1. Invisibilidade social: outra forma de preconceito. Disponível em:
<Http://www.overmundo.com.br/overblog/invisibilidade-social-outra-forma-de-preconceito>
Vivian Fernanda Garcia da Costa
Mateus de Lucca Constantino
Ser invisível é sofrer a indiferença, é não ter importância. Essa maneira de
discriminação está cada vez mais inserida na sociedade.Segundo Gachet o preconceito
que gera invisibilidade se estende a tudo o que está fora dos padrões de vida das classes
hierarquicamente superiores. Muitos são os indivíduos que sofrem com a invisibilidade
social, como por exemplo, profissionais do sexo, pedintes, usuários de drogas,
trabalhadores rurais, portadores de necessidades especiais e homossexuais.
Conseqüências
A invisibilidade social provoca sentimentos de desprezo e humilhação em indivíduos
que com ela convivem. De acordo com Gachet ser invisível pode levar as pessoas a
processos depressivos. ‘Aparecer’ é ser importante para a espécie humana, ser
valorizado de alguma forma é parte integrante de nossa passagem pela vida, temos que
ser alguém, um bom profissional, um bom estudante, um bom pai, uma boa mãe, enfim,
desempenhar com louvor algum papel social”, diz.
Outra conseqüência dessa invisibilidade é a mobilização dos “invisíveis”, grupos de
pessoas que se juntam para conseguir “aparecer” perante a sociedade. Muitos são os
exemplos desses grupos: MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais sem terra), a
Central Única de Favelas (CUFA), fóruns nacionais, estaduais e municipais de defesa
dos direitos da criança e do adolescente. Esses grupos também podem ser encontrados
no crime organizado, o PCC (Primeiro Comando da Capital) e o CV (Comando
Vermelho).
A invisibilidade social já está cotidianamente estabelecida e a sociedade acostumou-se a
ela, passar por um pedinte na rua ou observar uma criança “cheirando cola” em uma
esquina é algo corriqueiro na vida social, segundo Gachet aceitar isso é violar os
direitos humanos. “É preciso não só
ver esses invisíveis, mas é preciso olhar para eles e sentir junto com eles, é preciso
‘colocar óculos em toda humanidade’”, finaliza.
Gente invisível. Disponível em:
<http://revistaepoca.globo.com/Epoca/0,6993,EPT764232-1664,00.html>
Gente invisível
PAULA MAGESTE
Psicólogo investiga a vida das pessoas que, ao vestir um uniforme, ganham
invisibilidade – são tratadas como se não existissem
2. Em novembro de 1994, o então estudante do 2º ano de Psicologia da
Universidade de São Paulo (USP)
Fernando Braga tornou-se invisível.
'Fiquei atordoado, não conseguia
sentir o gosto da comida, perdi meu
centro', lembra. Nem loucura nem
ficção científica. Braga atingiu a
invisibilidade ao vestir um uniforme
de gari. Como parte de um estágio
solicitado por uma das disciplinas que
cursava, ele resolveu acompanhar, de
duas a três vezes por semana, a rotina
dos garis da Cidade Universitária -
pegando no pesado junto com eles.
Ao vestir calça, camisa e boné como
seus colegas de 'varreção', esperava
causar espanto, curiosidade ou até mesmo indignação em seus amigos,
professores, companheiros de futebol e conhecidos da USP. No entanto, não
conseguiu nem mesmo receber um bom-dia. 'Atravessei o andar térreo da
Psicologia de ponta a ponta. Estava atento, buscava a expressão de surpresa
em alguém. Mas nada acontecia', conta. 'Deixei de esperar perguntas
intrigadas, mas ainda seria capaz de responder a algum cumprimento. Nada.'
Os professores com quem havia conversado pela manhã passaram por ele e
nem perceberam sua presença. Não é que tenha sido ignorado,
menosprezado, rejeitado. Pior: nem foi visto. Era como não estar lá; como
'não ser'.
O mal-estar experimentado por Braga jamais o abandonou. Ele passou os
nove anos seguintes trabalhando com os garis da USP e transformou em
tese de mestrado o indigesto tema da 'invisibilidade pública' - o
desaparecimento de um homem no meio de outros homens. Concluída em
2002, a tese agora vira livro lançado pela editora Globo.
Roberto Setton/ÉPOCA
ROTINA
Braga (terceiro da esq. para a dir.)
na ''varreção'' com os garis, até três
vezes por semana
3. Ironicamente, o psicólogo ganhou visibilidade
falando da invisibilidade, que, segundo ele, está
relacionada à divisão social do trabalho e afeta até
mesmo quem não é totalmente excluído
economicamente. Ela seria uma espécie de cegueira
psicossocial, que elimina do campo de visão da
maioria da população aqueles que são condenados a
exercer uma atividade subalterna, desqualificada,
desumanizante e degradante o dia inteiro, às vezes
uma vida inteira. É uma situação diferente da
contada pelo escritor americano Ralph Ellison, que
nos anos 50 lançou seu romance O Homem
Invisível. Ellison, negro, contava a história de um
descendente de escravos que ao percorrer os
Estados Unidos descobriu apenas que, por ser
negro, era ignorado - segundo ele, algo muito pior
que ser confrontado ou desprezado. Braga mostra
que, independentemente do preconceito racial, o
preconceito social também é tão incrível que leva a
simplesmente apagar pessoas do campo de visão.
