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Segundo o sistema jurídico vigente, a maioridade penal se dá aos 18 anos de idade. Essa
norma encontra-se inscrita em três Diplomas Legais: 1) artigo 27 do Código Penal; 2)
artigo 104 caput do Estatuto da Criança e do Adolescente; 3) e artigo 228 da
Constituição Federal.

O Legislador manteve-se fiel ao princípio de que a pessoa menor de 18 anos não possui
desenvolvimento mental completo para compreender o caráter ilícito de seus atos, ou de
determinar-se de acordo com esse entendimento, erigindo, inclusive, o dogma
constitucional (CF, art. 228). Adotou-se o sistema biológico, em que é considerada tão-
somente a idade do agente, independentemente da sua capacidade psíquica.

Mas essa não foi uma constante. O Código Penal de 1969 (Decreto-lei nº 1.004/69), que
não chegou a viger, embora já estivesse em período de vacatio legis [1], possibilitava a
imposição de sanção penal a menor entre 16 e 18 anos, se este revelasse suficiente
desenvolvimento psíquico, bastante para entender o caráter ilícito do fato e de
determinar-se de acordo com esse entendimento. Aqui, o sistema adotado foi o
biopsicológico, ou seja, o de submissão da pessoa entre 16 e 18 anos a avaliação
psicológica para saber se, ao tempo do fato, possuía discernimento sobre a ilicitude de
seus atos.

À época, houve insurgência quanto à possibilidade da redução da maioridade penal.
Juristas e outros estudiosos combateram veementemente essa inovação não
implementada. Justamente em face das críticas, o Código Penal de 1969 não entrou em
vigor, e a reforma de 1984 (Lei nº 7.209/84) manteve a inimputabilidade penal ao
menor de 18 anos.

Na exposição de motivos da nova parte geral do Código Penal, o então Ministro da
Justiça Ibrahim Abi-Ackel justificou a opção legislativa aduzindo que "De resto, com a
legislação de menores recentemente editada, dispõe o Estado dos instrumentos
necessários ao afastamento do jovem delinqüente, menor de 18 (dezoito) anos, do
convívio social, sem sua necessária submissão ao tratamento do delinqüente adulto,
expondo-o à contaminação carcerária". [2]

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       sem origem aparente

      O eminente Ministro se referia ao Código de Menores (Lei nº 6.697/79), que
esteve em vigência por onze anos. Não obstante, a delinqüência junto a menores de
dezoito anos, ao invés de diminuir, aumentou.
Adveio o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069/90), substituindo o antigo
Código de Menores. Pensava-se ser esta Lei capaz de coibir a prática de condutas
criminosas por menores de 18 anos [3]. Tal, entretanto, igualmente não se verificou.

Em verdade, hoje se constata evolução crescente do número de adolescentes na prática
de atitudes criminosas, os quais já não mais se limitam ao cometimento de pequenos
delitos. A imprensa noticia com freqüência o envolvimento de menores em crimes
hediondos, como homicídio qualificado, tráfico de entorpecentes, estupro, extorsão
mediante seqüestro, latrocínio etc.

Surge, então, novamente, o debate sobre a questão da redução da maioridade penal.

É inolvidável, o jovem deste novo milênio não é aquele ingênuo de meados do Século
XX. Nos últimos cinqüenta anos, assistiu-se a evolução jamais vista em outro período
da humanidade. As transformações foram de ordem política, tecno-científica, social e
econômica. Caiu o muro de Berlim, surgiu o fenômeno da globalização, arrefeceram-se
as correntes ideológicas. No campo do conhecimento científico, houve a conquista do
espaço, o domínio da engenharia genética, a expansão da informática, a popularização
da internet, só para exemplificar.

Atualmente, o acesso à informação é quase compulsivo. Novas tecnologias fazem parte
do dia-a-dia das pessoas, inclusive dos jovens (telefone celular, internet, correio
eletrônico, rádio, tv aberta e fechada, etc). São tantos os canais de comunicação, que se
torna impossível manter-se ilhado, alheio aos acontecimentos. Não há espaço para a
ingenuidade, e com maior razão no que concerne aos adolescentes. Aliás, estes estão
mais afetos a essas inovações. Em algumas situações, há inversão da ordem natural. É
comum, por exemplo, filhos orientarem os pais sobre informática.

