Este poema-canção de Chico Buarque analisa a dor da perda de um filho e a saudade sentida por uma mãe após seu filho ter sido morto durante a ditadura militar no Brasil. A obra descreve a dor da separação e como a saudade é um tormento constante, pior do que o esquecimento. Cada estrofe expressa a falta que o filho faz e como um pedaço da mãe também partiu com sua morte.
1. UNIP – Universidade Paulista – Campus Vergueiro
Faculdade de Letras
Licenciatura em Línguas Portuguesa e Inglesa
LITERATURA BRASILEIRA -
ANÁLISE DO POEMA-CANÇÃO -
PEDAÇO DE MIM DE CHICO BUARQUE
Marcelino de A. França – B6597D – 1
Silvaneide Queiroz de Souza – B96164 – 3
Valdeide Lopes Costa – B751FA – 0
Usame Altintas – T49263 – 7
SÃO PAULO 2014
2. Introdução
Esta pesquisa está entre a análise e artigo de opinião, do poema-canção Pedaço
de Mim de Chico Buarque de Holanda. Optamos por essa forma de construção do
trabalho, por uma liberdade poética que o assunto inspira e sugere.
A obra
PEDAÇO DE MIM
Chico Buarque
Oh, pedaço de mim
Oh, metade afastada de mim
Leva o teu olhar
Que a saudade é o pior tormento
É pior do que o esquecimento
É pior do que se entrevar
Oh, pedaço de mim
Oh, metade exilada de mim
Leva os teus sinais
Que a saudade dói como um barco
Que aos poucos descreve um arco
E evita atracar no cais
Oh, pedaço de mim
Oh, metade arrancada de mim
Leva o vulto teu
Que a saudade é o revés de um parto
A saudade é arrumar o quarto
Do filho que já morreu
Oh, pedaço de mim
Oh, metade amputada de mim
3. Leva o que há de ti
Que a saudade dói latejada
É assim como uma fisgada
No membro que já perdi
Oh, pedaço de mim
Oh, metade adorada de mim
Lava os olhos meus
Que a saudade é o pior castigo
E eu não quero levar comigo
A mortalha do amor
Adeus
Contexto
Este poema canção é parte da trilha sonora do musical "Ópera do Malandro",
grande sucesso de Chico Buarque, criado em 1978 e lançado em 1979.
Francisco Buarque de Hollanda nasceu no Rio de Janeiro em 1944, em 1946 a
família muda-se para São Paulo, em 1953 para Roma e retornam ao Brasil e a São
Paulo em 1960. Filho do historiador Sérgio Buarque de Hollanda, Chico Buarque
teve acesso à nata do pensamento intelectual e cultural devido às visitas que seu
pai recebia em casa, influenciando assim, seu pensamento crítico e a habilidade
comunicativa. Chico estudou no Colégio Santa Cruz, com forte influência para
estudos sociais, assim como cursou a FAU, Faculdade de Arquitetura e Urbanismo
da Universidade de São Paulo, na época forte reduto de estudiosos voltados para
os problemas sociais do Brasil.
A obra, foi criada para à amiga e estilista internacionalmente reconhecida, Zuzu
Angel, que teve o filho, Stuart Angel Jones de 25 anos, torturado, morto e dado
como desaparecido pela ditadura militar. A estilista fez uma campanha internacional
de denuncia contra as brutalidades do regime militar brasileiro e pelo retorno do
corpo do filho, que também possuía a cidadania americana graças ao pai o
americano Norman Angel Jones. Zuzu faleceu na madrugada de 14 de abril de
4. 1976, num trágico acidente na saída do Túnel Dois Irmãos, na estrada da Gávea,
Rio de Janeiro. O processo do acidente foi revisto em 1998 pela Comissão Especial
dos Desaparecidos Políticos, que reconheceu que por sua luta engajada contra a
ditadura e pelo corpo do filho, o acidente era passível de ter sido forjado ou forçado
e que a mesma teria morrido de razões não naturais em dependências policiais ou
assemelhadas.
Análise
Chico Buarque de Holanda fez esse poema canção para assim, expor o
sofrimento dessa mãe e de muitas outras, como também de pais, irmãos, familiares
e amigos, que passaram pelo mesmo sofrimento e angustia. O autor se põe no
papel de quem perde um ente muito amado, e de maneira muito trágica, como se a
própria mãe fosse a narradora do sofrimento.
