O documento discute a bibliologia e a teontologia. Trata da definição e métodos de estudo da teologia, dividindo-a em diferentes áreas como antropologia, soteriologia e pneumatologia. Também aborda as seções da Bíblia e a inspiração divina das Escrituras, definindo-a como o registro fiel daquilo que saiu da boca de Deus, uma vez que cada palavra foi "soprada" por Ele por meio do Espírito Santo.
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Teologia I (Bibliologia e Teontologia)
1. Teologia Sistemática I
Teologia Sistemática I
Bibliologia e Teontologia
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Só a Escritura, Só Cristo, Só a Graça, Só a Fé, Só a Deus Glória
2. Teologia Sistemática I
I. A CIÊNCIA TEOLOGICA
1.1 Conceitos
a. Conceito Etimológico
O vocábulo teologia vem dois outros do língua grega, a saber: θεος (teos = Deus) + λογος
(logos = palavra, discurso). Sendo assim, etimologicamente, teologia é um discurso a respeito de Deus.
Orfeu e Homero foram chamados de teólogos entre os gregos, porque seus poemas tratavam
da natureza dos deuses. Aristóteles classificou as ciências sob os títulos de física (aquela que se ocupa com
a natureza), matemática (aquela que se ocupa com os números e da quantidade) e teologia (aquela que se
ocupa de Deus).
Os pais da igreja se referiam ao apóstolo João como “o teólogo”, porque em seu evangelho e
epístolas a divindade de Cristo se tornou proeminente.
b. Conceito Técnico
A definição de teologia mais comum, especialmente em nossos dias, é de que ela é a ciência
da religião. Contudo, a palavra religião é ambígua. Sua etimologia é duvidosa. Cícero faz referência a ela
como relegere, revisar novamente, considerar. “Religio” é então consideração, observação devota ,
especialmente do que pertence ao culto e serviço devidos a Deus.
Agostinho e Lactânio derivam a palavra de religare, religar. De acordo isso, religio é a base de
obrigação. É aquilo que nos liga a Deus. Subjetivamente, é a necessidade interior de união com Deus.
Esta diversidade de conceitos quanto ao que significa religião basta para provar quão
completamente vaga e insatisfatória precisa ser a definição de teologia como “a ciência da religião”. Além
disso, essa definição faz a teologia inteiramente independente da Bíblia. Pois como a filosofia moral é a
análise de nossa natureza moral, assim a teologia se torna a análise de nossa consciência religiosa,
justamente com as verdades que essa análise desenvolve. E mesmo a teologia cristã só é análise da
consciência religiosa do cristão.
Temos, pois, que restringir a teologia à sua real esfera, como a ciência dos fatos da revelação
divina até onde esses fatos dizem respeito à natureza de Deus e à nossa relação com Ele, como suas criaturas, como
pecadores e como sujeitos da redenção.
1.2 Métodos de Estudo da Teologia
Toda ciência tem seu próprio método, determinado por sua natureza peculiar. Este métodos
são os princípios que devem controlar as investigações científicas. Se uma pessoa adota um falso método,
ela é semelhante a alguém que toma uma estrada errada que jamais a levará a seu destino. Os dois grandes
métodos abrangentes são o a priori [que parte, em sua argumentação, da causa para o efeito] e o a posteriori
[que argumenta a partir do efeito para a causa].
Os métodos que se têm aplicado ao estudo da teologia podem ser reduzidos basicamente a
três categorias: a Especulativa, a Mística e a Indutiva.
a. Método Especulativo: Nesse método a especulação decide sobre toda a verdade, ou determina o
que é verdadeiro a partir das leis da mente, ou dos axiomas envolvidos na
constituição do princípio imaginativo dentro de nós. Neste método espera-se
que o homem creia não na autoridade de Deus, mas na autoridade da razão.
Toda a verdade precisa ser descoberta e estabelecida por um processo do
pensamento. Caso se admita que a Bíblia contém alguma verdade, que seja
só até o ponto em que ela coincide com os ensinos da filosofia.
b. Método Místico: Enquanto o processo especulativo busca inteiramente na razão a base de toda sua
investigação, argumentação e conclusões, o método místico, em direção
diametralmente oposta, entende que devemos entender a Deus e os fatos a Ele
atribuídos partindo dos sentimentos. Neste método presume-se que Deus, por sua
comunicação imediata com a alma, se revela através das emoções e por meio ou
na forma de intuições da divina verdade, independente do ensino externo de Sua
Palavra; e é essa luz interior, e não as Escrituras, que devemos seguir; ou, através
da consciência e sentimentos religiosos, onde, quando mais profundos e mais puros
forem estes, mais clara é a percepção da verdade.
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Só a Escritura, Só Cristo, Só a Graça, Só a Fé, Só a Deus Glória
3. Teologia Sistemática I
c. Método Indutivo Bíblico: segundo esse método, para chegarmos ao verdadeiro conhecimento de
Deus, é essencial que venhamos a aplicar o método de indução como
aplicado às ciências naturais, ou seja:
c.1 Assim como o cientista se aproxima do estudo da natureza com determinados pressupostos, o
teólogo, semelhantemente, deve iniciar seus estudo teológicos com o mesmo princípio, como por
exemplo: Deus existe e Ele se manifestou em Sua Palavra.
c.2 Como o estudante da natureza passa a perceber, reunir e a combinar os fatos, da mesma forma
o teólogo deve se propor a os elementos da revelação divina.
c.3 Da mesma forma como o cientista, partindo dos fatos (a posteriori), averiguados e classificados,
deduz as leis pelas quais estes são determinados, o teólogo da mesma forma deve ser capaz de
perceber as leis que regem os fatos da revelação divina por este mesmo processo de
averiguação e classificação. Essa leis ou princípios gerais não derivam da mente e são atribuídos aos
objetos externos, mas derivam e deduzem-se dos objetos e são impressos na mente.
Estes passos, portanto, devem ser aplicados à revelação divina. A Bíblia é para o teólogo o
que a natureza é para o cientista. Ela é seu depósito de fatos; e o seu método de averiguar o que a Bíblia
ensina é o mesmos que o filósofo natural adota para averiguar o que a natureza ensina. Ele se aproxima de
sua tarefa com todos os pressupostos acima mencionados.
1.3 Áreas da Teologia
Como ciência, no que concerne aos fatos da natureza, tem suas diversas áreas, como a
matemática, a química,a astronomia etc., assim a teologia, tendo os fatos da Escritura por seu tema, tem suas
áreas distinta e naturais, são elas:
a. A Teologia Propriamente Dita: Inclui todo o ensino referente ao ser e os atributos de Deus; a tríplice
personalidade da Deidade; a relação de Deus com o mundo, ou os
decretos e suas obras da criação e da providência.
b. A Antropologia: Inclui a origem e a natureza do homem; seu estado original e prova; sua queda; a
natureza do pecado; o efeito do primeiro pecado de Adão sobre si e sobre sua
posteridade.
c. A Soteriologia: Inclui o propósito ou plano de Deus em referência a salvação do homem; a pessoa e
obra do redentor; a aplicação da redenção de Cristo ao povo de Deus, sua
regeneração, justificação e santificação; e os meios de graça.
d. A Escatologia: O estudo das doutrinas que dizem respeito ao estado da alma após a morte; a
ressurreição; o segundo advento de Cristo; o juízo geral o fim do mundo;o céu e o
inferno.
e. A Eclesiologia: inclui a idéia, ou natureza da igreja; seus atributos; suas prerrogativas e sua
organização.
Além desta classificação podemos nomear algumas outras que as vezes são tidas como sub
tópicos da classificação supracitada, são elas.
f. Bibliologia: Estuda a Bíblia como palavra de Deus; a revelação; a inspiração, o processo de
canonicidade etc.
g. Hamartologia: Estuda a natureza do pecado; sua extensão na vida dos homens etc.
h. Cristologia: Faz referência a pessoa de Cristo, sua encarnação; seus atributos como ser divino,
estados de exaltação e humilhação etc.
i. Pneumatologia: diz respeito a pessoa do Espírito santo como terceira pessoa da Trindade; sua
personalidade; seu ministério; seus dons concedidos aos homens, atributos divinos
etc.
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4. Teologia Sistemática I
II. A BIBLIOLOGIA
2.1 Conceito
É a parte da teologia que estuda a Bíblia como Palavra de Deus; suas divisões, conceitos
como revelação, inspiração e iluminação; o processo e provas da inspiração das Escrituras Sagradas e o
processo de canonicidade.
2.2 As Seções da Bíblia
A Bíblia divide-se comumente em oito seções, quatro no Velho Testamento e quatro no Novo
Testamento.
A divisão do V.T. em quatro seções baseia-se na tradução das Escrituras Sagradas para o
grego. Essa tradução, conhecida como Versão dos Setenta ou Septuaginta (LXX), segundo muitos
estudiosos, iniciou-se no século III a.C. em Alexandria, no Egito, um dos grandes centros da grega, onde
residiam muitos judeus da Diáspora.
A Bíblia hebraica não segue essa divisão tópica em quatro partes. Antes, emprega uma
divisão em três partes. Os cinco primeiros livros de Moisés , que outorgou a Lei, aparecem em primeiro lugar;
seguem-se os livros dos homens que desempenharam a função profética, e, por fim, a terceira parte contém
livros escritos por homens que, segundo se cria, tinham o dom de profecia, sem serem profetas oficiais.
O N.T. faz uma possível alusão a uma divisão em três partes do Velho Testamento no texto de
Lc 24:44.
A Vulgata Latina, de Jerônimo, e as Bíblias posteriores a ela seguiram o formato mais tópico
das quatro partes em que se dividia a Septuaginta. Se combinarmos essa divisão com as outras partes do
N.T. veremos que a revelação bíblica centraliza-se na pessoa de Cristo.