Nesse contexto, o menor entre 16 e 18 anos precisa ser encarado como pessoa capaz de
entender as conseqüências de seus atos, vale dizer, deve se submeter às sanções de
ordem penal. Como exposto, o jovem nessa faixa etária possui plena capacidade de
discernimento. Sabe e consegue determinar-se de acordo com esse entendimento.

Veja, quando se fala em maturidade para efeitos penais, não se busca inteligência
destacada, capacidade de tomar decisões complexas, mas tão-somente a formação
mínima de valores humanos que uma pessoa deve ser dotada, podendo discernir entre o
bem e o mal, entre o certo e o errado, entre o que constitui crime e a atipicidade (livre-
arbítrio). É a imputabilidade, que se faz presente quando o sujeito compreende a
ilicitude de sua conduta e age de acordo com esse entendimento. [4]

Para esse grau de compreensão, bastam inteligência e amadurecimento medianos,
tranqüilamente verificáveis nos adolescentes entre 16 e 18 anos. Ora, será que o menor
de dezoito e maior de dezesseis anos não sabe o que é matar alguém, subtrair coisa
alheia móvel, seqüestrar pessoa com o fim de obter qualquer vantagem, como condição
ou preço do resgate? Será que não é capaz de determinar-se de acordo com esse
entendimento? A realidade hodierna diz que sim.

Indiscutível, pois, o desenvolvimento psíquico-intelectual do adolescente nessa faixa
etária. Bem por isso, tem sido comum o ingresso de menores de 18 anos em
universidades, nos mais variados cursos. E mais, jovens que sequer concluíram o
segundo grau têm conseguido se matricular em cursos de nível superior, graças a
liminares. Como, então, considerar essas pessoas inimputáveis?

O próprio legislador-constituinte reconhece aos maiores de dezesseis e menores de
dezoito anos lucidez e discernimento na tomada de decisões ao lhes conferir capacidade
eleitoral ativa, conforme expressa previsão constante no artigo 14, § 1º, inciso II, alínea
c, da Magna Carta. Segundo a Constituição da República, homens e mulheres entre 16 e
18 anos estão aptos a votar em candidatos para qualquer cargo público eletivo
(vereador, prefeito, deputado estadual, deputado federal, senador e Presidente da
República). Cuida-se, evidentemente, de responsabilidade só atribuída a quem possua
elevado grau de maturidade. Esta é a conclusão lógica diante das implicações do voto
no processo político e no destino da nação. A propósito, o Professor e jusfilósofo
MIGUEL REALE, comentando a necessidade de reduzir a maioridade penal, já em
1990 escreveu [5]:

No Brasil, especialmente, há um outro motivo determinante, que é a extensão do direito
ao voto, embora facultativo aos menores entre dezesseis e dezoito anos, como decidiu a
Assembléia Nacional Constituinte para gáudio de ilustre senador que sempre cultiva o
seu ‘progressismo’... Aliás, não se compreende que possa exercer o direito de voto
quem, nos termos da lei vigente, não seria imputável pela prática de delito eleitoral.

Dessa forma, se de um lado a Constituição Federal considera o menor de dezoito e
maior de dezesseis anos inimputável (artigo 228), por outro, o permite exercer o direito
ao voto (artigo 14, § 1º, inciso II, alínea c). Distingue o Texto Supremo a maioridade
penal, da maioridade eleitoral [6].

Embora ambos os dispositivos emanem do mesmo Poder Constituinte, verifica-se certa
antinomia principiológica entre essas normas. Como um jovem pode ter discernimento
para votar, v.g., no Presidente da República, mas não o tem em relação à pratica de
crimes, ainda que hediondos? Vale dizer, o menor conhece toda importância da escolha
dos integrantes dos Poderes Legislativo e Executivo, mas não tem consciência das
condutas delituosas, por isso é inimputável. O que é mais complexo? Evidente, o
processo eleitoral.

Impõe-se sim uma revisão do preceito constitucional atinente à maioridade penal. O
debate é atual, pois a violência e o envolvimento de menores de dezoito anos tem
aumentado. Há respeitáveis vozes defendendo a diminuição da maioridade penal,
entretanto grande parte dessa corrente a condiciona à comprovação do desenvolvimento
intelectual e emocional do adolescente entre 16 e 18 anos [7]. Adoção do sistema
biopsicológico (ou biopsicológico normativo ou misto), onde as pessoas nessa faixa
etária necessariamente serão submetidas a avaliação psiquiátrica e psicológica para
aferir o seu grau de amadurecimento.

