1) O promotor de justiça propõe uma ação civil pública contra um servidor público municipal e o secretário de educação do município.
2) O servidor utilizou indevidamente um ônibus escolar municipal para transportar manifestantes de uma greve, com a autorização do secretário.
3) Essa conduta configura ato de improbidade administrativa por utilizar bens públicos para fins particulares, conforme a Lei de Improbidade Administrativa.
Ação Civil Pública com pedido de tutela de urgência para que o Estado estenda...
Ação contra servidor e secretário por uso irregular de ônibus escolar
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1 11-
EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ DE DIREITO DA 2ª VARA DA COMARCA DE
IMBITUBA/SC
O MINISTÉRIO PÚBLICO DE SANTA CATARINA, por seu Órgão de
Execução, com fundamento no artigo 129, III, da Constituição Federal; artigo 5° da Lei
n. 7.347/85; artigo 90, inciso VI, Lei Complementar Estadual n. 738/2019 e, ainda, com
base nos documentos que instruem a Notícia de Fato n. 01.2019.00003224-4, entre
outros, vem, à presença de Vossa Excelência, propor
AÇÃO CIVIL PÚBLICA
contra EDER SILVA DA SILVEIRA, brasileiro, servidor público
municipal, RG n. 4159680/SC, residente e domiciliado na Estrada Geral do Sambaqui
(rua da empresa Refisa), s/n., (próximo à Marmoraria do Edacir), em Imbituba/SC; e
contra FILIPE DIAS ANTÔNIO, brasileiro, advogado, RG n.
3591111/SC, residente e domiciliado na Rua Antônio Paes, n. 323, Paes Leme, em
Imbituba/SC, em razão dos seguintes fatos e fundamentos, que passa a expor:
1 LEGITIMIDADE ATIVA
O Ministério Público, ex vi da definição insculpida no artigo 127, caput,
da Constituição Federal, "é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do
Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos
interesses sociais e individuais indisponíveis".
Com efeito, a atuação do Parquet, presentemente corolário do
alargamento de suas atribuições constitucionais, se faz intensa em áreas
estrategicamente importantes para a sociedade, notadamente na seara do meio
ambiente, da moralidade administrativa e na defesa dos interesses coletivos, difusos e
individuais indisponíveis.
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Para tanto, o legislador pátrio, não sem tempo, e num lampejo de rara
felicidade, deu à luz a Lei Federal nº 7.347/85, ofertando à sociedade o instrumento
processual da ação civil pública, no bojo da qual encomendou a composição judicial de
seus interesses mais prementes, confiando ao Ministério Público e a outras entidades
especificadas no artigo 5º a difícil, porém honrosa, legitimação ativa para a condução e
tutela desses elevados interesses em juízo.
Como se verifica, resta plenamente demonstrada a legitimidade ativa do
Ministério Público no ajuizamento da presente demanda, ainda mais se for levada em
conta toda a legislação que alicerça esse entendimento: arts. 127 e 129, inciso III, da
Constituição da República de 1988; art. 25, inciso IV, alínea “b”, da Lei n. 8.625/93; art.
82, inciso VI, alínea “d”, da Lei Complementar Estadual n. 197/2000; art. 1º inciso IV e
art. 5º, ambos da lei n.º 7.347/85; e, arts. 4º e 17, ambos da Lei n. 8.429/92.
Além disso, o Superior Tribunal de Justiça editou o enunciado de
Súmula n. 329, no seguinte sentido: “O Ministério Público tem legitimidade para propor
ação civil pública em defesa do patrimônio público”.
Destarte, cuidando-se de ação civil pública de reparação de dano e de
responsabilidade por ato de improbidade administrativa, é inquestionável a legitimidade
do Ministério Público, a qual advém do bem jurídico tutelado, que é a probidade do
administrador ou servidor público na gestão da res de todos, estando flagrante o
interesse difuso e indisponível.
2 LEGITIMIDADE PASSIVA
A Lei n. 8.429/92 apresenta-se como valioso instrumento de combate
aos atos ímprobos praticados não só por agentes públicos, como também por aqueles
que concorrem, induzem ou se beneficiam de alguma forma com a prática de atos que
importam em enriquecimento ilícito, são lesivos ao patrimônio público ou que atentam
contra os Princípios da Administração Pública.