LIVROS DO ANTIGO TESTAMENTO (LXX) LIVROS DO VELHO TESTAMENTO (TM)
A Lei (Pentateuco) Poesia A Lei (Tora) Os Profetas (Nebhiin)
Gênesis Jo Gênesis Profetas Anteriores Profetas Posteriores
Êxodo Salmos Êxodo Josué Isaías
Levitico Proverbios Levítico Juízes Jeremias
Números Eclesiastes Números Samuel Ezequiel
Deuteronômio Cantares Deuteronômio Reis Os doze
História Profetas Os Escritos (Kethubhim)
Profetas Maiores Profetas Menores Livros Poéticos Cinco Rolos Livros Históricos
Josué, Juizes Isaías Oséias, Joel, Amós, Salmos Cantares Daniel
Rue, I Samuel Jeremias Obadias,Jonas, Miquéias, Provérbios Rute Esdras - Neemias
II Samuel, I reis Lamentações Naum, Habacuque, Jó Lamentações Crônicas
II reis, I crônicas Ezequiel Sofonias, Ageu Ester
II crônicas, Esdras Daniel Zacarias, Malaquias Eclesiastes
Neemias, Ester
Lei Fundamento da chegada de Cristo
VELHO História Preparação para a chegada de Cristo
TESTAMENTO Poesia Anelo pela chegada de Cristo
Profecia Certeza da Chegada de Cristo
Evangelhos Manifestação de Cristo
NOVO Atos Propagação de Cristo
TESTAMENTO Epístolas Interpretação e aplicação de Cristo
Apocalipse Consumação em Cristo
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5. Teologia Sistemática I
2.3 A Inspiração da Bíblia
A característica mais importante da Bíblia não é sua estrutura e sua forma, mas o fato de ter
sido inspirada por Deus. E quando falamos de inspiração, não nos referimos a uma inspiração poética, mas
de autoridade divina.
2.3.1 Definição Etimológica de Inspiração
Embora a palavra inspiração seja usada apenas uma vez no Novo testamento (II Tm 3:16) e
outra no Velho Testamento (Jó 32:8), o processo pelo qual Deus transmite sua mensagem autorizada ao
homem é apresentada de muitas maneiras.
Assim escreveu Paulo a Timóteo:
“Toda Escritura é divinamente inspirada [θεοπνευστος] e proveitosa para
ensinar...”(II Tm 3:16).
O vocábulo grego θεοπνευστος traduzido como “divinamente inspirado” vem de dois outros
vocábulos, a saber: θεος (Deus) + πνηυµα (vento, sopro, espírito), dando-nos, assim, o entendimento que a
Bíblia é o registro fiel daquilo que saiu da boca de Deus, uma vez que cada palavra foi “soprada” por Ele.
Confirmando este conceito podemos citar os seguintes textos bíblicos: I Co 2:13; II Pe 1:21; Hb
1:1; I Pe 1:11. E fazendo uma combinação das passagens, descobrimos que a Bíblia é inspirada no seguinte
sentido: Homens, movidos pelo Espírito santo, escreveram palavras sopradas por Deus, as quais são fonte
de autoridade para a fé e para a prática cristã.
2.3.2 Definição Teológica da Inspiração
Num sentido mais amplo, a inspiração inclui o processo total pelo qual alguns homens movidos
pelo Espírito Santo, anunciaram e escreveram palavras emanadas da boca de Deus; e, por isso mesmo,
palavras dotadas de autoridade divina. Esse processo total de inspiração contém três elementos essenciais, a
saber:
a. Causalidade Divina: Deus é a causa e a fonte primordial da inspiração da Bíblia. O elemento
divino estimulou o elemento humano, revelou-lhe certas verdades da fé, e esses homens de
Deus as registraram.
b. Mediação Profética: Os profetas escreveram segundo a intenção total do coração, segundo a
consciência que os movia no exercício normal de sua tarefa, com seus estilos literários e seus
vocabulários individuais. As personalidades dos profetas não foram violentadas; Deus utilizou
personalidades humanas para comunicar proposições divinas.
c. Autoridade Escrita: A Escritura “é divinamente inspirada e proveitosa para ensinar, para
repreender, para corrigir, para instruir em justiça”. A Bíblia é a última palavra no que concerne a
assuntos doutrinários e éticos. Todas as controvérsias teológicas e morais devem ser trazidas ao
tribunal da Palavra Escrita de Deus, pois ela recebeu sua autoridade do próprio Deus.
2.3.3 Distinções Importantes
2.3.3.1 A Inspiração em Contraste com a Revelação e a Iluminação
No processo de inspiração devemos diferenciar alguns conceitos afim de que tenhamos uma
visão exata do que seja realmente a inspiração.
a. Revelação: ato pelo qual Deus se manifestou ao homem e deu a este o conhecimento de
qual era a sua vontade (sonhos, visões, profecias, teofanias, etc).
b. Inspiração: Ato pelo qual o Espírito Santo capacitou santos homens de Deus a escreverem
fielmente tudo quanto Deus quis que fosse registrado de suas revelações.
c. Iluminação: Ato pelo qual o espírito santo capacita os homens a compreenderem a
verdade de Deus nas Sagradas Escrituras.
2.3.3.2 A Inspiração dos Originais, não das Cópias
Só os manuscritos originais, conhecidos como autógrafos, foram inspirados por Deus.
Portanto, uma cópia ou tradução só é autorizada à medida que reproduz com exatidão os autógrafos.
De uma perspectiva técnica, só os autógrafos são inspirados; todavia, para fins práticos, a
Bíblia nas línguas de nossa época, por ser transmissão exata dos originais, é a Palavra de Deus inspirada.
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2.3.3.3 Inspiração do Ensino, mas não de todo o seu conteúdo
Só o que a Bíblia ensina foi inspirado por Deus e não apresenta erro; nem tudo que está na
Bíblia ficou isento de erro. Por exemplo, as Escrituras contém relatos de muitos atos maus, pecaminosos,
mas de modo algum a Bíblia os elogia, tampouco os recomenda. Ao contrário, condenas essas práticas
malignas. Exemplo disto é a narrativa que a Bíblia faz de algumas mentiras de Satanás (Gn 3:4). Neste
contexto, a única coisa que a inspiração divina garante aqui é que se trata de um registro verdadeiro de uma
mentira satânica.
2.3.4 A Natureza da Inspiração
Durante a história da igreja podemos perceber basicamente três conceitos diferentes atribuídas
a Bíblia em sua relação com a doutrina da inspiração e sua extenção. Vejamos cada uma delas.
a. A Ortodoxia: Pensamento teológico compreendido entre o I século até o século XVIII da era
cristã. Para a ortodoxia a Bíblia é a palavra de Deus. Em todas as suas partes e palavras ela o
registro fiel da revelação divina.
b. O Modernismo: Corrente teológica do século XIX que afirma que a Bíblia contém a palavra de
Deus; e, por este prisma, assevera que certas partes dela são divinas, expressão a verdade, mas
outras são obviamente humanas e apresentam erros.
c. A Neo-Ordodoxia: Corrente teológica do século XX. No início deste século a reviravolta nos
acontecimentos mundiais e a influência do pai dinamarquês do existencialismo, SØrem
Kierkeggard, deram origem a uma nova reforma na teologia européia. Muitos estudiosos
começaram a voltar-se de novo para as Escrituras, a fim de ouvir nelas a voz de Deus. Criando,
assim, um novo tipo de ortodoxia, afirmavam que Deus fala aos homens mediante a Bíblia; as
Escrituras tornam-se a Palavra de Deus num encontro pessoal entre Deus e o homem.
Embora, hoje, tanto o modernismo como a neo-ortodoxia sejam cor]rentes fortes no mundo
acadêmico da teologia, necessário se faz que venhamos a confirmar aquela posição que sempre foi a norma
fiel da igreja cristã por séculos. Isto porque a própria Bíblia, em detrimento aos conceitos dos teóricos
secularizados, nos fornece um conceito exato sobre o que é a inspiração e qual a sua extensão nos escritos
sagradas. Observemos cuidadosamente estes elementos.
a. A Inspiração é Verbal: é verbal no sentido em que todas as palavras contidas no Livro Sagrado
são exatamente aquelas que o Espírito Santo queria que estivessem lá. Esta verdade facilmente
se comprova nos textos bíblicos. Em II Tm 3:16 temos “toda a Escritura [γραφη] é inspirada por
Deus”; em Ex 24:4 “Moisés escreveu todas as palavras do Senhor”; em II Sm 23:2 “o Espírito do
Senhor fala por mim e a sua palavra está na minha boca, etc. No Novo Testamento Jesus usa
repetidamente a expressão “está escrito” (Mt 4:4,7; Lc 24:27,44); o apóstolo Paulo testemunhou
“... falamos, não como palavras de sabedoria humana, mas como as que o Espírito Santo
ensina...” (I Co 2:13) e João nos adverte quanto a não “tirar quaisquer palavras do livro desta
profecia” (Ap 22:19); Jesus declarou que não só as palavras,. Mas até mesmos os pequenos
sinais diacríticos de uma palavra hebraica vieram de Deus. Diante destes fatos, fica bem claro
que a Bíblia reivindica para si mesma toda a autoridade verbal ou escrita. Diz a Bíblia que suas
palavras vieram da parte de Deus.
b. A Inspiração é Plenária: A Bíblia reivindica a inspiração divina de todas as suas partes. É a
inspiração plena, total, absoluta. “Toda [πασα] Escritura é divinamente inspirada...” (II Tm 3:16)
Nenhuma parte das Escrituras deixou de receber total autoridade doutrinária. Jesus e todos os
autores do Novo Testamento exemplificam sua crença firme na inspiração integral e completa
do Antigo Testamento, citando trechos de todas as escrituras que eram para eles autoridade, até
mesmo o que apresentam ensinos fortemente polêmicos como a criação de Adão e Eva, a
destruição do mundo pelo dilúvio, o milagre de Jonas, etc.
c. A Inspiração Atribui Autoridade: uma vez que em todas as suas palavras, conceitos e partes a
Bíblia é a inspirada e perfeita revelação de Deus, segue-se disto, portanto, que ela também é
autoritativa, única regra de fé e prática. Disse Jesus “...a Escritura não pode ser anulada...” (Jo
10:35). Em numerosas ocasiões Jesus recorreu à palavra de Deus escrita, que ele considerava
árbitro definitivo em questões de fé e de prática, para purificar o templo (Mc 11:17), pôr em
cheque a tradição dos fariseus (Mt 15:3,4), resolver divergências doutrinárias (Mt 22:29) e
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7. Teologia Sistemática I
defender-se contra as tentações de Satanás (Mt 4:4,7,10). Por fim, o próprio Cristo disse que “é
mais fácil passar o céu e a terra do que cair um til sequer da lei” (Lc 16:17). Esta sua autoridade
é, também, decorrente de sua suficiência, ou seja, do fato de que tudo quanto necessitamos
para sermos salvos, conhecermos a Deus e servi-lo está claramente exposto nos seus escritos.
A idéia de que a Bíblia para ser a palavra de Deus tem que ser exaustiva em seu conteúdo, ou
seja, falar de todos os assuntos e de forma pormenorizada, é fruto de uma compreensão errada
sobre a inspiração da Bíblia e o propósito de Deus ao nos concedê-la, isto porque a inspiração
significa fidelidade na escrituração da revelação e o propósito de Deus ao nos conceder uma
revelação escrita foi o de nos mostrar o caminho da salvação e não falar de ciências, biologia,
filosofia ou outros assuntos.
