Café com Seguro: Riscos Cibernéticos - Marcia Cicarelli
Parecer da PGR no sentido da anulação do ato de instituição e de todos os atos praticados pela CPI do DPVAT
1. Nº 161222/2016 – ASJCIV/SAJ/PGR
Mandado de Segurança 34229 – DF
Relator: Ministro Edson Fachin
Impetrantes: Sindicato das Empresas de Seguros Privados,
de Resseguros e de Capitalização dos Estados
do Rio de Janeiro e do Espírito Santo e outro
Impetrado: Presidente da Câmara dos Deputados
MANDADO DE SEGURANÇA. COMISSÃO PARLAMENTAR
DE INQUÉRITO. INVESTIGAÇÃO. DPVAT. FATO
DETERMINADO.AUSÊNCIA.
1 – Ante a possível quebra de simetria entre cargos de re-
levância na estrutura republicana e o seu correspondente
foro de julgamento, torna-se competente o Supremo Tribu-
nal Federal para conhecimento e julgamento de mandado
de segurança impetrado em face de ato realizado pelo Presi-
dente da Câmara dos Deputados.
2 – Reconhece-se aos órgãos jurisdicionais, sem ofensa ao
princípio da separação dos poderes, o encargo de realizar o
controle dos atos parlamentares, desde que limitado a verifi-
car a compatibilidade desses em face das disposições consti-
tucionais e não invada a seara da interpretação e aplicação
das normas regimentais, matéria interna corporis, e, por conse-
guinte, insuscetível de apreciação jurisdicional.
3 – A Constituição Federal, em seu art. 58, § 3º, delimita os
seguintes requisitos para a criação e instalação das comissões
parlamentares de inquérito: requerimento de pelo menos
um terço dos parlamentares, apuração de fato determinado
e duração a prazo certo.
4 – Na linha da jurisprudência do Supremo Tribunal Fede-
ral, a apuração de fato determinado tem, por si só, regulação
estritamente constitucional.
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2. PGR Mandado de Segurança 34229 – DF
5 – O fato determinado deve ser, desde o momento do re-
querimento de constituição da Comissão Parlamentar de
Inquérito, um fato específico, com parâmetros concretos e
individualizados, o qual, mesmo sendo plúrimo, esteja com-
posto de ocorrências que guardem conexão entre si.
6 – Parecer pela anulação do ato de instituição e formação
da CPI do DPVAT, exarado pelo Presidente da Câmara dos
Deputados, e, por derivação, de todos os atos praticados no
âmbito da comissão parlamentar de inquérito.
Trata-se de mandado de segurança, com pedido de medida
liminar, impetrado pelo Sindicato das Empresas de Seguros
Privados, de Resseguros e de Capitalização dos Estados do Rio de
Janeiro e do Espírito Santo e pela Federação Nacional das
Empresas de Seguros Privados, de Capitalização e de Previdência
Complementar Aberta (Fenaseg) em face do ato de acatamento do
Presidente da Câmara dos Deputados do Requerimento 19/2015,
que instaurou comissão parlamentar de inquérito, no âmbito da
Câmara dos Deputados, com o propósito de investigar alegadas
irregularidades relativamente à concessão de seguro de danos
pessoais/DPVAT decorrentes de acidentes automobilísticos, no
período compreendido entre os anos de 2000 a 2015.
De início, a impetração calca-se na ausência de fato ou con-
junto de fatos determinados que permitissem a criação de comis-
são com finalidade investigativa acerca da destinação financeira das
indenizações no âmbito do sistema DPVAT.
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3. PGR Mandado de Segurança 34229 – DF
Fundando-se no princípio da finalidade, os impetrantes de-
fendem que a previsão constitucional do fato determinado como
pressuposto para a formação de CPI, de um lado, torna funcional e
eficiente a investigação parlamentar e, de outro, promove a conten-
ção do poder estatal para que a comissão parlamentar não seja ins-
trumento de “devassa geral”.
Complementam o articulado com a conclusão de que a ado-
ção de um processo de investigação política pode ser tanto um
mecanismo direcionado à defesa da coisa pública, como se trans-
formar em arma para abusos, extorsões e achaques e que, portanto,
esse instrumento deve ser serviente do princípio republicano, so-
bretudo, a partir de apropriação de uma interpretação mais restri-
tiva dos requisitos constitucionais deflagradores de comissão
parlamentar de inquérito.
Adotando o presente caso como exemplo, o writ relata que o
requerimento de instauração da CPI foi de autoria da Deputada
Federal Raquel Muniz, cuja atuação na Câmara dos Deputados
não evidencia qualquer interesse sobre o tema, caracterizando
como singulares as circunstâncias de criação da comissão investiga-
tiva ante o fato de que o momento de sua aprovação pelo até en-
tão Presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, se
avizinhou da decisão do Supremo Tribunal Federal que, por una-
nimidade, suspendeu o exercício de seu mandato parlamentar.
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4. PGR Mandado de Segurança 34229 – DF
Acrescentam ainda que a conduta do Presidente da Câmara
dos Deputados afrontou a isonomia de tratamento entre casos se-
melhantes, na medida em que “adotou conduta absolutamente di-
versa da que vinha seguindo em situações similares, em que
indeferia sistematicamente a criação de investigações parlamenta-
res, quando não havia precisa indicação de fato determinado pelos
respectivos requerentes. E não foi aduzida qualquer razão para jus-
tificar a inequívoca diferença de tratamento”.
