
pode quantificar através da informação de Shannon. O máximo de diferenciação
mensurável por I está embutido na distribuição de probabilidades de ocorrência desses
símbolos. (mas os idiomas se diferenciam antes pelos símbolos que usam). Por
exemplo, na lingua inglesa a probabilidade de a letra "h" suceder a letra "t" é muito
grande, pois há várias palavras com o sequência "th" (como no artigo "the" ou em
"thanks") . Do mesmo modo, no português, a probabilidade de a letra "a" suceder "ç" é
grande e, nessa ocorrência, é grande também a chance de aparecer a letra "o" (como em
"ação"). Assim o cálculo exato da quantidade de informação para suprir uma
definciência de memória no armazenamento de uma mensagem não é simples de se
fazer .As probabilidades funcionam como pesos estatísticos e cada idioma tem sua
distribuição própria. Na ocorrência de dois idiomas que utilizem o mesmo conjunto de
símbolos, é possível reconhecer o idioma simplesmente calculando-se a distribuição de
ocorrência de letras, mas isso é tudo que podemos extrair do conceito de informação de
Shannon que é largamente utilizado nas ciências da computação.
3. Examinando de perto o processo de transmissão de informação. Computadores
como manipuladores de sinais.
A transmissão de informação de um sistema a outro (utilizando o conceito de Shannon)
pode ser descrita de maneira muito simples, e é relevante para o que discutiremos
posteriormente. Nosso objetivo é compreender claramente a informação genuína como
um dos atributos de um sistema inteligente; algo que é por ele gerado e manipulado,
embora o conceito de informação que utilizamos aqui não leve em consideração o
conteúdo da mensagem. Veremos que onde há informação há inteligência, embora seja
possível criar sistema aparentemente inteligentes pelo fato de poderem manipular
informação.
Consideremos inicialmente dois sistemas idênticos. O que os diferencia além de suas
características próprias? Usemos o exemplo anterior, a casa com a sala e a porta. Duas
casas idênticas com a mesma sala e porta diferem entretanto pelo estado em que se
encontra a lâmpada da sala (se acesa ou apagada) e a porta (se aberta ou fechada).
Nessas duas casas idênticas aquela em que conhecemos o estado da lâmpada e da porta
é a casa com maior conteúdo de informação simplesmente porque, para descrever
qualquer outro aspecto da casa, precisamos de menos informação com essa casa do que
com a outra sobre a qual nada sabemos. De outra forma, podemos também dizer que no
caso da primeira casa (que sabemos a luz estar acesa e a porta fechada) nossa ignorância
é menor do que no caso da segunda casa. Note-se que o conteúdo da informação está
contido na sequência de perguntas e suas respectivas respostas.
Examinemos agora detalhadamente o processo de comunicação. A figura abaixo
representa uma versão simplificada de um processo desse tipo com os componentes da
fig. 1.
26. Fig. 3 Comunicação como acréscimo de conteúdo informativo.
Uma mensagem (constituída por uma seqüência de símbolos) é enviada pelo
transmissor para o receptor. Não importa aqui qual o tipo de processo (se eletrônico,
sonoro, luminoso, mediúnico etc). Toda vez que um símbolo é percebido pelo receptor
seu conteúdo de informação "aumenta" exatamente de I (usando o alfabeto anterior
como exemplo, esse ganho de informação é de aproximadamente 4.7 bits para cada
símbolo). Uma outra medida é utilizada pela teoria da informação para quantificar o
conteúdo informativo de uma mensagem. Essa medida é conhecida como Entropia e é
definida simplesmente como a média ponderada pelos pesos estatísticos da quantidade
de informacão:
Entropia de informação = <I>= - ( p1*log2 p1+p2*log2 p2+...+pN log2 pN )
onde p1, p2, .. , pN são os pesos de cada símbolo. A entropia de informação definida
dessa forma é uma quantidade que cresce com o número de símbolos usados para
codificar a mensagem. Cresce também com o tamanho da mensagem e, como no caso
da informação de Shannon, não serve para mensurar o conteúdo sintático de uma
mensagem, muito menos seu conteúdo tal como os seres humanos internamente o
compreendem.
No processo de comunicação descrito pela Fig. 3, não explicitamos a origem da
informação. Consideremos inicialmente que essa origem seja “inteligente”. Imaginemos
que o processo seja interceptado por um sistema mecânico (autômata) que possa
acrescentar ou modificar a seqüência de símbolos original. A fig. 4 ilustra o processo
modificado por esse agente externo.
Fig. 4 Processo de comunicação interceptado por um autômata.