2.3.5 Evidências da Inspiração da Bíblia
a. A Reivindicação da Inspiração do V.T.
a.1 O V.T. afirma ser um documento com mensagem profética. A expressões “assim diz o Senhor”
é muito comum nos escritos proféticos ( sandfkjdkfksjdnfkjasdkjfkjsdfksdnkfksd) .
a.2 As profecias escritas pelos profetas reconhecidamente inspirados eram preservados em
lugar especial, sagrado. Essa coleção foi reconhecida e muito citada como Palavra de Deus
(shghkjhksahdkfashkhsdsdasd).
a.3 Os outros textos, igualmente inspirados, eram postos juntos com os que já existiam em lugar
sagrado (kbkajsbkfasdbkakskçasdnbçkgja).
a.4 Jesus e os autores do N.T. tinham esses escritos na mais alta conta, para eles não podiam
ser revogados (çknbkdfgçkdfçgnçlkdfgçkdfshgpuiodfhklgnsdflk).
a.5 O escritores do N.T. fizeram numerosa referência aos escritos do V.T. tomando-os como
inspirados e autoritativos (,mlsngnasdfçgnçkldafngçksdnfçkgnsdf).
b. A Reivindicação da Inspiração do N.T.
b.1 Os escritores neotestamentários igualam seus escritos aos escritos do V.T. (II Pe 3:15,16).
b.2 Assim como Paulo chama o V.T de “Escritura” [γραφη] (II Tm 3:16), Pedro nomeia as
epístolas paulinas também de “Escrituras” [γραφας] (II Pe 3:15,16).
b.3 Cada livro do N.T. contém alguma reivindicação de autoridade divina.
b.4 Os cristãos da era apostólica e os que lhes sucederam logo reconheciam a origem divina
dos escritos neotestamentários, ao lado da autoridade divina do V.T.
b.5 Os livros do N.T. foram colecionados, lidos publicamente e posto ao lado do livros inspirados
do V.T.
c. Evidência Interna da Inspiração da Bíblia: É a evidência que brota da Bíblia.
c.1 Evidência da autoridade que se auto-confirma: A Bíblia fala com autoridade própria, cheia
de convicção. As multidões se maravilhavam com Cristo pois ele fala com autoridade (Mc
1:22). A expressão “assim diz o Senhor” ressalta a idéia de que os profetas nada falavam de si
mesmos, e, sim por determinação, orientação e supervisão de Deus”. As palavras das
Escrituras não precisam ser defendidas; precisam apenas ser ouvidas, para que se saiba que
são a Palavra de Deus.
c.2 Evidência do testemunho do Espírito Santo: A Palavra de Deus confirma-se perante os
filhos de Deus através do Espírito Santo. Este é o único que poderosa e eficazmente pode
convencer os pecadores sobre a realidade da inspiração verbal e plenária da Bíblia. Ou seja,
o mesmo Espírito que inspirou a Bíblia é o mesmo que ilumina os corações para que
entendam, creiam e sejam salvos ( ).
c.3 Evidência da capacidade transformadora da Bíblia: Há na Bíblia, Pelo Espírito Santo, a
capacidade de convencer, converte e edificar o pecador para a vida eterna. Os entristecidos
recebem conforto, os pecadores são repreendidos, os negligentes são exortados pelas
Escrituras. A evidência de que Deus atribui sua autoridade à Bíblia está em seu poder
evangelístico e edificador.
c.4 Evidência da unidade da Bíblia: Uma evidência mais formal da inspiração da Bíblia está na
sua unidade. Sendo constituída de 66 livros escritos ao longo de 1500 anos, por cerca de 40
escritores, diversas línguas, com centenas de tópicos, é muito mais que mero acidente que a
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8. Teologia Sistemática I
Bíblia apresente espantosa unidade temática – Jesus Cristo; um problema – o pecado; uma
solução – o salvador Jesus, unificando as páginas da Bíblia, do Gênesis ao Apocalipse.
d. Evidência Externa da Inspiração da Bíblia: É a que surge de fora da Bíblia.
d.1 Evidência Baseada na Historicidade da Bíblia: Grande parte do conteúdo bíblico é história
e, portanto, passível de constatação. Os artefatos arqueológicos, os documentos escritos e
nenhuma descoberta arqueológica invalidou um ensino ou relato bíblico. Grande parte da
antiga crítica à Bíblia foi firmemente refutada pelas descobertas arqueológicas que
demonstraram a existência da escrita no tempo de Moisés, a história e a cronologia dos reis
de Israel e até mesmo a existência dos hititas, povo até pouco só mencionado na Bíblia. A
Descoberta dos rolos do Mar Morto ilustra que existem milhares de manuscritos tanto do V.T.
como do N.T. , o que contrasta com o punhado de originais disponíveis de muitos clássicos
seculares de grande importância. Isto significa que a Bíblia é o livro do mundo antigo mais
bem documentado que existe.
d.2 Evidência do Testemunho de Cristo: Se Jesus possui alguma autoridade ou integridade
como mestre religioso, podemos concluir que a Bíblia é inspirada por Deus. O Senhor Jesus
ensinou que a Bíblia é a Palavra de Deus. Se alguém quiser provar ser esta assertiva falsa,
deverá primeiro rejeitar a autoridade que tinha Jesus de se pronunciar sobre a questão da
inspiração.
d.3 Evidência da Profecia: Até o presente momento nenhuma profecia bíblica ficou sem ser
cumprida, cada uma delas de concretizou literalmente. A época do nascimento de Jesus
Cristo (Dn 9), a cidade em que ele deveria nascer (Mq 5:2) e a natureza de sua concepção e
nascimento (Is 7:14). Outros livros reivindicam inspiração divina, como o Alcorão, todavia,
nenhum desses livros contém predições sobre o futuro. A Bíblia, portanto, tem um forte
argumento a favor de sua autoridade divina: suas profecias sempre se cumprem.
d.4 Evidência da Influência da Bíblia: Nenhum outro livro tem sido tão largamente
disseminado, nem exercido tão forte influência como a Bíblia. Esta já foi traduzida em mais
de mil línguas, abrangendo 90% da população do mundo. Nenhuma obra religiosa ou de
fundo moral do mundo excede a profundidade moral contida no princípio do amor cristão, e
nenhum apresenta conceito espiritual mais majestoso sobre Deus. A Bíblia apresenta ao
homem os mais elevados idéias que já pautaram a civilização.
d.5 Evidência da Manifesta Indestrutibilidade da Bíblia: A despeito de sua tremenda
importância, a Bíblia tem sofrido muito mais ataque perversos do que seria de esperar, em
se tratando de um livro. No entanto a Bíblia tem resistido a todos os ataques. Até mesma a
igreja Católica Romana tentou ocultá-la e até destruiu milhares delas, contudo a palavra de
Deus foi livre dos mosteiros e masmorras e entre pela Reforma Protestante aos homens.
d.6 Evidência Oriunda da Integridade de Seus Escritores: Os escritores bíblicos não eram
meros poetas, historiadores, religiosos,etc., estes homens carregavam com sigo a idéia bem
firmada que eles escreviam da parte de Deus, e, portanto, estavam disposta até morrer pela
defesa da fé que expunham em seus escritos. Embora estarem distanciados até por séculos,
eles sinceramente criam que Deus lhes falava e que era imperioso escrever aos homens a
vontade de Deus.
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9. Teologia Sistemática I
APÊNDICE - I
I. AS VERSÕES DA BÍBLIA E OS LIVROS APÓCRIFOS
a. A Septuaginta (LXX): Foi a tradução do Velho testamento hebraico para o grego em III a.C. na cidade de
Alexandria. Foi nesta tradução que pela primeira vez foram postos os livros
apócrifos ao lado dos livros inspirados.
b. A Antiga Latina: Foi a tradução da Bíblia para o latim antes de 200 d.C, no norte da África. Nesta tradução
fez-se uso da Septuaginta como texto base para se traduzir o V.T. ; com isto os livros
apócrifos continuaram ao lado dos livros inspirados.
c. A Vulgata Latina: Foi a tradução da Bíblia para o latim por volta do ano 382 d.C. Nesta tradução Jerônimo
fez uso do texto hebraico (texto massorético – TM). A controvérsia em torno da tradução
do V.T. por Jerônimo com base no original hebraico reflete não só os conflitos entre
cristãos e judeus, mas a crença mais problemática ainda sustentada por muitos líderes
cristãos, dos quais Agostinho, segundo a qual a LXX era verdadeiramente a Palavra
inspirada, inerrante, da parte de Deus, em vez de uma mera tradução não-inspirada
baseada nos originais hebraicos. Jerônimo considerou que os livros apócrifos não eram
de autoridade sobre a igreja, uma vez que eles não eram inspirados.
No século XVI, a igreja, tendo se afastado das Escrituras sagradas, veio a ficar comprometida
com a devassidão moral, politicagem eclesiástica, paganismo e tantos outros males. A Bíblia foi retirada das
mãos do povo comum e aqueles que tentavam mudar tal situação eram presos e até mortos pela própria
igreja, a mando do papa.
Os desvios doutrinários a cada dia apareciam, e para fins da construção da basílica de são
Pedro, ao monge Tetzel foi dada autoridade para a venda de indulgências que garantiam o perdão dos
pecados passados presentes e futuros a quem comprasse tal documento. Embora tal prática seja absurda até
para os católicos hoje, contudo na época tal prática era sancionada pelo papa e estava de acordo com a
doutrina do purgatório, da missa de sétimo dia e da infabilidade papal, uma vez que o próprio papa havia
reconhecido a existência de um lugar de purificação para aquelas almas que não iam diretamente para o céu.
Tudo de acordo com algumas pouquíssimas passagens dos livros apócrifos.
É, então, neste contexto histórico que surge a Reforma Protestante proclamando “Só a
Escritura” como única regra de fé e prática. Lutando contra as indulgências os reformadores asseveravam
que tal prática não tinha respaldo na Palavra de Deus e que portanto deveria ser rejeitada por todo verdadeiro
cristão. Tendo a igreja católica sofrido grandes baixas de membros em vários países, no Concílio de Trento
declara canônicos os livros apócrifos pelos seguintes motivos:
a. Para confirmar a doutrina do purgatório, missa de sétimo dia e outras afins, que tem sua
base no livro de Macabeus.
b. Para defender a autoridade papal sobre questões doutrinárias.
c. Para não cair em descrédito diante da opinião pública, tendo que se retratar quanto a um
erro de doutrina e prática.
d. Para continuar levantando recurso para a construção da Basílica de São Pedro
e.. Para combater o avanço da Reforma Protestante.