A intenção buscada pelo legislador ao ampliar os horizontes do alcance
da ação por ato de improbidade administrativa demonstra o comprometimento para com
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o patrimônio público, possibilitando a responsabilização e o ressarcimento em desfavor
de qualquer pessoa que tenha causado o dano, exigindo apenas que possua algum
vínculo com a Administração Pública, seja por nomeação, eleição, designação,
contratação ou qualquer outra forma de investidura.
O art. 2º da Lei de Improbidade Administrativa dá o conceito de agente
público:
Art. 2º Reputa-se agente público, para os efeitos desta lei, todo aquele
que exerce, ainda que transitoriamente ou sem remuneração, por
eleição, nomeação, designação, contratação ou qualquer outro forma de
investidura ou vínculo, mandato, cargo, emprego ou função nas
entidades mencionadas no artigo anterior.
Nesse ponto, os réus EDER e FILIPE estão sendo processados porque,
na condição de servidor público e Secretário Municipal de Educação do Município de
Imbituba/SC, enriqueceram-se ilicitamente e violaram os princípios da
administração ao utilizar e autorizar a utilização, respectivamente, de veículo público e
abastecido com dinheiro público, para fins particulares (transporte dos manifestantes da
"greve dos caminhoneiros"), sendo, portanto, autores do ato ímprobo praticado.
3 FATOS E FUNDAMENTOS JURÍDICOS
Prefacialmente, é necessário recordar que entre os dias 21 de maio e 1º
de junho de 2018, ocorreu a chamada "greve dos caminhoneiros", movimento nacional
que buscava, inicialmente, a proteção dos direitos dos motoristas de caminhão e
veículos congêneres.
O ato consistia na paralisação dos serviços de transporte, com a
ocupação de vias públicas e construção de barricadas, impedindo assim o trânsito de
caminhões.
1Um dos pontos de bloqueio mais críticos do movimento se instalou nos
principais acessos desta Comarca, nos trevos dos bairros Vila Nova e Nova Brasília.
Durante o período em questão, inúmeras pessoas se aglomeraram nas rodovias, em
1
https://g1.globo.com/sc/santa-catarina/noticia/sem-passagem-de-caminhoes-ponto-de-protesto-em-imbituba-e-
considerado-o-mais-critico-de-sc-pela-prf.ghtml
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verdadeiros acampamentos.
Nesse contexto, apontado pela Polícia Civil como um dos líderes da
manifestação, o réu EDER SILVA DA SILVEIRA era figura constante durante o período
do protesto, adotando postura de comando e sendo designado como representante nas
conversas com os órgãos públicos.
Convém ressaltar que EDER é servidor público municipal e ocupa o
cargo de motorista vinculado ao Município de Imbituba, estando, à época, responsável
pela guarda e utilização do veículo VW/15.190 EOD E.S.ORE, placa MKY-5044, de
propriedade deste Município, conforme demonstra o dossiê juntado ao Procedimento
Administrativo.
O referido ônibus era utilizado para o transporte de alunos da rede
municipal, estando plotado com a inscrição "escolar" e vinculado a Secretaria de
Educação de Imbituba:
Não satisfeito em apenas integrar o movimento grevista, o réu EDER
decidiu pela utilização do citado veículo, que estava sob sua responsabilidade, a fim de
satisfazer interesse pessoal. Isso porque, conforme apurado, ele realizou o transporte
de participantes da manifestação sediada no trevo do bairro Nova Brasília até o campo
de futebol localizado no bairro Sambaqui, ambos em Imbituba/SC, por diversas vezes,
sob o argumento de que lá poderiam tomar banho.
Porém, ele não agiu sozinho.
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O corréu FILIPE DIAS ANTÔNIO foi nomeado para o cargo de
Secretário Municipal de Educação em 4 de janeiro de 2017, perdurando no cargo até 3
de agosto de 2018. Conforme se vê, ele era o responsável pela pasta na data das
manifestações.
E foi assim, na condição de Secretário de Educação, que EDER entrou
em contato com FILIPE e questionou acerca da autorização para a utilização do veículo
oficial destinado à educação para o transporte dos grevistas durante o período citado,
tendo FILIPE autorizado que assim se procedesse.
Destaca-se que o artigo 9º, IV, da Lei n. 8.429/92, considera ato de
improbidade a utilização, por parte da servidor público, de veículo oficial para fins
particulares e políticos.
