1. QUANDO COMEÇA A VIDA
Até os dias de hoje, filósofos e cientistas ainda não chegaram a um consenso quanto à
definição do momento exato em que a vida humana tem início. Recentemente, essa
intrigante pergunta foi colocada em maior evidência devido às discussões sobre o aborto
de fetos anencéfalos e a utilização de células-tronco embrionárias para fins de pesquisa
e terapia. A resposta à pergunta de quando se inicia a vida é de fundamental importância
para o posicionamento do Direito perante essas questões polêmicas. A primeira linha de
pensamento defende que a vida começa a partir da fecundação, ou seja, no momento em
que o óvulo é fertilizado pelo espermatozóide. Essa é a tese defendida fervorosamente
pela Igreja Católica e por algumas Igrejas Protestantes. É uma das teses que possui o
maior número de adeptos.
Em defesa dessa teoria, o professor Dernival da Silva Brandão, especialista em
Ginecologia e membro emérito da Academia Fluminense de Medicina, afirma que:
“A ciência demonstra insofismavelmente – com os recursos mais modernos
– que o ser humano, recém-fecundado, tem já o seu próprio patrimônio
genético e o seu próprio sistema imunológico diferente da mãe. É o mesmo
ser humano – e não outro – que depois se converterá em bebê, criança,
jovem, adulto e ancião. O processo vai-se desenvolvendo suavemente, sem
saltos, sem nenhuma mudança qualitativa. Não é cientificamente admissível
que o produto da fecundação seja nos primeiros momentos somente uma
matéria germinante. Aceitar, portanto, que depois da fecundação existe um
novo ser humano, independente, não é uma hipótese metafísica, mas uma
evidência experimental. Nunca se poderá falar de embrião como de uma
pessoa em potencial que está em processo de personalização e que nas
primeiras semanas pode ser abortada. Por quê? Poderíamos perguntar-nos:
em que momento, em que dia, em que semana começa a ter a qualidade de
um ser humano? Hoje não é, amanhã já é. Isto, obviamente, é
cientificamente absurdo.``
AUTONOMIA DA MÃE
No Brasil, o aborto é considerado como crime contra a vida humana pelo
Código Penal Brasileiro, em vigor desde 1984, prevendo detenção de um a três
anos para a gestante que o provocar ou consentir que outro o provoque, de um
a quatro anos para quem provocá-lo em gestantes com seu consentimento e
de três a dez anos para quem o provocar em gestantes sem o seu
consentimento. Porém, não é qualificado como crime quando praticado por
médico capacitado em três situações: quando há risco de vida para a mulher
causado pela gravidez, quando a gravidez é resultante de um estupro ou se o
feto for anencefálico (desde decisão do STF pela ADPF 54, votada em 2012,
que descreve a prática como "parto antecipado" para fim terapêutico) Nesses
casos, o governo Brasileiro fornece gratuitamente o aborto legal pelo Sistema
Único de Saúde. Essa permissão para abortar não significa uma exceção ao
ato criminoso, mas sim uma escusa absolutória. Também não é considerado
crime o aborto realizado fora do território nacional do Brasil, sendo possível
realizá-lo em países que permitem a prática.