O documento discute a cidadania e a cultura da paz. Define cidadania como pertencimento a um estado ou cidade com direitos e deveres. Explora como a cidadania responsável e o envolvimento de todos na sociedade são essenciais para promover a paz. Também discute as ameaças à paz como pobreza e desigualdade, e as condições necessárias para a paz como educação, justiça e solidariedade.
1. Cidadania e cultura de paz
Agradecimentos
A reflexão compreende seis pontos:
I. Concepção de cidadania
II. Concepção de cultura de paz
III. Concepção da paz
IV. Algumas ameaças da paz
V. Condições para a paz
VI. Caminhos da paz
VII. Pilares da paz
VIII. Conclusão
I. Concepção de cidadania
A cidadania pode ser definida como pertença a um estado ou a uma cidade, com direitos e
deveres.
Touraine (1996) afirma que, “o termo cidadania refere-se directamente ao Estado nacional, mas
também pode dizer respeito à pertença a uma comunidade quer territorial bem como
profissional, a pertença, que se define por direitos, garantias e, portanto, por diferenças
reconhecidas em relação aos que não pertencem a essa comunidade…” (cfr. p. 95).
Como podemos observar, a consciência de cidadania significa consciência de se ser cidadão,
consciência de identidade, de pertencer a uma colectividade sócio - política e cultural, a uma
nação, a uma província, a uma cidade ou a um município, uma pertença que abrange direitos mas
também deveres para o bom funcionamento e o melhoramento dessa sociedade.
Podemos falar duma verdadeira cultura de paz onde houver uma cidadania responsável, isto é,
onde houver um verdadeiro e genuíno sentido de pertença, um verdadeiro amor à pátria, um
2. autêntico amor à cidade, amor manifestado no envolvimento e participação activa de todos no
progresso sócio - político, económico e cultural da cidade onde se vive ou da Nação, em geral.
Esse amor à própria cidade, à própria Nação passa, igualmente, pela preocupação de vê-la com
bom visual e boa apresentação que começa por pequenos gestos, nomeadamente, por não deixar
a casca de banana ao chão, por não depositar o lixo em lugares impróprios, por evitar o fecalismo
e a micção ao ceu aberto, até aos grandes gestos, como a participação em associações,
movimentos sociais, culturais, entre outros, até à participação nas eleições autárquicas e
nacionais, bem como o controlo.
A falta de espírito de cidadania leva à irresponsabilização e falta de escrutínio sobre dirigentes e
dirigidos porque o controlo social está ausente. O sentido de pertença e de cidadania fazem com
que o indivíduo seja mais consciente em relação ao seu empenhamento na protecção da sua
liberdade e bem-estar (liberdade e bem-estar individual), bem como pela liberdade e bem-estar
dos outros (liberdade e bem-estar colectivo). Nesse sentido, ele e os outros lutam pela limitação e
mesmo bloqueio do poder absoluto em favor do poder limitado, porque o poder absoluto,
manipula, domina, escraviza o povo em todos os aspectos, nomeadamente, social, político,
económico, entre outros.
II. Concepção de cultura de paz
Quando falamos da cidadania definimo-la como pertença a um estado ou a uma cidade, com
direitos e deveres.
E um dos direitos e deveres dos cidadãos, dentre tantos, ou seja, o principal direito e dever dos
cidadãos, depois do primeiríssimo que é o direito à vida, com o respectivo dever de promovê-la,
é a promoção da paz ou da cultura da paz.
A cultura da paz diz respeito a preocupação individual ou colectiva de promover a paz, a todos
os momentos e a todos os níveis.
A cultura de paz significa que a pessoa, no seu todo, está imbuída de sentimentos de paz.
A cultura de paz tem como finalidade o bem - estar das pessoas. E não pode existir esse bem -
estar se não houver uma cidadania responsável, ou seja, o contributo e o envolvimento de todos,
colectivamente, e de cada um, individualmente.
3. Para que em Moçambique essa pertença seja exemplar, é fundamental que as instituições
sociais também sejam exemplares, indomesticadas e indomesticáveis, isto é, livres de todo o
domínio sócio - político, cultural e, pelo contrário sejam democráticas, onde reina o verdadeiro
amor, a verdade, a fraternidade e a justiça, condições essenciais para uma verdadeira paz social.
A cidadania responsável significa também o envolvimento e o comprometimento
responsáveis de todos para que toda a sociedade tenha rosto e qualidade de vida. Que todos
tenham algum benefício útil. Que todos vejam os seus direitos reconhecidos, enquanto se
empenham arduamente no cumprimento dos seus deveres, e cheguem a afirmar, de viva voz, que
vale a pena viver nesta sociedade.
