O documento fornece um resumo da vida e obra de Aristóteles, o filósofo grego. Ele nasceu na Macedônia no século IV a.C. e estudou na Academia de Platão. Posteriormente, fundou sua própria escola, o Liceu, onde ensinou Alexandre, o Grande. Aristóteles escreveu sobre uma ampla gama de assuntos, organizando o conhecimento de forma enciclopédica e sentando as bases para muitas ciências modernas. Sua obra teve grande influência no pensamento ocidental.
1. “O Mestre dos que sabem"
ARISTÓTELES
" do grego, excelente confidente, ótimo
conselheiro”
2. LINHA DO TEMPO
594 ªC – Nebuchadnezar (Nabucodonosor II) invade Israel.
– Gregos colonizam a Espanha.
563 ªC – Nascimento de SIDARTA GAUTAMA (BUDA).
490 ªC – O pensamento de CONFÚCIO começa a se propagar na China.
483 ªC – Morre de SIDARTA GAUTAMA.
400 ªC – É redigido o Livro de Jó.
399 ªC – Julgamento, condenação e morte de SÓCRATES.
387 ªC – PLATÃO abre a sua Academia, em Atenas.
384 ªC – Nascimento de ARISTÓTELES.
359 ªC – Filipe I, é rei na Macedônia.
356 ªC – Nascimento de ALEXANDRE (Magno) na Macedônia.
347 ªC – Morre de PLATÃO.
343 ªC – Filipe convida ARISTÓTELES para preceptor de ALEXANDRE.
336 ªC – Filipe é assassinado e ALEXANDRE assume o trono.
335 ªC – ARISTÓTELES abre o Liceu, em Atenas.
3. 333 ªC – ALEXANDRE submete os países mediterrâneos dependentes da
Pérsia, conquista o Egito e funda Alexandria.
331 ªC – Vitória de ALEXANDRE sobre Dário III, Imperador da Pérsia.
327 ªC – ALEXANDRE penetra no vale do Indo.
323 ªC – Morte de ALEXANDRE na Babilônia.
322 ªC – Morte de ARISTÓTELES.
321 ªC – Chandragupta firma-se no Pendjab (Ìndia).
312 ªC – Em Roma, construção da Via Àpia e do Aqueduto.
300 ªC – Euclides estuda Geometria
– Desenvolve-se a escrita sânscrita e Maia.
294 ªC – Em Alexandria funcionam o Museu e a Biblioteca.
4. Surgiu nos séculos VII - VI ªC nas cidades gregas situadas na
Ásia Menor uma interpretação desacralizada dos mitos
difundidos pelas religiões daquele tempo. Os mitos foram
segundo Platão e Aristóteles o material inicial de reflexão dos
filósofos. Tornaram-se um campo comum para religião e a
filosofia, revelando que a separação entre estes dois modos de
interpretação da realidade não é tão nítida como parece.
O movimento de renovação do pensamento religioso, marcado
pela universalização e a procura de uma razão comum a todas
as coisas ocorreu antes do primeiro milênio com a atuação de:
- SIDARTA GAUTAMA e Mahiva na Índia.
- LAO-TSÉ e CONFÚCIO na China
- ZARATRUSTRA OU ZOROASTRO, na Pérsia
- Heráclito, Pitágoras e Empédocles na Grécia
- Isaías, Jeremias e EZEQUIEL no cativeiro israelita da
Babilônia .
5. Todos proclamam uma concepção universal do divino
encarando uma realidade que ultrapassava as perspectivas
particulares das sociedades em que viviam. A obra Aristotélica
só se integra na cultura filosófica européia da Idade Média,
através dos árabes, no século XIII, quando é conhecida a versão
(orientalizada) de Averróis, o seu mais importante comentarista.
Depois, S. Tomás de Aquino incorpora muitos passos das suas
teses no pensamento cristão. Os escritos de Aristóteles
perfazem grande número de volumes (consta que 150,
aproximadamente) e versam sobre assuntos variados: da
ciência, política e ética à crítica literária. Desses trabalhos, cerca
de dois terços desapareceram. Mesmo os que chegaram até nós
ficaram perdidos por séculos, por vezes em mais de uma
ocasião. Muitos deles só atravessariam a Idade Média traduzidos
para o árabe. Aristóteles pode ser considerado o criador do
estudo da Lógica e essa matéria, dentre toda a sua obra, foi a
única a continuar sendo estudada na Europa após a queda do
Império Romano.
Averrois
6. Aristóteles nasceu em Estagira (atual Stavro), próximo de Pela,
capital da Macedônia, portanto era Macedônio de origem Grega.
Estagiara era colônia fundada pelos calcidenses da ilha Eubéia
( na Trácia), no litoral norte do mar Egeu, em 384 a.C .
Diz Apolodoro nas Crônicas, que “Aristóteles nasceu no
primeiro ano da nonagésima olimpíada em uma região sob
controle da Macedônia”.
Seu pai, Nicômaco e sua mãe, Féstias, ao dar-lhe um nome
grego, quebram um costume: o filho deveria ter o nome do avô,
Macaon.
7. Timóteo, nas vidas, comenta que “Aristóteles, o mais ilustre dos
discípulos de Platão, tinha a voz débil, pernas delgadas e olhos
pequenos; que se vestia sempre com esmero, levava anéis e
cortava a barba" (Diógenes Laércio, V, 1).
Dois anos depois de Aristóteles, nasce Filipe da Macedônia. Os
jovens vão ser companheiros de infância nos jardins do palácio
real já que Nicômaco, pai de Aristóteles, é médico do rei Amintas
II. Mas, enquanto o filho de Amintas se exercita na cavalaria, no
tiro ao arco, na caça, o de Nicômaco não é brilhante nessas
artes.
Ambos, no entanto, têm uma paixão pela natureza. Percorrem as
florestas, conhecem as plantas, os animais do chão, as aves e
os peixes. É aí que Aristóteles desperta para a biologia. As
relações entre as duas crianças são afáveis e essa amizade, tão
cara a Aristóteles, embora com divergências, prolongar-se-á até
o assassínio de Filipe.
8. É nesse mar, junto ao Monte Athos, que Aristóteles inicia a
investigação dos animais, em especial, os marinhos. Ensinado
pelo pai, terá feito as primeiras dissecações. Também é aí que,
entre a praia e os rochedos, convive com pessoas do porto,
pescadores, marinheiros, crianças do cais e absorve os seus
conhecimentos.
É, porém, nos livros que satisfaz completamente a sua
curiosidade. Conhece de cor os poetas, sobretudo Homero,
conhece os filósofos de Atenas e, mesmo sem compreender
tudo, memoriza.