Portanto, a acusação que os protestantes retiraram livros da Bíblia não condiz que os fatos
históricos, uma vez que estes tais, aceitos tardiamente pelos católicos, só foram canonizados por motivos
espúrios e não por serem verdadeiramente inspirados, pois se o fossem como são os livros da Bíblia, estes,
chamados livros apócrifos, já teriam sido reconhecidos como canônicos, uma vez que por mais de um milênio
e meio já se encontravam pertos dos livros universalmente reconhecidos pelo povo de Deus como
inspirados.
Os livros apócrifos, embora não serem tidos como inspirados pelos protestantes, eram,
contudo, reconhecidos como obras históricas e testemunhas daquele período compreendido entre Malaquias
e Mateus. Eram portanto, até lidos, mas nunca usados como textos inspirados e autoritativos para de fazer
doutrina alguma ou se asseverar algo sobre a prática ou crença da igreja cristã.
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Só a Escritura, Só Cristo, Só a Graça, Só a Fé, Só a Deus Glória
10. Teologia Sistemática I
II. A CONFISSÃO DE FÉ DE WESTMISNTER
CAPÍTULO I – DA ESCRITURA SAGRADA
I. Ainda que a luz da natureza e as obras da providência manifestem de tal modo a bondade, a sabedoria
e o poder de Deus, que os homens ficam inescusáveis, todavia não são suficientes para dar aquele
conhecimento de Deus e de sua vontade, necessário à salvação; por isso foi o Senhor servido, em
diversos tempos e diferentes modos, revelar-se e declarar à sua igreja aquela sua vontade; e depois,
para melhor preservação e propagação da verdade, para o mais seguro estabelecimento e conforto da
igreja contra a corrupção da carne e malícia de Satanás e do mundo, foi igualmente servido fazê-la
escrever toda. Isto torna a Escritura Sagrada indispensável, tendo cessado aqueles antigos modos de
Deus revelar a sua vontade ao seu povo.
IV. A autoridade da Escritura Sagrada, razão pela qual deve ser crida e obedecida, não depende do
testemunho de qualquer homem ou igreja, mas somente de Deus (a mesma verdade) que é seu Autor;
tem, portanto, de ser recebida porque é a Palavra de Deus.
V. Pelo Testemunho da Igreja podemos ser movidos e incitados a um alto e reverente apreço pela
Escritura Sagrada; a suprema excelência do seu conteúdo, a eficácia da sua doutrina, a majestade do
seu estilo, a harmonia de todas as suas partes, o escopo do seu todo (que é dar a Deus toda a glória),
a plena revelação que faz do único meio de salvar-se o homem, as suas muitas outras excelências
incomparáveis e completa perfeição são argumentos pelos quais abundantemente se evidencia ser
ela a Palavra de Deus; contudo, a nossa plena persuasão e certeza da sua infalível verdade e divina
autoridade provém da operação interna do espírito Santo que pela Palavra e com a Palavra, testifica
em nossos corações.
VI. Todo conselho de Deus concernente a todas as coisas necessárias para a glória dele e para a
salvação, fé e vida do homem, ou é expressamente declarado na Escritura ou pode ser logicamente
deduzido dela. À Escritura nada se acrescentará em tempo algum, nem por novas revelações do
Espírito, nem por tradições dos homens; reconhecemos entretanto, ser necessária a íntima iluminação
do Espírito de Deus para a salvadora compreensão das coisas reveladas na Palavra, e há algumas
circunstâncias, quanto ao culto de Deus e o governo da igreja, comuns às ações e sociedades
humanas, as quais têm de ser ordenadas ela luz da natureza e pela prudência cristã, segundo as
regras da Palavra, que sempre devem ser observadas.
VIII. O Velho Testamento em hebraico (língua nativa do antigo povo de Deus) e o Novo testamento em
grego (a língua mais geralmente conhecida entre as nações no tempo em que ele foi escrito), sendo
inspirados imediatamente por Deus, e pelo seu singular cuidado e providência conservados puros em
todos os séculos, são, por isso, autênticos, e assim em todas as controvérsias religiosas a igreja deve
apelar para eles como para um supremo tribunal; mas, não sendo essas línguas conhecidas por todo
o povo de Deus, que tem direito e interesse nas Escrituras, e que deve, no temor de Deus, lê-las e
estudá-las, esses livros têm de ser traduzidos nas línguas vulgares de todas as nações aonde
chegarem, a fim de que a Palavra de Deus, permanecendo nelas abundantemente, adorem a Deus de
modo aceitável e possuam a esperanças pela paciência e conforto das Escrituras.
IX. A regra infalível de interpretação da Escritura é a mesma Escritura; portanto, quando houver questão
sobre o verdadeiro e pleno sentido de qualquer texto da Escritura (sentido que não é múltiplo, mas
único), esse texto pode ser estudado e compreendido por outros textos que falarem mais claramente.
X. O Juiz Supremo, pelo qual todas as controvérsias religiosas têm de ser determinadas, e por quem
serão examinados todos os decretos e concílios, todas as opiniões dos antigos escritores, toda as
doutrinas de homens e opiniões particulares, o Juiz Supremo, em cuja sentença nos devemos firmas,
não pode ser outro senão o Espírito Santo falando na Escritura.
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Só a Escritura, Só Cristo, Só a Graça, Só a Fé, Só a Deus Glória
11. Teologia Sistemática I
III. TEONTOLOGIA
3.1 A EXISTÊNCIA DE DEUS
a. O Lugar da Doutrina na Dogmática
As obras de dogmática ou de teologia geralmente começam com a doutrina de Deus. Há boas
razões para começar com a doutrina de Deus, se partirmos da admissão de que a Teologia é o conhecimento
sistematizado de Deus de quem, por meio de quem, e para quem são todas as coisas.
Efetivamente iniciamos o estudo da teologia com duas pressuposições básicas, a saber:
* Que Deus existe;
* Que Ele se revelou em sua Palavra Divina.
E por esta razão não nos é impossível começar com o estudo de Deus. Podemos dirigir-nos a
Sua Revelação para aprender o que Ele revelou a respeito de Si mesmo e a respeito de Sua relação para
com as Sua criaturas.
Até o começo do século XIX era quase geral a prática de começar o estudo da dogmática com
a doutrina de Deus, mas ocorreu uma mudança sob a influência de Scheleiermacher que procurou
salvaguardar o caráter científico da teologia com a introdução de um novo método. A consciência religiosa do
homem substituiu a palavra de Deus como a fonte da teologia. A fé na Escritura como autorizada revelação
de Deus foi desacreditada e a compreensão humana baseada na apreensão emocional ou racional do
homem, veio a ser o padrão do pensamento religioso. A religião gradativamente tomou lugar de Deus como
objeto da teologia. O homem deixou de ser ou de reconhecer o conhecimento de Deus como algo que lhe foi
dado na Escritura e começou a orgulhar-se de ter a Deus como seu objeto de pesquisa.
Conseqüência natural deste sistema teológico: Deus é criado segundo a imagem e
semelhança do homem.
b. Prova Bíblica da Existência de Deus
Para a teologia cristã a questão da existência de Deus não é apenas de que há alguma coisa,
alguma idéia ou ideal, algum poder ou tendência com propósito, a que se possa aplicar o nome de Deus, mas
que, de fato, existe um ser pessoal, auto-consciente, auto-existente, que é a origem de todas as coisas e que
transcende a criação inteira, mas ao mesmo tempo é imanente em cada parte de criação.
O cristão aceita a verdade da existência de Deus pela fé. As provas se acham primeiramente
na Escritura como palavra de deus inspirada, e, secundariamente na revelação de Deus na natureza.
Em nenhum livro da Bíblia algum escritor tenta provar a existência de Deus. Esta verdade, na
Bíblia, é apresentada como uma fato necessário (Gn 1:1).
c. Conceitos a Respeito de Deus
c.1 ATEÍSMO - Negação da Existência de Deus
Podemos dizer que existem dois tipos de ateus: o ateu prático e o ateu teórico. Entre os ateus
práticos encontramos aquelas pessoas não religiosas que, embora não afirmarem a não existência de Deus,
vivem como se Deus não existisse. Já os ateus teóricos são aqueles que procuram provar que Deus não
existe usando para este fim aquilo que lhes parece argumentos racionais da não existência de Deus. Os
Ateus estão classificados da seguinte forma:
* Ateus Dogmáticos: São os que negam peremptoriamente a existência de um ser
divino.
* Ateus Céticos: São os que tem dúvida quanto a capacidade da mente humana de
determinar se há ou não um Deus.
* Ateus Críticos: São os que sustentam que não há nenhuma prova válida da existência
de Deus.
c.2 Falsos Conceitos sobre Deus
Quando se debate sobre a realidade de Deus, muitos tendem a pensar que somente o ateísmo
desponto como elemento nocivo a fé cristã. Entretanto, tão prejudicial à alma humana como o ateísmo ( ) são
também os falsos conceito a cerca da existência de Deus. Isto porque estes, sob a aparência de verdade,
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Só a Escritura, Só Cristo, Só a Graça, Só a Fé, Só a Deus Glória
12. Teologia Sistemática I
conduzem a erros grotescos quando atribuem a Deus conceitos humanistas e puramente filosóficos.
Analisemos cada um deles a baixo.
* Politeísmo: É a crença na existência de vários deuses.
* Henoteísmo: É a crença na existência de vários deuses, entretanto apenas um é
escolhido como objeto se culto.
* Dualismo: É a crença na existência de dois deuses ou forças que são co-eternas,
poderosas e que ao mesmo tempo se opõe.
* Deísmo: Corrente teológica que afirma a existência de um ser pessoal, criador,
poderoso, sábio, etc. que, tendo criado todas as coisas, ausentou-se de sua
criação e deixando-a ser dirigida tão somente pelas leis naturais nas quais
ela foi posta. Este pensamento enfatiza a transcendência de Deus.
* Panteísmo: corrente filosófica que afirma que Deus é tudo e tudo é Deus.
* O Absoluta da Filosofia: alguns filósofos ao falarem a respeito da realidade ou não de
um ser divino, atribuíram a este a designação de absoluto
Diante destas correntes teológico-filosóficas podemos destacar, em suma, pelo três idéias
básicas a respeito de Deus, a saber:
1. Um Deus Imanente e impessoal: O teísmo sempre acreditou num Deus que é
transcendente e imanente. O deísmo retirou Deus do mundo, e deu ênfase à sua
transcendência em detrimento da sua imanência. Sob a influência do panteísmo, porém, o
pêndulo pendeu noutra direção, pois este identificou Deus com o mundo e não reconheceu
um Ser divino distinto da Sua criação e infinitamente exaltado acima dela.