A cidadania responsável também tem em vista a civilização da nação e dos cidadãos. Nesta
óptica, podemos afirmar que existe paz social se as pessoas são organizadas e civilizadas, vivem
de maneira civilizada, com ética e estética, sem se “devorarem” umas as outras, mas sempre
com o propósito de bem - estar e felicidade de todos.
A cidadania responsável em vista à paz também abrange o respeito, a observância, o
cumprimento das normas, das regras e das leis vigentes na sociedade, ou seja, para que haja a paz
é fundamental que a sociedade seja guiada por leis justas, que são observadas e cumpridas,
escrupulosamente, por todos e por cada um.
Enfim, a cidadania responsável visa construir uma sociedade justa, onde as liberdades da
cidadania igual são respeitadas e consideradas invioláveis (cfr. Rawls, 2000, p. 4).
III. Concepção da paz
4. Paz, do latim pace, significa ausência de guerra e, consequentemente, “a presença da
serenidade, da tranquilidade, do sossego, da boa harmonia e da conciliação” (cfr. Perfeito et al.,
1994, 1358).
Nesse sentido, quando há, por exemplo, ausência do cruzamento de balas de fogo, ou
seja, quando há ausência do disparo das armas, por um lado, e o esquivar das balas, por outro
lado, e vice-versa, acredita-se que se está em paz, embora não seja tudo, mas parte dum todo. Há
um denominador por acrescentar: tranquilidade e sossego.
A tranquilidade e o sossego, que aqui pretendemos, englobam todo o bem-estar sócio -
cultural, económico, político bem como religioso. Essa é que é a verdadeira paz. Essa é a paz
ideal, uma paz viva, paz da vida ou, como afirma Dom Jaime Gonçalves, paz dos vivos, “não
uma paz dos mortos ou dos cemitérios” (Gonçalves, 2014). Essa é a paz aqui querida, paz amada,
paz pretendida, almejada, perseguida, sonhada e proposta: paz integral.
É nessa óptica que se posiciona Santo Agostinho ao afirmar que a paz é essencialmente a
“tranquilidade da ordem em todas as coisas – pax omnium rerum tranquillitas ordinis”. (cfr. De
Civitate Dei, XIX, 12 e 13 in Chorão et al., - Brasileira de Filosofia, 1991, p. 1382). Esse é o
pressuposto, o fundamento e a essência da paz social: desafogo e tranquilidade em tudo e para
todos.
IV. Algumas ameaças da cultura da paz
Algumas ameaças que fazem perigar a paz são:
1. Fraca escolaridade
2. Desemprego
3. Ameaças provenientes da danosa exploração dos recursos minerais e florestais
4. Pobreza material e económica
5. Assimetrias regionais
6. Descontentamento popular e político
7. Sequestro e tráfico de pessoas e órgãos humanos
8. Justiça pelas próprias mãos
5. 9. Clivagens sociais, políticas e militares exacerbadas
10. Guerra
V. Condições para a paz
1. Educação, cultura e saúde integrais
2. Quantificação e qualificação da tecnologia e da mão-de-obra
3. Sábia gestão de recursos naturais e seus derivados
4. Estabilidade económica: redistribuição equitativa da riqueza
VI. Caminhos da paz
1. Justiça
1.1. Justiça social ou distributiva
1.2. Justiça pública ou jurídica
1.3. Justiça comutativa
2. Solidariedade
3. Bem - comum
VII. Pilares da paz
1. Paz política e inclusão social
2. Democracia
3. Segurança
4. Estabilidade ambiental
6. VIII. Conclusão
Não pode existir a paz onde não houver consciência de cidadania.
Na construção da paz, através da cidadania responsável, ninguém deve passar despercebido,
ninguém é hóspede ou estrangeiro, ninguém se deve sentir excluído. Mas todos são convidados a
envolverem-se e a empenharem-se activamente para a prosperidade de todos, em geral, e de cada
um, em particular.
Aliás, a força motriz ou principal da cidadania, em vista da paz, reside na vontade dos
cidadãos de agirem de maneira responsável na vida pública (cfr. Touraine, 1996, p. 105).
Sendo assim, todos os sonhos, projectos, ideais e até acções das pessoas devem ser bons, de
bem e para o bem. Todos eles devem ter em vista e como fundamento o bem.
Para concluir, a paz é feita de consensos e concessões
Referências
CHALITA, Gabriel, Os dez mandamentos da Ética, Nova Fronteira, São Paulo, 2003.
CHORÃO, João et al., Logos, Enciclopédia Luso - Brasileira de Filosofia, 3, Editorial Verbo,
Lisboa, 1991.
PERFEITO, Abílio et Al., Dicionário da língua portuguesa, Bloco gráfico, Porto, 1994
TOCQUEVILLE, Alexis, Da democracia na América, Princípia, Estoril, 2007.
TOURAINE, Alain, O que é a democracia? Instituto Piaget, Lisboa, 1996.