Após a morte de seu pai em 366 ªC vai para a casa da irmã
Arimnesta que vive em Mísia com o esposo Proxénos, que fica
como seu tutor.
Torna-se amigo de Hermias que também passara pela Academia,
eunuco e escravo liberto, rico, poderoso, amigo da filosofia que
mantinha uma comunidade de filósofos.
9. Aos dezoito anos, em 367, viajou à Atenas para prosseguir os
seus estudos e entre as várias opções, escolheu a Academia de
Platão, onde ficou por vinte anos e onde tornou-se professor, até
à morte do mestre em 347.
Nesse período estudou também os filósofos pré-platônicos, que
lhe foram úteis na construção do seu grande sistema.
Abandonou a Academia provavelmente por divergências quanto
à escolha de Espeusito, sobrinho de Platão, para a direção da
escola e foi para Atarnéia (Assos), na Mísia onde havia uma
comunidade de alunos da Academia, protegida pelo tirano
Hermias, rei de Atárnea já seu conhecido, que possibilita o
contato com a organização interna e externa do Estado (347-
345). Entretanto, não repete a experiência de Platão, junto aos
tiranos de Siracusa, e não procura moralizar Hermias. Casa com
Pítias, sobrinha de Hermias, e durante cinco anos gere suas
propriedades em um casamento que durou dez anos, mas sua
permanência em Assos foi subitamente interrompida, quando os
persas suspeitando que Hermias estava colaborando com os
macedônios, decidem crucifica-lo em Persópolis (345).Ruínas do Templo de Athenas, em ASSOS / Turquia
10. Aristóteles foge, refugiando-se em Mitilene, capital da ilha de Lesbos,
onde vive Féstias ,sua mãe, e se dedica ao estudo da biologia. Lesbos
localiza-se no mar Egeu, próximo à Turquia. Em grego moderno, o nome
da ilha é Lesvos.
Pítia dá-lhe uma filha. Mas, pouco depois, Aristóteles enviúva e passa a
conviver com uma concubina, Hérpilis, que lhe dará um filho, que
recebe o nome do avô paterno como era a tradição, Nicômaco,
restabelecendo a tradição..
Em 343, pai de família, com 41 anos, foi convidado pelo Rei Filipe -
conquistador da Grécia - para a corte de Pela, na Macedônia,
acompanhado da esposa Hérpilis, filho e filha. Foi o professor do
Príncipe Alexandre, então jovem de quinze anos, durante três anos em
troca da reconstrução de Estagira, arrasada por Filipe em uma guerra e
onde teve a oportunidade de organizar as leis.
Alexandre revelou-se um aluno apaixonado pelos autores clássicos e
manifestou igualmente interesse pelas discussões filosóficas, a
investigação da natureza, medicina, zoologia, botânica, fazendo-se
acompanhar nas suas expedições militares por um grupo de
investigadores.
Felipe II
11. Quando Alexandre subiu ao trono (em 335 ªC), treze anos depois
da morte de Platão, Aristóteles regressou à Atenas, onde criou a
sua própria escola, a sudoeste da cidade, com apoio de
Alexandre, junto ao templo dedicado a Apolo Liceano, o caçador
de lobos. Chamada Liceu ou Escola Peripatética, porque o
mestre dava suas lições passeando com os alunos da classe
exotérica, que era mais numerosa, em amena palestra, no
sombreado das colunas (peristilos) através das alamedas (os
peripatos) do ginásio comprado junto ao templo. Esta escola
seria a grande rival e a verdadeira herdeira da velha e gloriosa
academia platônica e teve a presença de Aristóteles por doze
anos. Os estudos concentravam-se sobre o que hoje
poderíamos denominar "ciências naturais", ao contrário da
Academia, onde era dada grande importância à geometria. Tinha
dois tipos de cursos, os "exotéricos" para o público, e os
"esotéricos" destinados apenas ao pequeno número de alunos
iniciados nas várias matérias. No Liceu Aristóteles e os seus
discípulos recolhiam informações sobre tudo, organizando
depois estes dados num sistema global.
Ruínas de Pella
12. Os tratados de Aristóteles provêm de notas tomadas por seus
ouvintes e constituem um vasto conjunto enciclopédico, dividido
posteriormente em quatro grupos de obras. Toda a sua filosofia
baseia-se numa observação minuciosa da natureza, sociedade e
indivíduos, organizada de uma forma verdadeiramente
enciclopédica. A sua idéia fundamental era a de tudo classificar,
dividindo as coisas segundo a sua semelhança ou diferença,
obedecendo a um conjunto de perguntas muito simples: Como é
esta coisa ? (o gênero). O que é que a difere de outras que lhe
são semelhantes? (a diferença). A partir daqui começava a
hierarquizar todas as coisas, de uma forma tão ordenada que até
então nunca ninguém conseguira fazer. A respeito do caráter de
Aristóteles, inteiramente recolhido na elaboração crítica do seu
sistema filosófico não se deixava distrair por motivos práticos
ou sentimentais. Foi essencialmente um homem de cultura, de
estudo, pesquisas, pensamento, que foi se isolando da vida
prática, social e política, para se dedicar à investigação
científica. A atividade literária de Aristóteles foi vasta e intensa,
como a sua cultura e seu gênio universal.
Apolo
13. Escreveu sobre todas as ciências, constituindo algumas os
primeiros fundamentos, organizando outras em corpo coerente
de doutrinas e sobre todas espalhando as luzes de sua
admirável inteligência.
Não lhe faltou nenhum dos dotes e requisitos que constituem o
verdadeiro filósofo: profundidade e firmeza de inteligência,
agudeza de penetração, vigor de raciocínio, poder admirável de
síntese, faculdade de criação e invenção aliados a uma vasta
erudição histórica e universalidade de conhecimentos
científicos.
O grande estagirita explorou o mundo do pensamento em todas
as direções. Pelo elenco dos principais escritos que dele ainda
nos restam, poder-se-á avaliar a sua prodigiosa atividade
literária. A primeira edição completa das obras de Aristóteles é a
de Andronico de Rodes pela metade do último século ªC.
autêntica, salvo alguns apócrifos e interpolações.
Monastério com o Monte Athos ao fundo
14. Classificação das obras doutrinais de Aristóteles conforme a
edição de Andronico de Rodes.
I. Escritos lógicos: cujo conjunto foi denominado Órganon
mais tarde, corresponde muito bem à intenção do autor, que
considerava a lógica instrumento da ciência.
II. Escritos sobre a física: abrangendo a hodierna cosmologia e a
antropologia, e pertencentes à filosofia Teorética
(Pensamentos), juntamente com a metafísica.
III. Escritos metafísicos: a Metafísica, em catorze livros. É uma
compilação feita depois da morte de Aristóteles mediante
seus apontamentos manuscritos, referentes à metafísica
geral e à teologia. O nome de metafísica é devido ao lugar
que ela ocupa na coleção de Andronico, que a colocou
depois da física.
