O documento discute a condição de "usuários" e como eles são caracterizados de forma limitada e oprimida. Apesar de serem capazes de projetar o futuro e produzir novas tecnologias, "usuários" historicamente foram afastados dos espaços de projeto e tiveram sua especialização negada.
8. Vieira Pinto
Campos dos Goytacazes 1909 ⭒
Rio de Janeiro 1987 †
Paulo Freire
⭒ 1921 Recife
† 1997 São Paulo
Ler Vieira Pinto e Paulo Freire me apresentou
um viés dialético-existencial para Design e IHC
+Augusto Boal
+Fanon
+Marcela Lagarde
…outras?
10. ser humano é ação no mundo
seu ser inclui o mundo ao redor
ser humano produz
sua própria existência
humano é produto e produção do mundo
transforma a realidade para se transformar
Usuários e Produção da Existência (Gonzatto, 2018)
11. ser humano é
histórico
e o futuro
“…para ser tem que estar sendo”
(Freire - Pedagogia do oprimido)
“O futuro não nos faz.
Nós é que nos refazemos na luta para fazê-lo”
(Freire - Pedagogia da indignação)
nunca está pront
o
não é determinad
o
sempre é aberto
“educando”
“processo de
humanização”
Existential time and historicity in interaction design (van Amstel, Gonzatto, 2021, no prelo)
12. futuro
vocação ontológica
do ser humano
esperança projeto
trabalho
inconclus
o
incomplet
o
inacabado
sempre em construçã
o
sempre em desenvolvimento
sonho
inédito
viável
ser mais
novas formas
de convivência
13. crítica ao
fatalismo
critica a
domesticação
do futuro
critica a
ideologia da
técnica
critica a
futurologia
negação da historicidade
do existente human
o
crític
a
ser-menos / desumanizaçã
o
des-dialetização do mundo
crítica ao
neoliberalismo
critica a
o
embasbacamento
crítica a
educação
bancária
crítica a
dor do futurível
(o que poderia ter sido)
crítica ao
messianismo e
saudosismo
crítica a
desproblematizaçã
o
do futuro
(futuro como dado)
14. The ideology of the future in design
fi
ctions (Gonzatto, van Amstel, Merkle, Hartmann, 2013)
Futuro da Tecnologia ou Tecnologia do Futuro? (Gonzatto, Merkle, 2016)
a especulação sobre o futuro
está sempre falando…
sobre o presente
futuro não se descobre,
se produz
“A condição, própria da consciência,
de estar centralizada no presente,
mas ter por essência do seu modo de
ser o expandir-se, o projetar-se na
reminiscência do passado e na
predição do futuro, obriga toda
futurologia a assumir necessariamente
o caráter de ideologia social.”
(ÁlvaroVieira Pinto)
futuros são
ideológicos
16. por qual futuro
“usuários” podem
esperar?
atencioso
“usuários” cada vez mais
exigentes com os produtos
forçam o mercado a melhorar
criativ
o
o mercado incluirá cada vez
mais “usuários” como
prosumidores
colaborativo
o futuro do mercado é
cultura da colaboração
tecnológic
o
“usuários terão mais
opções, mais funções ao
alcance da mão
ativ
o
nas mídias digitais usuários são
ativos, diferentemente dos
antigos telespectadores
passivos
17. por qual futuro
“usuários” podem
esperar?
atencioso
“usuários” cada vez mais
exigentes com os produtos
forçam o mercado a melhorar
criativ
o
o mercado incluirá cada vez
mais “usuários” como
prosumidores
colaborativo
o futuro do mercado é
cultura da colaboração
tecnológic
o
“usuários terão mais
opções, mais funções ao
alcance da mão
ativ
o
nas mídias digitais usuários são
ativos, diferentemente dos
antigos telespectadores
passivos
exemplos de
usuarismo
futurologia
“esperem que sua hora vai chegar”
porque não antes?
porque pressupõe-se que o futuro
não é criado pelos “usuários”
18. presente
exclusão digital
di
fi
culdade de acesso a equipamentos, internet
escasso letramento digital (educação)
falta de investimentos em acessibilidade
precarização do trabalh
o
uberização do trabalho que produz pela
dependência de demanda das plataforma
s
obsolescência programada
produtos que só servem no agor
a
propriedade intelectual
tradição mediante royalties
dati
fi
cação:
sem controle dos próprios dados;
qual a
fi
scalização da LGPD
?
