Cortes orçamentais e recessão: o difícil equilíbrio de Portugal
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Ricardo Costa: O tempo perdido e o que sobra
Ricardo Costa (www.expresso.pt)
ontem às 11:58
É nestes momentos que se percebe com clareza que andámos meses e meses a falar de coisas sem relevância. E que
agora caminhamos inexoravelmente para uma recessão com um fim duvidoso
Em qualquer crise o tempo de resposta é um fator crítico. Responder muito depressa pode ser um erro grave. Mas
atrasar a resposta pode ser fatal. Sobretudo quando esse atraso obriga a medidas extremas num prazo muito curto. É
neste ponto que Portugal está.
Vivemos um longo período de pré-crise política, onde partidos e eleitores se enganaram uns aos outros. Quando o PS
brandia submarinos que estão pagos o PSD respondia com mordomias e luxos de boys ou empresas públicas. Todos
teriam as suas pequenas razões, mas com essa discussão enganaram um país inteiro. Um país que foi achando que a
crise acabaria no dia em que se fundissem institutos ou se renegociasse uma ou duas PPP.
O PS foi especialista na estratégia de adiar a realidade, com Sócrates a conseguir a proeza de anunciar desgraças como
se fossem as últimas, culpar os outros pelo mal e apadrinhar o bem que restasse.
Sócrates apenas adiou o seu fim. Virámos a página mas continuámos a perder tempo. No meio de medidas estruturais e
corajosas, o novo Governo incentivou um discurso de caça ao luxo e aos ricos do Estado (com conceitos miseráveis de
luxo e de ricos) e divulgou medidas sem impacto na despesa. O fim da gravata no Ministério da Agricultura continua a
deter a medalha de ouro da baixa demagogia.
A divulgação a conta-gotas destas pequenas medidas e dos gastos excessivos do PS teve um efeito grave. Muito boa
gente achou que isso resolvia o problema. E esse é o pecado capital do Governo. Vítor Gaspar, que sempre soube o que
tinha pela frente, devia ter proibido esses pequenos enganos: quando um país tem de fazer num só ano um corte de oito
mil milhões de euros no orçamento, não há gravatas ou mordomias que nos valham. Só cortando em salários ou pensões
é que se chega lá.
Chegámos, como sempre, tarde ao problema. E, como sempre, temos de travar mais do que os outros. A Irlanda, que
está a regressar ao crescimento, vai ter em 2012 um défice de 8,6%. E nós? Queremos ir diretos para 4,5%! Recordistas
nos adiamentos, queremos agora ser recordistas na correção do défice. Não tenho grandes dúvidas sobre o caminho a
seguir, mas tenho imensas sobre a velocidade da viagem. Cortar o défice, recapitalizar a banca e reformar a economia no
meio de uma recessão e de uma crise de dívida pública são coisas que nunca foram feitas em simultâneo.
Só temos uma esperança. Que a UE nos dê mais um ano ou dois para equilibrar o défice. Podemos cortar a sério, mas a
recessão dará cabo de todas as contas. Não vale a pena fingir que não é assim.
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Artigo publicado na edição impressa do Expresso de 15 de Outubro de 2011
http://aeiou.expresso.pt/gen.pl?p=print&op=view&fokey=ex.stories/681066&sid=ex.... 18-10-2011