2. Um Deus Finito e Pessoal: A idéia de um Deus finito ou deuses finitos não é nova; é tão
antiga como politeísmo e o henoteísmo. Neste sistema encontramos o panteão grego com
todos os seus deuses que tinham, via de regra, as mesmas deficiências e dificuldades dos
homens.
3. Deus Como a Personificação de Uma Simples Idéia Abstrata: ficou muito em voga na
moderna teologia “liberal” considerar o nome “Deus” como um simples símbolo,
representando algum processo cósmico, uma vontade ou poder universal, ou um ideal
elevado e abrangente. A maioria dos que rejeitam o conceito teísta de Deus ainda professa
fé em Deus, mas este é um Deus de sua própria imaginação.
c.3 TEÍSMO – O Pensamento Cristão Sobre Deus
O conceito cristão sobre o ser Deus e seu modo de se relacionar com a sua criação esta
esboçado no pensamento teológico denominado de teísmo. Neste, Deus é apresentado como um ser
pessoal, sábio, poderoso, criador de todas as coisas, e que através de seu infinito poder e soberania,
governa, dirige, dispõe, sustenta todas as coisas conforme o conselho da sua vontade. Nisto, então,
percebemos que o teísmo tanto enfatiza a transcendência de Deus como a sua imanência.
d. Provas Racionais da Existência de Deus
No transcurso do tempo foram elaborados alguns argumentos em favor da existência de Deus.
Alguns deles já haviam sido sugeridos por Platão e Aristóteles, e outros foram acrescentados modernamente
por estudiosos da filosofia da religião. Observemos cada um deles.
d.1 Argumento Ontológico: O homem tem a idéia de um ser absolutamente perfeito. Esta
existência é um atributo de perfeição; portanto, um ser absolutamente perfeito tem que existir.
Kant declarou que este argumento era insustentável; todavia, Hegel o aclamou com um grande
argumento.
d.2 Argumento Cosmológico: Cada coisa que existe no mundo tem que ter uma causa adequada;
sendo assim, o universo tem que ter uma causa adequada, isto é, uma causa infinitamente
grande.
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Só a Escritura, Só Cristo, Só a Graça, Só a Fé, Só a Deus Glória
13. Teologia Sistemática I
d.3 Argumento Teleológico: Em toda parte o mundo revela inteligência, harmonia , ordem e
propósito, a assim implica a existência de um ser inteligente e com propósito, apropriado para a
produção de um mundo como este
d.4 Argumento Moral: Todo ser humano possui em sua constituição íntima a idéia de certo e
errado, uma personalidade ajustada aos valores morais e éticos; portanto deve existir um ser
moral e eticamente bom que criou o homem com este atributo; ou seja, o reconhecimento que o
homem tem do Sumo Bem e a sua busca de um ideal moral exigem a necessitam a existência
de um Deus que concretize este ideal.
d.5 Argumento Histórico: Entre todos os povos e tribos da terra há um sentimento religioso que se
revela em cultos exteriores. Visto ser um fenômeno universal, deve pertencer à própria natureza
do homem. E se a natureza do homem leva naturalmente ao culto religioso, isto só pode achar
uma explicação num ser superior que constituiu o homem um ser religioso.
3.2 A COGNOSCIBILIDADE DE DEUS
a. Deus Incompreensível e, Contudo, Cognoscível
A igreja cristã confessa, por um lado, que Deus é incompreensível, mas também, por outro
lado, que Ele pode ser conhecido e que conhecê-lo é um requisito absoluto para a salvação (Jó 11:7; Is
40:18; Jo 17:3; I Jo 5:20).
Os escolásticos sustentavam que não sabemos o que Deus é em seu Ser essencial, mas
podemos saber algo da Sua natureza, daquilo que Ele é para nós, como Ele se revela em seus atributos
divinos.
Já os Reformadores, embora concordando em linhas gerais com os escolásticos, rejeitaram a
idéia de que é possível adquirir real conhecimento de Deus pela razão humana desajudada, partindo tão
somente da revelação geral. Para Calvino, Deus, nas profundezas do seu ser, é insondável. “Sua essência”,
diz ele, ”é incompreensível; desse modo, Sua divindade escapa totalmente aos sentidos humanos”. Os
Reformadores não negam que o homem possa aprender alguma coisa da natureza de Deus por meio da Sua
obra criadora, mas sustentam que ele só pode adquirir verdadeiro conhecimento de Deus por meio da
revelação especial, sob a influência iluminadora do Espírito Santo.
Sob a influência da teologia da imanência, de tendência panteísta, inspirada por Hegel e
Schleiermacher, a transcendência de Deus é enfraquecida, ignorada ou explicitamente negada. Deus é
colocado no nível do mundo, considerado menos incompreensível e é afirmada a realidade de se obter real
conhecimento de Deus dentro do âmbito do ser do próprio homem, fora da revelação especial, uma vez que
esta é negada.
Barth, como neo-ortodoxo, assinala que não podemos encontrar Deus nem na natureza, nem
na história, nem na experiência humana de qualquer espécie, mas somente na revelação especial, que chega
até nós na Bíblia.
b. A Negação da Cognoscibilidade de Deus
Geralmente essa negação se baseia nos supostos limites da faculdade cognitiva humana,
segundo a qual a mente é incapaz de conhecer qualquer coisa que esteja além e por trás dos fenômenos
naturais, e , portanto, é necessariamente ignorante quanto às coisas supersensoriais e divinas. Huxley foi o
primeiro a aplicar àqueles que assumem esta posição, ele próprio incluído, o nome de “agnósticos”. Este não
gostam de ser rotulados de ateus, desde que eles não negam absoluta,mente a existência de Deus, mas
declaram que não sabem se Ele existe ou não e, mesmo que exista, não estão certos de terem algum
genuíno conhecimento dele, e, em muitos casos, negam de fato que possam ter algum conhecimento real
dele. Comte, pai do positivismo,era agnóstico em religião e, de acordo com seu pensamento, o homem nada
pode conhecer, se não pelos fenômenos físicos e suas leis. Os seus sentidos sãos as fontes de todo
verdadeiro pensamento, e ele nada pode conhecer, exceto os fenômenos que os seus sentidos apreendem.
c. Auto-Revelação, Requisito de Todo Conhecimento de Deus
c.1 Deus Transmite Conhecimento de Si Próprio ao Homem
Kuyper chama a atenção para o fato de que a teologia, como conhecimento de Deus, difere
num importante ponto de todos os demais tipos de conhecimento. No estudo de todas as outras ciências, o
homem se coloca acima do objeto de sua investigação e ativamente extrai dele o seu conhecimento pelo
método que lhe pareça mais apropriado; mas, na teologia, ele não pode colocar-se acima, e, sim , sob o
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Só a Escritura, Só Cristo, Só a Graça, Só a Fé, Só a Deus Glória
14. Teologia Sistemática I
objeto do seu conhecimento. Noutras palavras, o homem só pode verdadeiramente conhecer a Deus na
medida em que Este ativamente se faz conhecido. Sem a revelação divina o homem nunca seria capaz de
adquirir qualquer conhecimento legítimo de Deus. Todo o nosso conhecimento de Deus é derivado da Sua
auto-revelação na natureza e na Escritura.
c.2 A Revelação Geral e a Especial:
A Bíblia atesta uma dupla revelação de Deus: uma revelação na natureza que nos cerca, na
consciência humana, e no governo providencial do mundo (Sl 19:1,2; At 14:17; Rm 1:19,20); e uma revelação
encarnada na Bíblia como Palavra de Deus (II Re 17:13; Sl 103:7; Jo 1:18; Hb 1:1,2).
O Dr. Warfield afirma: “ A primeira é dirigida de modo geral a todos as criaturas inteligentes, e,
portanto é acessível a todos os homens; a outra dirige-se a uma classe especial de pecadores, aos quais
Deus quis tornar conhecida a Sua salvação...”. A revelação geral está arraigada na criação, e é dirigida ao
homem como homem. A revelação especial está arraigada no plano da redenção de Deus, e é dirigida ao
homem na qualidade de pecador, e só pode ser adequadamente compreendida e assimilada somente pela fé.
Os escolásticos afirmavam que a revelação natural fornecia os dados necessários para a
construção de uma teologia natural científica pela razão humana; mas, não fornecia o conhecimento dos
mistérios como os da Trindade, da encarnação, e da redenção. Este conhecimento é dado pela revelação
especial. É um conhecimento não demonstrável racionalmente, mas deve ser aceito pela fé.
Os Reformadores rejeitaram o dualismo dos escolásticos a afirmarem que não criam que a
razão humana tenha a capacidade para elaborar um sistema científico de teologia com base na revelação
natural pura e simples, isto porque, com a entrada do pecado no mundo, a escrita de Deus na natureza ficou
muito obscura, e em alguns dos assuntos mais importantes assuntos, é opaca e ilegível (Rm ). Deus
para remediar esta questão, em sua revelação especial, tornou a publicar as verdades da revelação natural,
e, em acréscimo a isso, Ele providenciou uma cura para a cegueira espiritual do homem na obra da
regeneração e santificação, incluindo iluminação espiritual, e, assim, capacitou o homem mais uma vez a
obter verdadeiro conhecimento de Deus, o conhecimento que leva consigo a segurança da vida eterna.
3.3 A REVELAÇÃO DO SER E DOS ATRIBUTOS DE DEUS
Os atributos de Deus são as suas qualidades essenciais nas quais o Ser de Deus é revelado e
com os quais pode ser identificado.
a. O Ser de Deus
A Bíblia nunca opera com um conceito abstrato de Deus, mas sempre O descreve com o Deus
Vivente, que entra em várias relações com as suas criaturas, relações que indicam vários atributos diferentes.
E o consenso da opinião da igreja primitiva, durante a idade média, e no tempo da Reforma, foi que Deus,
em seu ser mais recôndito, é O Incompreensível. Os escolásticos falavam de três perguntas às quais todas as
especulações a respeito do Ser Divino podiam ser reduzir-se: Quem é Deus? Qual a natureza de sua
constituição interna? O que é que faz que Ele seja o que Ele é? Para responder adequadamente essas
perguntas teríamos que ser capazes de compreender Deus e oferecer uma explicação satisfatória do seu Ser
Divino, e isto é completamente impossível. O Finito não pode compreender o infinito. Calvino também fala da
essência divina como incompreensível. Ele sustenta que Deus, nas profundezas do Seu Ser, está fora de
alcance. Já Tomas de Aquino afirmava que os atributos de Deus não revelam o que Deus é em Si mesmo,
nas profundezas do Seu Ser, mas somente o que Ele é em relação às Suas criaturas.
