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Centro de Reflexão sobre Ética e Antropologia da Religião (Crear)
DISCIPLINA: Antropologia da Religião
A antropologia como ciência
José Lisboa Moreira de Oliveira*
Para compreendermos bem a disciplina Antropologia da Religião é im-
portante, antes de tudo, entender o significado da Antropologia, vista antes de
tudo como ciência da humanidade, como aquele âmbito do conhecimento e do
saber que procura conhecer cientificamente a pessoa humana na sua totalida-
de. Além disso, para se estudar em profundidade o fenômeno religioso, objeto
primário da nossa pesquisa, é indispensável “uma reflexão sobre a experiência
do conhecimento humano” (RAMPAZZO, p. 23).
Comecemos então pela etimologia da palavra. “Antropologia” vem do
grego αντροποσ (anthropos), homem, e λογοσ, λογια (logos, logia), estudo, e,
etimologicamente, significa estudo do homem (MARCONI; PRESOTTO, p. 1-2).
Embora a Antropologia compreenda três dimensões básicas (biológica, socio-
cultural e filosófica), neste estudo vamos nos deter muito mais no seu aspecto
cultural, deixando os outros elementos para as disciplinas dos cursos especifi-
camente voltados para essas áreas.
Segundo alguns autores as origens da Antropologia remontam à Grécia
antiga. Os gregos teriam sido os primeiros a reunir informações sobre diversos
povos e culturas, embora não possamos desconsiderar as contribuições dos
chineses, dos egípcios e dos romanos. Heródoto, filósofo grego do V século
A.C. é considerado por esses estudiosos o “pai da Antropologia” (Ibid. p. 10-
11). Mas há quem discorde dessa afirmação e coloque em dúvida essa ideia
*
Licenciado em Filosofia, doutor em Teologia, escritor e conferencista, gestor do Centro de Reflexão
sobre Ética e Antropologia da Religião (Crear) da Universidade Católica de Brasília onde é também pro-
fessor de Antropologia da Religião e Ética.
(DAMATTA, p. 86-87). Na opinião desses antropólogos não se pode situar o
nascimento da Antropologia num simples relato de viagem de Heródoto no qual
ele reúne informações de povos que os gregos consideravam “bárbaros”. Eles
acreditam ainda que a história da Antropologia é uma verdadeira especulação,
uma vez que ela tem a ver com a capacidade dos seres humanos de percebe-
rem as suas diferenças e com os sistemas ideológicos que usaram os próprios
dados da Antropologia para justificar invasões e aniquilações de tantos grupos
étnicos.
Para DaMatta todo antropólogo terá que conviver sempre com generali-
zações sobre o específico de uma certa sociedade ou grupo e com a necessi-
dade de escolher alternativas (Ibid. p. 87-89). Jamais será possível num deter-
minado momento ter-se uma visão completa e definitiva de uma determinada
cultura. Isso explica porque até o século XVIII a Antropologia não era vista co-
mo ciência. Muitas pessoas como cronistas, viajantes, soldados, missionários,
comerciantes relataram fatos e deixam dados sobre povos e culturas, mas so-
mente nos meados do século XVIII é que a Antropologia começa a aparecer
como ciência. Normalmente se considera como primeiros antropólogos os se-
guintes cientistas: Linneu (que foi o primeiro a descrever as raças humanas),
Boucher de Perthes (o primeiro a relatar achados pré-históricos) e John Lubock
que fez os primeiros estudos sobre a Idade da Pedra, estabelecendo as dife-
renças culturais entre o Paleolítico e o Neolítico. Porém, a consagração definiti-
va da Antropologia como ciência vai se dar somente depois dos estudos de
Darwin, o qual propôs a teoria da evolução. No século XX a Antropologia co-
nhece um grande progresso, fruto das descobertas sobre o ser humano e as
constantes pesquisas de campo realizadas com bastante rigor científico
(MARCONI; PRESOTTO, p. 10-11).
1. A antropologia dentro do campo das ciências sociais
Sabemos que o ser humano “sempre teve curiosidade a respeito de si
mesmo, independentemente do seu nível de desenvolvimento cultural” (Ibid. p.
10). Assim sendo, o surgimento da Antropologia está ligado a este desejo da
humanidade de conhecer-se a si mesma buscando perceber e registrar as se-
melhanças e as diferenças entre os diversos grupos sociais e culturais. Esse
dado histórico nos leva à definição do objeto e, do objetivo da Antropologia.
Podemos afirmar que o objeto do estudo da Antropologia é a pessoa
humana e a sua atividade. No caso da Antropologia Cultural o objeto é o ser
humano e os seus comportamentos, ou seja, o homem e a mulher enquanto
integrantes de grupos sociais que fazem cultura. Por essa razão é possível di-
zer que o objetivo da antropologia é o estudo da humanidade como um todo,
bem como das suas diversas manifestações e expressões. Assim sendo, pode-
se dizer que no seu objetivo a Antropologia se preocupa com a pessoa humana
na sua condição de ser biológico, ser pensante, ser que produz culturas e ser
capaz de organizar-se em sociedades estruturadas (Ibid. p. 2-3).
No caso da Antropologia Cultural, dentro da qual se situa a Antropologia
da Religião, seu objetivo é procurar uma compreensão do ser humano enquan-
to tal e da sua existência ativa, capaz de interferir no destino do planeta que
habitamos. O papel da Antropologia Cultural é interpretar as diferenças cultu-
rais na medida em que elas formam sistemas culturais integrados. Sua função
é captar o essencial das culturas e buscar uma verdadeira compreensão de
tais sistemas. O essencial do trabalho do antropólogo cultural é o estudo da
vida das pessoas organizadas em grupos culturais, vendo o seu conjunto for-
mado por tantos elementos como os valores, as reflexões, os costumes, as
normas, etc. (DAMATTA, p. 143-150).