Vejamos:
Art. 9° Constitui ato de improbidade administrativa importando
enriquecimento ilícito auferir qualquer tipo de vantagem patrimonial
indevida em razão do exercício de cargo, mandato, função, emprego ou
atividade nas entidades mencionadas no art. 1° desta lei, e notadamente:
[...] IV - utilizar, em obra ou serviço particular, veículos, máquinas,
equipamentos ou material de qualquer natureza, de propriedade ou à
disposição de qualquer das entidades mencionadas no art. 1° desta lei, b
em como o trabalho de servidores públicos, empregados ou terceiros
contratados por essas entidades; [...]
Mauro Roberto Gomes de Mattos interpreta a norma supratranscrita:
Veda o inc. IV a utilização, em obra ou serviço particular, veículos,
máquinas, equipamentos, material de qualquer natureza, de propriedade
ou à disposição das entidades mencionadas no art. 1º, da Lei de
Improbidade Administrativa, bem como o trabalho de servidores públicos,
empregados ou terceiros contratados por essas entidades. (MATTOS,
Mauro Roberto Gomes de. O Limite da Improbidade Administrativa. 3ª
edição. Editora América Jurídica, Rio de Janeiro, ano 2006, p.195)
Emerson Garcia acrescenta:
A análise do preceito legal permite concluir que, afora o elemento volitivo
do agente, o qual deve necessariamente se consubstanciar no dolo, são
quatro os elementos formadores do enriquecimento ilícito sob a ótica da
improbidade administrativa: a) o enriquecimento do agente; b) que se
trate de agente que ocupe cargo, mandato, função, emprego ou
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atividade nas entidades elencadas no art. 1º; ou mesmo o extraneus que
concorra para a prática do ato ou dele se beneficie (arts. 3º e 6º); c) a
ausência de justa causa, devendo se tratar de vantagem indevida, sem
qualquer correspondência com os subsídios ou vencimentos recebidos
pelo agente público; d) relação de causalidade entre a vantagem
indevida e o exercício do cargo, pois a lei não deixa margem a dúvidas
ao falar em ‘vantagem patrimonial indevida em razão do exercício de
cargo...’ […] Inexistindo previsão legal, ilícito será o enriquecimento. No
mais, diferentemente do que ocorre no âmbito privado, em raras
ocasiões o enriquecimento do agente público importará no correlato
empobrecimento patrimonial do sujeito passivo, o qual é prescindível à
configuração da tipologia legal prevista no caput do art. 9º. A idéia de
empobrecimento é substituída pela noção de vantagem patrimonial
indevida, sendo considerado ilícito todo enriquecimento relacionado ao
exercício da atividade pública e que não seja resultado da
contraprestação paga ao agente, o que demonstra de forma insofismável
a infringência dos princípios da legalidade e da moralidade, verdadeiros
alicerces da atividade estatal. (GARCIA, Emerson. Improbidade
Administrativa. 6ª edição. Rio de Janeiro: Editora Lúmen Júris, ano 2011,
p. 255-256.)
E, mais à frente, diz que "o enriquecimento ilícito é o resultado de
qualquer ação ou omissão que possibilite ao agente público auferir uma vantagem não
prevista em lei.” (Obra citada, p. 282).
Por seu turno, Wallace Paiva Martins ensina que o enriquecimento
ilícito pode ocorrer na forma indireta, quando a autoridade não aufere ganhos
estimáveis em pecúnia incorporados ao seu patrimônio, mas usufrui da estrutura
pública para satisfazer necessidades particulares, com o intuito de economizar
seu patrimônio pessoal.
Para Francisco Bilac Moreira:
A vantagem econômica, sob forma de prestação negativa, é aquela que
nada acrescenta, diretamente, à fortuna do agente passivo da corrupção.
Ela representa, porém, para o servidor público, enriquecimento ilícito
indireto, porque corresponde à poupança de despesas a que se
obrigou, ou pela utilização de serviços de qualquer natureza, ou pela
locação de móveis ou imóveis, ou pela aceitação de transporte ou
hospedagem gratuitos ou pagos por terceiros (Enriquecimento ilícito no
exercício de cargos públicos. Rio de Janeiro: Forense, 1960. p.269, n.