O autômata é capaz de acrescentar símbolos à seqüência original de forma
independente. Isso ele faz recorrendo a um banco de símbolos que permite a reprodução
infinita de qualquer tipo de símbolo pertencente ao alfabeto convencionado pelo
processo de comunicação. Além disso para uma dada seqüência de símbolos, a ordem
ou disposição pode ser artificialemente modificada por uma seqüência de comandos
lógicos chamados “algoritmos”. Não importa para nós aqui a origem dos algoritmos
(embora sabemos que sua construção obedece a regras dos seres humanos). Chamamos
27. a atenção com o processo modificado de comunicação da Fig. 3 que o autômata pode
aumentar arbitrariamente o conteúdo informativo da mensagem original somente no
sentido da teoria da informação de Shannon que não leva em consideração o significado
da mesma para o destino último da mensagem. Afirmamos explicitamente: não importa
a complexidade, grau de manipulação dos “algoritmos” previamente programados no
autômata, qualquer que seja a natureza e resultado do conjunto de instruções o conteúdo
verdadeiramente informativo da mensagem original não é aumentado. Isso vale para
qualquer tipo de autômata. De fato, podemos representar o conjunto de operações sobre
cada bit original como a aplicação de uma função genérica G(u) onde u é bit de entrada:
Para a sequência original: u1, u2, u3 de símbolos pertencentes ao alfabeto, o resultado
final é G(u1), G(u2), G(u3), ...até o último bit enviado. Em particular o processo de
“comunicação” do receptor final com o autômata pode ser descrito para uma seqüência
de entradas nulas. Assim sendo, não existe comunicação no sentido genuíno de troca de
informação do autômato para com o receptor final suposto inteligente (embora esse
último possa ter a impressão de que isso ocorra de fato).
Longe de gerar informação, computadores são sistemas que apenas conseguem
manipular ou gerar sinais baseados em algoritmos. Todo o conteúdo aparentemente
inteligente (cognitivo) das mensagens ou da manipulação de informação por
computadores advém da inteligência (Espírito) dos seres humanos que os programaram.
4. Informação e o princípio inteligente.
Nosso principal problema é a inexistência de uma definição suficientemente abrangente
para a idéia de informação. Podemos entretanto definir alguns de seus atributos. Para
isso baseamo-nos em considerações do matemático Wernher Gitt [3]. Ele descreve esses
atributos do processo de transmissão de informação em cinco camadas:
1- Estatística: referente ao número e probabilidades de ocorrência de símbolos ou sinais
com uma linguagem previamente estabelecida para realizar o processo de comunicação.
É o nível de descrição de Shannon como vimos anteriormente;
2- Sintaxe: referente ao seqüenciamento dos símbolos formando palavras e frases.
Dependendo da ordem com que são transmitidos, um conjunto de símbolos podem
formar palavras diferentes. Como vimos nem essa seqüência é importante na teoria dos
sinais de Shannon;
3- Semântica: que diz respeito ao significado das palavras. Pelo fato de o nível
semântico ser de caracterização quantitativa inexistente, o preço dos telegramas só
depende da quantidade de símbolos (palavras) que ele porta e não de seu conteúdo;
4- Pragmática: que diz respeito à intenção do transmissor com o conteúdo informativo
da mensagem e seu impacto no receptor. A fim de que o receptor tenha determinada
reação, o transmissor reveste sua informação de conteúdo pragmático
5- Abobética: nível último representado pelo objetivo da mensagem. A abobética tem a
haver com o objetivo último do transmissor em enviar a informação no processo de
comunicação. Segundo Witt os dois últimos níveis se confundem várias vezes. Abrimos
um parêntese aqui para salientar o valor abobético das mensagens dos Espíritos
superiores. Longe de representar simples estórias contadas com o objetivo de
entretetimento, as mensagens verdadeiramente instrutivas são carregadas de conteúdo
moral e tem o objetivo de educar eticamente os receptores. Além do nível abobético
poderíamos acrescentar um outro nível superior quando o conteúdo da mensagem
comunicada não é suficiente para representar completamente o objetivo do transmissor
e impacto real sobre o receptor. Falamos do conteúdo das mensagens criptografadas que
fazem parte desse nível. Essas são mensagens que devem ser re-interpretadas por um
código a fim de que seu conteúdo seja compreendido. Outros exemplos podem ser
28. encontrados na linguagem poética e metafórica, onde a mensagem original só é
plenamente compreendida quando comparada pelo receptor a um conjunto de culturas e
conhecimentos (tácitos) não carregados em princípio pela mensagem original.
Que Kardec utilizou essas propriedades na caracterização das mensagens mediúnicas
não resta dúvida. Examinemos, por exemplo, o parágrafo 66 de “O Livro dos Médiuns”
no Capítulo III, “Das manifestações inteligentes”:
“Para uma manifestação ser inteligente, indispensável não é que seja eloqüente,
espirituosa, ou sábia, basta que prove ser de um ato livre e voluntário, exprimindo uma
intenção, ou respondendo a um pensamento. Decerto, quando uma ventoinha se move,
toda gente sabe que apenas obedece a uma impulsão mecânica: à do vento; mas, se se
reconhecem nos seus movimentos sinais de serem eles intencionais, se ela girasse para a
direita ou para a esquerda, depressa ou devagar, conforme se lhe ordenasse, forçoso
seria admitir-se, não que a ventoinha era inteligente, porém, que obedecia a uma
inteligência. Isso o que se deu com a mesa.”