O grande inconveniente dessa opção está na necessidade de perícia psicológica e
psiquiátrica em todo menor entre 16 e 18 anos que venha a cometer infração penal.

Como é cediço, inexiste em nosso País estrutura organizacional para a realização desses
exames. Em cada crime ou contravenção praticada por adolescente nessa faixa etária,
ter-se-ia de providenciar perícia médico-psicológica para apurar a imputabilidade ou
inimputabilidade, mesmo em se cuidando de delito de bagatela. Ora, isso atrasaria
sobremaneira a instrução do processo, congestionaria a rede pública de saúde e obstaria
por completo a entrega da prestação jurisdicional. De salientar que em grande parte das
comarcas do interior do Brasil não há profissionais habilitados para tal. Haveria, então,
necessidade de transportar os menores para centro maior, aumentando os riscos de
resgate, fuga, além de considerável ônus para o Estado.

Quando se tentou implantar sistema semelhante em 1969, por ocasião da edição do
Decreto-lei nº 1.004/69 [8], o grande argumento contrário foi exatamente a dificuldade
para se aferir a capacidade de culpa na faixa dos 16 a 18 anos, mediante perícia
sofisticada e de difícil praticabilidade.

Pensamos que o mais justo e socialmente adequado para os dias atuais é a redução da
maioridade penal de 18 para 16 anos, sem necessidade de avaliação do grau de
desenvolvimento psíquico-emocional do menor. Adoção do critério puramente
biológico, porém a partir do décimo sexto aniversário do adolescente. Uma vez
completados 16 anos de idade, a pessoa sujeitar-se-ia às regras do Código Penal e leis
esparsas pertinentes. Não haveria qualquer subjetivismo. A fim de corroborar esse ponto
de vista, novamente trago à colação a abalizada lição do mestre MIGUEL REALE [9],
verbis:

Tendo o agente ciência de sua impunidade, está dando justo motivo à imperiosa
mudança na idade limite da imputabilidade penal, que deve efetivamente começar aos
dezesseis anos, inclusive, devido à precocidade da consciência delitual resultante dos
acelerados processos de comunicação que caracterizam nosso tempo.

É incompreensível a resistência quanto ao rebaixamento da maioridade penal. O
discurso pela manutenção da regra atual pode ser politicamente defensável e até
romântico, porém completamente divorciado da realidade, se considerarmos o nível de
amadurecimento do jovem entre 16 e 18 anos de idade e, ainda, espantosa violência com
que costumam agir. Há diversos países onde a maioridade penal inicia-se aos 16 anos
(p. ex: Argentina, Espanha, Bélgica e Israel); em outros, aos 15 anos (Índia, Egito, Síria,
Honduras, Guatemala, Paraguai, Líbano); na Alemanha e Haiti, aos 14 anos. E por
incrível que pareça, na Inglaterra a pessoa é considerada imputável a partir dos 10 anos.

Não podemos assistir de braços cruzados a escalada de violência, onde menores de 18
anos praticam os mais hediondos crimes e já integram organizações delituosas, sendo
inteiramente capazes de entender o caráter ilícito do fato e de determinar-se de acordo
com esse entendimento. O Estatuto da Criança e do Adolescente, por benevolente que é,
não tem intimidado os menores. Como forma de ajustamento à realidade social e de
criar meios para enfrentar a criminalidade com eficácia, impõe-se seja considerado
imputável qualquer homem ou mulher a partir dos dezesseis anos de idade.


Notas

1. Exposição de Motivos da Nova Parte Geral do Código Penal, itens 2 a 4.

2. Exposição de Motivos da Nova Parte Geral do Código Penal, item 23.
3. O Professor JULIO FABBRINI MIRABETE deixa claro essa esperança em sua obra
Manual de Direito Penal, vol. 1, Editora Atlas, 8ª edição, 1994, p. 209.

4. HELENO CLÁUDIO FRAGOSO, Lições de direito penal, parte geral, 4ª edição,
editora Forense, p. 205.

5. In Nova Fase do Direito Moderno, Ed. Saraiva, São Paulo, 1990, p. 161.

6. Pinto Ferreira, Código Eleitoral Comentado, 4ª edição, 1997, editora Saraiva, p. 40.

7. A esse respeito PEC nº 20, de 1999, de autoria do Senador José Roberto Arruda.

8. O aludido Decreto-lei, em seu art. 33 previa a redução da maioridade penal para 16
anos, desde que comprovado por perícia o suficiente grau de discernimento do jovem.