Devido à estreita relação entre os atributos e a essência de Deus, pode-se dizer que o
conhecimento dos atributos leva consigo o conhecimento da essência divina. Seria um erro conceber a
essência de Deus como existente por Si própria e anterior aos atributos, como também seria um erro
conceber os atributos como características aditivas e acidentais do Ser Divino. São eles qualidades essenciais de
Deus, inerentes ao seu próprio Ser e com Ele coexistente. Estas qualidades não podem ser alteradas sem alterar o Ser
essencial de Deus. E desde que são qualidades essenciais, cada um deles revela-nos alguns aspectos do Ser de Deus.
b. Os Atributos de Deus em Geral
b.1 Definição de Atributos
Os atributos de Deus podem ser definidos como as perfeições que constituem qualidades do
Ser Divino na Escritura, ou que são visivelmente exercidos por Ele em sua Obras de criação, providência e
redenção.
b.2 Método de Determinação dos Atributos de Deus
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Só a Escritura, Só Cristo, Só a Graça, Só a Fé, Só a Deus Glória
15. Teologia Sistemática I
Os Escolásticos afirmavam três modos pelos quais determinar os atributos de Deus: Via da
Causalidade, onde subimos dos efeitos à uma causa primeira; Via da Negação, quando retiramos de nossa
idéia de Deus todas as imperfeições humanas; e, Via da Eminência, quando atribuímos a Deus, em grau
infinitamente perfeito, as qualidades que encontramos no homem.
Na Teologia Experimental de Macintosh o postulado praticamente necessário é que Deus é
absolutamente suficiente e absolutamente confiável com referência às necessidades religiosas do homem, e
que é sobre esta base que o homem pode construir a sua doutrina sobre os atributos de Deus.
Esses métodos têm seu ponto de partida na experiência humana, e não na Palavra de Deus.
Deliberadamente ignoram a clara revelação que Deus nos dá de Si na Escritura e exaltam a idéia do
descobrimento humano de Deus. Os que se apóiam em tais métodos fecham os olhos para a única avenida
pela qual poderiam obter real conhecimento de Deus, a saber, a Sua revelação especial, evidentemente
esquecidos do fato de que somente o Espírito de Deus pode sondar e revelar as profundezas de Deus, e no-
las revelar. O próprio método de que se utilizam os compele a arrastar Deus para baixo, ao nível do homem,
ao salientar sua imanência em detrimento de Sua transcendência. E como resultado final de sua filosofia,
temos um Deus feito à imagem do homem.
A única maneira apropriada pela qual podemos obter conhecimento dos atributos divinos
perfeitamente confiável é o estudo da auto-revelação de Deus na Escritura. É verdade que podemos adquirir
algum conhecimento da grandeza e poder de Deus, de sua sabedoria e bondade, pelo estudo da natureza,
mas para uma adequada concepção, mesmo destes atributos, será necessário voltar-nos para a Palavra de
Deus. Na teologia da revelação procuramos aprender da Palavra de Deus quais são os atributos do Ser
Divino. O homem não pode extrair conhecimento de Deus como o faz dos outros objetos de estudo, mas
Deus transmite conhecimento de Si ao homem, conhecimento este que o homem pode somente aceitar e
assimilar.
c. Os atributos Incomunicáveis
É muito comum, na teologia, falar de Deus como o Ser Absoluto, termo este mais característico
da filosofia do que da própria teologia. Na metafísica a expressão “o Absoluto” é um designativo do
funda,mento último de todas existência. O termo “Absoluto” é derivado do termo latino absolutus, composto
de ab (preposição de, indicando procedência) e solvere (soltar) e, assim, significa livre quanto a condição, ou
livre de limitação ou restrição. De sorte que o Absoluto foi considerado como aquilo que é livre de todas as
condições(Incondicionado ou Auto-existente), ou livre de todas as relações (o Irrelacionado), de todas as
imperfeições (o Perfeito), ou livre de todas as diferenças ou distinções fenomenológicas, como matéria e
espírito, ser e atributos, sujeito e objeto, aparência ou realidade (o Real, a Realidade última).
Quando o Absoluto é definido como a Causa primeira de todas as coisas existentes, ou como o
fundamento último de toda realidade, ou como o único Ser Auto-existente, pode ser considerado idêntico ao
Deus da teologia. Ele é O Infinito, que não existe em relações necessárias, porque Ele é auto-suficiente, mas
ao mesmo tempo pode entrar livremente em relações com sua criação como um todo e suas criaturas.
Enquanto os atributos incomunicáveis salientam o Ser Absoluto de Deus, os atributos
comunicáveis acentuam o fato de que ele entra em várias relações com as Suas criaturas.
c.1 A Existência Autônoma de Deus
Deus é auto-existente, isto é, Ele tem em Si mesmo a base de sua existência (Jo 5:26). O
homem, por outro lado, não existe necessariamente, e tem a causa da sua existência fora dele próprio. Este
atributo de Deus está implícito nas religiões pagãs e no Absoluto da filosofia. Esta auto-existência de Deus
acha expressão no nome YAHWEH. É somente como Ser auto-existente e independente que Deus pode dar
a certeza de que permanecerá eternamente o mesmo com relação ao seu povo eleito.
Ele é independente de todas as coisas e todas as coisas só existem por meio dele (Sl 94:8), Is
40:18; At 7:25); Ele é independente em seu pensamento (Rm 11:33,34), em sua vontade (Dn 4:35; Rm 9:19;
Ef 1:5; Ap 4:11) em seu poder (Sl 115:3) e em seu conselho (Sl 33:11).
c.2 A Imutabilidade de Deus
É a perfeição pela qual não há mudanças em Deus, não somente em Seu Ser, mas também
em Suas perfeições, em seus propósitos e em suas promessas. Esta verdade, além de ser escriturística, é
comprovada pela razão que nos ensina que não é possível nenhuma mudança em Deus, visto que qualquer
mudança é para melhor ou para pior.
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Só a Escritura, Só Cristo, Só a Graça, Só a Fé, Só a Deus Glória
16. Teologia Sistemática I
A imutabilidade de Deus é claramente ensinada nas Escrituras sagradas (Ex 3:14; Sl 102:26-
28; Is 41:4; Is 48:12; Ml 3:6; Rm 1:23; Tg 1:17).
No entanto, há passagens bíblicas que parecem atribuir mudança em Deus (Ex 32:10-14; Jn
3:10; Pv 11:20; Sl 18:26,27). A objeção aqui presente baseia-se até certo ponto em errônea compreensão. A
imutabilidade divina não deve ser entendida no sentido de imobilidade, pois na teologia fala-se de Deus como
actus Purus, Deus sempre em ação. A Bíblia nos ensina que Deus entra em multiformes relações com os
homens, Ele está cercado de mudanças, mudanças nas relações dos homens com Ele, mas não há nenhuma
mudança em Seu Ser, em Seus atributos, em Seus propósitos, em Seus motivos de ação, nem em Sua
promessas.
Se a Escritura fala do Seu arrependimento, de Sua mudança de intenção, e da alteração que
faz de sua relação com os pecadores quando estes se arrependem, devemos lembrar-nos de que se trata
apenas de um modo antropopático [ a antropopatia é atribuição de sentimentos humanos a Deus com o fim
de, em linguagem humana, tentar melhor compreender a divindade] de falar. Na realidade a mudança não está
em Deus, mas no homem e nas relações do homem com Deus.
É importante sustentar a doutrina da imutabilidade de Deus contra a doutrina pelagiana e
armeniana de que Deus é sujeito a mudança, na verdade não em Seu Ser, mas em seu conhecimento e em
sua vontade, de modo que Suas decisões dependem em grande medida das ações do homem.
c.3 A Infinidade de Deus
É a perfeição de Deus pela qual Ele é isento de toda e qualquer limitação em seu Ser Divino e
Seus atributos. Esta infinidade não deve ser confundida como se Ele estivesse espalhado pelo universo todo,
uma parte aqui, outra ali, pois Deus não tem corpo e, portanto, não tem extensão espacial. Este atributo,
conseqüentemente, é uma realidade em Deus e só por Ele compreendida plenamente; e que se pode
distinguir em três aspectos, vejamos.
* Sua Perfeição Absoluta: Esta é a infinidade de Deus relacionada em si mesma. O Ser
e os atributos de Deus são plenamente perfeitos. Ele é tudo o
que deve ser e seus atributos não carecem de acréscimos
(Jó 11:7-10; Sl 145:3; Mt 5:48).
* Sua Eternidade: A eternidade é a infinidade de Deus em relação ao tempo. A forma
como a Bíblia apresenta a eternidade de Deus é simplesmente a de
duração pelos séculos dos séculos sem fim (Sl 90:2; Sl 102:12; Ef
3:21). Devemos lembrar, porém que ao falar como fala, a Bíblia
emprega linguagem popular, e não a linguagem da filosofia. Na
realidade, a eternidade no sentido estrito da palavra, está relacionada
a tudo quanto transcende a todas as limitações temporais (II Pe 3:8).
Nossa existência é assinalada por dias, semanas, meses e anos; não
há essa divisão na vida de Deus. Ele é o eterno “Eu Sou”. A sua
eternidade pode ser definida como a perfeição pela qual Ele é
elevado acima de todos os limites temporais e de toda sucessão de
momentos, e tem a totalidade da Sua existência num único presente
indivisível.
* Sua Imensidade: É a infinidade de Deus em relação ao espaço, e pode ser definida
como a perfeição do Ser divino pela qual Ele transcende todas as
limitações espaciais e, contudo, está presente em todos os pontos do
espaço com todo o Seu Ser. Os corpos físicos ocupam o espaço
circunscritivamente, por que limitados por ele; os espíritos finitos
ocupam o espaço definidamente, visto que não estão em toda a
parte, e Deus ocupa os espaço repletivamente, porque ele preenche
todo o espaço. Ele não esta ausente de nenhuma parte do espaço,
nem tampouco está mais presente numa parte que noutra. Em certo
sentido, os termos “imensidade” e “onipresença”, como são aplicados
a Deus, denotam a mesma coisa.; com uma particularidade, ou seja,
enquanto a imensidade aponta para o fato de que Deus transcende
todo o espaço e não está sujeito às suas limitações, a onipresença
denota que ele preenche todas as partes do espaço com to o Seu
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Só a Escritura, Só Cristo, Só a Graça, Só a Fé, Só a Deus Glória
17. Teologia Sistemática I
Ser. A Onipresença de Deus é revelada claramente na Bíblia. O céu
e a terra não podem contê-lo ( I Re 8:27; Is 66:1; At 7:48,49) e ao
mesmo tempo Ele preenche ambos e é Deus acessível (Sl 139:7-10;
Jr 23:23,24; At 17:27,28).
c.4 A Unidade de Deus
Este atributo salienta a unidade e a unicidade de Deus, o fato de que Ele é numericamente um
e que, como tal, Ele é único. Implica que só existe um Ser Divino, que, pela natureza do caso, só pode existir
apenas um, e que todos os outros seres têm sua existência dele, por meio dEle e para Ele (I Re 8:60; I Co
8:6; I Tm 2:5; Dt 6:4).
d. Os Atributos Comunicáveis (Deus como Espírito Pessoal)
É nos atributos comunicáveis que Deus se posiciona como Ser moral, consciente, inteligente e
livre, como ser pessoal no mais alto sentido da palavra.
