O artigo expressa raiva contra as medidas de austeridade anunciadas pelo primeiro-ministro, afirmando que estas medidas não estão no acordo com a Troika, punem os trabalhadores, e irão lançar milhares no desemprego e desespero, reduzindo drasticamente a economia. O autor argumenta que o governo deveria lutar mais para minimizar os sacrifícios e dar mais tempo a Portugal, em vez de agir como "diretores da Troika".
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Nicolau Santos: Uma raiva a nascer-me nos dentes
Nicolau Santos (www.expresso)
ontem às 12:01
Sr. primeiro-ministro, depois das medidas que anunciou sinto uma força a crescer-me nos dedos e uma raiva a nascer-
me nos dentes, como diria o Sérgio Godinho. V.Exa. dirá que está a fazer o que é preciso. Eu direi que V.Exa. faz o que
disse que não faria, faz mais do que deveria e faz sempre contra os mesmos. V.Exa. disse que era um disparate a ideia
de cativar o subsídio de Natal. Quando o fez por metade disse que iria vigorar apenas em 2011. Agora cativa a 100% os
subsídios de férias e de Natal, como o fará até 2013. Lançou o imposto de solidariedade. Nada disto está no acordo com
a troika. A lista de malfeitorias contra os trabalhadores por conta de outrem é extensa, mas V.Exa. diz que as medidas
são suas, mas o défice não. É verdade que o défice não é seu, embora já leve quatro meses de manifesta dificuldade em
o controlar. Mas as medidas são suas e do seu ministro das Finanças, um holograma do sr. Otmar Issing, que o incita a
lançar uma terrível punição sobre este povo ignaro e gastador, obrigando-o a sorver até à última gota a cicuta que o há
de conduzir à redenção.
Não há alternativa? Há sempre alternativa mesmo com uma pistola encostada à cabeça. E o que eu esperava do meu
primeiro-ministro é que ele estivesse, de forma incondicional, ao lado do povo que o elegeu e não dos credores que nos
querem extrair até à última gota de sangue. O que eu esperava do meu primeiro-ministro é que ele estivesse a lutar
ferozmente nas instâncias internacionais para minimizar os sacrifícios que teremos inevitavelmente de suportar. O que eu
esperava do meu primeiro-ministro é que ele explicasse aos Césares que no conforto dos seus gabinetes decretam o
sacrifício de povos centenários que Portugal cumprirá integralmente os seus compromissos - mas que precisa de mais
tempo, melhores condições e mais algum dinheiro.
Mas V.Exa. e o seu ministro das Finanças comportam-se como diligentes diretores-gerais da troika; não têm a menor
noção de como estão a destruir a delicada teia de relações que sustenta a nossa coesão social; não se preocupam com a
emigração de milhares de quadros e estudantes altamente qualificados; e acreditam cegamente que a receita que tão
mal está a provar na Grécia terá excelentes resultados por aqui. Não terá. Milhares de pessoas serão lançadas no
desemprego e no desespero, o consumo recuará aos anos 70, o rendimento cairá 40%, o investimento vai evaporar-se e
dentro de dois anos dir-nos-ão que não atingimos os resultados porque não aplicámos a receita na íntegra.
Senhor primeiro-ministro, talvez ainda possa arrepiar caminho. Até lá, sinto uma força a crescer-me nos dedos e uma
raiva a nascer-me nos dentes.
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Artigo publicado na edição impressa do Expresso de 15 de Outubro de 2011
http://aeiou.expresso.pt/gen.pl?p=print&op=view&fokey=ex.stories/681069&sid=ex.... 18-10-2011