Composto em sextetos e quase simétrico, demonstra cuidados técnicos e uma
elaboração quase formal, isso tanto para o poema como para a melodia, repetindo
por igual nas cincos estrofes. Entre o menestrel, aquele que exercita,
predominantemente, as funções de músico e cantor, ou trovador, pela autoria do
trabalho, toda a obra de Chico Buarque é cuidadosamente construída, nada é
inocente ou por acaso.
O poema possui um eu lírico em primeira pessoa, que ama desesperadamente,
e apesar da métrica quase exata de um mantra ou oração, o ritmo de canção se
impõe, em um tom crescente de dor marcado pelas escolhas lexicais no segundo
verso, o que muito se assemelha as poesias da escola romântica da segunda
geração. Apresenta ainda uma linguagem marcada pela interjeição, que inicia os
dois primeiros versos de cada estrofe, dando um ar de suplica, que é reforçada pela
repetição do primeiro verso em todas as estrofes. É a dor e a saudade causadas
pela separação entre entes mui amados como a dor incurável da perda de um filho.
5. Comparação
Fazendo uma comparação com a canção EU TE AMO, do mesmo autor gravada
em 1980, nota se a entrega que do mesmo ao sentimento exagerado, a entrega por
completo ao ser amado. Já no primeiro verso da canção, o autor faz uma suplica a
mulher amada e no terceiro, o autor intimida a pessoa amada, como se a falta dela
lhe amputasse as pernas. Esse tipo de exacerbação romântica acompanha as obras
de Chico.
“Ah, se já perdemos a noção da hora
Se juntos já jogamos tudo fora
Me conta agora como hei de partir”
“Se nós, nas travessuras das noites eternas
Já confundimos tanto as nossas pernas
Diz com que pernas eu devo seguir”
Aqui uma interpretação livre.
Oh, pedaço de mim. Ele diz da falta que o filho faz, pois os dias daquela mãe
nunca mais serão os mesmo.
Oh, metade afastada de mim. A morte interrompeu uma vida inteira que ele
tinha pela frente ao lado de seus familiares.
Leva o teu olhar. O olhar do filho que nunca mais ela irá ver...
Que a saudade é o pior tormento. A falta a dor da saudade a tristeza a
solidão.
É pior do que o esquecimento. Esquecer uma pessoa é fácil o difícil é sentir
saudade e saber que não poderá vê-la nunca mais.
É pior do que se entrevar. É pior do ficar inválido.
Oh, metade exilada de mim. Um pedaço dela também foi com o filho.
Leva os teus sinais. No interior daquela mãe o filho também possa ter
lembranças dela.
6. Que a saudade dói como um barco. A saudade é uma dor que não passa,
navega por todo o ser de uma pessoa.
Que aos poucos descreve um arco. A infinidade ele não irá voltar, essa
tristeza será pra sempre.
É evita atracar no cais. Cais é uma estrutura fixa, a mãe pode não ter essa
estrutura para suportar tanta dor.
Oh, metade arrancada de mim. Quando foi assassinado brutalmente um
pedaço dela foi junto com ele, pois os filhos são parte da mãe, quando um
deles morre um pedaço é arrancado dela e vai junto deles.
Leva o volto teu. Levou o corpo e ficou as lembranças.
Que a saudade é o revés de um parto. Um parto é uma felicidade a morte é
uma tristeza uma dor desespero.
A saudade de arrumar o quarto do filho que já morreu. Tem lembranças de
quando ele era criança e ela arrumava talvez com brinquedos para todos os
lados, hoje o filho não está mais presente , ao lado da mãe.
Oh, metade amputada de mim. O pedaço dela que se foi.
Leva o que há de ti. Tudo foi com ele ficou somente saudade.
Que a saudade dói latejada. Como uma pontada ou uma facada à todo
momento.
É assim como uma fisgada. No membro que já perdi. É como tivessem
retirado um órgão do corpo dela. O filho foi tirado, mas a dor continua ali
dentro para sempre.
Oh, metade adorada de mim. Um pedaço dela foi embora.
Lava os olhos meus. Lavar os olhos pra ver se é realidade ou um pesadelo.
Que a saudade é o pior castigo. É a pior dor que o ser humano pode ter,
não há nada para ser comparada.
E eu não quero levar comigo. A mortalha do amor Adeus. Não quer ter essas
lembranças do filho.