113) […]
Assim, caracterizam o enriquecimento ilícito qualquer ação ou omissão
no exercício de função pública para angariar vantagem econômica, [...] em razão do seu
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vínculo com a Administração Pública, independentemente da causação de dano
patrimonial a esta, porque o relevo significativo do enriquecimento ilícito tem em si
considerada preponderância do valor moral da Administração Pública, sendo
direcionado ao desvio ético do agente público. […] Irrelevante, par os fins da lei, que o
agente público pratique ato lícito ou ilícito; incide sobre ambas as situações, porque é
intolerável o uso anormal ou antiético da função pública para se enriquecer, mesmo
agindo licitamente, sem embargo de que outras conseqüências jurídicas poderão advir
da prática de ato ilícito.” (Obra citada, p. 227-228).
E, mais adiante, arremata:
O agente público deve servir à Administração Pública e não servir-se
dela, obtendo ou fornecendo vantagens a partir da utilização de bens e
serviços públicos, dispondo da coisa pública como se fosse bem do seu
acervo particular. O Estado organiza e presta serviços, adquire e utiliza
bens, visando ao interesse da coletividade e não à satisfação dos
interesses do agente público. Não obstante, o fato mais prosaico é
justamente a negação dessa parêmia, pois os agentes públicos têm o
péssimo costume de utilizar-se da máquina oficial par os mais diverso
escopos distanciados da finalidade estabelecida. 4) A ética pública tem
como objeto a noção de o funcionário estar a serviço do interesse
público, e não o contrário; por isso, não tolera a utilização dos bens
públicos para finalidades alheias ao serviço”. (Obra citada, p. 234 -235).
Sérgio Turra Sobrane não diverge:
Os agentes públicos, para consecução de suas atividades, possuem
disposição sobre diversos bens e contam com a colaboração de outros
servidores. A utilização de bens e mão de obra, contudo, deve estar
atrelada à finalidade pública do ato a ser praticado pelo agente, sendo
vedado o uso para satisfação de interesses particulares. O emprego de
bens e mão de obra sem escopo público onera o erário e promove o
enriquecimento ilícito do agente, que deixa de empenhar suas posses
para satisfação de interesses privatísticos, próprios ou de outrem. No
caso, evidencia-se o locupletamento por prestação negativa, ante a
poupança de recursos próprios.” (SOBRANE, Sérgio turra. Improbidade
Administrativa, Aspectos Materiais, Dimensão Difusa e Coisa Julgada. 1ª
edição. Editora Atlas, São Paulo, ano 2010, p.43).
Portanto, concluiu-se por comprovado que os réus, de fato,
utilizaram o veículo público para fins exclusivamente particulares, deixando de
arcar com despesa de natureza privada e, desta forma, auferindo enriquecimento
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ilícito, caracterizando o ato de improbidade previsto no art. 9º, IV, da LIA.
Neste sentido:
IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. UTILIZAÇÃO DE VEÍCULO OFICIAL
POR AGENTES POLÍTICOS PARA FINS PARTICULARES. ATO QUE,
POR EXCELÊNCIA, É OFENSIVO AOS ARTIGOS 9º, 10 E 11 DA LEI
DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. AUTOR, CONTUDO, QUE NÃO
COGITA DE PREJUÍZO AO ERÁRIO, TAMPOUCO QUANTIFICA O
PROVEITO DITO OBTIDO, INEXISTINDO, NOS AUTOS, ELEMENTOS
QUE PERMITAM A SUA MENSURAÇÃO, AINDA QUE EM
LIQUIDAÇÃO, COMO RECONHECIDO PELA PRÓPRIA
PROCURADORIA-GERAL DA JUSTIÇA. DOLO ESPECÍFICO, DE
TODO MODO, COMPROVADO, O QUE TORNAVA DE RIGOR A
PROCEDÊNCIA DA AÇÃO. "APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE
IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA - UTILIZAÇÃO DE VEÍCULO
OFICIAL EM BENEFÍCIO PRÓPRIO - DEPOIMENTOS
TESTEMUNHAIS COMPROVANDO A CONDUTA REPROCHÁVEL DO
ADMINISTRADOR PÚBLICO - ATOS DE IMPROBIDADE PREVISTOS
NOS INCISOS IV E XII DO ART. 9º DA LEI 8.429/92 - [...]" (Apelação
Cível n. 2009.042310-2, de Tangará, rel. Des. Sérgio Roberto Baasch
Luz, j. 14-10-2009). DOSIMETRIA DA PENA. INAPLICABILIDADE DE
TODAS AS SANÇÕES PREVISTAS NO ART. 12. MULTA CIVIL.