Muito além de seu tempo, Kardec soube caracterizar as propriedades superiores das
mensagens de conteúdo informativo inteligente que hoje é largamente utilizada na
pesquisa por sinais inteligentes vindos do espaço ou na análise do processo de
comunicação dos animais. De acordo com esses cinco níveis (que levam em conta a
intenção do comunicante), podemos excluir a grande classe de sistemas naturais
mecânicos (físicos) como geradores de informação. É o que Kardec diz quando utiliza
do exemplo da ventoinha. No máximo tais sistemas gerariam sinais no nível estatístico
sem significado. Por outro lado, a Natureza está cheia de criaturas capazes de se
comunicar nos cinco níveis descritos acima. Sabemos que os animais se comunicam
(consideremos as linguagens químicas das formigas ou o canto das baleias), logo trocam
informação. O processo de comunicação nesses seres se dá muito de acordo com o
modelo da Fig. 1 e nos cinco níveis descrito, onde podemos identificar cada um dos
elementos da cadeia comunicativa. Machos de várias espécies de pássaros cantam para
as fêmeas para chamar a atenção ou para reinvidicar território (um exemplo de
comunicação até o nível pragmático). Mesmo com as plantas - embora muito
limitadamente - há comunicação (consideremos os fenômenos de polinização com o
esforço das flores em se tornarem atraentes aos insetos). Visto pura e simplesmente do
ponto de vista do que temos discutido aqui, os seres humanos (Espíritos encarnados)
podem ser vistos como seres vivos capazes de transformar energia química em
informação. Essa definição é amplamente aceita na comunidade acadêmica (embora
haja divergências quanto ao significado do termo informação) pois corresponde
exatamente aos fatos. O problema aqui é saber onde está a origem da informação. Como
vimos, depois de eliminar os sistemas mecânicos (o que inclui sistemas químicos ou
bioquímicos reduzidos aos seus componentes atômicos), o que nos sobra?
Informação como fonte no princípio inteligente: somente o espírito, tendo como
atributo o princípio inteligente, é capaz de gerar, armazenar e manipular a informação
que só pode ser compreendida cognitivamente por outra entidade que disponha desse
mesmo atributo.
Em outros termos propomos que a origem de toda informação, tal como descrita em
seus atributos pelos níveis estatístico, sintático, semântico e abobético, está no espírito.
Obvimente por “linguagem” não nos restringimos exclusivamente às representações
gráficas e fonéticas de símbolos que nós, Espíritos encarnados em evolução, inventamos
para facilitar o processo de comunicação. Seres considerados inferiores, mas que
dispõem de princípio inteligente, comunicam-se por linguagem que podemos considerar
primitiva (códigos químicos ou bioquímicos), o que propomos como uma evidência de
sua natureza espiritual. A Natureza bruta não gera informação. Como Kardec na sua
análise das manifestações inteligentes, hoje podemos dizer que forçoso é admitir-se, não
que a matéria nesses casos seja inteligente, mas que obedeçe a uma inteligência. Essa
29. inteligência é um atributo do Espírito.
5. Algumas considerações
Exobiologia.
Há um debate recente sobre a possibilidade de se descobrir vida inteligente em outros
planetas para além de nosso sistema solar. Sabemos que a Doutrina Espírita previou
com grande antecedência essa possibilidade. Atualmente, um programa de pesquisa
bastante audacioso [4] está em andamento visando detectar vida extraterrestre
totalmente baseados em sinais de rádio. A parte do problema de escolha de canal de
transmissão, para que sejam aceitos como prova da existência dessas civilizações, esses
sinais devem satisfazer um conjunto de critérios que passam pela análise da verificação
dos atributos descritos na parte 4. A grande maioria dos sinais detectados via rádio
obedecem padrões meramente estatísticos, isto é, não se caracterizam como sinais
inteligentes pois são geradas por fontes naturais (estrelas, nuvens interestelares etc).
Para que o sejam devem ter um objetivo contido na própria mensagem. Reconhe-se
assim o caráter não físico das mensagem genuinamente inteligentes.
Biologia.
A biologia moderna descobriu que a chave para a estrutura dos seres vivos está no
código genético. O DNA ou RNA são longas cadeias moledulares que descreveriam
bioquimicamente os constituintes últimos dos seres vivos. O código genético é uma
molécula com conteúdo altamente informativo (do ponto de vista da informação de
Shannon, o DNA humano contém mais informação que todos os livros já editados na
Terra). Um debate recente tem acontecido na comunidade acadêmica sobre a origem
dessa cadeia. Já se calculou corretamente que a probabilidade de os átomos do DNA
humano apresentarem seu arranjo característico por mera chance ser ínfimo. Isso deu
origem a clamores recentes por parte dos neocriacionistas [3] de que a estrutura do
DNA ter sido “dada por Deus”. Os opositores, baseados em modelos computacionais,
puderam mostrar que essa sequência poderia ter sido gerada por chance se esta fosse
assitida por algum mecanismo externo. De uma maneira muito simplificada imagina-se
que a Natureza tenha uma função resposta que resulta em pesos altos caso a chance vá
na direção correta (embora não se especifique quem seja o responsável por especificar
qual seja essa direção). De maneira geral acredita-se que mecanismos de evolução das
espécies, mutações e seleção natural tenham sido os responsáveis ao longo do tempo
pela forma final da molécula.