15. IV. Escritos morais e políticos:
Ética a Nicômaco, em dez livros, provavelmente publicada por
Nicômaco, seu filho, ao qual é dedicada;
Ética a Eudemo, inacabada, escrito com base na ética de Aristóteles.
Grande Ética, compêndio da Ética a Nicômaco e, em especial da Ética a
Eudemo
Política, em oito livros, incompleta.
V. Escritos retóricos e poéticos:
Retórica, em três livros;
Poética, em dois livros, que, no seu Estado atual, é apenas uma parte da
obra de Aristóteles. As obras e doutrinas que nos restam - manifestam
um grande rigor científico, sem enfeites míticos ou poéticos, exposição
e expressão breve e aguda, clara e ordenada, perfeição maravilhosa da
terminologia filosófica, de que foi ele o criador.
16.
O Pensamento: A Gnosiologia
Segundo Aristóteles, a filosofia deve decifrar o enigma do
universo, diante da atitude inicial de assombro com esse
mistério. Sua questão fundamental é o problema do ser, não o
problema da vida. O objeto da filosofia, onde está a solução do
problema, são as essências imutáveis e a razão última das
coisas, as formas e suas relações, o universal e o necessário,
pois não pode haver ciência em torno do individual e do
contingente. As formas são imanentes na experiência, nos
indivíduos, de que constituem a essência. A filosofia aristotélica
é conceitual como a de Platão mas parte da experiência; é
dedutiva, onde o ponto de partida dedutivo é tirado pelo
intelecto da experiência. Sob o ponto de vista metafísico, o
objeto da ciência aristotélica é a forma, como idéia era o objeto
da ciência platônica.
18. Aristóteles é o criador da lógica, como ciência especial, sobre a
base socrático-platônica; é denominada por ele ANALÍTICA e
representa a metodologia científica. Aristóteles trata dos
problemas lógicos e gnosiológicos que tomou mais tarde o
nome de Órganon.
A ciência aristotélica é objetiva, realista onde tudo que se pode
aprender precede a sensação e é independente dela, é a
dedução do particular pelo universal, explicação do
condicionado mediante a condição, porquanto o primeiro
elemento depende do segundo.
Também aqui se segue a ordem da realidade, onde o fenômeno
particular depende da lei universal e o efeito da causa. Objeto
essencial da lógica aristotélica é precisamente este processo de
derivação ideal, que corresponde a uma derivação real.
19. A lógica aristotélica, portanto, bem como a platônica, é
essencialmente dedutiva, demonstrativa. O seu processo
característico, clássico, é o silogismo. Os elementos primeiros,
os princípios supremos, as verdades evidentes, consoante
Platão, são fruto de uma visão imediata, intuição intelectual, em
relação com a sua doutrina do contato imediato da alma com as
idéias – a reminiscência. Segundo Aristóteles, entretanto, de
cujo sistema é banida toda forma de inatismo, também os
elementos primeiros do conhecimento - conceito e juízos -
devem ser, de um modo e de outro, tirados da experiência, da
representação sensível, cuja verdade imediata ele defende, pois
os sentidos por si nunca nos enganam. O erro começa de uma
falsa elaboração dos dados dos sentidos: a sensação, como o
conceito, é sempre verdadeira. Certamente que,
metafisicamente, o universal, o necessário, o inteligível, é
anterior ao particular, ao contingente, ao sensível: mas,
psicologicamente existe primeiro o particular, o contingente, o
sensível, que constituem precisamente o objeto próprio do
nosso conhecimento sensível, que é o nosso primeiro
conhecimento.
20. Assim sendo, compreende-se que Aristóteles, paralelamente, e
em conseqüência da doutrina de dedução, seja constrangido a
elaborar, na lógica, a doutrina da indução. Não está efetivamente
acabada, mas pode-se integrar logicamente segundo o espírito
profundo da sua filosofia. Com relação aos elementos básicos
do conhecimento racional, como os conceitos, a indução nada
mais é que a abstração do conceito, do inteligível, da
representação sensível, isto é, a "desindividualização" do
universal do particular, em que o universal é imanente. A
formação do conceito é retirada da experiência. Quanto ao juízo,
que é o elemento constitutivo da ciência, onde temos
unicamente ou não temos a verdade, depende do princípio da
demonstração, dos juízos imediatamente evidentes. Aristóteles
reconhece que é impossível uma indução completa, isto é, uma
resenha de todos os casos de fenômenos particulares para
poder tirar com certeza absoluta as leis universais abrangendo
todas as essências. Então só resta possível uma indução
incompleta do juízo onde os conceitos são tirados da
experiência, e seu nexo analítico, colhido imediatamente pelo
intelecto humano mediante a sua evidência.
21. Filosofia de Aristóteles
Partindo como Platão do mesmo problema acerca do valor
objetivo dos conceitos, mas abandonando a solução do mestre,
Aristóteles constrói um sistema inteiramente original. Os
caracteres desta grande síntese são:
1. Unidade do conjunto - Sua vasta obra filosófica constitui um
verdadeiro sistema, uma verdadeira síntese.Todas as partes se
compõem, se correspondem, se confirmam.
2. Observação fiel da natureza - Platão, idealista, rejeitara a
experiência como fonte de conhecimento certo. Aristóteles, mais
positivo, toma sempre o fato como ponto de partida de suas
teorias, buscando na realidade um apoio sólido às suas mais
elevadas especulações metafísicas.
3. Rigor no método - Depois de estudar as leis do pensamento, o
processo dedutivo è aplicado em todas as suas obras,
substituindo à linguagem figurada de Platão, em estilo conciso e
criando uma terminologia filosófica de precisão admirável. Pode
ser considerado o autor do método científico.
23. A Teologia
Objeto a teologia é o primeiro motor imóvel, ato puro, o
pensamento do pensamento, isto é, Deus, a quem Aristóteles
chega através de uma sólida demonstração, baseada sobre a
imediata experiência, indiscutível, realidade do vir-a-ser, da
passagem da potência ao ato. Os objetos sensíveis são
constituídos pelo princípio da perfeição (o ato), são enquanto
são e pelo princípio da imperfeição (a potência), através do qual
se lhes permite a aquisição de novas perfeições. O ato explica a
unidade do ser, a potência, a multiplicidade e a mudança. Esta
passagem da potência ao ato, requer finalmente um não-vir-a-
ser. A necessidade deste primeiro motor imóvel não é
absolutamente excluída pela eternidade do vir-a-ser, do
movimento, do mundo. Mesmo admitindo que o mundo seja
eterno, isto é, que não tem princípio e fim no tempo, enquanto
for passagem da potência ao ato, fica eternamente inexplicável,
contraditório, sem um primeiro motor imóvel, origem extra-
temporal, causa absoluta, razão metafísica de todo devir.