9. Ob. Cit., p. 161.

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      A morte do menino João Hélio, de 6 anos, arrastado por um carro depois de um assalto no Rio de Janeiro, reacendeu o debate
     sobre a redução da maioridade penal no país. Como em outros crimes violentos, menores de idade tiveram papel ativo no brutal
     crime - mas poderão ficar no máximo 3 anos presos. Saiba quais são os principais argumentos dos defensores e dos críticos da
                                       medida - e como a mudança na lei poderia ser realizada.

                                                      1. O que é maioridade penal?
                                      2. O que diz a legislação brasileira sobre infrações de quem
                                                    não atingiu a maioridade penal?
                                     3. Como é a legislação brasileira em relação a outros países?
                                       4. Quais os argumentos para reduzir a maioridade penal?
                                5. Quais mudanças são as propostas em relação à maioridade penal?
                                  6. O que dizem os que são contra a redução da maioridade penal?
                                           7. Quem é contra a redução da maioridade penal?
                                   8. Quem se manifestou a favor da redução da maioridade penal?
                                   9. Quais são os trâmites legais para reduzir a maioridade penal?
                         10. Que propostas sobre maioridade penal serão avaliadas pelo Congresso Nacional?
                      11. Quando a Câmara dos Deputados votará as propostas de redução de maioridade penal?
O que é maioridade penal?

  A maioridade penal fixada em 18 anos é definida pelo artigo 228 da Constituição. É a idade em que, diante da lei, um jovem passa a
  responder inteiramente por seus atos, como cidadão adulto. É a idade-limite para que alguém responda na Justiça de acordo com o
                         Código Penal. Um menor é julgado pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).


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   O que diz a legislação brasileira sobre infrações de quem não atingiu a maioridade
                                          penal?

Pela legislação brasileira, um menor infrator não pode ficar mais de três anos internado em instituição de reeducação, como a Febem. É
        uma das questões mais polêmicas a respeito da maioridade penal. As penalidades previstas são chamadas de “medidas
 socioeducativas”. Apenas crianças até 12 anos são inimputáveis, ou seja, não podem ser julgadas ou punidas pelo Estado. De 12 a 17
  anos, o jovem infrator será levado a julgamento numa Vara da Infância e da Juventude e poderá receber punições como advertência,
    obrigação de reparar o dano, prestação de serviços à comunidade, liberdade assistida, inserção em regime de semiliberdade ou
                  internação em estabelecimento educacional. Não poderá ser encaminhado ao sistema penitenciário.


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                      Como é a legislação brasileira em relação a outros países?

A legislação brasileira sobre a maioridade penal entende que o menor deve receber tratamento diferenciado daquele aplicado ao adulto.
   Estabelece que o menor de 18 anos não possui desenvolvimento mental completo para compreender o caráter ilícito de seus atos.
   Adota o sistema biológico, em que é considerada somente a idade do jovem, independentemente de sua capacidade psíquica. Em
 países como Estados Unidos e Inglaterra não existe idade mínima para a aplicação de penas. Nesses países são levadas em conta a
     índole do criminoso, tenha a idade que tiver, e sua consciência a respeito da gravidade do ato que cometeu. Em Portugal e na
          Argentina, o jovem atinge a maioridade penal aos 16 anos. Na Alemanha, a idade-limite é 14 anos e na Índia, 7 anos.


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                        Quais os argumentos para reduzir a maioridade penal?

Os que defendem a redução da maioridade penal acreditam que os adolescentes infratores não recebem a punição devida. Para eles, o
   Estatuto da Criança e do Adolescente é muito tolerante com os infratores e não intimida os que pretendem transgredir a lei. Eles
  argumentam que se a legislação eleitoral considera que jovem de 16 anos com discernimento para votar, ele deve ter também tem
                                 idade suficiente para responder diante da Justiça por seus crimes.


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               Quais mudanças são as propostas em relação à maioridade penal?

  Discute-se a redução da idade da responsabilidade criminal para o jovem. A maioria fala em 16 anos, mas há quem proponha até 12
  anos como idade-limite. Propõe-se também punições mais severas aos infratores, que só poderiam deixar as instituições onde estão
internados quando estivessem realmente “ressocializados”. O tempo máximo de permanência de menores infratores em instituições não
  seria três anos, como determina hoje a legislação, mas até dez anos. Fala-se em reduzir a maioridade penal somente quando o caso
envolver crime hediondo e também em imputabilidade penal quando o menor apresentar "idade psicológica" igual ou superior a 18 anos.