De nossa parte acreditamos que o argumento de “dada por Deus” é naturalmente válido
pois Deus é a causa primária de todas as coisas. Porém podemos imaginar que o DNA
represente hoje uma espécie de “documento material” que ateste o processo de evolução
conjunta (através dos milhares de anos) do princípio espiritual com a matéria. Assim a
origem do conteúdo informativo da molécula DNA e de outras proteínas importantes no
metabolismos dos seres seria o próprio princípio espiritual em sua viagem de evolução
ao longo de múltiplos renascimentos na matéria. Essa proposição parece ser atestada por
muitos autores espirituais [5].
A física desbancada?
O reconhecimento da importância da informação no Universo (assim como a matéria e a
energia) e sua origem no princípio inteligente é um profundo golpe no reducionismo
que previa ser possível reduzir todo nosso conhecimento das ciências às interações
físicas entre seus constituintes. Mostra também que a descrição da “matéria viva” não
pode ser feita baseando-se exclusivamente em princípios mecânicos ou quanto-
mecânicos. Sistemas auto-organizáveis [6] têm sido propostos como modelos para a
matéria viva, entretanto, à luz do que estamos expondo, esses sistemas são meros
30. geradores de ordem (diminuição da entropia por serem sistemas abertos longe do
equilíbrio) e não de informação. Essa conclusão pode ser revista no futuro pois o
problema da origem da informação só muito recentemente recebeu atenção devida e não
faz parte do programa normal de pesquisa da física.
6. Nota conclusiva.
Isso posto concluímos que o princípio utilizado pelo codificador da Doutrina Espírita,
Allan Kardec, que viu uma causa inteligente nas mensagens inteligentes [1] e com isso
descobriu a origem não material das inteligências por detrás das mensagens pode ser
expandido para toda a Natureza. Ousamos dizer que se a origem das comunicações
mediúnicas foi atestadamente demonstrada como tendo origem em inteligências
incorpóreas, então, muito provavelmente, a origem de toda informação com conteúdo
verdadeiramente cognitivo não pode ser atribuída à matéria. Isso se extende a todos os
fenômenos existentes que podemos classificar como tendo um objetivo ou inteligência.
Referências
[1] O Livro dos Médiums, Parágrafo 65, Capítulo III, Das manifestações inteligentes.
54ª Edição da Federação Espírita Brasileira, Tradução de Guillon Ribeiro. Ver também
Ref. [7] “Prolegômenos”.
[2] C. E. Shannon, ``A mathematical theory of communication,'' Bell System Technical
Journal, 27, pp. 379-423 and 623-656,. Julho e Outubro de 1948.
[3] Werner Gitt “Information, science and biology”. Publicado em Technical Journal 10
(2): 181-187. Agosto de 1996.
[4] Ver www.seti.org (SETI - “Search for Extraterrestrial Inteligence”). “The mission of
the SETI Institute is to explore, understand and explain the origin, nature and
prevalence of life in the universe.” A missão do intituto SETI é explorar, compreender e
explicar a origem, naturesa e prevalência de vida no Universo.
[5] André Luiz, Evolução em Dois Mundos, Cap. VII, “Evolução da Hereditariedade”,
4ª edição. Federação Espírita Brasileira (1977).
[6] Ver Press Release: The 1977 Nobel Prize of Chemistry (nobelprize.org). Nota para a
imprensa sobre o prêmio Nobel de 1977 concedido a Ilya Prigogine por suas
colaborações em termodinâmica fora do equilíbrio e estruturas dissipativas.
[7] A Kardec, O Livro dos Espíritos, Tradução de Guillon Ribeiro, 71ª edição.
Federação Espírita Brasileira (1991).
http://www.geae.inf.br/pt/boletins/geae485.html
... Ademir L. Xavier Jr.
> O que a Genética e a Astrologia tem em comum?
Artigos
31. Resumo
Ainda que distantes em importância na sociedade moderna, algumas extrapolações de
pensamento por detrás das modernas pesquisas genéticas e da velha astrologia têm
muito em comum. Fazemos aqui uma comparação entre essas diferentes disciplinas e
analisamos tais características comuns segundo a visão espírita, apontando a causa
dessa situação[1].
1. Introdução
É muito comum encontrarmos hoje em dia discussões sobre as questões da
consciência, sobre como a mente se estabelece e opera. Esse renovado debate
(encontradas em respeitadas revistas de divulgação científica) reflete o grau crescente
de interesse de alguns ramos do conhecimento científico com relação às questões do
espírito. O ponto de vista subjacente que orienta as discussões ainda é materialista,
apoiado principalmente por um grande contingente de biologistas (evolucionistas,
fisiologistas, zoólogos, geneticistas etc). A crença geral desses grupos sustenta que a
mente humana – e, como conseqüência toda individualidade humana – é o resultado de
interações e conexões de entidades moleculares componentes da parte material, visível
ou mensurável pelas técnicas de diagnóstico moderno, o cérebro. Não discutiremos aqui
as difíceis propostas de modificação dessa concepção materialista, que têm sido
levantadas mesmo dentro de círculos acadêmicos[2]. Tomemos apenas a idéia
materialista descrita acima e analisemos suas conseqüências para o homem, dentro do
âmbito de algumas especulações a partir de partes da biologia, em particular a que trata
dos mecanismos de perpetuação das espécies.
