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Walter Aranha Capanema
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         A publicidade e o direito à informação na era da Internet


Introdução:

       Julian Assange, o mantenedor do site Wikileaks, ao permitir a divulgação de
documentos sensíveis da diplomacia americana, foi tratado ora como terrorista
(como entendeu a ex-governadora do Alasca, Sarah Palin), ora como herói da
liberdade e da transparência, por aplicar (ou ao menos parecer aplicar) a filosofia do
“The Hacker Manifesto”1.

       Vê-se que a legalidade da sua conduta vai depender do espectro em que for
analisada. Será que Julian Assange é um terrorista quando divulga documentos que
comprovam atividades ilícitas de governos? Ou será que ele é um herói quando
disponibiliza mapas com áreas de segurança sensíveis a ataques criminosos?

        O caso Wikileaks despertou a controvérsia: podem os governos definir o
sigilo e a proteção de seus documentos, mesmo dos seus cidadãos?



1. A legislação brasileira e a publicidade:



       O que se verifica, e é necessário utilizar como premissa, é que nem todos os
dados governamentais são de conhecimento público obrigatório, embora a sua
publicidade seja a regra geral.

        E essa distinção é feita, inclusive, pela legislação brasileira.



1
 “We explore... and you call us criminals. We seek after knowledge... and you call us criminals. We
exist without skin color, without nationality, without religious bias... and you call us criminals. You build
atomic bombs, you wage wars, you murder, cheat, and lie to us and try to make us believe it's for our
own good, yet we're the criminals. Yes, I am a criminal. My crime is that of curiosity. My crime is that
of judging people by what they say and think, not what they look like. My crime is that of outsmarting
you, something that you will never forgive me for”. The Hackers Manifesto. Disponível em
<http://www.phrack.org/issues.html?issue=7&id=3&mode=txt>. Acesso em: 20-dez-2010.
Walter Aranha Capanema
         www.waltercapanema.com.br / contato@waltercapanema.com.br

       A nossa Constituição Federal, inspirada e conduzida por ideais democráticos,
declara a importância da publicidade em várias situações, merecendo destaque três
delas:

   a) ao estabelecer a obrigação da Administração Pública de observar o princípio
      da publicidade (“publicidade administrativa” - art. 37, caput, CF);

   b) ao garantir a publicidade dos atos processuais, permitindo a sua restrição em
      casos de defesa da intimidade privada ou do interesse social (“publicidade
      processual” - art. 5º, LX, CF).

   c) ao conceder o direito de obtenção de certidões, para conhecimento e
      esclarecimento de situações pessoais do solicitante (“direito de informação” -
      art. 5º, XXXIV, b, CF).

     Esse direito à informação foi regulamentado por duas leis ordinárias (Leis
8.159/91 e 11.111/2005), definindo como regra geral o direito de acesso pleno aos
documentos públicos (art. 22, Lei 8.159/91).

      Todavia, se a divulgação desse documento colocar em risco “a segurança da
sociedade e do Estado, bem como aqueles necessários ao resguardo da
inviolabilidade da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem das pessoas”,
poderá, então, ser essa informação classificada como sigilosa, com uma restrição
de acesso de 30 a 100 anos, dependendo dos interesses envolvidos (art. 23, §§1º,
2º, 3º, Lei 8.159/91).

    Mas haveria limites para essa proteção? Poderia o particular analisar um
documento protegido sob sigilo?



2. A fiscalização da sociedade e o sigilo:

      Há entendimento no sentido de que a classificação de um documento público,
por ser ato exclusivo do Poder Executivo, não poderia ter seus critérios analisados
pelos outros Poderes, especialmente o Judiciário, sob pena de se violar a
necessária independência (art. 2º, CF).
Walter Aranha Capanema
         www.waltercapanema.com.br / contato@waltercapanema.com.br

      O que se critica é que essa classificação decorreria de critérios puramente
subjetivos e discricionários do Administrador, razão pela qual a proteção conferida
pela lei poderia ser utilizada para ocultar condutas ilegais governamentais.

      Um Prefeito, por exemplo, poderia contratar sem concurso público, em
violação ao art. 37, II, CF, e classificar como “sigilosos” os documentos funcionais
desses servidores de fato, dificultando a fiscalização e a investigação.

     Excepcionalmente, o art. 24, caput, da Lei 8.159/91 permite ao particular,
através de procedimento judicial, tomar conhecimento de documentos públicos, mas
desde que necessários “à defesa de direito próprio ou esclarecimento de situação
pessoal”. Busca-se aqui a resguardar interesse individual apenas.