24. Deus, o real puro, é aquilo que move sem ser movido, é aquilo
que é movido, sem mover a si mesmo.
Da análise do conceito de Deus, concebido como primeiro motor
imóvel, conquistado através do precedente raciocínio,
Aristóteles, pode deduzir logicamente a natureza essencial de
Deus, concebido, antes de tudo, como ato puro, e, como
pensamento de si mesmo.
Deus é unicamente pensamento, atividade Teorética), enquanto
que outra atividade teria fim extrínseco, incompatível com o ser
perfeito, auto-suficiente. Se o agir, e o querer têm objeto diverso
do sujeito agente e "querente", Deus não pode agir e querer,
mas unicamente conhecer e pensar, conhecer a si próprio e
pensar em si mesmo. Deus é, portanto, pensamento de
pensamento, pensamento de si, que é pensamento puro. E nesta
autocontemplação imutável e ativa, está a beatitude divina.
25. Se Deus é mera atividade Teorética, tendo como objeto
unicamente a própria perfeição, não conhece o mundo
imperfeito, e menos ainda opera sobre ele.
Deus não atua sobre o mundo, voltando-se para ele, com o
pensamento e a vontade; mas unicamente como o fim último,
atraente, isto é, como causa final, e, por conseqüência, e só
assim, como causa eficiente e formal (exemplar).
De Deus depende a ordem, a vida, a racionalidade do mundo;
ele, porém, não é criador, nem providência do mundo. Em
Aristóteles o pensamento grego conquista logicamente a
transcendência de Deus; mas, no mesmo tempo, permanece o
dualismo, que vem anular aquele mesmo Absoluto a que
logicamente chegara, para dar uma explicação filosófica da
relatividade do mundo pondo ao seu lado esta realidade
independente dele.
26. A Moral
Aristóteles afirma que todo ser tende necessariamente à
realização da sua natureza, à atualização plena da sua forma: e
nisto está o seu fim, seu bem, e sua felicidade, e, por
conseqüência, sua lei. Sendo a razão a essência característica
do homem, ele realiza sua natureza vivendo racionalmente e
sendo consciente. Assim consegue a felicidade e a virtude, isto
é, consegue a felicidade mediante a virtude, que é precisamente
uma atividade conforme à razão, isto é, uma atividade que
pressupõe o conhecimento racional. Logo, o fim do homem é a
felicidade, a que é necessária à virtude, e a esta é necessária a
razão. A característica fundamental da moral aristotélica é,
portanto, o racionalismo, sendo a virtude ação consciente
segundo a razão, que exige o conhecimento absoluto,
metafísico, da natureza e do universo, natureza segundo a qual e
na qual o homem deve operar.
27. As virtudes éticas, morais, não são mera atividade racional,
como as virtudes intelectuais, pensamentos; mas implicam, por
natureza, um elemento sentimental, afetivo, passional, que deve
ser governado pela razão, e não pode, todavia, ser
completamente resolvido na razão. A razão aristotélica governa,
domina as paixões, não as aniquila e destrói, como queria o
ascetismo platônico. A virtude ética não é, pois, razão pura, mas
uma aplicação da razão; não é unicamente ciência, mas uma
ação com ciência.
Uma doutrina aristotélica a respeito da virtude teve muita prática
popular, embora se apresente discutível onde a virtude é
precisamente concebida como um justo meio entre dois
extremos, isto é, entre duas paixões opostas: porquanto o
sentido poderia esmagar a razão ou não lhe dar forças
suficientes. Naturalmente, este justo meio, na ação de um
homem, não é abstrato ou igual para todos e sempre; mas
concreto, personalizado e variável conforme as circunstâncias.
28. No que diz respeito à virtude, tem, ao contrário, certamente,
maior valor uma outra doutrina aristotélica: precisamente a da
virtude concebida como hábito racional. Se a virtude é,
fundamentalmente, uma atividade segundo a razão, mais
precisamente é ela um hábito segundo a razão, um costume
moral, uma disposição constante, reta, da vontade, isto é, a
virtude não é inata, como não é inata a ciência; mas adquiri-se
mediante a ação, a prática, o exercício e, uma vez adquirida,
estabiliza-se, mecaniza-se; torna-se quase uma segunda
natureza e, logo, torna-se de fácil execução - como o vício.
Como já foi mencionado, Aristóteles distingue duas categorias
fundamentais de virtudes: as éticas, que constituem
propriamente o objeto da moral, e as dianoéticas, que a
transcendem. É uma distinção e uma hierarquia, que têm uma
importância essencial em relação a toda a filosofia e
especialmente à moral. As virtudes intelectuais, Teorética,
contemplativas, são superiores às virtudes éticas, práticas,
ativas. Noutras palavras, Aristóteles sustenta o primado do
conhecimento, do intelecto, da filosofia, sobre a ação, a vontade
e a política.
29. A Política
A política aristotélica é essencialmente unida à moral, porque o
fim último do Estado é a virtude, isto é, a formação moral dos
cidadãos e o conjunto dos meios necessários para isso. O
Estado é um organismo moral, condição e complemento da
atividade moral individual, e fundamento primeiro da suprema
atividade contemplativa. A política, contudo, é distinta da moral,
porquanto esta tem como objetivo o indivíduo, aquela a
coletividade. A ética é a doutrina moral individual, a política é a
doutrina moral social. Desta ciência trata Aristóteles na Política.
O Estado, então, é superior ao indivíduo, porquanto a
coletividade é superior ao indivíduo, o bem comum superior ao
bem particular. Unicamente no Estado efetua-se a satisfação de
todas as necessidades, pois o homem, sendo naturalmente
animal social, político, não pode realizar a sua perfeição sem a
sociedade do Estado.
30.
Visto que o Estado se compõe de uma comunidade de famílias,
assim como estas se compõem de muitos indivíduos, antes de
tratar propriamente do Estado será mister falar da família, que
precede cronologicamente o Estado, como as partes precedem o
todo.
Segundo Aristóteles, a família compõe-se de quatro elementos:
os filhos, a mulher, os bens, os escravos; além, naturalmente, do
chefe a que pertence a direção da família.
Deve ele guiar os filhos e as mulheres, em razão da imperfeição
destes. Deve fazer frutificar seus bens, porquanto a família, além
de um fim educativo, tem também um fim econômico. E, como
ao Estado, é-lhe essencial a propriedade, pois os homens têm
necessidades materiais. No entanto, para que a propriedade seja
produtora, são necessários instrumentos inanimados e
animados; estes últimos seriam os escravos.