Esse posicionamento adquire grande interesse popular diante das aventadas
extrapolações e implicações da genética. Através de seus princípios, a genética teve
grande importância no esclarecimento dos mecanismos de aparecimento e
desenvolvimento das espécies, fatos que não estavam tão claros na obra revolucionária
de Charles Darwin de 1859, “Sobre a origem das espécies por meio da evolução
natural”. Na verdade a comunidade científica da época dobrou-se às evidências práticas
fornecidas por Darwin a favor da seleção natural que ele conseguiu junto à
paleontologia e a biogeografia. Em contrapartida, o desenvolvimento posterior da teoria
de Darwin dinamizada pela genética deu origem a diversas especulações em torno da
natureza do homem (e das espécies humanas), de seu mecanismo de desenvolvimento e
até mesmo de suas conseqüências éticas. Nasceu a idéia de que os genes (entidades no
limite entre o muito pequeno e o atômico) seriam responsáveis não só pelos caracteres
morfológicos de um ser vivo – que é princípio na genética – mas também de toda sua
bagagem comportamental. Aplicada ao homem, essa forma radical de interpretação
genética adquiriu enorme força na forma da “sociobiologia” ou “darwinismo social”.
Foram lançados então os fundamentos para o desenvolvimento de um doutrina dentro
das disciplinas consideradas científicas, que seria capaz de explicar completamente o
indivíduo. A base de tal proposta seria a lei de perpetuação de um determinado gene
como determinante de uma certa característica – seja morfológica ou comportamental
mas principalmente esta última quando trouxesse vantagens claramente desejáveis a
toda espécie. A perpetuação do gene favoreceria diretamente a perpetuação da própria
espécie. Como corolário desse princípio (que é válido para os caracteres morfológicos),
32. seria possível alterar o comportamento dos indivíduos pela manipulação genética. Em
seus fundamentos, a sociobiologia admite explicitamente que os genes contêm todo o
código que descreve o indivíduo, mesmo em sua mais íntima psicologia, a saber: sobre
como ele se posiciona diante de determinadas circunstâncias, de suas tendências inatas
(inteligência, afetividade, relacionamento social), de seus gostos pessoais etc. É bastante
óbvio ao leitor que tal doutrina está em franco desacordo com o Espiritismo. Reduzido a
sua última expressão, para os sociobiólogos, o homem seria apenas um repositório para
a sobrevivência dos genes que carregariam para a eternidade nossos sentimentos e
modos de ser.
A sociobiologia está por detrás de uma ampla gama de debates recentes em torno
das questões éticas relacionadas à genética. Tomemos também como exemplo, o
ápice de algumas extrapolações que estão na raiz da sociobiologia tal como a doutrina
da eugenia fundada por Francis Galton. Segundo ela seria possível ao Estado gerar uma
elite genética pelo controle rigoroso da reprodução humana favorecendo a perpetuação
dos indivíduos desejáveis (na verdade caracteres de comportamento desejáveis) e
eliminando os indesejáveis. Sabemos que alguns Estados totalitários do século XX
chegaram a flertar com a eugenia como programa de desenvolvimento social com
trágicas conseqüências.
Nosso objetivo aqui é chamar a atenção para os fundamentos que diferenciam a posição
espírita das especulações advindas principalmente da genética. O principal fundamento
que colide diretamente com essas recentes propostas é a noção de livre-arbítrio,
facilmente reconhecida mesmo entre outras doutrinas espiritualistas. Não será difícil ao
leitor nesse ponto reconhecer de imediato que as duas disciplinas enunciadas no título
desse texto depõem contra essa noção. Além disso, esses fundamentos se somam a
observações mais acuradas a partir de pesquisas biológicas recentes que atingem
seriamente o darwinismo social como uma ciência. Para conhecimento dessas críticas,
o leitor deve consultar “Os herdeiros de Darwin” por Marcel Blanc (1).
2. Um paralelo
Chamamos mais uma vez a atenção ao fato de que não estamos a criticar a genética
como ciência bem estabelecida, mas sim muitas interpretações nascidas de
extrapolações de estudos genéticos. Assim, a “genética” do título deste texto refere-se
propriamente a tais interpretações que, como vimos, tomaram a forma seja da
sociobiologia ou da eugenia. Para motivar nosso estudo, vamos construir um paralelo
que se apresenta à mente moderna diante das propostas de descrição da personalidade
humana pelos estudos genéticos. Tal paralelo é bastante motivador dentro do contexto
da história e filosofia da ciência, pois revela aspectos correlatos entre diferentes
doutrinas científicas aparentemente distantes entre si no tempo.
O que de fato pode haver em comum entre tais propostas e as velhas proposições
astrológicas? No passado, o estudo da posição e movimento dos corpos celestes, a seu
turno, desempenhou um papel fundamental na predisposição e destino de tudo o que
ocorria na Terra. Em seus estudos, os astrólogos descobriram fenômenos celestes de
grande importância. Aprenderam como antecipar em anos os eclipses solares a lunares e
contribuíram para o desenvolvimento dos calendários, aumentando assim a riqueza de
suas sociedades pela introdução de um rigoroso controle de tempo na agricultura. Não
se tem dúvida de que a astronomia (considerada uma das mães da filosofia natural e,
portanto, de toda ciência moderna) nasceu a partir de antigos estudos de natureza
astrológica.