       E se um grupo de hackers brasileiros decidir pela divulgação dessas
informações sigilosas, haveria alguma ilegalidade, mesmo que a sua sincera
intenção fosse de dar transparência aos atos governamentais?



3. A divulgação de documentos sigilosos sem autorização:

      Se tivéssemos um Wikileaks brasileiro, o nosso Julian Assange verde-
amarelo teria vários problemas com a lei.

       O art. 6º da Lei 8.159/91 determina que “(f)ica resguardado o direito de
indenização pelo dano material ou moral decorrente da violação do sigilo, sem
prejuízo das ações penal, civil e administrativa”.

      Com isso, seriam possíveis as seguintes repercussões jurídicas:

   a) ação de indenização / compensação por danos morais, por expor a
      privacidade de indivíduos. Se a violação da privacidade atingir um grupo,
      poder-se-ia falar em dano moral coletivo, a ser amparado por ação civil
      pública;

   b) condenação criminal: dependendo do caso, poderá configurar hipótese de
      crime contra a segurança nacional, previsto na Lei 7.710/83, como, por
      exemplo, na divulgação de documentos que mostrem os pontos sensíveis de
      invasão do território nacional. Seria, na hipótese, uma conduta que exporia
      perigo “a integridade territorial e a soberania nacional” (art. 1º, I). Ressalta-se
Walter Aranha Capanema
         www.waltercapanema.com.br / contato@waltercapanema.com.br

      que há entendimento no sentido de que essa lei seria inconstitucional, por
      prever, de forma ampla, as condutas que tipificariam o delito;

   c) condenação por improbidade administrativa: dependendo do status do
      agente, poderá ele ser condenado pela prática de ato que atente contra os
      princípios da Administração Pública (art. 11, da Lei 8.429/92).



Conclusão:

       Muito embora a Constituição Federal garanta a publicidade dos atos
governamentais, é preciso que essa divulgação não prejudique a intimidade do
particular e, ainda, não afete a coletividade como um todo.

      Logo, por mais que seja benéfica a divulgação de documentos públicos, se
essa publicidade trouxer prejuízos materiais e morais ao particular e à sociedade,
deverá ser mantido o necessário sigilo.

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O wikileaks e o direito à informação