Trata-se, pois, de estudar o ser humano enquanto capaz de produzir cul-
tura. Por isso é fundamental percebermos desde agora a diferença e a relação
entre sociedade e cultura. De fato, pode existir sociedade sem cultura. O que
caracteriza a sociedade é a vida ordenada, com divisões de trabalho, de espa-
ços, de idades, de extratos sociais, de sexos e assim por diante. Por isso tam-
bém os animais são capazes de viver em sociedade. Já a cultura, como vere-
mos depois, supõe uma tradição viva que passe de geração em geração o que
foi elaborado coletivamente, de modo que o próprio grupo perceba e tenha
consciência de que seu estilo de vida é diferente dos outros. A partir dessa
percepção e dessa consciência o grupo estabelece as suas normas de inclusão
e de exclusão. Consequentemente, podemos ter um grupo ordenado social-
mente, mas sem consciência do seu próprio estilo de vida, isto é, sem cultura.
A cultura se caracteriza, pois, pela tradição, ou seja, pela transmissão do jeito
próprio de ser de um grupo, o qual é mais do que viver ordenadamente com
regras e normas estabelecidas. A cultura é a vivência coletiva consciente e
responsável dos padrões, costumes e hábitos, dentro de um espaço e de uma
temporalidade, e que identificam um determinado grupo. Na cultura há uma
interação dialética entre as regras e o grupo, com possibilidades de reciproci-
dade e de mudanças. O grupo age ou não desta ou daquela forma porque tem
consciência de que esse agir lhe dá ou não identidade e o diferencia dos outros
grupos sociais (Ibid. p. 47-58).
2. Divisões e Campos da Antropologia
A definição de Antropologia nos ajudou a perceber que ela tem um cam-
po muito vasto, abrangendo espaços, situações e tempos amplos e bem dife-
rentes. Por esse motivo ela possui âmbitos diversos e uma infinidade de cam-
pos de ação. De um modo geral os antropólogos costumam dividir a Antropolo-
gia em dois grandes campos de estudo: a Antropologia Física ou Biológica e a
Antropologia Cultural (MARCONI; PRESOTTO, p. 3-7).
A Antropologia Física ou Biológica estuda o ser humano na sua natureza
e na sua condição física. Procura compreendê-lo nas suas origens, no seu pro-
cesso evolutivo, na sua estrutura anatômica, bem como nos seus processos
fisiológicos e biológicos. Ela está estruturada em cinco campos: 1) a Paleonto-
logia que estuda a origem e a evolução da espécie humana; 2) a Somatologia
(do grego soma, corpo + logia, estudo) que estuda o corpo humano nas suas
variedades existentes, nas diferenças físicas e na sua capacidade de adapta-
ção; 3) A Raciologia que se interessa pela historia racial do ser humano; 4) A
Antropometria (do grego anthropos, homem + metria, medida) que trabalha
com técnicas de medição do corpo humano, especialmente de esqueletos (crâ-
nio, ossos, etc.), usando instrumentos especiais de precisão, com o objetivo de
fornecer informações detalhadas acerca de pessoas ou de achados arqueoló-
gicos, sendo muito usada no âmbito forense para tentar identificar corpos e
esqueletos; 5) Antropometria do crescimento, voltada para o conhecimento e o
estudo dos índices de crescimento dos indivíduos, relacionando-o com o tipo
de alimentação, de atividades físicas e assim por diante.
Por sua vez a Antropologia Cultural, o campo mais amplo dessa ciência,
estuda o ser humano enquanto fazedor de cultura. O seu principal objetivo é
compreender os relacionamentos humanos, os comportamentos tanto instinti-
vos como aqueles adquiridos pela aprendizagem, sem deixar de analisar os
aspectos biológicos que contribuem para o desenvolvimento das capacidades
culturais dos seres humanos. Portanto, seu objetivo é conhecer o ser humano
enquanto capaz de criar o seu meio ou ambiente cultural através de formas
bem diferenciadas de comportamento.
3. Campos da Antropologia Cultural
A Antropologia Cultural abrange seis campos específicos de atuação (I-
bid.: 4-7). O primeiro deles é a Arqueologia que tem como objeto o estudo das
culturas extintas que viveram em épocas, em tempos e em lugares diferentes,
de modo particular as que não deixaram documentos escritos. Por isso o estu-
do da Arqueologia consiste basicamente na análise de vestígios e de restos de
materiais dessas culturas encontrados em escavações e que resistiram à des-
truição através do tempo.
Um segundo campo de atuação da Antropologia Cultural é a Etnografia
(do grego éthnos, povo e graphein, escrever) que se ocupa com a descrição
das sociedades humanas por meio da observação e da análise dos grupos so-
ciais, tentando, na medida do possível, fazer a reconstituição fiel de suas vidas.
De um modo geral a Etnografia se ocupa com as culturas simples, denomina-
das “primitivas” ou “ágrafas” (não possuidoras de escrita). Ligado a esse campo
está a Etnologia que, utilizando os dados coletados e oferecidos pela Etnogra-
fia, procura fazer a análise, interpretação e comparação das diversas culturas
pesquisadas, tentando perceber as semelhanças e diferenças entre elas, bus-
cando a existência ou não de inter-relações do ser humano com o seu ambien-
te, da pessoa com a cultura, em vista da percepção de mudanças e de ações.
O quarto campo da Antropologia cultural é a Linguística que estuda a
linguagem, as formas de comunicação e também a forma de pensar dos povos
e culturas. A lingüística é um dos espaços mais independentes e mais ricos da
Antropologia. Basta pensar, por exemplo, na quantidade e diversidade de lín-
guas, sendo que cada uma delas possui a sua forma e a sua estrutura básica.
Por essa razão ela é considerada o âmbito mais autossuficiente da Antropolo-
gia. A Linguística é muito importante para a Antropologia da Religião. Basta
pensar, por exemplo, nas religiões que possuem “livros sagrados”. A Linguísti-
ca ajuda a compreendê-los melhor, evitando a leitura puramente literal e fun-
damentalista destes textos.