Vejamos agora o caso da genética que se inicia com os estudos de Mendel no século
XIX. Constituindo um dos campos mais avançados de pesquisa na atualidade (no que
diz respeito à aplicação de técnicas de pesquisa empírica e a julgar pelas enormes
fortunas que os governos têm gasto em seu desenvolvimento), a genética tem sido
33. responsável por uma enorme variedade de contribuições práticas em biologia, medicina,
veterinária, agricultura etc. Em seus estudos os geneticistas têm desvendado o
mecanismo oculto dos genes, tornando possível a cura de muitas doenças e a produção
de substâncias que melhoram consideravelmente o desempenho fisiológico de muitos
seres vivos. Ao mesmo tempo, a genética projeta sistemas biológicos nunca imaginados
anteriormente. Digamos que, de uma perspectiva histórica, as modernas descobertas
práticas da genética não devem em nada àquelas derivadas da astrologia.
Entretanto, a astrologia não foi praticada apenas de olho em possíveis aplicações
práticas. Seu objetivo primordial era a revelação de fatos desconhecidos, o futuro das
pessoas. Seu princípio básico[3] era o de que uma pessoa nasce sob o signo de uma
determinada “estrela”. Especificamente, o futuro de um indivíduo estaria de certa forma
ligado à posição dos planetas no zodíaco[4]. Essa idéia assume de uma forma explícita
que a individualidade do ser humano (suas tendências, sentimentos etc) está fixado
pelos planetas no momento de seu nascimento. Implicitamente isso representa uma
limitação ao livre-arbítrio do homem, já que este não está tão livre no momento da
tomada de decisões, ou seja, alguma coisa, além de si próprio intervém tornando
possível uma escolha em detrimento de outra. Ainda que se possa dizer no contexto
moderno que os astros não influenciam diretamente uma determinada decisão particular,
eles certamente fazem parte da imagem final do ser humano por terem moldado suas
predisposições. Fundamentalmente isso contrasta abertamente com a tese
espiritualista do ser que tem todos seu comportamento resultante de propriedades
de sua essência última, o seu Espírito.
Substituamos agora “posição dos planetas” por “arranjos especiais dos genes” e
teremos quase que a mesma coisa nas modernas interpretações do papel dos genes no
comportamento humano. A predisposição celeste foi apenas substituída pela molecular,
possivelmente quanto-mecânica em natureza[5], ainda que por meio de obscuras
interrelações. Assim, tanto de acordo com a velha astrologia como por algumas
interpretações da natureza humana nos estudos da moderna genética, no que diz respeito
à individualidade humana e quanto ela pode ser fixada em seu destino, fomos
inexoravelmente pré-programados desde a hora de nosso nascimento. A comparação se
estende até no momento de se evitar este ou aquele comportamento: enquanto a
astrologia pode sugerir a programação baseada na hora do nascimento – segundo a
posição dos planetas no céu – na impossibilidade de se alterar essa posição, as
extrapolações baseadas na genética sugerem a modificação no conteúdo hereditário das
células mães em um esforço para alterar o comportamento. Ambas doutrinas também
conferem ao ambiente um papel modelador importante, podendo alterar
consideravelmente o script pré-programado.
Em um referencial histórico mais amplo as semelhanças são igualmente
compreensíveis. No passado, a astrologia inseria-se no contexto de doutrinas religiosas
politeístas. Tendo a ciência tomado o lugar da religião na sociedade moderna, é natural
que as perspectivas genéticas modernas do ser humano tomassem o lugar das velhas
doutrinas astrológicas que tinham igualmente algo a dizer sobre o destino e a razão de
agir dos indivíduos. Não se pode porém confundir uma diferença: a de que, enquanto a
astrologia tinha como objetivo fundamental prever o futuro – tanto no que dizia respeito
a acontecimentos terrenos e seus principais atores, os seres humanos, a sociobiologia
que discutimos aqui é uma extrapolação de conclusões específicas e restritas de um
ramo da biologia, a genética, cujo principal objetivo é compreender melhor o
mecanismo temporais de geração, perpetuação e morfologia dos seres vivos. Um quadro
geral comparando essas duas visões pode ser visto abaixo.
Origem
histórica
Extrapolações de
estudos em
genética aplicada
Tradições antigas.
Crença no destino
traçado pelos
deuses.
34. Fundamentos
A personalidade é
função de sua
bagagem genética.
A personalidade é
função do signo
astrológico.
Mecanismos
Genes e herança. O
ambiente tem
papel importante.
Posição dos
planetas no
momento do
nascimento. O
ambiente tem
papel importante.
Prescrição
corretiva
A personalidade
pode ser
programada
geneticamente pela
alteração nas
células mães.
A personalidade
pode ser
programada pelo
instante do
nascimento.
Conseqüências
O destino da
criatura é moldado
independentemente
dela.
O destino da
criatura é moldado
independentemente
dela.