Antes de finalizar, fazem referência ao fato de que apenas as
seguradoras componentes do consórcio, administrado pela Segura-
dora Líder dos Consórcios do Seguro DPVAT S.A., suportam o
prejuízo de eventuais falhas de gestão ou fraudes, já que os fundos
utilizados para os ressarcimentos não são abastecidos por recursos
públicos.
Requereram, por fim, a concessão da segurança “para cassar o
ato coator que autorizou a instauração da Comissão Parlamentar
de Inquérito da Câmara dos Deputados, objeto do Requerimento
nº 19/2015, bem como todos os atos eventualmente já praticados
ligados a criação, instalação e funcionamento da referida CPI”.
Aportados os autos no Supremo Tribunal Federal, foi orde-
nada a notificação da autoridade coatora para prestar informações
na forma da lei.
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5. PGR Mandado de Segurança 34229 – DF
O Presidente da Casa Legislativa apresentou-as, exaltando os
seguintes posicionamentos: (i) a ilegitimidade ativa ad causam de
pessoas destituídas de mandato parlamentar para ajuizar mandado
de segurança com vistas a regularizar o trâmite do processo legisla-
tivo, a partir da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, sob
pena de instituir um controle preventivo de constitucionalidade de
atos legislativos; (ii) a existência de controvérsia fática acerca da
falta de isonomia entre os requerimentos de instauração de CPI,
dada a impossibilidade de adoção da via do mandado de segurança
para tal fim; (iii) a existência de fatos concretos a ensejar a investi-
gação parlamentar sobre o DPVAT, que consiste em contribuição
parafiscal, e sobre a atuação da Superintendência de Seguros Priva-
dos (Susep) e (iv) o efetivo preenchimento dos requisitos constitu-
cionais, “o que tornaria despicienda a tentativa de desqualificação
da Deputada Raquel Muniz, autora do pedido para a investigação
a ser encetada pela CPI do DPVAT, e do Deputado Eduardo Cu-
nha, enquanto exercia a Presidência desta Casa”.
Ordenada a intimação, os autos vieram à Procuradoria-Geral
da República, no curso do recesso forense, para confecção de pare-
cer no prazo de dez dias.
O mandado de segurança foi impetrado tempestivamente.
Conquanto o Requerimento 19 tenha sido apresentado em 9 de
dezembro de 2015, a análise de seu teor pelo Presidente da Câ-
mara dos Deputados foi realizada apenas em 4 de maio de 2016,
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6. PGR Mandado de Segurança 34229 – DF
tendo a sua publicação no Diário da Câmara dos Deputados ocor-
rida no dia seguinte (5)1
, momento a partir do qual é contado o
interstício decadencial previsto no art. 23 da Lei 12.016/2009.
Quanto à legitimidade dos impetrantes para a defesa dos in-
teresses dos substituídos processuais, tem-se por acolhida a repre-
sentatividade necessária para a consumação da substituição
processual, como se observa dos estatutos sociais da Fenaseg2
e do
Sindicato das Empresas de Seguros Privados3
, inclusive com dis-
1 Presumindo-se cientes os interessados.
2 Art. 1º – A Federação Nacional das Empresas de Seguros Privados, de Ca-
pitalização e de Previdência Complementar Aberta – Fenaseg, regida por
esta Estatuto Social e pelas disposições legais aplicáveis, doravante desig-
nada Fenaseg, […], é uma associação sindical de segundo grau, de atuação
e abrangência nacional, instituída para coordenar, proteger, congregar e re-
presentar os Sindicatos filiados e as categorias econômicas das empresas de
seguros privados, de capitalização e de previdência complementar aberta.
[…] Art. 2º – São objetivos institucionais e prerrogativas da Fenaseg: I –
Representar, no plano nacional, perante os Poderes Executivo, Legislativo e
Judiciário, os direitos e interesses das categorias econômicas a que se refer
o artigo 1º.
3 Art. 1º. O Sindicato das Empresas de Seguros Privados, de Resseguros e de
Capitalização dos stados do Rio de Janeiro e do Espírito Santo, [...], fun-
dado em 16 de maio de 1933, com prazo de duração por tempo indeter-
minado, tem por objetivo o estudo, coordenação, proteção e representação
legal da categoria econômica das empresas de seguros privados, inclusive as
seguradoras que operam no ramo vida e que tenham sido autorizadas a
operar, também, com previdência complementar aberta, de resseguros, e de
capitalização, tendo por base territorial interestadual os Estados do Rio de
Janeiro e do Espírito Santo, bem como o intuito de colaborar com os po-
deres públicos e as demais entidades de classe e associações, no sentido da
solidariedade social e da sua subordinação aos interesses nacional.
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7. PGR Mandado de Segurança 34229 – DF
pensa de instrumento de mandato4
para o patrocínio de ações ju-
diciais que tragam benefícios aos filiados.
A leitura dos respectivos estatutos permite referendar o nexo
temático que confere a necessária legitimidade extraordinária aos
impetrantes, reconhecendo-se a afinidade institucional de ambas as
pessoas coletivas, tal como já considerado pelo Supremo Tribunal
Federal em julgado de natureza tributária:
MANDADO DE SEGURANÇA COLETIVO - LEGITIMAÇÃO - NATUREZA
DO INTERESSE. O interesse exigido para a impetração de man-
dado de segurança coletivo há de ter ligação com o objeto
da entidade sindical e, portanto, com o interesse jurídico
desta, o que se configura quando em jogo a contribuição so-
cial sobre o lucro das pessoas juridicas prevista na Lei n.