REDUÇÃO, À LUZ DO PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE E DA
PROPORCIONALIDADE. 1. A fixação das sanções estabelecidas no
artigo 12 da LIA deve levar em conta o padrão de lesividade e a
reprovabilidade da conduta. Quanto mais graves forem, maior a
exasperação das penalidades. 2. A reprimenda imposta ao agente deve,
ainda, ser adequada e coerente em relação ao ato ímprobo que
cometeu. E mais: compatível com a gravidade e a extensão do dano
(material e moral) causado. 3. É indispensável que as circunstâncias que
as influenciaram sejam valoradas e que haja uma logicidade entre o tipo
de infração e a definição da sanção. Explicando: ao agente público que
frustra ou frauda processo de licitação, é razoável a proibição de
contratar com o Poder Público; àquele que comete infração à lei eleitoral,
a sanção de perda do cargo (se o caso a recomendar) e a suspensão
dos direitos políticos é coerente. 4. Considerações que, aplicadas ao
caso vertente, evidenciam a manutenção tão somente da pena de multa,
que, por outro lado, deve ter o seu valor elevado, porque assaz módico o
quantum estabelecido no primeiro grau de jurisdição - valor
correspondente a duas remunerações recebida pelos agentes públicos à
época dos fatos, que passa para valor correspondente a cinco vezes
dessa mesma remuneração. RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO
PARCIALMENTE PROVIDO. RECURSO DOS RÉUS DESPROVIDO.
(TJSC, Apelação Cível n. 2014.092292-9, de Catanduvas, rel. Des.
Vanderlei Romer, j. 18-08-2015).
E, ainda:
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9 11-
AÇÃO CIVIL PÚBLICA - REEXAME NECESSÁRIO - IMPROBIDADE
ADMINISTRATIVA - ENRIQUECIMENTO INDEVIDO - DANO AO
ERÁRIO - VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO
PÚBLICA - UTILIZAÇÃO DE VEÍCULO OFICIAL DE PROPRIEDADE DO
ESTADO DE MINAS GERAIS PARA TRANSPORTE DO AGENTE
PÚBLICO E ACOMPANHANTE A MOTEL- DESVIRTUAÇÃO DA
DESTINAÇÃO PÚBLICA DO BEM - IMPROBIDADE RECONHECIDA -
PENALIDADES - NECESSIDADE DE INDIVIDUALIZAÇÃO DE ACORDO
COM A GRAVIDADE DA CONDUTA DO RÉU - SENTENÇA
PARCIALMENTE REFORMADA. 1- Constitui ato de improbidade
administrativa, violador dos princípios da legalidade, impessoalidade e
moralidade, como também causador de enriquecimento indevido e de
dano ao erário, na forma dos arts., 09, 10 e 11 da Lei 8.429/92, a
utilização de veículo de propriedade pública para fins estritamente
particulares, e sem qualquer finalidade ou interesse público (transporte
do agente público e acompanhante para encontro em motel da cidade),
desvirtuando a destinação do bem de sua finalidade originária. 2- No
caso de aplicação das penalidades decorrentes da prática de ato de
improbidade administrativa, cabível é a individualização das penas
proporcionalmente a gravidade da conduta do envolvido no ato ímprobo,
para que melhor se atenda ao princípio da razoabilidade, e o ideal da
justiça. 3 - Sentença parcialmente reformada, em reexame necessário,
para julgar parcialmente procedente o pedido." (TJ-MG - REEX:
10223062044399001 MG, Relator: Sandra Fonseca, Data de
Julgamento: 15/04/2014, Câmaras Cíveis / 6ª CÂMARA CÍVEL, Data de
Publicação: 29/04/2014)
A vantagem patrimonial, no caso, evidencia-se na modalidade de
prestação negativa (economia de recursos). Com efeito, o agente público que se serve
indevidamente de bem público, em serviço particular, onera o erário e se enriquece
ilicitamente, na medida em que economiza seus próprios recursos, deixando de
empenhar suas posses para a satisfação de interesses particulares. Ora, se os réus de
alguma forma quisessem ajudar os grevistas, que o fizessem através de seus próprios
recursos, e não utilizando de veículo público para tal finalidade, que é alheia aos
interesses da administração, em especial da secretaria de educação.