3. A visão espírita
Não é consolador e belo poder dizer: sou uma inteligência e uma vontade livre; a mim
mesmo me fiz, inconscientemente, através das idades; edifiquei lentamente minha
individualidade e liberdade, e agora conheço a grandeza e a força que há em mim.
Leon Denis (Ref. 2, página 219)
Algumas idéias expostas acima como parte integrante do darwinismo social aplicada à
natureza humana parecem fortemente limitar uma das mais misteriosas propriedades do
ser humano: o livre-arbítrio. Podemos descrever o livre-arbítrio como a capacidade do
ser decidir entre duas alternativas ou entre um conjunto de opções por uma introspecção
interna. O livre arbítrio prende-se logicamente a razão de ser da personalidade humana,
diz-se que a criatura humana age de acordo com suas pendências pessoais, e toma a
decisão segundo seus interesses e inclinações quando o livre-arbítrio tem papel
preponderante. Para nós, Espíritos encarnados, estamos absolutamente convencidos de
que nada externo a nós influencia tal escolha, não estamos “pré-programados” ou somos
controlados “remotamente” para decidir entre isso e aquilo.
Do ponto de vista espírita, assim, as semelhanças entre as extrapolações genéticas e a
astrologia também têm sua razão de ser. Elas provêm de uma compreensão parcial da
natureza humana. Os Espíritos foram bastante claros quanto à inexistência de scripts
pré-programados determinando a personalidade humana. Na Parte 2 do Capítulo 1 de
“O Livro dos Espíritos” (3), Kardec dirige-se aos Espíritos nos termos:
Por que é que alguns Espíritos seguiram o caminho do bem e outros do mal?
“Não têm eles o livre-arbítrio? Deus não os criou maus; criou-os simples e ignorantes,
isto é, tendo tanta aptidão para o bem quanto para o mal. Os que são maus, assim se
tornam por vontade própria.”
A resposta dada contém em si um princípio. Os Espíritos são dotados de uma
capacidade própria (como no caso da inteligência), o de julgarem as coisas livremente.
Compreende-se que se não fosse assim, Deus certamente seria o responsável pela
escolha “errada” e portanto todo o mal que parece se originar dessa escolha. Em outras
palavras, sem o livre-arbítrio os Espíritos não passariam de meros autômatas
previamente programados. A resposta, como de costume, parece não ter sido suficiente
35. a Kardec. Ele volta ao ponto da escolha entre as duas opções possíveis com a questão
122.
Como podem os Espíritos, em sua origem, quando ainda não têm consciência de si
mesmos, gozar da liberdade de escolha entre o bem e o mal? Há neles algum
princípio, qualquer tendência que os encaminhe para uma senda de preferência a
outra?
“O livre-arbítrio se desenvolve à medida que o Espírito adquire a consciência de si
mesmo. Já não haveria liberdade, desde que a escolha fosse determinada por uma
causa independente da vontade do Espírito. A causa não está nele, está fora dele, nas
influências a que cede em virtude de sua livre vontade. É o que contém a grande figura
emblemática da queda do homem e do pecado original; uns cederam à tentação, outros
resistiram.”
“As influências a que cede em virtude de sua livre vontade” constituem todas as
influências externas ao Espírito que atuam durante sua vida espiritual e que lhe são
impostas a fim de que consiga progredir. A decisão de qual caminho tomar diante de
tais influências pertence somente ao Espírito, durante sua jornada evolutiva. Por tais
fatores externos compreendemos não somente os inumeráveis fatos que o Espírito
encontra na encarnação[6] (prazeres fictícios, pessoas as quais ele tem afeto ou não,
circunstâncias felizes ou de desgraça), mas também todas as condições especiais criadas
pelo corpo físico no período da reencarnação. Assim, o papel da hereditariedade não é
definir o comportamento humano (com exclusão do livre-arbítrio que seria função dessa
programação), mas sim libertar ou limitar as capacidades já adquiridas pelo Espírito por
meio de arranjos especiais ou vínculos físicos no corpo material, entendido como uma
ferramenta de trabalho desse Espírito.
Considerações mais específicas ao assunto que aqui tratamos são tecidas nas questões
845 e 846. Destacamos a primeira:
Não constituem obstáculos ao exercício do livre-arbítrio as predisposições
instintivas que o homem já traz consigo ao nascer?
"As predisposições instintivas são as do Espírito antes de reencarnar.Conforme seja
este mais ou menos adiantado, elas podem arrastá-lo à prática de atos repreensíveis,
no que será secundado pelos Espíritos que simpatizam com essas disposições. Não há,
porém, arrastamento irresistível, uma vez que se tenha a vontade de resistir. Lembrai-
vos de que querer é poder. (361)”
No final da resposta, há uma referência direta à questão 361 onde os Espíritos
reafirmam que as qualidades morais que caracterizam a índole ser humano têm origem
em seu Espírito. Poder-se-ia argumentar que as predisposições instintivas fossem
determinadas geneticamente ou, no caso da astrologia, pela posição dos astros no
firmamento. A Doutrina Espírita abertamente faz a asserção de que as
predisposições instintivas são patrimônio do Espírito, a bagagem ou herança
espiritual criada e carregada por ele mesmo através dos séculos. Isso porque a lei moral
que regula a distribuição eqüitativa da justiça só é um conceito válido se o Espírito for o
único responsável por seu sucesso ou fracasso. Tal é o conteúdo de perfectibilidade da
lei assentando sobre um princípio que se liga diretamente à origem do Espírito e a sua
mais íntima natureza. Essa conclusão magistralmente integrada ao conteúdo de
princípios da Doutrina Espírita é a única capaz de explicar o ser humano ou de ao
menos trazer a sensação consoladora de que não somos joguetes da sorte. Para os
abusos de interpretação oriundos da genética ou da astrologia, o ser humano é uma
criatura incompleta, inconsistente em si mesmo porque para vir a ser necessita do jogo
aleatório seja das disposições genéticas ou da posição dos astros.