7.689/88. Na espécie, a controvérsia está relacionada com a
própria atividade desenvolvida pelas empresas, o lucro obtido
e a incidência linear, considerada toda a categoria, da contri-
buição social. Portanto, se as atribuições do sindicato se fa-
zem em prol daqueles que congrega, forçoso é concluir pela
existência do indispensável nexo.
(RE 157234, Relator Min. MARCO AURÉLIO, Segunda Turma,
DJ 22 set. 1995)
Por fim, não se mostra infensa à ordem jurídico-processual a
possibilidade de pessoas coletivas (associações, sindicatos) pleitea-
rem em defesa dos respectivos substituídos no âmbito da formação
ou do trâmite de comissão parlamentar de inquérito, mormente
em fase embrionária do procedimento investigativo e sem um
acervo probatório consolidado.
4 Referenciado pelo art. 2º,VI, do estatuto social tanto do Sindicato das Em-
presas de Seguros Privados como da Fenaseg.
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8. PGR Mandado de Segurança 34229 – DF
Ponto relevante trata da competência do Supremo Tribunal
Federal para o conhecimento de mandado de segurança em face
de ato produzido pelo Presidente da Câmara dos Deputados.
Isso porque a atribuição constitucional do STF para o exame
de mandado de segurança, textualmente, restringe-se aos casos em
que a autoridade coatora for a Mesa da Câmara dos Deputados ou
a do Senado Federal,5
englobando-as em rol exaustivo ou de di-
reito estrito, conforme a jurisprudência da Corte.
É o que veio a concluir o STF, por ocasião do julgamento do
Mandado de Segurança 23977, no qual consignou ser da compe-
tência originária da primeira instância de jurisdição federal o man-
damus dirigido em face de ato exarado pelo Presidente da Câmara,
ante a literalidade do texto constitucional:
COMPETÊNCIA. Originária. Não caracterização. Mandado de
segurança. Impetração contra ato omissivo do presidente da
Câmara dos Deputados. Omissão não imputável à Mesa da
Câmara. Feito da competência da Justiça Federal. Pedido não
conhecido. Interpretação do art. 102, I, "d", da CF. Prece-
dente. Não compete ao Supremo, mas à Justiça Federal, co-
nhecer de mandado de segurança impetrado contra ato,
omissivo ou comissivo, praticado, não pela Mesa, mas pelo
presidente da Câmara dos Deputados.
5 Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda
da Constituição, cabendo-lhe: I - processar e julgar, originariamente: […]
d) o habeas corpus, sendo paciente qualquer das pessoas referidas nas alí-
neas anteriores; o mandado de segurança e o habeas data contra atos do
Presidente da República, das Mesas da Câmara dos Deputados e do Se-
nado Federal, do Tribunal de Contas da União, do Procurador-Geral da
República e do próprio Supremo Tribunal Federal; [...]
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9. PGR Mandado de Segurança 34229 – DF
(MS 23977, Relator Min. CEZAR PELUSO (Presidente),Tribu-
nal Pleno, DJe-159 de 26 ago. 2010)
Contudo, em revisão da tese, o Supremo Tribunal Federal,
ante a dignidade do cargo de chefe da Casa Legislativa e dos am-
plos poderes a ele incumbidos pelo respectivo regimento interno,
concluiu haver uma quebra de simetria entre cargos de relevância
na estrutura republicana e o seu correspondente foro de julga-
mento.
Em seu voto, proferido nos autos do MS 28538, impetrado
contra ato do Presidente do Senado Federal que resultou na de-
missão de Diretor da Secretaria de Recursos Humanos dessa Casa
Legislativa, o Ministro Marco Aurélio, relator do caso, consignou
que “não desconheço que a alínea d do inciso I do art. 102 da Constitui-
ção de 1988 versa caber ao Supremo o julgamento de mandado de segu-
rança contra ato do Presidente da República, das Mesas da Câmara dos
Deputados e do Senado Federal, do Tribunal de Contas da União, do
Procurador-Geral da República e do próprio Tribunal. O que imprimo ao
preceito é uma interpretação integrativa ao admitir a impetração contra
aquele que personifica, em termos até mesmo maiores, como ressaltei no
voto, a própria Casa Legislativa, no caso, o Presidente do Senado Federal.
Então, a interpretação que faço do dispositivo é uma interpretação teleoló-
gica. Busco o objetivo da norma”.
A ementa desse julgado caracteriza com mais precisão a tese
adotada pela Suprema Corte:
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10. PGR Mandado de Segurança 34229 – DF
COMPETÊNCIA – MANDADO DE SEGURANÇA – ATO DO PRESIDENTE
DO SENADO FEDERAL.A interpretação sistemática, teleológica e
integrativa da Constituição Federal revela a competência do
Supremo para julgar mandado de segurança contra ato do
Presidente do Senado Federal. MANDADO DE SEGURANÇA –
PROVA. O mandado de segurança não viabiliza a fase proba-
tória, devendo vir com a inicial os elementos de convicção
quanto à ofensa a direito líquido e certo. PROCESSO
ADMINISTRATIVO-FUNCIONAL – REGULARIDADE. Observados os
parâmetros legais, tem-se como regular processo administra-
tivo-funcional voltado à definição de infração por servidor
público.