Temos ainda o campo do folclore e o campo da antropologia social pro-
priamente dita. O folclore é o estudo da cultura enquanto fenômeno humano
espontâneo. Possui diversos aspectos e âmbitos (rural, urbano, material, espiri-
tual, espacial, temporal etc.). Já a Antropologia Social se interessa da socieda-
de e das suas instituições. Estuda o ser humano enquanto ser social, capaz de
organizar-se e de tecer relações sociais. Também ela inclui diversos aspectos:
vida social, família, economia, política, religião, direito etc. Ela pode estudar
tanto um aspecto, como também o conjunto das organizações e instituições
sociais, tendo presente a sua totalidade. De fato, para se compreender uma
sociedade é indispensável vê-la como um todo.
No campo da Antropologia Social é de fundamental importância estudar
a relação que existe entre cultura, sociedade e indivíduo, uma vez que esse
último não é um mero receptor e portador de cultura, mas também agente de
mudança cultural. Por outro lado, sabemos que a cultura tem uma influência
determinante sobre a vida do indivíduo. Pelo processo de endoculturação o
grupo social confere um tipo de personalidade às pessoas que dele fazem par-
te. Conhecer estas inter-relações é sumamente importante para analisar o
comportamento humano e a capacidade de adaptação dos indivíduos aos valo-
res propostos pelos grupos aos quais pertencem.
4. Interação da Antropologia com outras ciências
O que acabamos de analisar, nos mostra que, embora a Antropologia
seja uma ciência autônoma, ela necessita de uma interação com outras ciên-
cias para que possa cumprir a sua tarefa de ciência da humanidade (MARCO-
NI; PRESOTTO, p. 8-10). No âmbito da Antropologia Cultural e Social é de
fundamental importância a sua interação com a Sociologia, com a Psicologia,
com as Ciências Econômicas e Políticas e com a História.
Através da interação entre Antropologia e Sociologia é possível conhe-
cer melhor a condição humana e social dos indivíduos e dos grupos a que per-
tencem. A Antropologia vai trabalhar mais o enfoque cultural, enquanto a socio-
logia analisa tanto o conceito como a experiência de vida em sociedade. O cru-
zamento de dados e informações contribui significativamente para o conheci-
mento do ser humano na sua globalidade.
Já a interação entre Antropologia e Psicologia se dá pelo interesse acer-
ca do comportamento humano. A Psicologia analisa mais o comportamento
individual, enquanto a Antropologia aprofunda os comportamentos grupais, so-
ciais e culturais. Desse modo a Psicologia ajuda a Antropologia a compreender
a complexidade das culturas a partir da avaliação do comportamento dos seus
indivíduos. Essa, por sua vez, auxilia a Psicologia a perceber cada indivíduo
como ser inculturado que recebe influência do ambiente onde vive e do grupo
cultural a que pertence. Os dados resultantes desse processo ajudam a des-
vendar melhor o mistério da existência humana.
No que se refere à interação entre Antropologia e Ciências Econômicas
e Políticas, pode-se afirmar que os estudos comuns estão relacionados à com-
preensão das organizações econômicas e das instituições que regulam o poder
dentro dos grupos humanos. Trata-se, sem dúvida alguma, de uma realidade
complexa e bastante diferenciada, mas que é determinante para a existência
das sociedades e de suas culturas.
Quanto à relação entre Antropologia e História podemos afirmar que o
ponto de encontro é basicamente a tentativa de reconstrução de culturas que já
desapareceram. A História permite a Antropologia conhecer as origens dos fe-
nômenos culturais, bem como as formas de adaptação e de modificação intro-
duzidas pelas pessoas no meio ambiente.
5. Métodos científicos da Antropologia
Enquanto ciência social que estuda o ser humano, a Antropologia faz
uso de diversos métodos, de acordo com os seus campos e com as situações
(MARCONI; PRESOTTO, p. 11-14). Por método entende-se um conjunto de
regras bem definidas que são utilizadas na investigação. Normalmente o méto-
do segue um procedimento anteriormente elaborado e que deve ser cuidadosa
e escrupulosamente observado. O método tem como finalidade descobrir quais
são as lógicas e as leis da natureza e da sociedade, visando respostas satisfa-
tórias.
Normalmente são utilizados sete métodos nas pesquisas de Antropolo-
gia. O primeiro é o método histórico utilizado para a investigação de culturas
passadas. Por meio dele o antropólogo, com a ajuda do historiador, tenta re-
construir as culturas, explicar fatos e observar fenômenos, como, por exemplo,
as mudanças ocorridas e as adaptações. O segundo é o método estatístico
empregado, sobretudo para analisar as variações culturais das populações ou
sociedades. Os dados são obtidos por meio de tabelas, gráficos, quadros com-
parativos etc. O terceiro é o método etnográfico utilizado para descrever as so-
ciedades humanas, de modo particular as consideradas primitivas ou ágrafas
(sem escrita). O método consiste essencialmente em levantar todos os dados
possíveis sobre uma determinada cultura ou etnia e, a partir desses levanta-
mentos, tentar descrever o estilo de vida ou cultura desses grupos.
O quarto método é chamado de comparativo ou etnológico. É usado de
modo particular para a pesquisa sobre populações extintas. Por meio da com-
paração de materiais coletados, especialmente fósseis, se estudam os pa-
drões, os costumes, os estilos de vida das culturas, vendo de modo particular
as diferenças e semelhanças existentes entre elas. O objetivo é melhor com-
preender as culturas passadas e extintas. O quinto método é conhecido como
monográfico. É também chamado de estudo de caso. Consiste em estudar com
profundidade determinados grupos humanos, considerando todos os seus as-
pectos como, por exemplo, as instituições, os processos culturais e a religião.
O estudo monográfico é muito importante para os casos de culturas que estão
ameaçadas de extinção, uma vez que permite analisá-las e descrevê-las de
forma bem pormenorizada.