31. Aristóteles não nega a natureza humana ao escravo; mas
constata que na sociedade são necessários também os
trabalhos materiais, que exigem indivíduos particulares, a que
fica assim tirada fatalmente a possibilidade de providenciar a
cultura da alma, visto ser necessário, para tanto, tempo e
liberdade, bem como aptas qualidades espirituais, excluídas
pelas próprias características qualidades materiais de tais
indivíduos. Daí a escravidão.
O Estado surge, pelo fato de ser o homem um animal
naturalmente social, político. O Estado provê, inicialmente, a
satisfação daquelas necessidades materiais, negativas e
positivas, defesa e segurança, conservação e engrandecimento,
de outro modo irrealizáveis. Mas o seu fim essencial é espiritual,
isto é, deve promover a virtude e, conseqüentemente, a
felicidade dos súditos mediante a ciência.
32. A tarefa essencial do Estado é a educação, que deve desenvolver
harmônica e hierarquicamente todas as faculdades: antes de tudo as
espirituais, intelectuais e, subordinando as materiais e físicas.
O fim da educação é formar homens mediante as artes liberais,
importantíssimas a poesia e a música, e não máquinas, mediante um
treinamento profissional. Eis porque Aristóteles, como Platão, condena
o Estado que, ao invés de se preocupar com uma pacífica educação
científica e moral, visa a conquista e a guerra. E critica, dessa forma, a
educação militar de Esparta, que faz da guerra a tarefa precípua do
Estado, e põe a conquista acima da virtude, enquanto a guerra, como o
trabalho, são apenas meios para a paz e o lazer sapiente.
Não obstante a sua concepção ética do Estado, Aristóteles,
diversamente de Platão, salva o direito privado, a propriedade particular
e a família.
O comunismo como resolução total dos indivíduos e dos valores no
Estado é fantástico e irrealizável. O Estado não é uma unidade
substancial, e sim uma síntese de indivíduos substancialmente
distintos.
33. Se quiser a unidade absoluta, será mister reduzir o Estado à família e a
família ao indivíduo; só este último possui aquela unidade substancial
que falta aos dois precedentes.
Reconhece Aristóteles a divisão platônica das castas, e reconhece duas
classes: a dos homens livres, possuidores, isto é, a dos cidadãos e a
dos escravos, dos trabalhadores, sem direitos políticos.
Quanto à forma exterior do Estado, Aristóteles distingue três principais:
a monarquia, que é o governo de um só, cujo caráter e valor estão na
unidade, e cuja degeneração é a tirania;
a aristocracia, que é o governo de poucos, cujo caráter e valor estão na
qualidade, e cuja degeneração é a oligarquia;
a democracia, que é o governo de muitos, cujo caráter e valor estão na
liberdade, e cuja degeneração é a demagogia.
As preferências de Aristóteles vão para uma forma de república
democrático-intelectual, a forma de governo clássica da Grécia,
particularmente de Atenas. No entanto, com o seu profundo realismo,
reconhece Aristóteles que a melhor forma de governo não é abstrata, e
sim concreta: deve ser relativa, acomodada às situações históricas, às
circunstâncias de um determinado povo.
34. De qualquer maneira a condição indispensável para uma boa
constituição, é que o fim da atividade estatal deve ser o bem
comum e não a vantagem de quem governa despoticamente.
Aristóteles compôs dois grandes trabalhos sobre a ciência
política:
"Política" (Politéia) que provavelmente eram lições dadas no
Liceo e registradas por seus alunos, e a "Constituição de
Atenas", obra que só se tornou mais conhecida, ainda que em
fragmentos, no final do século XIX, mais precisamente em 1880-
1881, quando foi encontrada no Egito; registra as várias formas
e alterações constitucionais que ela passou por obra dos seus
grandes legisladores, tais como Drácon, Sólon, Pisístrato,
Clístenes e Péricles e que também pode ser lida como uma
história política da cidade.
35. A Religião e a Arte
Com Aristóteles afirma-se o teísmo do ato puro. No entanto, este
Deus, pelo seu efetivo isolamento do mundo, que não conhece,
não cria, não governa, não está em condições de se tornar
objeto de religião, mais do que as transcendentes idéias
platônicas. E não fica nenhum outro objeto religioso. Também
Aristóteles, como Platão, se exclui filosoficamente o
antropomorfismo, não exclui uma espécie de politeísmo, e
admite, ao lado do Ato Puro e a ele subordinado, os deuses
astrais, isto é, admite que os corpos celestes são animados por
espíritos racionais. Entretanto, esses seres divinos não parecem
e não podem ter função religiosa sem a física.Não obstante esta
concepção filosófica da divindade, Aristóteles admite a religião
positiva do povo, até sem correção alguma. Explica e justifica a
religião positiva, tradicional, mítica, como obra política para
moralizar o povo, e como fruto da tendência humana para as
representações antropomórficas; e não diz que ela teria um
fundamento racional na verdade filosófica da existência da
divindade, a que o homem se teria facilmente elevado através do
espetáculo da ordem celeste.
36. Aristóteles como Platão considera a arte como imitação,
conforme o fundamental realismo grego. Não, porém, imitação
de uma imitação, como é o fenômeno, o sensível, dos
platônicos; e sim imitação direta da própria idéia, do inteligível
imanente no sensível, imitação da forma imanente na matéria.
Na arte, esse inteligível, universal é encarnado, concretizado
num sensível, num particular e tornando intuitivo, graças ao
artista. Por isso, Aristóteles considera a arte a poesia de Homero
que tem por conteúdo o universal, o imutável, ainda que
encarnado fantasticamente num particular, como superior à
história e mais filosófica do que a história de Heródoto que tem
como objeto o particular, o mutável, embora seja real.
O objeto da arte não é o que aconteceu uma vez como é o caso
da história, mas o que por natureza deve, necessária e
universalmente, acontecer. Deste seu conteúdo inteligível,
universal, depende a eficácia espiritual pedagógica, purificadora
da arte.
37. A Metafísica
A metafísica aristotélica é "a ciência do ser como ser, ou dos princípios
e das causas do ser e de seus atributos essenciais". Ela abrange ainda
o ser imóvel e incorpóreo, princípio dos movimentos e das formas do
mundo, bem como o mundo mutável e material, mas em seus aspectos
universais e necessários. A Metafísica tem como objeto o mundo que
vem-a-ser - natureza e homem - e culmina no que não pode vir-a-ser,
isto é, Deus.
Podem-se reduzir fundamentalmente a quatro as questões gerais da
metafísica aristotélica:
potência e ato
matéria e forma
particular e universal
movido e motor.
A primeira e a última abraçam todo o ser, a segunda e a terceira todo o
ser em que está presente a matéria.