(MS 28538, Relator Min. MARCO AURÉLIO, Tribunal Pleno,
DJe-149 de 1º ago. 2014)
Superado qualquer questionamento acerca da competência
da Corte para o exame da presente controvérsia e a legitimidade
ativa, procede-se à averiguação do tema central.
Todavia, não é permitido ao órgão ministerial furtar-se à ca-
racterização do ato coator.
A postulação, inequivocamente, qualifica como coator o ato
da Presidência da Câmara dos Deputados que formaliza a criação
da comissão parlamentar para investigar “denúncias e supostas
irregularidades na concessão do seguro de danos pessoais causados
por veículos automotores de vias terrestres – DPVAT”.
Diversamente do que pode levar a crer, esse ato não é mera-
mente declaratório da abertura da CPI. Nele se concentram a
oportunidade, a conveniência e a verificação dos requisitos consti-
tucionais e regimentais para a criação da comissão pelo chefe da
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11. PGR Mandado de Segurança 34229 – DF
Casa Legislativa. Portanto, embora sucinta a sua redação, o citado
ato equivale a uma autorização formal para que a Câmara dos De-
putados, por meio de uma comissão, deflagre um procedimento
investigatório a respeito do tema ali descrito.
Essa constatação pode ser comprovada pela redação do art.
35, § 2º, do Regimento Interno da Câmara dos Deputados:
Art. 35. […] § 2º Recebido o requerimento, o Presidente o
mandará a publicação, desde que satisfeitos os requisitos regi-
mentais; caso contrário, devolvê-lo-á ao Autor, cabendo des-
ta decisão recurso para o Plenário, no prazo de cinco sessões,
ouvida a Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania.
O dispositivo permite concluir que, apenas ao exclusivo juízo
do Presidente da Casa Legislativa, o requerimento de abertura da
CPI poderia ser publicado, após, por óbvio, da análise dos requisi-
tos regimentais para a sua admissibilidade. A eventual negativa de
prosseguimento do requerimento parlamentar ensejaria a interpo-
sição de recurso para o plenário da Câmara dos Deputados, a teor
do § 3º desse mesmo artigo.
Desse modo, não pode proceder qualquer justificativa no sen-
tido de que o mencionado ato possuiria natureza vinculada a des-
naturar a sua essência potencialmente coatora, pois não reside
dúvida quanto ao realizado juízo de ponderação do Presidente da
Câmara dos Deputados para aquilatar a existência e a satisfação dos
requisitos para admissão do pedido de instalação da comissão par-
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12. PGR Mandado de Segurança 34229 – DF
lamentar de inquérito, estando apto a ser impugnado pelo presente
writ.
Assentada essa premissa e delimitada a caracterização do ato
apontado como coator, importa verificar os limites da atuação do
SupremoTribunal Federal e o substrato de mérito.
Reiteradamente, a Suprema Corte afirma que o Poder Judici-
ário pode, sem ofensa ao princípio da separação dos poderes, reali-
zar o controle dos atos parlamentares, desde que se limite a
verificar a compatibilidade destes em face das disposições constitu-
cionais e não invada a seara da interpretação e aplicação das nor-
mas regimentais, matéria interna corporis, e, por conseguinte,
insuscetível de apreciação jurisdicional6
.
Quanto à competência do STF para conhecer do presente
mandado de segurança e adentrar o mérito do debate, a matéria
trazida à colação vai além da mera exegese do Regimento Interno
da Câmara dos Deputados. Há reflexos diretos na realização do
preceito constitucional que assegura a instauração de comissões
parlamentares de inquérito hígidas para a investigação de fatos de-
terminados e específicos, de modo a contribuir para uma dialética
construtiva com as demais instâncias públicas de controle e para a
utilização mais seletiva e eficaz desse instrumento investigatório,
6 Nesse sentido: MS 33.353 (Relator o Min. Celso de Mello, DJe 30 jan.
2015); MS 24.849 (Relator o Min. CELSO DE MELLO, DJ 29 set. 2006); e
MS 24.831 (Relator o Min. CELSO DE MELLO, DJ 4 ago. 2006).
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13. PGR Mandado de Segurança 34229 – DF
notadamente relevante para o desempenho da função fiscalizadora
do Poder Legislativo.
O Supremo Tribunal Federal, aliás, tem orientação sedimen-
tada especificamente sobre a possibilidade de controle jurisdicional
dos atos legislativos relacionados à instalação e funcionamento das
Comissões Parlamentares de Inquérito, conforme se extrai da se-
guinte ementa:
COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUÉRITO - DIREITO DE OPOSIÇÃO -
PRERROGATIVA DAS MINORIAS PARLAMENTARES - EXPRESSÃO DO
POSTULADO DEMOCRÁTICO - DIREITO IMPREGNADO DE ESTATURA
CONSTITUCIONAL - INSTAURAÇÃO DE INQUÉRITO PARLAMENTAR E
COMPOSIÇÃO DA RESPECTIVA CPI - TEMA QUE EXTRAVASA OS
LIMITES "INTERNA CORPORIS" DAS CASAS LEGISLATIVAS -
VIABILIDADE DO CONTROLE JURISDICIONAL - IMPOSSIBILIDADE DE A
MAIORIA PARLAMENTAR FRUSTRAR, NO ÂMBITO DO CONGRESSO
NACIONAL, O EXERCÍCIO, PELAS MINORIAS LEGISLATIVAS, DO DIREITO
CONSTITUCIONAL À INVESTIGAÇÃO PARLAMENTAR (CF, ART. 58, §
3º) - MANDADO DE SEGURANÇA CONCEDIDO. CRIAÇÃO DE
COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUÉRITO: REQUISITOS
CONSTITUCIONAIS.