ausência de direitos: limitado a condição
de consumidor; qual a
fi
scalização do Marco Civil
(interesses de mídia sociedade civil
)
sistemas fechados: caixas pretas.
artefatos que di
fi
cultam a transformação para
outros projetos. perda do direito ao repar
o
criminalização do software livre,
cultura hacker, a chamada “pirataria”
19. Usuários e Produção da Existência (Gonzatto, 2018)
User oppression in HCI (Gonzatto, van Amstel, em submissão)
caracterização ingênua de usuário
:
“quem usa”
(computadores, máquinas, sistemas e outros artefatos)
20. Usuários são afastados dos
espaços e tempos projetuais
privilegiados
Usuários foram
desespecializados
Usuários e Produção da Existência (Gonzatto, 2018)
busca por caracterização crítica de usuário
:
construção social e histórica
21. • “Usuários” não são ignorantes: lhes foi negada a
especialização em tecnologias computacionais
• Pessoas foram historicamente desespecializadas
de sua busca pelo domínio das tecnologias digitais
• Nos negamos a reconhecer
que “usuários” podem se especializar
Usuários foram
desespecializados
22. • Utentes projetam, nos espaços que lhes são
possíveis Mas esses não são espaços de projeto
privilegiados pelo modo de produção capitalista.
• Afastados dos espaços projetuais propícios
para transformar computadores
(fábrica, indústria, estúdio)
• Mesmo “fora” exige-se de usuários uma
percepção do sistema que cujo espaço para
ter/participar é muito regulado
Usuários são afastados dos
espaços e tempos projetuais
privilegiados
23. opressão dos usuários
limitação, regulação ou negação de participação da produção
das tecnologias que podem efetivamente transformar seu
entorno e servirem de mediação para uma produção da
existência para si.
User oppression in HCI (Gonzatto, van Amstel, em submissão)
usuarismo
distinção social de grupos por
sua relação com as técnicas
que nega, subestima, prevene,
bloqueia ou explora o seu
desenvolvimento humano
domesticação do futuro
ocultação do futuro como
campo de superação da opressão
do presente
ocultada por operação ideológicas como:
24. caracterização cotidiana de projeto:
“usuário” posto como o
“outro” dos projetistas
de
fi
nido pela carência/ausência/falta
projetista
projeta
dentro
especialista
técnic
a
razão
sujeit
o
futur
o
usuário
usa
fora
não-especialist
a
intuiçã
o
emoçã
o
objet
o
presente
Usuários e Produção da Existência (Gonzatto, 2018)
25. quando “usuários” começam a dominar tecnologia
s
paramos de chama-los de “usuários
“se tornam
”
hackers
everyday designer
amateur designer
non-expert designers
co-designers
não-designers
etc.
não “usam”. fazem:
design intuitivo
design espontâneo
ad hoc appropriations
creative use
creative practice
design-by-use
Non-Intentional Design
etc.
Usuários e Produção da Existência (Gonzatto, 2018)
26. Exemplo de teorização de usuários em IHC
algumas promessas
User oppression in HCI (Gonzatto, van Amstel, em submissão)
advogar por seus interesses
(Cooper and Bowers, 1995; Woolgar, 1990
)
colocá-los no centro do projeto
(Vandenberghe; Slegers, 2016; Spinuzzi, 2003
)
proteger de riscos associados a erros de uso
(Pereira et al., 2015
)
satisfazer suas necessidades
(Kaptelinin and Nardi, 2012
)
facilitar sua vida funcionalmente
(Banon and Bødker, 1991)
27. quem paga e
fi
nancia
“usuários” sendo:
Centrado
s
Modelado
s
Avaliado
s
Testados
— designers trabalham para quem?
Design Centrado no Usuário
mas submisso a lógica de mercado que vem antes dele?