38. I. A doutrina da potência e do ato:
È fundamental na metafísica aristotélica, potência significa
possibilidade, capacidade de ser, não-ser atual; e ato significa
realidade, perfeição, ser efetivo.
Todo ser, que não seja o Ser perfeitíssimo, é portanto uma
síntese de potência e de ato, em diversas proporções, conforme
o grau de perfeição, de realidade dos vários seres.
Um ser desenvolve-se, aperfeiçoa-se, passando da potência ao
ato; esta passagem da potência ao ato é atualização de uma
possibilidade, de uma potencialidade anterior. Esta doutrina
fundamental da potência e do ato é aplicada - e desenvolvida -
por Aristóteles especialmente quando da doutrina da matéria e
da forma, que representam a potência e o ato no mundo, na
natureza em que vivemos.
39. II. Aristóteles não nega o vir-a-ser de Heráclito, nem o ser de
Parmênides, mas une-os em uma síntese conclusiva, já iniciada pelos
últimos pré-socráticos e grandemente aperfeiçoada por Demócrito e
Platão. Segundo Aristóteles, a mudança, que é intuitiva, pressupõe uma
realidade imutável, que é de duas espécies.
Um substrato comum, elemento imutável da mudança, em que a
mudança se realiza; e as determinações que se realizam neste
substrato, a essência, a natureza que ele assume. O primeiro elemento é
chamado matéria (prima), o segundo forma (substancial). O primeiro é
potência, possibilidade de assumir várias formas, imperfeição; o
segundo é atualidade - realizadora, especificadora da matéria - ,
perfeição.
A síntese da matéria e da forma constitui a substância, e esta, por sua
vez, é o substrato imutável, em que se sucedem os acidentes, as
qualidades acidentais. A mudança, portanto, consiste ou na sucessão
de várias formas na mesma essência, forma concretizada da matéria,
que constitui precisamente a substância.
40. A matéria sem forma, a pura matéria, chamada matéria-prima, é
um mero possível, não existe por si, é um absolutamente
interminado, em que a forma introduz as determinações.
A matéria aristotélica, porém, não é o puro não-ser de Platão,
mero princípio de decadência, pois ela é também condição
indispensável para concretizar a forma, ingrediente necessário
para a existência da realidade material, causa concomitante de
todos os seres reais.
Então não existe, propriamente, a forma sem a matéria, ainda
que a forma seja princípio de atuação e determinação da própria
matéria. Com respeito à matéria, a forma é, portanto, princípio de
ordem e finalidade, racional, inteligível.
Diversamente da idéia platônica, a forma aristotélica não é
separada da matéria, e sim imanente e operante nela. Ao
contrário, as formas aristotélicas são universais, imutáveis,
eternas, como as idéias platônicas.
41. Os elementos constitutivos da realidade são, portanto, a forma e
a matéria. A realidade, porém, é composta de indivíduos,
substâncias, que são uma síntese de matéria e forma. Por
conseqüência, estes dois princípios não são suficientes para
explicar o surgir dos indivíduos e das substâncias que não
podem ser atuados - bem como a matéria não pode ser atuada -
a não ser por um outro indivíduo, isto é, por uma substância em
ato.
Daí a necessidade de um terceiro princípio, a causa eficiente,
para poder explicar a realidade efetiva das coisas. A causa
eficiente, por sua vez, deve operar para um fim, que é
precisamente a síntese da forma e da matéria, produzindo esta
síntese o indivíduo. Daí uma quarta causa, a causa final, que
dirige a causa eficiente para a atualização da matéria mediante a
forma.
42. III. Mediante a doutrina da matéria e da forma, Aristóteles explica
o indivíduo, a substância física, a única realidade efetiva no
mundo, que é precisamente síntese de matéria e de forma. A
essência - igual em todos os indivíduos de uma mesma espécie -
deriva da forma; a individualidade, pela qual toda substância é
original e se diferencia de todas as demais, depende da matéria.
O indivíduo é, portanto, potência realizada, matéria enformada,
universal particularizado.
Mediante esta doutrina é explicado o problema do universal e do
particular, que tanto atormenta Platão;
Aristóteles faz o primeiro - a idéia - imanente no segundo - a
matéria, depois de ter eficazmente criticado o dualismo
platônico, que fazia os dois elementos transcendentes e
exteriores um ao outro.
43. IV. Da relação entre a potência e o ato, entre a matéria e a forma, surge
o movimento, a mudança, o vir-a-ser, a que é submetido tudo que tem
matéria, potência.
A mudança é, portanto, a realização do possível. Esta realização do
possível, porém, pode ser levada a efeito unicamente por um ser que já
está em ato, que possui já o que a coisa movida deve vir-a-ser, visto ser
impossível que o menos produza o mais, o imperfeito o perfeito, a
potência o ato, mas vice-versa.
Mesmo que um ser se mova a si mesmo, aquilo que move deve ser
diverso daquilo que é movido, deve ser composto de um motor e de
uma coisa movida. Por exemplo, a alma é que move o corpo.
O motor pode ser unicamente ato, forma; a coisa movida - enquanto tal -
pode ser unicamente potência, matéria. Eis a grande doutrina
aristotélica do motor e da coisa movida, doutrina que culmina no motor
primeiro, absolutamente imóvel, ato puro, isto é, Deus.
44. A Psicologia
Objeto geral da psicologia aristotélica é o mundo animado, isto é,
vivente, que tem por princípio a alma e se distingue essencialmente do
mundo inorgânico, pois, o ser vivo diversamente do ser inorgânico
possui internamente o princípio da sua atividade, que é precisamente a
alma, forma do corpo.
A característica essencial e diferencial da vida e da planta, que tem por
princípio a alma vegetativa, é a nutrição e a reprodução. A característica
da vida animal, que tem por princípio a alma sensitiva, é precisamente a
sensibilidade e a locomoção. Enfim, a característica da vida do homem,
que tem por princípio a alma racional, é o pensamento.
Todas estas três almas são objeto da psicologia aristotélica. Aqui nos
limitamos à psicologia racional, que tem por objeto específico o
homem, visto que a alma racional cumpre no homem também as
funções da vida sensitiva e vegetativa; e, em geral, o princípio superior
cumpre as funções do princípio inferior.
45. Segundo Aristóteles diversamente de Platão todo ser vivo tem
uma só alma, ainda que haja nele funções diversas faculdades
diversas porquanto se dão atos diversos. E assim, conforme
Aristóteles, diversamente de Platão, o corpo humano não é
obstáculo, mas instrumento da alma racional, que é a forma do
corpo.