- O Parlamento recebeu dos cidadãos, não só o poder de re-
presentação política e a competência para legislar, mas, tam-
bém, o mandato para fiscalizar os órgãos e agentes do Estado,
respeitados, nesse processo de fiscalização, os limites materiais
e as exigências formais estabelecidas pela Constituição Fede-
ral. - O direito de investigar - que a Constituição da Repú-
blica atribuiu ao Congresso Nacional e às Casas que o
compõem (art. 58, § 3º) - tem, no inquérito parlamentar, o
instrumento mais expressivo de concretização desse relevan-
tíssimo encargo constitucional, que traduz atribuição ine-
rente à própria essência da instituição parlamentar. - A
instauração do inquérito parlamentar, para viabilizar-se no
âmbito das Casas legislativas, está vinculada, unicamente, à
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14. PGR Mandado de Segurança 34229 – DF
satisfação de três (03) exigências definidas, de modo taxativo,
no texto da Carta Política: (1) subscrição do requerimento
de constituição da CPI por, no mínimo, 1/3 dos membros
da Casa legislativa, (2) indicação de fato determinado a ser
objeto de apuração e (3) temporariedade da comissão parla-
mentar de inquérito. - Preenchidos os requisitos constitucio-
nais (CF, art. 58, § 3º), impõe-se a criação da Comissão
Parlamentar de Inquérito, que não depende, por isso mesmo,
da vontade aquiescente da maioria legislativa. Atendidas tais
exigências (CF, art. 58, § 3º), cumpre, ao Presidente da Casa
legislativa, adotar os procedimentos subsequentes e necessá-
rios à efetiva instalação da CPI, não lhe cabendo qualquer
apreciação de mérito sobre o objeto da investigação parla-
mentar, que se revela possível, dado o seu caráter autônomo
(RTJ 177/229 - RTJ 180/191-193), ainda que já instaura-
dos, em torno dos mesmos fatos, inquéritos policiais ou pro-
cessos judiciais. […] O CONTROLE JURISDICIONAL DOS ATOS
PARLAMENTARES: POSSIBILIDADE, DESDE QUE HAJA ALEGAÇÃO DE
DESRESPEITO A DIREITOS E/OU GARANTIAS DE ÍNDOLE
CONSTITUCIONAL. - O Poder Judiciário, quando intervém para
assegurar as franquias constitucionais e para garantir a inte-
gridade e a supremacia da Constituição, desempenha, de ma-
neira plenamente legítima, as atribuições que lhe conferiu a
própria Carta da República, ainda que essa atuação instituci-
onal se projete na esfera orgânica do Poder Legislativo. -
Não obstante o caráter político dos atos parlamentares, re-
vela-se legítima a intervenção jurisdicional, sempre que os
corpos legislativos ultrapassem os limites delineados pela
Constituição ou exerçam as suas atribuições institucionais
com ofensa a direitos públicos subjetivos impregnados de
qualificação constitucional e titularizados, ou não, por mem-
bros do Congresso Nacional. Questões políticas. Doutrina.
Precedentes. - A ocorrência de desvios jurídico-constitucio-
nais nos quais incida uma Comissão Parlamentar de Inqué-
rito justifica, plenamente, o exercício, pelo Judiciário, da
atividade de controle jurisdicional sobre eventuais abusos le-
gislativos (RTJ 173/805-810, 806), sem que isso caracterize
situação de ilegítima interferência na esfera orgânica de ou-
tro Poder da República. [...]
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15. PGR Mandado de Segurança 34229 – DF
(MS 24831, Relator Min. Celso de Mello, Tribunal Pleno,
DJ 4 ago. 2006) (sublinhado não original)
Nesse passo, não se sustenta qualquer argumento em defesa
do ato que busque desqualificar ou impedir a atuação do STF, por
afirmar que a discussão aqui tratada envolva, exclusivamente, as-
sunto próprio da corporação legislativa (interna corporis).
O poder de investigação pelas casas legislativas do Congresso
Nacional é inerente ao Estado Democrático de Direito. Como as-
sinalado por Laurence H. Tribe, ao tratar do instituto no direito
norte-americano, tal poder, embora não esteja explicitado na
Constituição dos Estados Unidos da América, configura poder im-
plícito e ancilar, encontrando-se relacionado aos poderes de autor-
regulação do Legislativo e de reconhecimento do impedimento de
altas autoridades, constituindo-se auxiliar essencial da função legis-
lativa, por sua capacidade de abordar e aprofundar questões de in-
teresse nacional7
.