Para provar a personalidade de Deus têm sido apresentadas provas parecidas com as citadas
em prol da existência de Deus, são elas:
1. A personalidade humana requer um Deus pessoal para sua explicação: Visto que o homem
é um produto pessoal, o poder que o originou também deve ser pessoal. Doutro modo,
existe no efeito alguma coisa superior ao que quer que se ache na causa; e isto seria
completamente impossível.
2. O mundo em geral revela os mais claros sinais de uma inteligência infinita, das emoções
mais profundas e de uma vontade poderosa. Conseqüentemente, deve existir um Ser
Criador do mundo que com inteligência, sensibilidade e vontade, criou todas as coisas.
3. A natureza moral e a religiosa do homem também aponta para a personalidade de Deus. A
sua natureza lhe impõe um senso de obrigação de fazer o que é reto, e isto implica
necessariamente a existência de um Legislador supremo. Além disso, sua natureza
religiosa constantemente o incita a procurar comunhão pessoal com algum Ser superior.
Mas, conquanto todas estas considerações sejam verdadeiras e tenham valor como
testemunhas, não são, contudo, as provas de que a teologia depende em sua doutrina da personalidade de
Deus. Ela busca prova na revelação que Deus faz de Si na Escritura. A Escritura atesta a personalidade de
Deus com quem podem conversar, confiar, amar e serem amados. E, finalmente a mais alta revelação de
Deus como ser pessoal está na encarnação de Cristo (Jo 14:9). Provas mais pormenorizadas aparecerão na
discussão dos atributos comunicáveis.
d.1 A Espiritualidade de Deus
A Bíblia não nos dá uma definição de Deus. O que mais se aproxima disso é a palavra dita por
Jesus à mulher samaritana: “Deus é Espírito” (Jo 4:24). Pelo ensino da espiritualidade de Deus, a teologia
salienta o fato de que Deus tem um Ser substancial exclusivamente seu e distinto do mundo, e que este Ser
Substancial é imaterial, invisível, e sem composição nem extensão. Deste de que Ele é Espírito no sentido
mais absoluto e mais puro da palavra, não há nele nenhuma composição ou partes (I Tm 1:17; I Tm 6:15,16).
É verdade que a Bíblia fala de mãos e pés, olhos e ouvidos, boca e nariz de Deus, mas ao
fazê-lo, está falando antropomórfica ou figuradamente daquele que, de longe, transcende o nosso
conhecimento humano.
d.2 Os Atributos Intelectuais
d.2.1O Conhecimento de Deus: É a sua perfeição pela qual Ele, de maneira única,
conhece-se a Si próprio e a todas as coisas possíveis e reais num só ato eterno e
simples. (I Sm 2:3; Jó 12:13; Sl 94:9; Is 29:15; Is 40:27,28). Sendo perfeito (Jó 37:16), é
também simultâneo e não sucessivo, de modo que Ele vê as coisas de uma vez em sua
totalidade, e não fragmentadas uma após outra. Além disso é inalterável e completo.
Ele conhece o que é possível (coisas que poderiam ocorrer em certas circunstancias) e o
que existe concretamente. É preciso defender esta doutrina contra Márcion e Socino e
todos quantos acreditam num Deus finito e que possui conhecimento limitado. Quanto a
presciência, necessário se faz que afirmemos que ela está presente na Bíblia (I Sm
23:10-13; II Re 13:19; Sl 81:14,15; Jr 2:2,3; Mt 11:21), que ela apóia-se nos decretos de
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Só a Escritura, Só Cristo, Só a Graça, Só a Fé, Só a Deus Glória
18. Teologia Sistemática I
Deus ( vsdvv ) e que a Bíblia afirma tanto a responsabilidade humana como a
soberania de Deus ( bsbsbsdb ).
d.2.2 A Sabedoria de Deus: A sabedoria de Deus é a Sua infinita e perfeita inteligência
como manifestada na adaptação de meios e fins. Ela indica de que Ele sempre busca
os melhores fins possíveis, e escolhe os melhores meios para a consecução dos seus
propósitos (Rm 11:33; Ef 1:11; Cl 1:16; I Co 2:7; Ef 3:10).
d.2.3 A Veracidade de Deus: Este atributo de Deus pode ser melhor explicado em três
aspectos: (1) Ele é a verdade num sentido metafísico, pois só nEle a idéia de Divindade
se concretiza perfeitamente, e, portanto, não há outro Deus (Sl 96:5; 97:7; 115:4-8); (2)
Ele é a verdade num sentido ético, pois Ele revela-se como realmente é e Sua Relação e
plenamente confiável (Nm 23:19; Rm 3:4; Hb 6:18); e, Ele é a verdade num sentido
lógico, pois conhece as coisas como realmente são, conhece não somente as
aparências, mas também a realidade das coisas. Assim, a verdade de Deus é o alicerce
de todo verdadeiro conhecimento (Ex 34:6; Nm 23:19; Dt 32:4; Is 65:16; Jr 10:8; I Jo
5:20,21).
d.3 Os Atributos Morais
d.3.1 A Bondade de Deus: É a perfeição de Deus que o leva a tratar benevolamente e
generosamente todas as sua criaturas (Sl 145:9,15,16; Mt 5:45; Lc 6:35; At 14:17). Esta
bondade revela-se em palavras bíblicas como amor (nnnnns ), graça ( bdbadb ),
misericórdia ( gagga ) e longanimidade ( svsdvsdv ).
d.3.2 A Santidade de Deus: A palavra hebraica para “ser santo”, qadash ( ), deriva da raiz
qad ( ), que significa cortar ou separar. A mesma idéia é comunicada pelas palavras
hagiazo ( ) e hagios ( ), no Novo Testamento. Disto já se vê que não é correto
pensar na santidade primariamente com uma qualidade moral. Sua idéia fundamental é
a de uma posição ou relação existente entre Deus e uma pessoa ou coisa. Daí poder-
se fala de dois sentidos da santidade: (1) O sentido original no qual Deus é
absolutamente distinto de todas as Suas criaturas, e é exaltado acima delas em
majestade infinita. Assim entendida, santidade de Deus é um dos seus atributos
transcendentes; (2) e o sentido ético, que o apresenta como aquele que está separado
de todo mal moral, isto é, o pecado. Em virtude de sua santidade, Deus não pode ter
comunhão com o pecado (Jó 34:10; Hc 1:13). Contudo, a idéia de santidade não é
meramente negativa (separação do pecado); tem igualmente um conteúdo positivo, a
saber, o de excelência moral, ou perfeição ética. Portanto, podemos definir a santidade
como a perfeição de Deus, em virtude daqual Ele eternamente quer manter e mantém a Sua
excelência moral, aborrece o pecado, e exige pureza moral em suas criaturas. Esta santidade é
revelada na lei moral implantada no coração do homem e que fala por meio da
consciência, na Lei revelada à nação de Israel, na pessoa de Cristo, que é chamado “o
santo e o Justo” (At 3:14) e na igreja como o corpo de Cristo (Jo 17:11; I Pe 1:16; Ap
4:8).
d.3.3 A Justiça de Deus: É a perfeição de Deus pela qual Ele se mantém contra toda
violação da Sua santidade e mostra, em tudo e por tudo, que Ele é santo. Esta justiça
se manifesta especialmente em dar a cada homem o que lhe é devido, em tratá-lo de
acordo com os seus merecimentos. Esta justiça é de duas classes: (1) Justiça
Remunerativa, que se manifesta na distribuição de recompensa a homens e anjos (Dt
7:9,12,13; II Cr 6:15; Sl 58:11; Mt 25:21, Rm 2:7), não com base em méritos, mas tão
somente pela graça; e, (2) Justiça Retributiva, que se relaciona com a imposição de
castigos. É uma expressão da ira divina (Rm 1:32; Rm 2:9; II Ts 1:8). O propósito
primordial da punição do pecado é a manutenção do direito e da justiça.
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Só a Escritura, Só Cristo, Só a Graça, Só a Fé, Só a Deus Glória
19. Teologia Sistemática I
d.4 Os Atributos de Soberania
Deus na Escritura é apresentado como o Criador e Sua vontade como a causa de todas as
coisas. Ele sustenta todas as coisas e determina os fins que elas estão destinadas a cumprir, e todas as
coisas dependem dele e Lhe são subservientes (Gn 14:19; Ex 18:11; Dt 10:14-17; I Cr 29:11,12; Ne 9:6; Sl
22:28; Jr 27:5; Lc 1:53; At 17:24-26; Ap 19:6). Dois atributos requerem discussão sob este título, a saber: (1)
a vontade soberana de Deus, e (2) o poder soberano de Deus.
d.4.1 A Vontade Soberana de Deus: a vontade divina, na Escritura, é apresentada como a
causa final de todas as coisas: a criação e preservação (Sl 135:6; Jr 18:6; Ap 4:11); o
governo (Pv 21:1; Dn 4:35); a predestinação e a reprovação (Rm 9:15,16; Ef 1:11), os
sofrimentos de Cristo (Lc 22:42; At 2:23), a regeneração (Tg 1:18), a santificação (Fp 2:13),
os sofrimentos dos crentes (I Pe 3:17), a vida e o destino dos homens (At 18:21; Rm 15:32;
Tg 4:15), e até as menores coisas da vida (Mt 10:29). A palavra vontade, no entanto,
quando aplicada a Deus, nem sempre possui a mesma conotação, ela pode designar:
(1) a faculdade de auto-determinação de Deus em Ele decide tomar um curso de ação,
(2) um plano ou propósito, (3) o poder de executar este plano, ou (4) a regra de vida
firmada para as criaturas racionais.