  • 1. Walter Aranha Capanema www.waltercapanema.com.br / contato@waltercapanema.com.br A publicidade e o direito à informação na era da Internet Introdução: Julian Assange, o mantenedor do site Wikileaks, ao permitir a divulgação de documentos sensíveis da diplomacia americana, foi tratado ora como terrorista (como entendeu a ex-governadora do Alasca, Sarah Palin), ora como herói da liberdade e da transparência, por aplicar (ou ao menos parecer aplicar) a filosofia do “The Hacker Manifesto”1. Vê-se que a legalidade da sua conduta vai depender do espectro em que for analisada. Será que Julian Assange é um terrorista quando divulga documentos que comprovam atividades ilícitas de governos? Ou será que ele é um herói quando disponibiliza mapas com áreas de segurança sensíveis a ataques criminosos? O caso Wikileaks despertou a controvérsia: podem os governos definir o sigilo e a proteção de seus documentos, mesmo dos seus cidadãos? 1. A legislação brasileira e a publicidade: O que se verifica, e é necessário utilizar como premissa, é que nem todos os dados governamentais são de conhecimento público obrigatório, embora a sua publicidade seja a regra geral. E essa distinção é feita, inclusive, pela legislação brasileira. 1 “We explore... and you call us criminals. We seek after knowledge... and you call us criminals. We exist without skin color, without nationality, without religious bias... and you call us criminals. You build atomic bombs, you wage wars, you murder, cheat, and lie to us and try to make us believe it's for our own good, yet we're the criminals. Yes, I am a criminal. My crime is that of curiosity. My crime is that of judging people by what they say and think, not what they look like. My crime is that of outsmarting you, something that you will never forgive me for”. The Hackers Manifesto. Disponível em <http://www.phrack.org/issues.html?issue=7&id=3&mode=txt>. Acesso em: 20-dez-2010.
  • 2. Walter Aranha Capanema www.waltercapanema.com.br / contato@waltercapanema.com.br A nossa Constituição Federal, inspirada e conduzida por ideais democráticos, declara a importância da publicidade em várias situações, merecendo destaque três delas: a) ao estabelecer a obrigação da Administração Pública de observar o princípio da publicidade (“publicidade administrativa” - art. 37, caput, CF); b) ao garantir a publicidade dos atos processuais, permitindo a sua restrição em casos de defesa da intimidade privada ou do interesse social (“publicidade processual” - art. 5º, LX, CF). c) ao conceder o direito de obtenção de certidões, para conhecimento e esclarecimento de situações pessoais do solicitante (“direito de informação” - art. 5º, XXXIV, b, CF). Esse direito à informação foi regulamentado por duas leis ordinárias (Leis 8.159/91 e 11.111/2005), definindo como regra geral o direito de acesso pleno aos documentos públicos (art. 22, Lei 8.159/91). Todavia, se a divulgação desse documento colocar em risco “a segurança da sociedade e do Estado, bem como aqueles necessários ao resguardo da inviolabilidade da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem das pessoas”, poderá, então, ser essa informação classificada como sigilosa, com uma restrição de acesso de 30 a 100 anos, dependendo dos interesses envolvidos (art. 23, §§1º, 2º, 3º, Lei 8.159/91). Mas haveria limites para essa proteção? Poderia o particular analisar um documento protegido sob sigilo? 2. A fiscalização da sociedade e o sigilo: Há entendimento no sentido de que a classificação de um documento público, por ser ato exclusivo do Poder Executivo, não poderia ter seus critérios analisados pelos outros Poderes, especialmente o Judiciário, sob pena de se violar a necessária independência (art. 2º, CF).
  • 3. Walter Aranha Capanema www.waltercapanema.com.br / contato@waltercapanema.com.br O que se critica é que essa classificação decorreria de critérios puramente subjetivos e discricionários do Administrador, razão pela qual a proteção conferida pela lei poderia ser utilizada para ocultar condutas ilegais governamentais. Um Prefeito, por exemplo, poderia contratar sem concurso público, em violação ao art. 37, II, CF, e classificar como “sigilosos” os documentos funcionais desses servidores de fato, dificultando a fiscalização e a investigação. Excepcionalmente, o art. 24, caput, da Lei 8.159/91 permite ao particular, através de procedimento judicial, tomar conhecimento de documentos públicos, mas desde que necessários “à defesa de direito próprio ou esclarecimento de situação pessoal”. Busca-se aqui a resguardar interesse individual apenas. E se um grupo de hackers brasileiros decidir pela divulgação dessas informações sigilosas, haveria alguma ilegalidade, mesmo que a sua sincera intenção fosse de dar transparência aos atos governamentais? 3. A divulgação de documentos sigilosos sem autorização: Se tivéssemos um Wikileaks brasileiro, o nosso Julian Assange verde- amarelo teria vários problemas com a lei. O art. 6º da Lei 8.159/91 determina que “(f)ica resguardado o direito de indenização pelo dano material ou moral decorrente da violação do sigilo, sem prejuízo das ações penal, civil e administrativa”. Com isso, seriam possíveis as seguintes repercussões jurídicas: a) ação de indenização / compensação por danos morais, por expor a privacidade de indivíduos. Se a violação da privacidade atingir um grupo, poder-se-ia falar em dano moral coletivo, a ser amparado por ação civil pública; b) condenação criminal: dependendo do caso, poderá configurar hipótese de crime contra a segurança nacional, previsto na Lei 7.710/83, como, por exemplo, na divulgação de documentos que mostrem os pontos sensíveis de invasão do território nacional. Seria, na hipótese, uma conduta que exporia perigo “a integridade territorial e a soberania nacional” (art. 1º, I). Ressalta-se
  • 4. Walter Aranha Capanema www.waltercapanema.com.br / contato@waltercapanema.com.br que há entendimento no sentido de que essa lei seria inconstitucional, por prever, de forma ampla, as condutas que tipificariam o delito; c) condenação por improbidade administrativa: dependendo do status do agente, poderá ele ser condenado pela prática de ato que atente contra os princípios da Administração Pública (art. 11, da Lei 8.429/92). Conclusão: Muito embora a Constituição Federal garanta a publicidade dos atos governamentais, é preciso que essa divulgação não prejudique a intimidade do particular e, ainda, não afete a coletividade como um todo. Logo, por mais que seja benéfica a divulgação de documentos públicos, se essa publicidade trouxer prejuízos materiais e morais ao particular e à sociedade, deverá ser mantido o necessário sigilo.