'Nem na Suécia uma criança é incentivada pelos pais a ser gari, faxineiro ou
coveiro', provoca. 'Não tem a ver com salário, mas com a simbologia.'
Todo o mundo se sente invisível em algum momento da vida - numa festa
de gente de outra tribo, no emprego novo em que não se conhece ninguém.
Mas essas são outras invisibilidades, circunstanciais, e portanto passageiras,
reversíveis. O estudo de Braga é sobre uma invisibilidade tão automatizada
na sociedade que muitas vezes nem mesmo o ser invisível se dá conta de
sua degradante situação. 'Se ele percebe, carece de armas para o combate.
Depois de ser ignorado a vida inteira ou, no máximo, maltratado, ninguém
anda de cabeça erguida.'
TÍTULO
Homens Invisíveis: Relatos de uma
Humilhação Social
AUTOR
Fernando Braga
EDITORA
Globo
PÁGINAS
282
4. De fato, na maioria das vezes, o gari que limpa
nossa cidade só é notado quando falta ao serviço.
O ascensorista é tratado como uma máquina que
funciona por comando de voz, sem direito a 'por
favor' nem 'obrigado'. A empregada doméstica põe
o avental, alimenta a família e deixa a casa
organizada anos a fio, mas os patrões mal sabem
seu sobrenome, se tem filhos, se está com algum
problema. Os únicos cidadãos que vestem
uniforme para servir aos outros e ganham
visibilidade e reconhecimento são os que estão em
situação de poder sobre o interlocutor - médicos,
enfermeiros, policiais. 'Algumas profissões estão
num nível de rebaixamento absoluto', reforça
Braga. 'As pessoas estão habituadas a passar pelos
garis como quem passa por objetos', assinala.
Nilce de Paula, mineiro de 61 anos, confirma. Desde que chegou a São
Paulo, aos 18 anos, trabalhou em bar, restaurante, fez salgadinhos para
vender, foi ascensorista - de terno e gravata, orgulha-se - e carregou
contêineres de veneno. Já tinha experimentado o preconceito racial, mas a
indiferença mesmo só conheceu quando virou gari. 'Às vezes estou
trabalhando na avenida e passa uma pessoa. Mesmo que ela não me
cumprimente, eu cumprimento, porque um bom-dia não custa nada', afirma.
'O pior é quando os carros quase passam por cima da gente, sem nem tentar
desviar. A gente tem de trabalhar de frente para a avenida e se cuidar.'
A invisibilidade pública vem sempre na companhia da humilhação social, o
sofrimento pelo rebaixamento político, social e psicológico experimentado
continuamente por cidadãos de classes D e E. O conceito é recente e foi
cunhado por José Moura Gonçalves Filho, orientador de Braga. Afeta o
raciocínio, a visão e o afeto de quem é discriminado. 'O invisível não tem
voz, seu discurso não é levado em conta, sua opinião sobre o mundo não
importa. Ele aparece apenas como ferramenta', diz o psicólogo. Funcionária
de uma empresa terceirizada de limpeza, a baiana Sônia Aragão, de 34 anos,
veio para São Paulo em 1996, depois de ter passado pela lavoura, por
restaurantes e casas de família. Ter de usar uniforme foi um choque: 'Tem
gente que passa reto e faz de conta que não me vê. Eu mesma me sinto
estranha com esta roupa, porque parece que não sou eu. Quando não estou
de uniforme, pelo menos as pessoas me olham, mesmo que não falem
comigo', diz.
Otávio Dias de Oliveira/ÉPOCA
Roberto
Setton/ÉPOCA
'No dia em que fiquei
invisível, perdi o centro,
não conseguia sentir o
gosto da comida. Isso não
passa nunca, só piora'
FERNANDO BRAGA
psicólogo
5. 'Eu me sinto feia de
uniforme. Quando estou
de roupa, pelo menos as
pessoas me olham,
mesmo que não falem
comigo'
SÔNIA ARAGÃO,
34 anos, funcionária de
firma de limpeza
'Eu cumprimento
mesmo que a pessoa
não me olhe. Deve
ser alguma revolta.
Um bom-dia não
custa nada'
NILCE DE
PAULA,
61 anos, gari
6. 'Eu me sinto feia de
uniforme. Quando estou
de roupa, pelo menos as
pessoas me olham,
mesmo que não falem
comigo'
SÔNIA ARAGÃO,
34 anos, funcionária de
firma de limpeza
'Eu cumprimento
mesmo que a pessoa
não me olhe. Deve
ser alguma revolta.
Um bom-dia não
custa nada'
NILCE DE
PAULA,
61 anos, gari