Diz-se, também, que se a vontade decretatória de Deus determinou também a entrada
do pecado no mundo, com isso Deus é o autor do pecado e realmente quer uma coisa
contrária às sua perfeições morais. Para fugirem à dificuldade, os armenianos dizem que
a vontade de Deus, permitindo o pecado, depende do Seu pré-conhecimento do curso
que o homem escolheria. Os teólogos reformados (calvinistas), embora mantendo, com
base em passagens como At 2:23 e 3:8; etc., que a vontade decretatória de Deus inclui
também os atos pecaminosos do homem, sempre têm cuidado de assinalar que se
deve conceber isto de modo que não se faça de Deus o autor do pecado. Insistem que
a vontade Deus de Deus quanto ao pecado é de permitir o pecado, e não de efetuá-lo e
que esta vontade leva consigo a certeza de que o pecado virá ocorrer
d.4.2 O Poder Soberano de Deus: A soberania de Deus acha expressão, não somente na
vontade divina, mas também na onipotência de Deus, ou em seu poder de executar a
Sua vontade. Sendo assim, o seu poder soberano pode ser definido como a perfeição
de Deus pela qual Ele, mediante o simples exercício da Sua vontade, pode realizar tudo
quanto está presente em Sua vontade ou conselho. O poder de Deus, em seu exercício
fatual, limita-se àquilo que o seu decreto eterno abrange. Mas o exercício fatual do
poder de Deus não representa os seus limites. Deus poderia fazer mais que isso, se
fosse esta a Sua intenção. Deve-se manter esta posição contra aqueles que, como
Schleiermacher e Strauss, sustentam que o poder de Deus se limita àquilo que Ele
realiza de fato. A Bíblia nos ensina por um lado, que o poder de Deus estende-se além
daquilo que é realizado de fato (Gn 18:14; Jr 32:27; Zc 8:6; Mt 3:9; 26:53). Mas, por
outro lado, ela indica também que há muitas coisas que Deus não pode fazer. Ele não
pode mentir, pecar, mudar,e não pode negar-se a Si próprio (Nm 23:19; I Sm 15:29; II
Tm 2:13; Hb 6:18). Não há poder absoluto nele divorciado de suas perfeições, em
virtude do qual Ele pudesse fazer todo tipo de coisas inerentemente contraditórias entre
si. A idéia da onipotência de Deus é expressa pelo nome ‘El-Shaddai; e a Bíblia fala a
seu respeito em termos que não deixam dúvida, em passagens como Jó 9:12; Sl 115:3;
Jr 32:17; Mt 19:26; Lc 1:37.
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20. Teologia Sistemática I
3.4 A TRINDADE SANTA
1. A Doutrina da Trindade na História
Os judeus no tempo de Jesus davam muita ênfase à unidade de Deus, e esta ênfase foi trazida
para dentro da igreja cristã. O resultado foi que alguns eliminaram completamente as distinções pessoais da
Divindade, e que outros não fizeram plena justiça à divindade essencial da segunda pessoa e da terceira
pessoas da Trindade Santa. Tertuliano foi o primeiro a empregar o termo “Trindade” e a formular a doutrina ,
mas a sua formulação foi deficiente, desde que envolvia uma infundada subordinação do Filho ao Pai.
Os arianos negavam a divindade do Filho e do Espírito Santo, apresentando o Filho como a
primeira criatura do Pai, e o Espírito Santo como a primeira criatura do Filho.
O monarquianismo dinâmico via em Jesus apenas um homem e no Espírito Santo uma
influência divina.
Já o monarquianismo modalista considerava o Pai, o Filho e o Espírito Santo meramente como
três modos de manifestação assumidos sucessivamente pela Divindade.
A igreja começou a formular a sua doutrina da Trindade no século quarto. O Concílio de Nicéia
(325 d.C.) declarou que o Filho é co-essencial com o Pai, enquanto que o Concílio de Constantinopla (381
d.C.) afirmou a divindade do espírito, embora não com a mesma precisão.
Depois da Reforma não temos maior desenvolvimento da doutrina da Trindade, mas o que
encontramos são algumas das errôneas formulações antigas. Os arminianos, Episcópio, Curceleu e Limborgh
reavivaram a doutrina da subordinação ao atribuírem ao Pai uma certa preeminência sobre as outras pessoas
da Trindade – em ordem, dignidade e poder. Outros seguiram o caminho indicado por Sabélio, ensinando
uma espécie de modalismo com, por exemplo, Schleiermacher, que considerava as três pessoas
simplesmente como três aspectos de Deus: o Pai é Deus como a subjacente unidade de todas as coisas, o
Filho é Deus como passando a uma personalidade consciente no homem, e o Espírito Santo é Deus vivendo
na igreja. Os socinianos da época da Reforma seguiram as linhas arianas, mas foram além de Ário, pois para
eles Cristo era simplesmente um homem e o Espírito Santo apenas um poder ou influência.
2. Deus Como Trindade em Unidade
a. A Personalidade de Deus e a Trindade
Os atributos comunicáveis de Deus salientam a sua personalidade desde que O revelam como
um ser moral bem como racional. E, visto que o homem foi criado à imagem de Deus, podemos compreender
algo da vida pessoal de Deus pela observação da personalidade como a conhecemos no homem.
Contudo, precisamos ter cuidado de não estabelecer a personalidade humana como padrão
pelo qual avaliar a personalidade de Deus. Pois há grande diferença entre ambas, e esta é que o homem é
unipessoal, enquanto Deus é tri-pessoal. E esta existência tripessoal é uma necessidade do Ser Divino, e em
nenhum sentido resulta de uma escolha feita por Deus. Ele não poderia existir em nenhuma outra forma que
não a forma tri-pessoal.
b. Prova Bíblica da Doutrina da Trindade
A doutrina da Trindade depende decisivamente da revelação autoritativa que Deus deu aos
homens.
b.1 Provas do Velho Testamento: Alguns dos primeiros pais da igreja e alguns teólogos mais
recentes desconsideram o caráter progressivo da revelação e opinaram que a doutrina da
Trindade foi revelada completamente no V.T. Por outro lado, os socinianos e os arminianos
eram de opinião que não há nada desta doutrina ali. Contudo, tanto estes como aqueles
estavam enganados. E V.T não contém pela revelação da existência trinitária de Deus, mas
contém várias indicações dela. Ou seja, a Bíblia nunca trata desta doutrina de maneira
abstrata, mas revela a subsistência trinitária, em suas várias relações, como uma realidade
viva. E esta revelação vai tendo maior clareza, na medida em que a obra redentora de Deus
é revelada mais claramente, como na encarnação do Filho e no derramamento do Espírito.
No Velho Testamento, portanto, encontramos as seguintes passagens indicadoras da
doutrina da Trindade:
* Aquelas passagens em que Deus fala de si mesmo no plural (Gn 1:26; 11:7), o que
indicam distinções pessoais em Deus, embora não sugiram uma triplicidade, mas
apenas uma pluralidade de pessoas;
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21. Teologia Sistemática I
* As passagens que referem ao Anjo do Senhor que, por um lado, é identificado com
Jeová e, por outro, distingue-se dele (Gn 16:7-13; Gn 18:1-21; 19:1-28; Ml 3:1);
* Passagens em que a Palavra e a Sabedoria de Deus são personificadas (Sl 33:4,6;
Pv 8:12-31);
* Textos nos quais Deus fala e menciona o Espírito e o Messias, ou quem fala é o
Messias, que menciona Deus e o Espírito (Is 48:16; Is 61:1; Is 63:9,10).
b.2 Provas do Novo Testamento: O Novo Testamento traz consigo uma revelação mais clara
das distinções da Divindade, vejamos:
* Se no V.T. Jeová e apresentado como o Redentor e Salvador de seu povo (Jó
19:25; Sl 19:14; Is 41:14; Jr 14:3), no N.T. o Filho de Deus distingue-se nesta
capacidade (Mt 1:21; Lc 1:76-79; Jo 4:42, etc);
* Se no V.T. é Jeová que habita em Israel e nos corações dos que O temem (Sl 74:2;
Sl 135:21; Is 8:18; Ez 43:7-9), no N.T. é o Espírito santo que habita na igreja (At 2:4;
Rm 8:9,11; I Co 3:16; Gl 4:6; Ef 2:22);
* Vemos o Pai de dirigindo ao Filho (Mc 1:11; Lc 3:22), o Filho comunicando-se com o
Pai (Mt 11:25; Jo 11:41), e o Espírito Santo orando a Deus nos corações dos
crentes (Rm 8:26).
* No batismo do Filho, o Pai fala e o Espírito Santo desce na forma de pomba (Mt
3:16,17);
* Na grande comissão Jesus menciona as três pessoas em igualdade de autoridade
(Mt 28:19) e também observamos o mesmo princípio em outras passagens (I Co
12:4-6; II Co 13:13; I Pe 1:2).
c. Exposição da Doutrina da Trindade
c.1 Há no Ser Divino apenas uma essência indivisível: Deus é um em Seu ser essencial, ou
seja, em Sua natureza constitucional. Esta idéia baseia-se em passagens como Dt 6:4 e Tg
2:19.
c.2 Neste único Ser Divino há três pessoas, o Pai, o Filho e o Espírito santo: A experiência
indica que onde temos uma pessoa, temos também uma essência individual distinta. Mas em
Deus não há três indivíduos justapostos e separados uns dos outros, mas somente auto-
distinções pessoais dentro da essência divina. E estas auto-distinções do Ser Divino implicam
um “eu” e “tu” no Ser de Deus, que assumem relações pessoais uns para com os outros (Mt
3:16; Jo 1:18; Jo 3:16; Jo 16:13-15).
c.3 Toda a indivisiva essência de Deus pertence a cada uma das três pessoas: Quer dizer
que a essência não é dividida entre as três pessoas, mas está com a totalidade absoluta da
sua perfeição em cada uma das pessoas, de modo que têm unidade numérica de essência.
Ora, se é assim, portanto, não de deve haver subordinação de uma pessoa a outra da
Divindade quanto ao ser essencial, e, conclusivamente, nenhuma diferença na dignidade
pessoal. A única subordinação que podemos falar é uma subordinação quanto à ordem e o
relacionamento.
c.4 A subsistência e as operações das três pessoas do Ser Divino são assinaladas por certa
ordem definida: Quanto a subsistência o Pai é a primeira pessoa, o Filho é a segunda, e o
Espírito é a terceira. Esta ordem, contudo, não pertence a nenhuma prioridade de tempo ou de
dignidade essencial, mas somente à ordem de derivação lógica. O Pai não é gerado por
nenhuma das outras duas pessoas, nem delas procede; o Filho é eternamente gerado pelo
Pai, e o Espírito santo procede do Pai e do Filho desde toda a eternidade. Todas as coisas
provém do Pai, mediante o Filho e no Espírito Santo.
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