Essa vantagem ilícita também ofende os Princípios Constitucionais da
Legalidade e da Moralidade, configurando a prática de ato de improbidade
administrativa previsto no art. 11 da LIA, assim redigido:
Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os
princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole
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10 11-
os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às
instituições, e notadamente: [...]
Émerson Garcia e Rogério Pacheco ensinam que a violação de princípio
arrolado na norma em comento constitui ato de improbidade. Note-se:
O art. 11 da Lei n.º 8429/1992 é normalmente intitulado 'norma de
reserva', o que é justificável, pois ainda que a conduta não tenha
causado danos ao patrimônio público ou acarretado o enriquecimento
ilícito do agente, será possível a configuração da improbidade sempre
que restar demonstrada a inobservância dos princípios regentes da
atividade estatal.” (GARCIA, Émerson Garcia, e PACHECO, Rogério
Pacheco. Improbidade Administrativa, 6ª edição, São Paulo: Editora
Lumen Iuris, ano 2011, p. 318- 319).
Nesse sentido, posiciona-se Aluízio Bezerra Filho:
A utilização de bens ou servidores públicos em favor do interesse
privado do agente público é violação do dever funcional que implica ato
de improbidade administrativa pelo desrespeito ao princípio da legalidade
e da moralidade administrativa, conquanto beneficiar o particular,
acrescendo-lhe vantagem econômica às custas do erário é desvio de
finalidade dos serviços públicos, pois os tributos t~em destinação
exclusiva para financiar as despesas do Estado, e não para privilegiar
um indivíduo isoladamente; apenas porque é detentor de um cargo
público poderá dispor dessas regalias. Além do ônus que essa conduta
representa para a Administração Pública, significa uma afronta aos
princípios da legalidade e da moralidade administrativa, pelos quais
todos os agentes públicos têm o dever de velar.” (BEZERRA, Aluízio
Filho. Lei de Improbidade Administrativa Aplicada e Comentada. 1ª
edição. Editora Juruá. Curitiba, ano 2006, p.51)
Hodiernamente, sabe-se que o iter a ser percorrido para a identificação
do ato de improbidade haverá de ser iniciado com a comprovação da incompatibilidade
da conduta com os princípios regentes da atividade estatal, vale dizer, com a
inobservância do princípio da juridicidade, no qual avultam em importância os princípios
da legalidade e da moralidade.
Assim, as condutas dos réus, estampadas e comprovadas
documentalmente nos autos, inclusive por intermédio de sua própria confissão (EDER),
consubstanciam-se nos atos de improbidade administrativa previstos no art. 9º, caput e
IX e, subsidiariamente, no art. 11, caput, todos da Lei n. 8.429/92.
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11 11-
4 PEDIDOS
Diante do exposto, o Ministério Público requer:
I – A notificação dos requeridos para manifestação preliminar, na forma
do art. 17, § 7º, da Lei n. 8.429/92;
II O recebimento da presente ação e a citação dos réus para
contestarem o feito, sob pena de presunção de veracidade dos fatos afirmados,
observando-se o procedimento da Lei n. 8.429/92;
III A produção de todos os meios de prova admitidos, especialmente o
recebimento dos documentos que acompanham a presente inicial (NF n.
01.2019.00003224-4), depoimento pessoal dos demandados, inquirição de
testemunhas, além de outras provas que se fizerem necessárias;
IV A procedência da presente Ação Civil Pública a fim de condenar os
requeridos nas sanções do art. 12, I e, subsidiariamente, III, da Lei n. 8.429/92,
quantificando-se o dano quando da liquidação da sentença, nas despesas processuais,
honorários ao Fundo para Reconstituição de Bens Lesados e demais verbas de
sucumbência.
Embora o valor da causa seja inestimável, e, portanto, não passível de
quantificação, dá-se o valor de R$ 998,00 (novecentos e noventa e oito reais).
Imbituba, 25 de julho de 2019.
[assinado digitalmente]
VICTOR ABRAS SIQUEIRA
Promotor de Justiça Substituto