Entretanto, já comentamos sobre a influência da matéria. Esta é naturalmente função
do grau de adiantamento do Espírito, tanto intelectual como moral. Essa influência
36. foi inúmeras vezes reafirmada pelos Espíritos, podendo ser encontrada em diversas
respostas do “O Livro dos Espíritos”. Nos estágios iniciais de evolução é natural que os
Espíritos estejam fortemente sujeitos aos ditames da matéria. A matéria não determina a
decisão do Espírito, mas atua vigorosamente como vínculos que o incitam a uma ou
outra direção. À medida que o Espírito evolui, os laços materiais tornam-se mais fracos,
liberando-o cada vez mais para decisões independentes ou para a manifestação de
capacidades em desacordo com os arranjos materiais ou leis naturais. Alguns exemplos
práticos dessa liberdade relativa da matéria podem ser encontradas mesmo em
nossa sociedade:
I – A liberdade de escolha de seres humanos em ter ou não filhos. Como se sabe, a
reprodução é uma lei natural através da qual os genes são transmitidos a futuras
gerações de uma certa espécie por meio de um processo que é o próprio núcleo da
evolução natural. Se não há reprodução dentro da espécie, esta inexoravelmente morre,
tanto fisicamente como para a Natureza como um todo, já que seu conteúdo hereditário
deixa de existir. Os seres humanos, que são Espíritos encarnados, podem
surpreendentemente “refutar” essa lei biológica e decidir por não se reproduzir. Se
admitirmos que os animais e os humanos guardam origem e natureza comuns (são seres
encarnados em diferentes graus da escala evolutiva), tal escolha bizarra só pode ser
compreendida dentro da relativa liberdade espiritual adquirida pelo Espírito com essa
evolução. Naturalmente devemos diferenciar aqui a decisão de não se reproduzir tomada
como uma opção de vida onde o sexo ainda é ingrediente corrente daquela inerente ao
próprio Espírito na abstinência sexual a que se dedica, as vezes durante toda a vida, por
ter atingido uma relativa independência das necessidades sexuais. No caso desse seres,
cuja quantidade em nossa sociedade é muito maior do que se pensa, existe uma clara
libertação de uma lei que continua a valer para o imenso contingente de encarnados.
II – Os inumeráveis e não ortodoxos comportamentos sexuais humanos.
Entendemos que homossexualismo, bisexualismo e transsexualismo são fenômenos que
surgem naturalmente, no sentido exposto acima, da liberdade adquirida pelo Espírito
dos laços e leis materiais ou da força de seus instintos internos – originados em sua
própria natureza espiritual – que refutam a escolha biológica herdada. Muitas teorias
têm sido desenvolvidas para explicar tais comportamentos, partindo-se de diferentes
hipóteses. Algumas delas tendem a enfatizar a “bagagem hereditária”, enquanto que
outras o ambiente. Nenhuma explicação adequada e convergente tem sido encontrada. O
ponto crucial parece ser a falta de uma imagem coerente do ser humano, que pode ser
plenamente encontrada através da aplicação dos princípios espíritas. De fato, a
reencarnação é o ponto de partida para se compreender muitos desses fenômenos, sendo
o transsexualismo apenas um dos exemplos notáveis.
As aparentes similaridades entre a astrologia e a genética (tanto quanto podemos inferir
do conhecimento comum dessas disciplinas) estão conclusivamente estabelecidas sobre
uma visão parcial da natureza humana. Embora sejam consideradas muito
diferentemente pela sociedade moderna, tanto uma como a outra limitam, de certa
forma, o livre-arbítrio humano, que sofre a interferência de fatores externos no
momento do nascimento. Os Espíritos, entretanto, deixaram claro que não existe uma
programação de comportamento, antes, o Espírito é livre para tomar as decisões que
julgar conveniente. Para isso, o Espírito utiliza os recursos materiais colocados a sua
disposição, sendo ele o responsável pela escolha correta ou errada, se caiu sob esse ou
aquele arrastamento. À medida que o Espírito progride, torna-se menos vulnerável à
influência material, porque já demonstrou em si mesmo que está livre.
Há ainda a questão da escolha dos fatores materiais, que são mais ou menos
estabelecidos no momento da reencarnação. Para a Doutrina Espírita, mesmo nesse
instante, não existe propriamente uma “imposição externa”, mormente se o Espírito já
desfruta de um certo nível evolutivo. No início de sua jornada, é razoável admitir que o
Plano Maior se responsabilize pelo estabelecimento dos recursos materiais apropriados