PROVA - ESTUDO CONTEMPORÂNEO E TRANSVERSAL: LEITURA DE IMAGENS, GRÁFICOS E MA...
Reflexão sobre a chuva
1. NO UNIVERSO
PESSOANO
Numa perspetiva pessoana, com um cheiro a Caeiro :)
A chuva que há tanto ameaçava cair, finalmente se fez sentir na pele nua das minhas mãos e
cara. As pingas são ténues e delicadas, o seu contacto com a minha pele provoca-me pequenos
arrepios, mas eu não desgosto, antes pelo contrário, a sua leveza faz-me sentir distante da realidade
em que me encontro e, por um momento, já não estou inserido naquela rua movimentada com
todas aquelas pessoas a procurar refúgio antes da tempestade, estou isolado, no meio de todas
aquelas gotas que caem ao meu redor formando uma pequena barreira entre mim e os demais.
Observar o cair da chuva faz-me pensar na admiração que tenho pela mesma, a fluidez e
simplicidade com que aquelas gotas percorrem o seu caminho até atingirem o chão é deveras
invejável. Por momentos, sinto-me algo inferior a esta água proveniente dos céus, enquanto a
mesma se encontra sempre fluída e espontânea eu hei de sempre me encontrar perdido em meio de
pensamentos, cuja demasia me impede de agir perdendo todo o meu tempo no meio de lamentos,
caindo, portanto, num poço sem fundo, Ah bela chuva, o quanto eu não dava para ter a tua
simplicidade e pureza e poder viver a minha vida naturalmente sem toda esta lucidez que teima em
não me abandonar.
A chuva tornou-se mais violenta, a minha roupa já se encontra completamente colada a mim e o
frio já começou a fazer-se sentir. Tento retomar a minha peregrinação mas o meu corpo parece não
me dar ouvidos Permito então que toda aquela água que cai sobre mim, percorrendo inteiramente o
meu corpo até atingir o chão, leve consigo as minhas preocupações e pensamentos numa tentativa
fracassada de me deixar apenas com as sensações que a mesma provoca no meu ser.
Subitamente já não sinto nada a cair sobre mim e constato que a chuva finalmente parou, de
forma tão espontânea como começou. Perdi a noção do tempo outra vez, a rua já se começa a
2. encher novamente e o som dos passos apressados e os sussurros das conversas vulgares começam a
atingir os meu ouvidos. Recomponho-me e, numa tentativa falhada, ajeito a minha roupa que
mostrava a minha silhueta de uma forma quase perfeita. Dou então continuidade ao meu passeio,
apesar de já não ter um destino.
O dia deu em chuvoso
Se eu fosse Ricardo Reis, não veria a chuva como o tórrido sofrimento que me abala, não a
pensaria como a minha alma despida e nua onde a água embate e fere, nem a sentiria como o
galopar de armas postas no céu e em mim. Se eu fosse Reis, não sofreria como sofro, nem
acabaria por desistir dos meus próprios desejos e sentimentos por saber que não faz sentido
insistir numa coisa que sei que não vai dar resultado. Se fosse como ele, veria em cada
oportunidade de sentir uma bomba prestes a explodir, correndo na direção oposta. Se pensasse
como ele, não acreditaria em banalizações e ilusões do senso comum, como se fosse tudo
perfeito, nem encontraria em cada canto um gatilho prestes a disparar.
Sinceramente, admiro-o esplendidamente por ser quem de facto nunca consegui ser: um
ser desprovido de emoções ou aparentemente desprovido das mesmas. A capacidade de
renunciar a tudo o que é intenso e vivo encanta-me com o mesmo poder com que o fogo me
aquece, a simplicidade com que encara a vida e a transfigura dão-me alento e a banalização de
tudo e a questionação de nada fazem-me acreditar que a vida poderá ser mesmo assim: simples e
fácil. Mas não o é… fico assustadoramente inquieta com as metamorfoses incessantes e disfóricas
desta, não sabendo onde me posicionar nem o que sentir. Acredito que tudo tem uma razão de
ser ou, até mesmo, que existe o destino como fator determinante da nossa vida. Porém não sei o
que fazer nem o que mais pensar, uma vez que apenas na última hora já me invadi de todos os
pensamentos cruéis e completamente acobardadores verosímeis. Só quero que chegue o verão e
a chuva passe, levando consigo as balas, os gatilhos, os ferimentos e, sobretudo, o sofrimento.
Apenas me quero convencer de que tudo é fugaz, efémero e transitório, tal como Reis, contudo
inserido na necessidade de evasão que possuo.
Porque, se fosse Reis, perceberia que a chuva é o segundo sol e é momentânea, afastar-
me-ia do que me pode vir a causar dor ou perturbação e viveria serena e tranquilamente!
12º ano