O homem é uma unidade substancial de alma e de corpo, em que
a primeira cumpre as funções de forma em relação à matéria,
que é constituída pelo segundo. O que caracteriza a alma
humana é a racionalidade, a inteligência, o pensamento, pelo
que ela é espírito. Mas a alma humana desempenha também as
funções da alma sensitiva e vegetativa, sendo superior a estas.
Assim, a alma humana, sendo embora uma e única, tem várias
faculdades, funções, porquanto se manifesta efetivamente com
atos diversos. As faculdades fundamentais do espírito humano
são duas: Teorética (Pensamentos) e prática, cognoscitiva e
operativa, contemplativa e ativa.
46.
Cada uma destas, pois, se desdobra em dois graus, sensitivo e
intelectivo, se se tiver presente que o homem é um animal
racional, quer dizer, não é um espírito puro, mas um espírito que
anima um corpo animal. O conhecimento sensível, a sensação,
pressupões um fato físico, a saber, a ação do objeto sensível
sobre o órgão que sente, imediata ou à distância, através do
movimento de um meio. Mas o fato físico transforma-se num fato
psíquico, isto é, na sensação propriamente dita, em virtude da
específica faculdade e atividade sensitivas da alma. O sentido
recebe as qualidades materiais sem a matéria delas, como a cera
recebe a impressão do selo sem a sua matéria. A sensação
embora limitada é objetiva, sempre verdadeira com respeito ao
próprio objeto; a falsidade, ou a possibilidade da falsidade,
começa com a síntese, com o juízo. O sensível próprio é
percebido por um só sentido, isto é, as sensações específicas
são percebidas, respectivamente, pelos vários sentidos; o
sensível comum, as qualidades gerais das coisas tamanho,
figura, repouso, movimento, etc. são percebidas por mais
sentidos.
47.
O senso comum é uma faculdade interna, tendo a função de coordenar,
unificar as várias sensações isoladas, que a ele confluem, e se tornam,
por isso, representações, percepções. Acima do conhecimento sensível
está o conhecimento inteligível, especificamente diverso do primeiro.
Aristóteles aceita a essencial distinção platônica entre sensação e
pensamento, ainda que rejeite o inatismo platônico, contrapondo-lhe a
concepção do intelecto como tabula rasa, sem idéias inatas. Objeto do
sentido é o particular, o contingente, o mutável, o material. Objeto do
intelecto é o universal, o necessário, o imutável, o imaterial, as
essências, as formas das coisas e os princípios primeiros do ser, o ser
absoluto. Por conseqüência, a alma humana, conhecendo o imaterial,
deve ser espiritual e, quanto a tal, deve ser imperecível. Analogamente
às atividades Teorética, duas são as atividades práticas da alma: apetite
e vontade. O apetite é a tendência guiada pelo conhecimento sensível, e
é próprio da alma animal. Esse apetite é concebido precisamente como
sendo um movimento finalista, dependente do sentimento, que, por sua
vez depende do conhecimento sensível. A vontade é o impulso, o
apetite guiado pela razão, e é própria da alma racional. Como se vê,
segundo Aristóteles, a atividade fundamental da alma é Teorética,
cognoscitiva, e dessa depende a prática, ativa, no grau sensível bem
como no grau inteligível.
49. Biologia:
Recusando a separação das idéias da natureza, como fazia Platão, Aristóteles,
apontou como tarefa para o investigador a de descobrir e classificar as formas
do mundo material. Os últimos 12 anos da sua vida foram preenchidos com esta
tarefa. Partindo de uma observação sistemática dos seres vivos, e não
desdenhando estudar vermes ou insetos, registrou perto de 500 classes
diferentes de animais, dos quais dissecou aproximadamente 50 tipos. Foi o
primeiro que dividiu o mundo animal entre vertebrados e invertebrados; sabia
que a baleia não era um peixe e que o morcego não era um pássaro, mas que
ambos eram mamíferos.
Política:
Sua primeira preocupação foi a elaborar uma listagem tão completa quanto
possível sobre os diferentes modelos políticos que existiam no seu tempo.
Enumerou um total de 158 constituições de cidades ou países diferentes.
Partindo da sua diversidade procurou depois as suas semelhanças e diferenças,
pondo em evidência o que constituía a natureza de cada regime. Evitou, quanto
pode, mostrar as suas preferências por um ou outro regime político.
50. Física:
A física era a chave da natureza das coisas, não apenas da forma como
se comportavam no presente, mas também no que potencialmente
viriam a transformar-se. Quanto à constituição das coisas defendia a
teoria dos quatro elementos: água, terra, fogo e ar.
Os corpos celestes, com exceção da terra, eram constituídos por um
quinto elemento puro e incorruptível. O universo é concebido de forma
hierarquizada, tendo no centro a terra, girando à sua volta todos os
corpos celestes. Aristóteles explicou que as fases da Lua dependem de
quanto da parte da face da Lua iluminada pelo Sol está voltada para a
Terra. Explicou, também, os eclipses: um eclipse do Sol ocorre quando
a Lua passa entre a Terra e o Sol; um eclipse da Lua ocorre quando a
Lua entra na sombra da Terra. Aristóteles argumentou a favor da
esfericidade da Terra, já que a sombra da Terra na Lua durante um
eclipse lunar é sempre arredondada.
Afirmava que o Universo é esférico e finito. Aperfeiçoou a teoria das
esferas concêntricas de Eudoxus de Cnidus (408-355 a.C.), propondo eu
seu livro De Caelo, que "o Universo é finito e esférico, ou não terá
centro e não pode se mover."
51. O espaço e tempo foi alvo de investigações profundas, sendo definido
como o limite do corpo, isto é, o limite imóvel do corpo "circundante"
com respeito ao corpo circundado. O tempo é definido como sendo o
número - isto é, a medida - do movimento segundo a razão, o aspecto,
do "antes" e do "depois". Admitidas as precedentes concepções de
espaço e de tempo - como sendo relações de substâncias, de
fenômenos - é evidente que fora do mundo não há espaço nem tempo:
espaço e tempo vazios são impensáveis.
Uma terceira questão fundamental da filosofia natural de Aristóteles é
relativa ao teleologismo - finalismo - por ele propugnado com base na
finalidade, que ele descortina em a natureza. "A natureza faz, enquanto
possível, sempre o que é mais belo". Fim de todo devir é o
desenvolvimento da potência ao ato, a realização da forma na matéria.
Quanto às ciências químicas, físicas e especialmente astronômicas, as
doutrinas aristotélicas têm apenas um valor histórico, e são
logicamente separáveis da sua filosofia, que tem um valor teorética.
Especialmente célebre é a sua doutrina astronômica geocêntrica, que
prestará a estrutura física à Divina Comédia de Dante Alighieri.