Por fim, temos o método genealógico e o método funcionalista. No pri-
meiro caso trata-se de um método usado para o estudo do parentesco e todos
os outros aspectos sociais dele decorrentes. Visa à análise da estrutura familiar
e exige a presença de um informante, ou seja, de alguém que possa revelar os
nomes das pessoas que compõem a árvore genealógica. No segundo caso, a
cultura é estudada e analisada a partir do âmbito da função ou das funções.
Por meio dele busca-se perceber a funcionalidade de uma determinada unida-
de cultural no contexto da cultura geral ou global.
6. Técnicas de pesquisa da Antropologia
Já foi possível perceber que aos métodos estão associadas determina-
das técnicas de pesquisa. Por técnica entende-se a habilidade do cientista ou
pesquisador no uso dos métodos, ou seja, daquele conjunto de regras bem
definidas que são utilizadas na investigação e que lhe permite obter os dados
desejados. As técnicas usadas no campo antropológico são três: observação,
entrevista e formulário (MARCONI; PRESOTTO, p. 14-16).
A técnica da observação consiste na coleta e obtenção de dados. Nela
os sentidos têm um lugar privilegiado. Ela pode ser sistemática ou participante.
Na sistemática o pesquisador direta (pessoalmente) ou indiretamente (por meio
de outras pessoas) observa os fatos no local da investigação e por um período
de tempo. Na participante o pesquisador, por um longo período de tempo, par-
ticipa do seu campo de pesquisa. É muito utilizada para a pesquisa cultural.
Neste caso o cientista torna-se um participante ativo da cultura que quer estu-
dar. Ela exige fina capacidade de observação, superação de preconceitos, tra-
balho diário de anotação, registro de fatos e de dados. Exemplo desse tipo de
pesquisa é aquela feita pelo francês Roger Bastide sobre as religiões africanas
em Salvador (Bahia) ou o caso de Dacyr Ribeiro que conviveu durante muito
tempo com os índios Kayapós em Mato Grosso. Também Roberto DaMatta
descreve a sua pesquisa entre os índios Gaviões no Pará e entre os Apinayé
no atual estado de Tocantins (DAMATTA, p. 182-240).
A técnica da entrevista consiste num contato direto, face a face, do cien-
tista e pesquisador com a pessoa entrevistada, da qual ele pretende obter in-
formações. A entrevista pode ser estruturada ou semiestruturada (livre). A en-
trevista estruturada é aquela na qual o entrevistador segue um roteiro pré-
estabelecido. A semiestruturada é aquela do tipo informal, sem roteiro a ser
seguido, na qual o entrevistador vai colhendo as idéias do entrevistado, mani-
festadas de forma espontânea.
O formulário é uma técnica que se parece com o questionário. Consiste
num levantamento de dados feito através de uma série organizada de pergun-
tas escritas entregues ao entrevistado, às quais ele é convidado a responder.
De certa maneira é uma pesquisa dirigida, uma vez que o rol de perguntas é
feito pelo entrevistador, visando obter esclarecimentos sobre determinadas
questões.
Convém observar que no caso das duas últimas técnicas, embora as
respostas sejam dadas pelo entrevistado, o modo de formular as perguntas e a
escolha do público alvo pode induzir a um determinado resultado. Isso aconte-
ce, por exemplo, em certas pesquisas de opinião pública, como ficou bem evi-
dente por ocasião das recentes eleições no Brasil. O risco de manipulação dos
resultados pode sempre existir. Neste caso temos um problema ético muito
grave e o cientista encarregado da pesquisa pode ser responsabilizado por fal-
sificar os resultados.
Conclusão
Podemos concluir afirmando que, dada as suas características, a Antro-
pologia é uma ciência de extrema atualidade. Ela pode contribuir para o desen-
volvimento dos seres humanos e dos povos. O resultado de seus estudos e
pesquisas ajuda na superação de desequilíbrios e de tensões culturais. Os an-
tropólogos costumam apontar as causas das tensões sociais e indicar soluções
para que se restabeleça o equilíbrio entre os diversos grupos culturais.
O grande desafio está no fato de que as culturas dominantes nem sem-
pre concordam com as conclusões dos estudos e das pesquisas dos antropó-
logos. Por isso muitas tensões sociais permanecem e até tendem a se agravar.
Não se quer escutar uma verdade que incomoda.
“A ação do antropólogo é de relevância, mas a perspecti-
va histórica tem demonstrado que sua tarefa lhe tem sido decep-
cionante, em face das pressões da cultura dominante, que nem
sempre concorda com as posições teóricas e os métodos huma-
nísticos por ele adotados, ao desempenhar o papel de concilia-
dor entre o mundo dominante e o mundo dominado” (MARCONI;
PRESOTTO, p. 19).
Mesmo assim vale a pena insistir sobre a importância da Antropologia no
mundo de hoje. Com a sua função de produzir interpretações das diferenças e
de captar, com reverência e profunda compreensão, o essencial de cada cultu-
ra diferente, ela contribui para alargar nossas visões e romper esquemas ideo-
lógicos que tendem a desvalorizar aqueles que não são e não pensam como
nós (DAMATTA, p. 143-150). A Antropologia, mesmo no atual contexto, tem
essa função de ser ponte e mediação entre dois mundos. Cabe-lhe a tarefa de
ajudar-nos a ver o diferente não como algo exótico, distante e marginal, mas
como uma realidade familiar. Embora não deixe também de ter a função de
manter o caráter “exótico” de cada cultura, ou seja, de insistir sobre o direito
que cada cultura tem de permanecer diferente, com suas características pró-
prias, sem que lhe seja imposta uma aculturação forçada.
Bibliografia
DAMATTA, Roberto. Relativizando. Uma introdução à Antropologia So-
cial. Rio de Janeiro: Rocco, 1987.