28. Estudos críticos sobre usuários revelam
uma outra imagem:
User oppression in HCI (Gonzatto, van Amstel, em submissão)
recurso cênico do espaço
projetual
(Sharrock and Anderson, 1994)
representados como ingênuos
(Bannon, 1991)
ou exóticos (Cooper and Bowers,
1995)
vitimizados por problemas de
usabilidade, dependentes de
salvacção por um designer-
herói (Spinuzzi, 2002).
representados de forma
abstraídas, sem referências
históricas e comunitárias
(Bannon and Bødker, 1991;
Oudshoorn, 1991),
estereotipados (Melo, 2012),
patologizados (Cooper and Bowers,
1995), descorpori
fi
cados (Lupton,
1995), e desempoderados
(Kerssens, 2016; Clement, 1994)
seres passivos nas mãos de
designer, como “amigos
imaginários” (Massanari, 2010)
30. projet
o
reduzid
o
a
o
us
o
instrumenta
l
caracterizad
o
po
r
demanda
s
d
o
presente
,
d
o
agor
a
com
o
s
e
dependesse
m
apena
s
d
e
outro
s
par
a
transforma
r
su
a
realidad
e
induze
m
a
image
m
super
fi
cia
l
d
e
qu
e
“usuários
”
nã
o
produze
m
futuro
s
31. “usuário” não de
fi
ne só quem us
a
caracteriza con
fi
guração socio-histórica,
marcada pela opressão,
do modo injusto como pessoas são postas
para se relacionar com as tecnologias que
necessitam para sobreviver
User oppression in HCI (Gonzatto, van Amstel, em submissão)
32. condição de “usuário
pessoa a quem foi negada especializar-se nelas
e foi afastada dos espaços onde poderia
participar em seu projeto (de existência
)
mas que
é pessoa que projeta, futura, produz
porque precisa usar tecnologias computacionais
para sobreviver e ser
Usuários e Produção da Existência (Gonzatto, 2018)
34. não tem apoio e não podem depender dos
projetos de designers pro
fi
ssionai
s
pois possuem outros interesse
s
pois possuem outras condições amanuais
“usuários” prospectam futuros
…
projeta
m
especula
m
porque precisam!
para sobreviver (resistência ao ser menos
)
para produzir sua existência (anúncio de ser mais
)
35. Criando pelo uso:
com o disponível nas circunstância
s
com o que se “tem a mão”
Adaptando/regulando
com o que se tem disponível
Projetando novas funções em objetos
que não foram “feitos para aquilo”
36. dual SI
M
caso de comunidades rurais no Quênia
uso de mais de um SIM no mesmo celular
(interface amanual)
como criar um botão de desliga
?
tirar a bateria para celular desligar quando
trava= botão de desligar (interface
amanual)
celular como lantern
a
foi observando o uso de celulares como lanternas
que essa funcionalidade foi “adicionada”
usuarios prospectam massivamente em us
o
em um ciclo de projeto e aplicaçã
o
interfaces amanuais
37. emoticons :
)
#hashtags
@pessoa
praticamente todas as funções
sociais de redes sociai
s
foram criadas pelos seus “usuários”
tempos e espaços de projetos diferente
s
demandas diferentes
Adaptando/regulando
com o que se tem disponível
38. “nuvem dos “usuários”
e-mail, grupo, whatsApp para si mesmo
para armazenamento ou notas
ou para transferir arquivos do celular pro computador
“usuários
”
projetando novas funções em objetos
que não foram “feitos para aquilo”
40. “usuários
”
projetam, computam e interagem
entre
o grau de amanualidade social possível
e o grau de amanualidade que cria
m
é uma amanualidade que foi
negada,
constrangida,
subdesenvolvida
41. prospecta
m
não com as técnicas de Design, IHC e Computação
que nunca lhe foram ensinadas, mas com
uso, não-us
o
gambiarra, adaptação, resigni
fi
caçã
o
resistência, contra-projeto
com técnicas manuais, artesanais, acessíveis, abundante
s
“usuários” se especializam em criar espaço projetua
l
nas brechas dos
processos produtivos
42. uma outra imagem
de “usuário”:
“Usuários” como sujeitos
na pesquisa e na prospecçã
o
de futuros
43. • “Usuários não devem ser só “objetos de futuros
(a quem o futuro se destina)
• “Usuários tem técnica, projetam e produzem
mesmo que em condições desprivilegiadas
• “Usuários” produzem Design, e o
Design deveria reconhecer a produção por utentes.