7 The power of Congress to investigate.The remainder of this chapter will be de-
voted to the most familiar congressional role of all: that of making national law. But
before beginning this analysis, it is important to note an implicit or ancillary power
belonging to Congress that is at times every bit as important as the power to which
it is supposedly and most dramatically exemplified by hearings, some of them in
executive session but most of them in the glare of the klieg lights and with the na-
tion watching. Such investigations have served an important role in ventila-
ting issues of profound national concern. In fact, the modern function of
hearings is often simply to focus the national attention and place a pressing issue on
the nation's agenda. Some might say that, in certain legislative sessions, such consci-
ousness-raising ranks among Congress' most constructive accomplishments. Even if
no particular legislation is in view or results from such airing of the nation's laun-
dry, there is as a constitutional matter nothing inherently objectionable about such
uses of the congressional investigatory power, although in extreme cases of exposure
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16. PGR Mandado de Segurança 34229 – DF
Tanto a jurisprudência quanto a doutrina norte-americanas
ressaltam a importância de se observar, no exercício das atividades
das comissões de investigação, regras de devido processo legal, em
especial quanto à delimitação do objeto da investigação e quanto
aos direitos dos investigados. Neste sentido, voto do juiz Van De-
vanter na Suprema Corte norte-americana, no caso McGrain v.
Daugherty, 273 U.S. 135, 174-175 (1927)8
.
Alegam as pessoas coletivas impetrantes, como ponto central
da impugnação, a inexistência de fato determinado e específico a
dar ensejo à criação da comissão investigativa. E parecem ter razão
em seus fundamentos.
A Constituição Federal, em seu art. 58, § 3º, delimita os se-
guintes requisitos para a criação e instalação das comissões parla-
mentares de inquérito: requerimento de pelo menos um terço dos
parlamentares, apuração de fato determinado e duração a prazo
certo. Esses requisitos representam as feições básicas de toda comis-
são parlamentar de inquérito: (i) a necessária representatividade, o
for exposure's sake in might constitute a kind of legislative punishment, even if not
quite trial by legislature and a bill of attainder.Although congressional authority
to conduct investigations, and in the process to compel testimony, is not ex-
plicitly recognized by the Constitution, this power is of course necessary in
connection with Congress' quasi-judicial powers of impeachment and self-
regulation. (TRIBE, Laurence H. American Constitutional Law, vol. 1,
2000, p. 790-791, negritos acrescidos).
8 Disponível em: http://supreme.justia.com/us/273/135/case.html. Acesso
em: 21 jun. 2015. Também Atkins v. United States, 354 U.S. 178, 187
(1957)., Barenblatt v. United States, 360 U.S. 109, 111 (1959) e Eastland v.
United States Servicemen’s Fund, 421 U.S. 491, 503–507 (1975).
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17. PGR Mandado de Segurança 34229 – DF
que acaba por delimitar o desejo político de um número conside-
rável de parlamentares, mas que não expresse necessariamente a
maioria congressual; (ii) a existência de um assunto real e delimi-
tado a ser investigado, sob pena de falhar nesse propósito em razão
da excessiva abstração e (iii) por ser uma comissão temporária e
com objetivos rigidamente definidos, é essencial a prévia demarca-
ção temporal de sua atuação.
É de se reconhecer, portanto, que a apuração de fato deter-
minado tem, por si só, regulação estritamente constitucional, con-
forme já reconhecido pela Supremo Corte (MS 22.484, Relator o
Min. MAURÍCIO CORRÊA, DJ 7 fev. 1997 e MS 32.885, Relatora a
Min. ROSA WEBER, DJ 25 abr. 2014).
Muito embora a Constituição não explicite o que vem a ser
fato determinado, é assente que por determinado tem-se aquele
acontecimento relevante que se revista de implicações para a vida
pública e para a ordem constitucional, legal, econômica e social do
país, na forma delineada pelo art. 35, § 1º, do Regimento Interno
da Câmara dos Deputados9
.
O fato determinado deve ser, desde o momento do requeri-
mento de constituição da Comissão Parlamentar de Inquérito, um
fato específico, com parâmetros concretos e individualizados, o
9 Art. 35 […] § 1º Considera-se fato determinado o acontecimento de rele-
vante interesse para a vida pública e a ordem constitucional, legal, econô-
mica e social do País, que estiver devidamente caracterizado no
requerimento de constituição da Comissão.
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18. PGR Mandado de Segurança 34229 – DF
qual, mesmo sendo plúrimo, esteja composto de ocorrências que
guardem conexão entre si.
Nesse sentido decidiu a Ministra ROSA WEBER, no supracitado
Mandado de Segurança 32885:
A atenta leitura do preceito constitucional (art. 58, § 3º, da
Lei Maior) – a reverenciar, em sua concepção, a teleologia
do instituto, e sem ignorar, em sua prudência, os consensos,
tradições e pressupostos resultantes da secular prática das
CPIs -, autoriza, a meu juízo, a convicção de que a exigência
de 'fato determinado' implica vedação a que se instale CPI
para investigar fato genérico, difuso, abstrato ou de contor-
nos indefinidos. Fato determinado, unitário ou múltiplo, é
aquele devidamente descrito no requerimento que dá ori-
gem à CPI com objetividade suficiente para permitir o ade-
quado desenvolvimento da missão confiada à Comissão de
Inquérito. (DJ 25 abr. 2014).