MARCONI, Marina de Andrade; PRESOTTO, Zélia Maria Neves. Antro-
pologia. Uma introdução, São Paulo: Atlas. 2006, 6ª edição.
RAMPAZZO, Lino. Antropologia, religiões e valores cristãos, São Paulo:
Loyola.

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A antropologia como ciência da humanidade

  • 1. UNIVERSIDADE CATÓLICA DE BRASÍLIA Pró-Reitoria de Extensão (Proex) Diretoria de Programas de Pastoral (Dipas) Centro de Reflexão sobre Ética e Antropologia da Religião (Crear) DISCIPLINA: Antropologia da Religião A antropologia como ciência José Lisboa Moreira de Oliveira* Para compreendermos bem a disciplina Antropologia da Religião é im- portante, antes de tudo, entender o significado da Antropologia, vista antes de tudo como ciência da humanidade, como aquele âmbito do conhecimento e do saber que procura conhecer cientificamente a pessoa humana na sua totalida- de. Além disso, para se estudar em profundidade o fenômeno religioso, objeto primário da nossa pesquisa, é indispensável “uma reflexão sobre a experiência do conhecimento humano” (RAMPAZZO, p. 23). Comecemos então pela etimologia da palavra. “Antropologia” vem do grego αντροποσ (anthropos), homem, e λογοσ, λογια (logos, logia), estudo, e, etimologicamente, significa estudo do homem (MARCONI; PRESOTTO, p. 1-2). Embora a Antropologia compreenda três dimensões básicas (biológica, socio- cultural e filosófica), neste estudo vamos nos deter muito mais no seu aspecto cultural, deixando os outros elementos para as disciplinas dos cursos especifi- camente voltados para essas áreas. Segundo alguns autores as origens da Antropologia remontam à Grécia antiga. Os gregos teriam sido os primeiros a reunir informações sobre diversos povos e culturas, embora não possamos desconsiderar as contribuições dos chineses, dos egípcios e dos romanos. Heródoto, filósofo grego do V século A.C. é considerado por esses estudiosos o “pai da Antropologia” (Ibid. p. 10- 11). Mas há quem discorde dessa afirmação e coloque em dúvida essa ideia * Licenciado em Filosofia, doutor em Teologia, escritor e conferencista, gestor do Centro de Reflexão sobre Ética e Antropologia da Religião (Crear) da Universidade Católica de Brasília onde é também pro- fessor de Antropologia da Religião e Ética.
  • 2. (DAMATTA, p. 86-87). Na opinião desses antropólogos não se pode situar o nascimento da Antropologia num simples relato de viagem de Heródoto no qual ele reúne informações de povos que os gregos consideravam “bárbaros”. Eles acreditam ainda que a história da Antropologia é uma verdadeira especulação, uma vez que ela tem a ver com a capacidade dos seres humanos de percebe- rem as suas diferenças e com os sistemas ideológicos que usaram os próprios dados da Antropologia para justificar invasões e aniquilações de tantos grupos étnicos. Para DaMatta todo antropólogo terá que conviver sempre com generali- zações sobre o específico de uma certa sociedade ou grupo e com a necessi- dade de escolher alternativas (Ibid. p. 87-89). Jamais será possível num deter- minado momento ter-se uma visão completa e definitiva de uma determinada cultura. Isso explica porque até o século XVIII a Antropologia não era vista co- mo ciência. Muitas pessoas como cronistas, viajantes, soldados, missionários, comerciantes relataram fatos e deixam dados sobre povos e culturas, mas so- mente nos meados do século XVIII é que a Antropologia começa a aparecer como ciência. Normalmente se considera como primeiros antropólogos os se- guintes cientistas: Linneu (que foi o primeiro a descrever as raças humanas), Boucher de Perthes (o primeiro a relatar achados pré-históricos) e John Lubock que fez os primeiros estudos sobre a Idade da Pedra, estabelecendo as dife- renças culturais entre o Paleolítico e o Neolítico. Porém, a consagração definiti- va da Antropologia como ciência vai se dar somente depois dos estudos de Darwin, o qual propôs a teoria da evolução. No século XX a Antropologia co- nhece um grande progresso, fruto das descobertas sobre o ser humano e as constantes pesquisas de campo realizadas com bastante rigor científico (MARCONI; PRESOTTO, p. 10-11). 1. A antropologia dentro do campo das ciências sociais Sabemos que o ser humano “sempre teve curiosidade a respeito de si mesmo, independentemente do seu nível de desenvolvimento cultural” (Ibid. p. 10). Assim sendo, o surgimento da Antropologia está ligado a este desejo da humanidade de conhecer-se a si mesma buscando perceber e registrar as se-
  • 3. melhanças e as diferenças entre os diversos grupos sociais e culturais. Esse dado histórico nos leva à definição do objeto e, do objetivo da Antropologia. Podemos afirmar que o objeto do estudo da Antropologia é a pessoa humana e a sua atividade. No caso da Antropologia Cultural o objeto é o ser humano e os seus comportamentos, ou seja, o homem e a mulher enquanto integrantes de grupos sociais que fazem cultura. Por essa razão é possível di- zer que o objetivo da antropologia é o estudo da humanidade como um todo, bem como das suas diversas manifestações e expressões. Assim sendo, pode- se dizer que no seu objetivo a Antropologia se preocupa com a pessoa humana na sua condição de ser biológico, ser pensante, ser que produz culturas e ser capaz de organizar-se em sociedades estruturadas (Ibid. p. 2-3). No caso da Antropologia Cultural, dentro da qual se situa a Antropologia da Religião, seu objetivo é procurar uma compreensão do ser humano enquan- to tal e da sua existência ativa, capaz de interferir no destino do planeta que habitamos. O papel da Antropologia Cultural é interpretar as diferenças cultu- rais na medida em que elas formam sistemas culturais integrados. Sua função é captar o essencial das culturas e buscar uma verdadeira compreensão de tais sistemas. O