Que futuro é esse que
“usuários produzem?
44. ativismo LGB
T
projetando inclusão de
nome social em formulários
https://ufmg.br/comunicacao/noticias/nome-social-
pode-ser-incluido-na-plataforma-do-curriculo-lattes
45. “Eu acho que só quem não
briga é quem não tem futuro.
E quem não tem futuro, não tem
presente. Entende? Porque o
futuro a
fi
nal de contas não é uma
província que
fi
ca distanciada
de mim, muito além de mim,
à espera de que eu chegue lá,
pelo contrário, eu sou fazedor
do futuro. Somos nós enquanto
gente, enquanto povo, enquanto
classe social e, também,
enquanto indivíduos que temos
que transformando o presente,
com o aprendizado que a
experiência do passado nos deu,
criar o futuro. Quer dizer, o
futuro é uma invenção da gente.”
Glossário Audiovisual do educador Paulo Freire. Verbete: FUTURO
http://glossario.paulofreire.org/verbete/203
46. entregadore
s
projetando apps
(e disputando futuros)
com greve
https://www.uol.com.br/tilt/noticias/redacao/2020/07/01/greve-dos-
entregadores-ocorre-em-diversas-capitais-do- brasil-con
fi
ra.htm
47.
48.
49. Álvaro Vieira Pinto
O Conceito de Tecnologia
vol. 1
Compreende-se portanto que uma
fi
loso
fi
a, ao
pretender constituir-se à base das criações humanas do
presente, especialmente as de ordem tecnológica, e levar
em conta o processo da realidade, origine igualmente
uma “futurologia”, uma certa prospecção do porvir,
tendo por essência a descoberta daquilo, atualmente
existente, que será negado no futuro.
A legítima futurologia deve incluir portanto
não apenas a previsão do novo que está por vir,
mas a indicação do que se acha em via de
desaparecer, porque este último aspecto é c
condição da possibilidade do primeiro.”
52. retomar o projeto “para o outro” como
“para si
”
inverter a participação:
onde usuários já são sujeitos dos futuros?
não o “usuário” participando do design:
“usuário” já está projetand
o
mas outros assumindo-se também como
“usuários” e a apoiando o
design que vem de “usuários”
inverter a participação
53. modalidade de projeto
que é impossível de se realizar
sem ser por “usuários
o projeto para si
manifesto fabless
projeto para si, empoderamento emancipatório
libertação, partindo da manualidade,
não aceitação de ser apenas “usuário”
para nós
54. 1) As pessoas constroem
as máquinas;
2) As capacidades de
fabricação digital da
comunidade superam as
de qualquer indivíduo;
3) O laboratório de
fabricação digital existe
onde quer que a
comunidade necessite;
4) O resultado é mais
importante que os
métodos e ferramentas
utilizados para obtê-lo;
5) Pode existir um
laboratório de fabricação
digital sem máquinas, mas
não sem pessoas.
Mani
fi
esto Fab-Less: cómo fabricar casi cualquier cosa con casi nada
(Emilio Velis e coletivos de El Salvador)
outras condições/corporeidades
no subdesenvolvimento
:
designers “como usuários
55. o futuro para si
para nós
participar dos movimentos de
LIBERTAÇÃO (o novo) que a
RESISTENCIA (a opressão) dos
usuários já anunci
a
“usuários” já estão projetando
suas existências
suas condições materiais
56. quem tem que se fazer incluído”
na participação são os “projetistas
”
para tal, também
precisam estar como/com “usuários
”
produção de
futuros
pela produção de
novas formas de existência
57. Álvaro Vieira Pinto
O Conceito de Tecnologia
vol. 2 (p. 693)
“Deste modo parece-nos lícito dizer que a futurologia
eloqüente euforicamente desenhada por economistas e
sociólogos a serviço do imperialismo constitui alguma
coisa pior que um erro: é uma inutilidade.
O homem, em última instância, não está interessado
em saber com que máquinas irá conviver mas com
que homens. Outra maneira de dizer a mesma coisa:
o que o homem espera do futuro não são melhores
máquinas, que lhe dêem maior conforto,
mas melhores homens, formando uma
sociedade fraterna, sem riscos, privações,
angústias e explorações.