Leciona Anna Candida da Cunha Ferraz que não se pode
instalar Comissão Parlamentar de Inquérito para averiguação de
fatos genéricos, sem contornos delimitados ou para investigar cri-
ses em abstrato. Afirma também que “o fato determinado a ser objeto
de controle da CPI, no sistema constitucional brasileiro, deve relacionar-se
com as competências do Congresso Nacional e de suas câmaras, vale dizer,
deve referir-se a uma atribuição constitucional específica e própria do Poder
Legislativo”10
.
10 FERRAZ, Anna Candida da Cunha. Comentário ao art. 58, §3º, da
Constituição Federal de 1988, in Comentários à Constituição do
Brasil/J.J. Gomes Canotilho [et.al.]. São Paulo: Saraiva/Almedina, 2013, p.
1112-1113.
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19. PGR Mandado de Segurança 34229 – DF
É possível, então, sustentar que o fato determinado deve ser
dotado de concretude, relevância social e individualização suficien-
temente objetivas para ser investigado, no prazo determinado, pela
Comissão Parlamentar de Inquérito.
No caso presente, o requerimento de criação da CPI foi redi-
gido nos seguintes termos:
Nos termos § 3º do artigo 58 da Constituição Federal, com-
binado com o artigo 35 do Regimento Interno da Câmara
dos Deputados, requeremos a Vossa Excelência a instituição
de Comissão Parlamentar de Inquérito com a finalidade de
investigar denúncias e possíveis irregularidades na concessão
do seguro de danos pessoais causados por veículos automo-
tores de vias terrestres (DPVAT) nas unidades da federação,
no período compreendido entre 2000 e 2015. A Comissão
será composta por 15 membros e igual número de suplentes,
e terá o prazo de 120 dias, prorrogável para conclusão dos
seus trabalhos. Os recursos financeiros e administrativos, bem
como o assessoramento necessário ao funcionamento desta
Comissão, serão providos por recursos orçamentários da Câ-
mara dos Deputados.
JUSTIFICAÇÃO
Instituído pela Lei nº 6.194, de 1974, o seguro de danos pes-
soais causados por veículos automotores de vias terrestres
passou a ser obrigatório a todos os proprietários de veículos
automotores sujeitos a registro e licenciamento. A finalidade
do seguro é prestar indenização rápida às vitimas de trânsito,
com cobertura para os riscos de morte, invalidez perma-
nente e despesas médicas e suplementares.
O Código de Trânsito Brasileiro, em seu artigo 78, parágrafo
único, determina o repasse de 10% (dez por cento) dos re-
cursos destinados à Previdência Social ao Coordenador do
Sistema Nacional de Trânsito, para aplicação exclusiva em
programas destinados à prevenção de acidentes.
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Apesar da sua inegável importância social, o DPVAT en-
contra-se em uma situação de quase descalabro e enfrenta
uma onda geral de descrédito que já motiva muitos setores a
proporem sua extinção, por considerá-lo uma contribuição
inútil, que beneficia apenas um grupo de seguradoras.
Denúncias mostram que o DPVAT tem sido objeto de ação
de quadrilhas e bandos criminosos, que intervêm como fal-
sos despachantes e intermediários, agindo no processo de
cobranças das indenizações para lesar os verdadeiros benefi-
ciários do seguro, as vítimas e herdeiros das vítimas de aci-
dentes de trânsito.
Em 13 de abril do corrente ano, o portal do G1 publicou
matéria relatando como se deu a operação “Tempo de Des-
pertar”, que foi deflagrada pela Polícia Federal nos Estados
da Bahia, Rio de Janeiro e Minas Gerais:
“A PF estima que a fraude pode chegar a R$ 28 mi-
lhões, e os primeiros levantamentos mostram que já fo-
ram pagos R$ 25 milhões indevidamente. Segundo a
polícia, 39 pessoas já foram presas – entre elas 10 agen-
tes e um delegado da Polícia Civil, um policial militar,
oito advogados, três médicos, dois fisioterapeutas e 14
empresários. Segundo a investigação, o grupo crimi-
noso usava várias maneiras para fraudar o seguro, como
falsificação de assinaturas em procurações e declaração
de residência falsa. Em alguns casos, o pagamento do
seguro era autorizado mesmo sem a documentação ne-
cessária ou com base em laudos médicos e ocorrências
policiais falsificadas.”
http://g1.globo.com/mg/grande-minas/noticia/
2015/04/operacao-da-pf-combate-fraudes-no-seguro-
dpvat-em-tres-estados.html
Lamentamos, ainda, a visível inoperância da Superintendên-
cia de Seguros Privados no que tange a prevenção das frau-
des e solução de conflitos que envolvem o DPVAT, razão
pela qual entendemos que somente a imediata e enérgica
ação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito é que tere-
mos condições de discutir uma solução viável para um pro-
blema que atinge milhões de brasileiros.
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21. PGR Mandado de Segurança 34229 – DF
Desta forma, a fim de que sejam adotadas providências e
medidas necessárias para uma elucidativa investigação, solici-
tamos o apoio dos nobres Pares para a instituição da referida
Comissão Parlamentar de Inquérito no âmbito da Câmara
dos Deputados.
Da exposição do objeto da investigação acima transcrita, per-
cebe-se a impossibilidade de se identificar fato determinado apto a
ser averiguado pela comissão parlamentar.
Não se nega a possibilidade de ocorrerem irregularidades em
procedimentos de averiguação de sinistros no âmbito do DPVAT e
de pagamentos, tudo em descompasso com a legislação aplicável,
contudo, o objetivo da CPI, tal como posto no Requerimento
19/2015, é instaurar uma amplíssima investigação desvinculada de
fatos efetivamente convincentes da ruína desse sistema solidário de
seguro de vida.
