O documento discute o fenômeno do "miguxês", uma forma de escrita usada na internet que alterna letras maiúsculas e minúsculas. Especialistas afirmam que é uma forma de identidade cultural para grupos online e não prejudica o aprendizado, desde que os jovens sejam alfabetizados corretamente. No entanto, miguxês não é aceito em provas formais por não seguir as normas da língua portuguesa.
1. O Miguxês, quem diria, vai virar dialeto
por Marcelo Xavier ( marcelo@rabisco.com.br )
Senhoras e senhores, miguxos e miguxas, parece brincadeira, mas o que era modismo veio
para ficar. Ou não? Na verdade, eu achei que se tratasse apenas de uma variação do
“internetês”, que tem as suas justificativas e a sua razão de ser. Afinal de contas, essa geração
de adolescentes foi pega de surpresa pelo hábito de ter que utilizar um terminal de computador,
coisa que a minha geração só conseguia dominar de forma correta se freqüentasse um curso
de datilografia. Hoje, as pessoas são obrigadas a se comunicar através de um teclado, tarefa
difícil para os não iniciados. A pressa ou a incapacidade de digitar com todos os dedos permitiu
que se criasse um código particular, o de usuário de internet. O Miguxês, odiado por tanta
gente (só no Orkut, existem mais de vinte comunidades sobre o assunto), seria a versão rococó
da linguagem internética: de tão lúdica, acaba se tornando hermética, exótica e entrópica.
Me socorro da Wikipédia para encontrar um conceito para “miguxês”. Aqui vai: é um termo
popular usado para designar uma forma de grafia que tenta imitar a linguagem infantil (também
chamada de quot;tatibitatequot;), sendo largamente usada na Internet por algumas adolescentes. Não
se confunde com o chamado internetês por não ter uso restringido à Internet, nem ter como
propósito agilizar a escrita. Ao contrário, é visível que essa forma de escrever é ainda mais
trabalhosa do que a escrita normal, dado o recurso comum de alternar letras maiúsculas com
minúsculas e substituir o quot;squot; por quot;xquot;. O termo é proveniente de quot;miguxaquot;, um hipocorístico para
quot;amigaquot;.
De forma a depreciar os adeptos desse estilo, muitos os associam aos “emos”, adolescentes
que cultivam cabelos “tigelinha”, pintam os olhos e se vestem de preto. A associação, por sinal,
é inevitável e irresistível, já que ambos postulam uma estética de afetação além do comum. E,
de fato, comum é o que interessa aqui. Porém, o que era para ser uma abreviação das
palavras, visando facilitar a escrita, virou uma barroquice sem tamanho. Palavras são escritas
com letras intercalando maiúsculas e minúsculas, causando um impacto visual bom para quem
tem extrema dificuldade em ler textos na tela do computador.
O Miguxês divide opiniões: ou se ama, ou se odeia de maneira total e irrestrita. A
Desciclopédia (versão politicamente incorreta da Wikipedia) trata do assunto sem meias
palavras. O verbete propõe alguns padrões de escrita, a saber:
* Miguxês padrão: escrita de acordo com as normas ortográficas de idiomas que usam o
alfabeto latino como o português e o inglês, com a exceção de que não existem letras
maiúsculas.
* Miguxês alternante: semelhante ao anterior, consiste em alternar letras maiúsculas e letras
minúsculas.
* Miguxês numérico: similar ao 1337, substitui certas letras por números, como no exemplo:
quot;01, p3xx01nh4xx!!quot; (port: quot;oi, pessoinhasquot;).
* Miguxês hieroglífico: norma de ortografia mais freqüente no MSN Messenger, consistindo
numa mistura aleatória de pictogramas (emoticons) e caracteres alfanuméricos. Não é
mutuamente inteligível com o português e aqueles que não são versados em miguxês
precisam de muita atenção, paciência e, principalmente, calma para não arrebentar o teclado
na cabeça do interlocutor.
Para não dar a impressão que a coluna pretende apenas debochar do assunto, eu puxo o
assunto do ponto de vista acadêmico, conforme li em um artigo muito interessante e elucidativo
do portal Clicrbs (www.clicrbs.com.br ). Na matéria, o site pergunta a alguns especialistas qual
é o ponto de vista de professores e linguístas. Gabriel de Ávia Othero, autor do livro Língua
Portuguesa nas Salas de Bate-Papo: Uma visão lingüística de nosso idioma na era digital, tem
uma visão menos ortodoxa do caso. Para ele, as transformações são naturais, e não existe
nada de errado nessa especilidade no idioma, e ainda comemora o fato de que, de qualquer
2. maneira, as pessoas estão usando a língua escrita para se comunicar, e em tempo real. “Tem
que ser um poliglota na tua língua, isso é importante”, diz ele. “Tem alunos que escrevem
internetês em redações. O meu caso, quando comecei a pesquisa para o livro na internet, era o
contrário. Eu era um lingüista, que domina a norma culta, em um ambiente onde só se falava o
internetês, e eu não entendia nada! Tive que me alfabetizar de novo”.
A respeito do fenômeno do miguxês, Othero entende que a alternância de caixa alta/caixa
baixa e outros artifícios é uma forma de buscar uma identidade num grupo de pessoas. Para
ele, a linguagem da Internet transcendeu a funcionalidade para uma questão de identidade
cultural. “A língua demarca nossa identidade. Essa é a identidade do grupo de pessoas que
mexe na internet. Os pais podem até querer acompanhar as conversar e às vezes não
conseguir entender”, diz.
Já Sabrina Abreu, coordenadora-geral da correção das redações do vestibular da
Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), acha que o modismo do miguxês “não
afeta a vida escolar dos alunos” e diz que nunca encontrou essa linguagem em provas. Porém,
o internetês (abreviações, por exemplo), embora poucos, sempre aparecem. Ele explica que,
desde 2006, existe uma pontuação específica a ser descontada em casos como esses. Sabrina
revela que já leu pq ( porque ), vc ( você ), tb ( também ) e qq ( qualquer ) em textos escolares.
Embora haja restrições ao internetês, a professora explica que é contra qualquer tipo de
censura à liberdade lingüística. “É uma forma de identidade entre os jovens, eles usam por um
determinado período. O miguxês é mais usado por adolescentes. Se eles foram alfabetizados
adequadamente e são bons leitores, não vejo problema algum. É como na infância, quando a
gente tem uma linguagem infantil, que chamamos de ‘tatibitate’. Depois passa. Reprimir não é
bom. A escola deve continuar fazendo seu papel, que é o de mostrar os diferentes níveis de
linguagem, até para entender o português comparativamente. Claro que não se pode aceitar o
miguxês numa prova, tem que saber o nível de linguagem a ser aplicado em cada momento”.
Se você acha que está por fora com essa onda de linguagem virtual, recomendo o site http://
aurelio.net/web/miguxeitor.html . É um chiste, mas é um chiste espirituoso. Aqui, você pode
transformar qualquer texto em bom Português clássico na curiosa linguagem “emo”. Veja como
ficou o soneto “Sete Anos de Pastor”, de Luís de Camões.
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