essencial do trabalho do antropólogo cultural é o estudo da vida das pessoas organizadas em grupos culturais, vendo o seu conjunto for- mado por tantos elementos como os valores, as reflexões, os costumes, as normas, etc. (DAMATTA, p. 143-150). Trata-se, pois, de estudar o ser humano enquanto capaz de produzir cul- tura. Por isso é fundamental percebermos desde agora a diferença e a relação entre sociedade e cultura. De fato, pode existir sociedade sem cultura. O que caracteriza a sociedade é a vida ordenada, com divisões de trabalho, de espa- ços, de idades, de extratos sociais, de sexos e assim por diante. Por isso tam- bém os animais são capazes de viver em sociedade. Já a cultura, como vere- mos depois, supõe uma tradição viva que passe de geração em geração o que foi elaborado coletivamente, de modo que o próprio grupo perceba e tenha consciência de que seu estilo de vida é diferente dos outros. A partir dessa percepção e dessa consciência o grupo estabelece as suas normas de inclusão e de exclusão. Consequentemente, podemos ter um grupo ordenado social- mente, mas sem consciência do seu próprio estilo de vida, isto é, sem cultura. A cultura se caracteriza, pois, pela tradição, ou seja, pela transmissão do jeito
  • 4. próprio de ser de um grupo, o qual é mais do que viver ordenadamente com regras e normas estabelecidas. A cultura é a vivência coletiva consciente e responsável dos padrões, costumes e hábitos, dentro de um espaço e de uma temporalidade, e que identificam um determinado grupo. Na cultura há uma interação dialética entre as regras e o grupo, com possibilidades de reciproci- dade e de mudanças. O grupo age ou não desta ou daquela forma porque tem consciência de que esse agir lhe dá ou não identidade e o diferencia dos outros grupos sociais (Ibid. p. 47-58). 2. Divisões e Campos da Antropologia A definição de Antropologia nos ajudou a perceber que ela tem um cam- po muito vasto, abrangendo espaços, situações e tempos amplos e bem dife- rentes. Por esse motivo ela possui âmbitos diversos e uma infinidade de cam- pos de ação. De um modo geral os antropólogos costumam dividir a Antropolo- gia em dois grandes campos de estudo: a Antropologia Física ou Biológica e a Antropologia Cultural (MARCONI; PRESOTTO, p. 3-7). A Antropologia Física ou Biológica estuda o ser humano na sua natureza e na sua condição física. Procura compreendê-lo nas suas origens, no seu pro- cesso evolutivo, na sua estrutura anatômica, bem como nos seus processos fisiológicos e biológicos. Ela está estruturada em cinco campos: 1) a Paleonto- logia que estuda a origem e a evolução da espécie humana; 2) a Somatologia (do grego soma, corpo + logia, estudo) que estuda o corpo humano nas suas variedades existentes, nas diferenças físicas e na sua capacidade de adapta- ção; 3) A Raciologia que se interessa pela historia racial do ser humano; 4) A Antropometria (do grego anthropos, homem + metria, medida) que trabalha com técnicas de medição do corpo humano, especialmente de esqueletos (crâ- nio, ossos, etc.), usando instrumentos especiais de precisão, com o objetivo de fornecer informações detalhadas acerca de pessoas ou de achados arqueoló- gicos, sendo muito usada no âmbito forense para tentar identificar corpos e esqueletos; 5) Antropometria do crescimento, voltada para o conhecimento e o estudo dos índices de crescimento dos indivíduos, relacionando-o com o tipo de alimentação, de atividades físicas e assim por diante.
  • 5. Por sua vez a Antropologia Cultural, o campo mais amplo dessa ciência, estuda o ser humano enquanto fazedor de cultura. O seu principal objetivo é compreender os relacionamentos humanos, os comportamentos tanto instinti- vos como aqueles adquiridos pela aprendizagem, sem deixar de analisar os aspectos biológicos que contribuem para o desenvolvimento das capacidades culturais dos seres humanos. Portanto, seu objetivo é conhecer o ser humano enquanto capaz de criar o seu meio ou ambiente cultural através de formas bem diferenciadas de comportamento. 3. Campos da Antropologia Cultural A Antropologia Cultural abrange seis campos específicos de atuação (I- bid.: 4-7). O primeiro deles é a Arqueologia que tem como objeto o estudo das culturas extintas que viveram em épocas, em tempos e em lugares diferentes, de modo particular as que não deixaram documentos escritos. Por isso o estu- do da Arqueologia consiste basicamente na análise de vestígios e de restos de materiais dessas culturas encontrados em escavações e que resistiram à des- truição através do tempo. Um segundo campo de atuação da Antropologia Cultural é a Etnografia (do grego éthnos, povo e graphein, escrever) que se ocupa com a descrição das sociedades humanas por meio da observação e da análise dos grupos so- ciais, tentando, na medida do possível, fazer a reconstituição fiel de suas vidas. De um modo geral a Etnografia se ocupa com as culturas simples, denomina- das “primitivas” ou “ágrafas” (não possuidoras de escrita). Ligado a esse campo está a Etnologia que, utilizando os dados coletados e oferecidos pela Etnogra- fia, procura fazer a análise, interpretação e comparação das diversas culturas pesquisadas, tentando perceber as semelhanças e diferenças entre elas, bus- cando a existência ou não de inter-relações do ser humano com o seu ambien- te, da pessoa com a cultura, em vista da percepção de mudanças e de ações. O quarto campo da Antropologia cultural é a Linguística que estuda a linguagem, as formas de comunicação e também a forma de pensar dos povos e culturas. A lingüística é um dos espaços mais independentes e mais ricos da Antropologia. Basta pensar, por exemplo, na quantidade e diversidade de lín- guas, sendo que cada uma delas possui a sua forma e a sua estrutura básica.