Faz o documento menções vagas acerca de denúncias sobre a
ação de quadrilhas especializadas que, utilizando-se de falsos des-
pachantes, agiriam na cobrança de indenizações para lesão os ver-
dadeiros beneficiários da indenização do seguro.
Aproveitando-se de uma publicação jornalística referente à
deflagração de operação policial, denominada Tempo de Despertar,
pela Polícia Federal, o requerimento de criação da CPI faz alusão
a diversas pessoas que se consorciaram para a prática de engodo
dos beneficiários do seguro e o saque indevido das corresponden-
tes indenizações.
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22. PGR Mandado de Segurança 34229 – DF
Embora sejam eventos revestidos de certa gravidade, esses não
podem suprir a exigência constitucional do fato determinado e
tampouco, a criação de uma comissão parlamentar de inquérito.
O Procurador-Geral da República, no Parecer 87430/2016 –
ASJCIV/SAJ/PGR, recém-exarado nos autos do Mandado de Se-
gurança 3363511
, definiu-se pela insuficiência de referência a re-
portagens jornalísticas como motivação para a decretação de
quebra de sigilo de investigado por comissão parlamentar de in-
quérito, evidenciando que a narrativa excessivamente genérica é
incapaz de conduzir a fatos que possam ser objetivamente esqua-
drinhados pelo órgão de fiscalização.
A bem da verdade, se com base em meras afirmações da im-
prensa, houve entendimento ministerial pela anulação de delibera-
ção de quebra de sigilo, que, sem dúvida, é ato acessório e
instrumental de uma comissão parlamentar de inquérito já consti-
tuída, um senso médio de coerência reconheceria haver razões
mais robustas para a vedação para instalação da própria CPI com
apoio nesses mesmos indícios. Se, nesse caso, a medida de quebra
de sigilo, aplicada a poucos investigados, já deve ser considerada
imprópria, quanto mais a instauração de apuração destituída de li-
mites quanto ao objeto da investigação ou mesmo aos potenciais
investigados.
11 A propósito, essa tese foi acolhida pelo Ministro Celso de Mello que deci-
diu pela concessão da segurança e a invalidação da deliberação da CPI que
ordenou a quebra de sigilo dos impetrantes.
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23. PGR Mandado de Segurança 34229 – DF
Isso porque a matéria jornalística, além de não constituir tec-
nicamente fato determinado para os fins de constituição de uma
comissão investigativa, porquanto mero exemplo das irregularida-
des abordadas, funciona como elemento de persuasão para a atua-
ção do Poder Legislativo sobre um sistema cujo problema é
essencialmente combatido por forças policiais.
O próprio caso retratado na reportagem evidencia essas ca-
racterísticas, uma vez que os envolvidos no esquema criminoso
não laboravam em seguradoras12
e os ardis aplicados nas vítimas
eram oriundas de falhas nas operações de pagamentos dos seguros.
As justificativas do requerimento sequer abordaram em que
sentido a atuação parlamentar poderia contornar as alegadas im-
perfeições ou evitar que esse sistema público de seguro de vida
deixasse de ser alvo de pessoas mal intencionadas. Conquanto seja
reconhecido o caráter social do DPVAT13
e a sua relevância à luz
do princípio da solidariedade, o requerimento de abertura da CPI
deixou de contemplar, em face da explícita natureza criminal dos
ilícitos cometidos contra a organização securitária, as possíveis for-
12 “A PF estima que a fraude pode chegar R$ 28 milhões, e os primeiros le-
vantamentos mostram que foram pagos R$ 25 milhões indevidamente. Se-
gundo a polícia, 39 pessoas já foram presas – entre elas 10 agentes e um
delegado da Polícia Civil, um policial militar, oito advogados, três médicos,
dois fisioterapeutas e 14 empresários.”
13 Tal como reconhecido pela Procuradoria-Geral da República, no Parecer
4473 – RJMB/pc, da lavra do atual Chefe do Ministério Público Federal,
vertido nos autos do Recurso Extraordinário 631111.
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24. PGR Mandado de Segurança 34229 – DF
mas de atuação ou vertentes de trabalho a serem adotadas pela
Casa Legislativa.
Evidencia-se, portanto, que os fatos indicados no
Requerimento 19/2015 não atendem às exigências quanto a
concretude e individualização dos acontecimentos para os quais se
postula investigação, vício que contamina a própria existência da
CPI do DPVAT.
De mais a mais, desincumbiram-se os impetrantes, na pre-
sente via, de demonstrar, objetivamente, que o ato apontado como
coator realmente desatendeu aos requisitos constitucionais e regi-
mentais exigidos, evidenciando-se a generalidade e a abstração dos
fatos que deram ensejo à instalação da CPI.
Ante o exposto, opina a Procuradoria-Geral da República
pela anulação do ato de instituição e formação da CPI do DPVAT,
exarado pelo Presidente da Câmara dos Deputados, e, por deriva-
ção, de todos os atos praticados no âmbito da comissão parlamen-
tar de inquérito.
Brasília (DF), 15 agosto de 2016.
Rodrigo Janot Monteiro de Barros
Procurador-Geral da República
JCCR/UASJ
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