52. Juízo sobre Aristóteles
É difícil aquilatar em sua justa medida o valor de Aristóteles. A
influência intelectual por ele até hoje exercida sobre o pensamento
humano não se pode comparar a de nenhum outro pensador tal é a
envergadura de seu gênio excepcional.
Criador da lógica, autor do primeiro tratado de psicologia científica,
primeiro escritor da história da filosofia, patriarca das ciências naturais,
metafísico, moralista, político, ele é o verdadeiro fundador da ciência
moderna e "ainda hoje está presente com sua linguagem científica não
somente às nossas cogitações, senão também à expressão dos
sentimentos e das idéias na vida comum e habitual".
Nem por isso podemos deixar de apontar as lacunas do seu sistema.
Sua moral, sem obrigação nem sanção, é defeituosa e mais gravemente
defeituosa ainda que a teodicéia, sobretudo na parte que trata das
relações de Deus com o mundo. O dualismo primitivo e irredutível entre
Deus, ato puro, e a matéria, princípio potencial, é, na própria teoria
aristotélica.
53.
Com Sócrates entra a filosofia em seu caminho definitivo. O
problema do objeto e da possibilidade da ciência é posto em
seus verdadeiros termos e resolvido, nas suas linhas gerais,
pela doutrina do conceito. Platão dá um passo além, procurando
determinar a relação entre o conceito e a realidade, mas encalha,
de um lado, nas dificuldades insolúveis de um realismo
exagerado; de outro, nas extravagâncias de um idealismo
extremo.
Aristóteles, com o seu espírito positivo e observador, retoma o
mesmo problema no pé em que o pusera Platão e dá, pela teoria
da abstração e da inteligência ativa, uma solução satisfatória e
definitiva nas grandes questões. Em torno desta questão com
relação à metafísica, psicologia e lógica, vi se desenvolvendo
harmoniosamente as outras partes da filosofia até constituírem
em Aristóteles esta grandiosa síntese do saber universal, o mais
precioso legado da civilização grega que declinava diante da
civilização ocidental que surgia.
54.
Alexandre, o Grande, prossegue a campanha da Ásia cometendo
excessos que o filósofo criador da teoria do justo meio, o que se situa
entre o defeito e o excesso, enfim, o bom senso, desaprovou e não
perdoa a morte de Clístenes, o sobrinho querido que se recusara a
aceitar Alexandre como um deus. Mas em 323 a.C. Alexandre morre de
febres e a unidade Macedônia-Grécia, se desmonta e em Atenas surgem
os desejos de independência, estourando uma reação nacional,
chefiada por Demóstenes. Aristóteles era malvisto pelos atenienses, por
causa do apoio macedônio. O governador de Atenas foi Antipater,
indicado por Alexandre e velho amigo de Aristóteles. É imperioso
expulsar tudo e todos os que tenham ligação com os macedônios. Tudo
que recorde o domínio de Alexandre, deve ser banido. É preciso
encontrar um expediente para proscrever Aristóteles. Recorda-se
Sócrates: o melhor é uma acusação de impiedade. Vasculha-se o
passado para encontrar o "crime", algo que ponha em causa os valores
da liberdade e da independência, como, por exemplo, adorar um homem
como se fosse um deus. Um hino, um péan que Aristóteles escrevera
dedicado a um tirano, Hermias como louvor, tornando herói um ex-
escravo, depravado, eunuco, bárbaro, estrangeiro, déspota, serve de
pretexto. Prudente, reconhece que não pode esperar a decisão do
tribunal.e prevendo a condenação à morte pelo Areópago, refugia-se
voluntariamente em Cálcis, na Eubéia (Eugéia).
55. Com os manuscritos, a esposa Hérpilis, os filhos Pítia e
Nicômaco parte para o último exílio. Aos 61 anos. Dirá,
pensando em Sócrates: "não quero que os Atenienses cometam
um novo assassínio contra a filosofia".
Féstias, a mãe, era de Cálcis, a principal cidade da ilha Eubéia, a
norte de Atenas. Aristóteles e a sua troupe atravessam o estreito
de Euripo que separa a ilha da Ática. Instala-se na casa que fora
de sua mãe, uma propriedade de dimensão razoável. Regressar
a Estagira seria cortar definitivamente com Atenas. A direção do
Liceu, após a sua saída foi confiada ao seu discípulo Teofrasto.
Na casa da mãe, Aristóteles está doente. Há muito que sofre do
estômago, provavelmente da bílis, do fígado. O corpo que
sempre preservara, cuidadosamente, abandona-o. A casa da
mãe é o regresso ao útero. Em Atenas humilham-no, vexam-no,
retiram-lhe as honras, degradam-no.
Quando Antipater desbarata as forças gregas e retoma o poder
em Atenas, Aristóteles já não tem forças para regressar. Terá de
deixar-se a si mesmo e entrar na morte no verão de 322, aos 62
anos.
57.
Obras de Aristóteles
q Livros de lógica ("organon" ou instrumento): Categorias;
Sobre a Interpretação; Primeiros Analíticos ( 2 livros),; Segundo
Analíticos (2 Livros); Tópicos (8 livros); Refutações Sofísticas.
q Livros de física e a concepção do universo: Física (8 livros);
Sobre o Céu (2 livros); Sobre a Geração e a Corrupção (2 livros);
Meteorológicos (4 livros).
q Livros de psicologia: Acerca da Alma (3 livros); "Parva
Naturalia" (4 tratados), incluindo os seguintes livros: Acerca da
da percepção dos sentidos; Acerca da memória e reminiscência;
acerca do sono; acerca dos sonhos;
Livros de biologia: História dos Animais (10 livros, com partes
de autoria duvidosa); Acerca das partes dos animais (4 livros);
acerca do movimento dos animais; acerca da marcha dos
animais; acerca da geração dos animais (5 livros).
58. Livros de metafísica: Foi Andronico que atribuiu a estes livros
(14) a denominação de Metafísica (literalmente "depois da física),
por os mesmo se seguirem aos seus apontamentos que
tratavam da física.
Livros de ética: Ética a Nicômaco (organizada por Nicômaco,
filho de Aristóteles); Ética a Eudemo (7 livros, organizados por
Eudemo, discípulo de Aristóteles); a Grande Moral ( 2 livros, com
fragmentos das éticas anteriores e de autoria duvidosa):
Livros de Política: Política (8 livros); Constituição de Atenas.
Livros sobre a linguagem e a estética: Retórica e Poética.
Lógica: o primeiro sistema lógico, que permitiu estabelecer um
conjunto de princípios e regras formais por meio das quais se
tornou possível distinguir as conclusões falsas das exatas. Na
Idade Média os seus escritos sobre lógica foram os manuais
mais importantes usados nas universidades, sobretudo na forma
que lhes deu o filósofo português Pedro Hispano ( Papa João
XXI).