  • 6. Por essa razão ela é considerada o âmbito mais autossuficiente da Antropolo- gia. A Linguística é muito importante para a Antropologia da Religião. Basta pensar, por exemplo, nas religiões que possuem “livros sagrados”. A Linguísti- ca ajuda a compreendê-los melhor, evitando a leitura puramente literal e fun- damentalista destes textos. Temos ainda o campo do folclore e o campo da antropologia social pro- priamente dita. O folclore é o estudo da cultura enquanto fenômeno humano espontâneo. Possui diversos aspectos e âmbitos (rural, urbano, material, espiri- tual, espacial, temporal etc.). Já a Antropologia Social se interessa da socieda- de e das suas instituições. Estuda o ser humano enquanto ser social, capaz de organizar-se e de tecer relações sociais. Também ela inclui diversos aspectos: vida social, família, economia, política, religião, direito etc. Ela pode estudar tanto um aspecto, como também o conjunto das organizações e instituições sociais, tendo presente a sua totalidade. De fato, para se compreender uma sociedade é indispensável vê-la como um todo. No campo da Antropologia Social é de fundamental importância estudar a relação que existe entre cultura, sociedade e indivíduo, uma vez que esse último não é um mero receptor e portador de cultura, mas também agente de mudança cultural. Por outro lado, sabemos que a cultura tem uma influência determinante sobre a vida do indivíduo. Pelo processo de endoculturação o grupo social confere um tipo de personalidade às pessoas que dele fazem par- te. Conhecer estas inter-relações é sumamente importante para analisar o comportamento humano e a capacidade de adaptação dos indivíduos aos valo- res propostos pelos grupos aos quais pertencem. 4. Interação da Antropologia com outras ciências O que acabamos de analisar, nos mostra que, embora a Antropologia seja uma ciência autônoma, ela necessita de uma interação com outras ciên- cias para que possa cumprir a sua tarefa de ciência da humanidade (MARCO- NI; PRESOTTO, p. 8-10). No âmbito da Antropologia Cultural e Social é de fundamental importância a sua interação com a Sociologia, com a Psicologia, com as Ciências Econômicas e Políticas e com a História.
  • 7. Através da interação entre Antropologia e Sociologia é possível conhe- cer melhor a condição humana e social dos indivíduos e dos grupos a que per- tencem. A Antropologia vai trabalhar mais o enfoque cultural, enquanto a socio- logia analisa tanto o conceito como a experiência de vida em sociedade. O cru- zamento de dados e informações contribui significativamente para o conheci- mento do ser humano na sua globalidade. Já a interação entre Antropologia e Psicologia se dá pelo interesse acer- ca do comportamento humano. A Psicologia analisa mais o comportamento individual, enquanto a Antropologia aprofunda os comportamentos grupais, so- ciais e culturais. Desse modo a Psicologia ajuda a Antropologia a compreender a complexidade das culturas a partir da avaliação do comportamento dos seus indivíduos. Essa, por sua vez, auxilia a Psicologia a perceber cada indivíduo como ser inculturado que recebe influência do ambiente onde vive e do grupo cultural a que pertence. Os dados resultantes desse processo ajudam a des- vendar melhor o mistério da existência humana. No que se refere à interação entre Antropologia e Ciências Econômicas e Políticas, pode-se afirmar que os estudos comuns estão relacionados à com- preensão das organizações econômicas e das instituições que regulam o poder dentro dos grupos humanos. Trata-se, sem dúvida alguma, de uma realidade complexa e bastante diferenciada, mas que é determinante para a existência das sociedades e de suas culturas. Quanto à relação entre Antropologia e História podemos afirmar que o ponto de encontro é basicamente a tentativa de reconstrução de culturas que já desapareceram. A História permite a Antropologia conhecer as origens dos fe- nômenos culturais, bem como as formas de adaptação e de modificação intro- duzidas pelas pessoas no meio ambiente. 5. Métodos científicos da Antropologia Enquanto ciência social que estuda o ser humano, a Antropologia faz uso de diversos métodos, de acordo com os seus campos e com as situações (MARCONI; PRESOTTO, p. 11-14). Por método entende-se um conjunto de regras bem definidas que são utilizadas na investigação. Normalmente o méto- do segue um procedimento anteriormente elaborado e que deve ser cuidadosa
  • 8. e escrupulosamente observado. O método tem como finalidade descobrir quais são as lógicas e as leis da natureza e da sociedade, visando respostas satisfa- tórias. Normalmente são utilizados sete métodos nas pesquisas de Antropolo- gia. O primeiro é o método histórico utilizado para a investigação de culturas passadas. Por meio dele o antropólogo, com a ajuda do historiador, tenta re- construir as culturas, explicar fatos e observar fenômenos, como, por exemplo, as mudanças ocorridas e as adaptações. O segundo é o método estatístico empregado, sobretudo para analisar as variações culturais das populações ou sociedades. Os dados são obtidos por meio de tabelas, gráficos, quadros com- parativos etc. O terceiro é o método etnográfico utilizado para descrever as so- ciedades humanas, de modo particular as consideradas primitivas ou ágrafas (sem escrita). O método consiste essencialmente em levantar todos os dados possíveis sobre uma determinada cultura ou etnia e, a partir desses levanta- mentos, tentar descrever o estilo de vida ou cultura desses grupos. O quarto método é chamado de comparativo ou etnológico. É usado de modo particular para a pesquisa sobre populações extintas. Por meio da com- paração de materiais coletados, especialmente fósseis, se estudam os pa- drões, os costumes, os estilos de vida das culturas, vendo de modo particular as diferenças e semelhanças existentes entre elas. O objetivo é melhor com- preender as culturas passadas e extintas. O quinto método é conhecido como monográfico. É também chamado de estudo de caso. Consiste em estudar com profundidade determinados grupos humanos, considerando todos os seus as- pectos como, por exemplo, as instituições, os processos culturais e a religião. O estudo monográfico é muito importante para os casos de culturas que estão ameaçadas de extinção, uma vez que permite analisá-las e descrevê-las de forma bem pormenorizada. Por fim, temos o método genealógico e o método funcionalista. No pri- meiro caso trata-se de um método usado para o estudo do parentesco e todos os outros aspectos sociais dele decorrentes. Visa à análise da estrutura familiar e exige a presença de um informante, ou seja, de alguém que possa revelar os nomes das pessoas que compõem a árvore genealógica. No segundo caso, a cultura é estudada e analisada a partir do âmbito da função ou das funções.
  • 9. Por meio dele busca-se perceber a funcionalidade de uma determinada unida- de cultural no contexto da cultura geral ou global. 6. Técnicas de pesquisa da Antropologia Já foi possível perceber que aos métodos estão associadas determina- das técnicas de pesquisa. Por técnica entende-se a habilidade do cientista ou pesquisador no uso dos métodos, ou seja, daquele conjunto de regras bem definidas que são utilizadas na investigação e que lhe permite obter os dados desejados. As técnicas usadas no campo antropológico são três: observação, entrevista e formulário (MARCONI; PRESOTTO, p. 14-16). A técnica da observação consiste na coleta e obtenção de dados. Nela os sentidos têm um lugar privilegiado. Ela pode ser sistemática ou participante. Na sistemática o pesquisador direta (pessoalmente) ou indiretamente (por meio de outras pessoas) observa os fatos no local da investigação e por um período de tempo. Na participante o pesquisador, por um longo período de tempo, par- ticipa do seu campo de pesquisa. É muito utilizada para a pesquisa cultural. Neste caso o cientista torna-se um participante ativo da cultura que quer estu- dar. Ela exige fina capacidade de observação, superação de preconceitos, tra- balho diário de anotação, registro de fatos e de dados. Exemplo desse tipo de pesquisa é aquela feita pelo francês Roger Bastide sobre as religiões africanas em Salvador (Bahia) ou o caso de Dacyr Ribeiro que conviveu durante muito tempo com os índios Kayapós em Mato Grosso. Também Roberto DaMatta descreve a sua pesquisa entre os índios Gaviões no Pará e entre os Apinayé no atual estado de Tocantins (DAMATTA, p. 182-240). A técnica da entrevista consiste num contato direto, face a face, do cien- tista e pesquisador com a pessoa entrevistada, da qual ele pretende obter in- formações. A entrevista pode ser estruturada ou semiestruturada (livre). A en- trevista estruturada é aquela na qual o entrevistador segue um roteiro pré- estabelecido. A semiestruturada é aquela do tipo informal, sem roteiro a ser seguido, na qual o entrevistador vai colhendo as idéias do entrevistado, mani- festadas de forma espontânea. O formulário é uma técnica que se parece com o questionário. Consiste num levantamento de dados feito através de uma série organizada de pergun-
  • 10. tas escritas entregues ao entrevistado, às quais ele é convidado a responder. De certa maneira é uma pesquisa dirigida, uma vez que o rol de perguntas é feito pelo entrevistador, visando obter esclarecimentos sobre determinadas questões. Convém observar que no caso das duas últimas técnicas, embora as respostas sejam dadas pelo entrevistado, o modo de formular as perguntas e a escolha do público alvo pode induzir a um determinado resultado. Isso aconte- ce, por exemplo, em certas pesquisas de opinião pública, como ficou bem evi- dente por ocasião das recentes eleições no Brasil. O risco de manipulação dos resultados pode sempre existir. Neste caso temos um problema ético muito grave e o cientista encarregado da pesquisa pode ser responsabilizado por fal- sificar os resultados. Conclusão Podemos concluir afirmando que, dada as suas características, a Antro- pologia é uma ciência de extrema atualidade. Ela pode contribuir para o desen- volvimento dos seres humanos e dos povos. O resultado de seus estudos e pesquisas ajuda na superação de desequilíbrios e de tensões culturais. Os an- tropólogos costumam apontar as causas das tensões sociais e indicar soluções para que se restabeleça o equilíbrio entre os diversos grupos culturais. O grande desafio está no fato de que as culturas dominantes nem sem- pre concordam com as conclusões dos estudos e das pesquisas dos antropó- logos. Por isso muitas tensões sociais permanecem e até tendem a se agravar. Não se quer escutar uma verdade que incomoda. “A ação do antropólogo é de relevância, mas a perspecti- va histórica tem demonstrado que sua tarefa lhe tem sido decep- cionante, em face das pressões da cultura dominante, que nem sempre concorda com as posições teóricas e os métodos huma- nísticos por ele adotados, ao desempenhar o papel de concilia- dor entre o mundo dominante e o mundo dominado” (MARCONI; PRESOTTO, p. 19).
  • 11. Mesmo assim vale a pena insistir sobre a importância da Antropologia no mundo de hoje. Com a sua função de produzir interpretações das diferenças e de captar, com reverência e profunda compreensão, o essencial de cada cultu- ra diferente, ela contribui para alargar nossas visões e romper esquemas ideo- lógicos que tendem a desvalorizar aqueles que não são e não pensam como nós (DAMATTA, p. 143-150). A Antropologia, mesmo no atual contexto, tem essa função de ser ponte e mediação entre dois mundos. Cabe-lhe a tarefa de ajudar-nos a ver o diferente não como algo exótico, distante e marginal, mas como uma realidade familiar. Embora não deixe também de ter a função de manter o caráter “exótico” de cada cultura, ou seja, de insistir sobre o direito que cada cultura tem de permanecer diferente, com suas características pró- prias, sem que lhe seja imposta uma aculturação forçada. Bibliografia DAMATTA, Roberto. Relativizando. Uma introdução à Antropologia So- cial. Rio de Janeiro: Rocco, 1987. MARCONI, Marina de Andrade; PRESOTTO, Zélia Maria Neves. Antro- pologia. Uma introdução, São Paulo: Atlas. 2006, 6ª edição. RAMPAZZO, Lino. Antropologia, religiões e valores cristãos, São Paulo: Loyola.