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O que dizem os que são contra a redução da maioridade penal?

Os que combatem as mudanças na legislação para reduzir a maioridade penal acreditam que ela não traria resultados na diminuição da
  violência e só acentuaria a exclusão de parte da população. Como alternativa, eles propõem melhorar o sistema socioeducativo dos
   infratores, investir em educação de uma forma ampla e também mudar a forma de julgamento de menores muito violentos. Alguns
defendem mudanças no Estatuto da Criança e do Adolescente para estabelecer regras mais rígidas. Outros dizem que já faria diferença
                                              a aplicação adequada da legislação vigente


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                               Quem é contra a redução da maioridade penal?

   Representantes da Igreja Católica e do Poder Judiciário combatem a redução da maioridade penal. Para a presidente do Supremo
Tribunal Federal (STF), ministra Ellen Gracie, a melhor solução seria ter uma “justiça penal mais ágil e rápida”. O presidente Luiz Inácio
 Lula da Silva diz que o Estado “não pode agir emocionalmente”, pressionado pela indignação provocada por crimes bárbaros. Karina
Sposato, diretora do Instituto Latino-Americano das Nações Unidas para a Prevenção e Tratamento da Delinqüência (Ilanud), diz que o
 país não deveria “neutralizar” parte da população e sim procurar “gerir um sistema onde as pessoas possam superar a delinqüência”.
 Tanto o presidente nacional da Ordem dos Advogados do Brasil, Cezar Britto, como o presidente da Câmara dos Deputados, Arlindo
                       Chinaglia, afirmam que reduzir a maioridade penal não seria uma solução para a violência.


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                   Quem se manifestou a favor da redução da maioridade penal?

Os quatro governadores da região Sudeste - José Serra (PSDB-SP), Sérgio Cabral Filho (PMDB-RJ), Aécio Neves (PSDB-MG) e Paulo
   Hartung (PMDB-ES) propõem ao Congresso Nacional alterar a legislação para reduzir a maioridade penal. Eles querem também
aumentar o prazo de detenção do infrator para até dez anos. Além dos governadores, vários deputados e senadores querem colocar em
                                            votação propostas de redução da maioridade.


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                   Quais são os trâmites legais para reduzir a maioridade penal?

 Depois de ser discutida pelo Senado, a proposta de emenda constitucional (PEC) deve ir a plenário para votação em dois turnos. Na
                  seqüência, a proposta tem de ser votada pela Câmara dos Deputados para transformar-se em lei.


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    Que propostas sobre maioridade penal serão avaliadas pelo Congresso Nacional?

  Das seis propostas de redução da maioridade penal que a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado avalia, quatro
  reduzem a maioridade de 18 para 16 anos, e uma para 13 anos, em caso de crimes hediondos. Há ainda uma proposta de emenda
 constitucional (PEC), do senador Papaléo Paes (PSDB-AP) que determina a imputabilidade penal quando o menor apresentar "idade
                                             psicológica" igual ou superior a 18 anos.
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Quando a Câmara dos Deputados votará as propostas de redução de maioridade penal?

Não há prazo definido. O presidente da Câmara dos Deputados, Arlindo Chinaglia (PT-SP), não quis incluir o assunto entre as primeiras
  medidas do chamado “pacote da segurança”. O que tem ocorrido é que em períodos de comoção e mobilização da opinião pública o
assunto ganha visibilidade e várias propostas chegam ao Congresso. Passada a motivação inicial, os projetos caem no esquecimento. A
   proposta para redução da maioridade está parada no Congresso desde 1999. Desde 2000, esta é a quarta vez que um “pacote de
segurança” é proposto. O último “esforço concentrado” foi em junho de 2006, após os ataques do PCC em São Paulo, quando o Senado
 aprovou 13 projetos de endurecimento da legislação penal, que não incluíam a discussão sobre a maioridade. Em 2003, após a morte
   de dois juízes, houve uma “semana da segurança”. Em 2000, depois de um sequestrador de um ônibus ser morto ao lado de uma
 refém, a Câmara e o Senado criaram uma comissão mista para discutir o endurecimento das leis. Não houve votação originada desta
                                                               comissão




Muitos vêem na alternativa da redução da maioridade penal uma
formula para diminuir o crescente nível de violência em nosso país,
o que é um argumento falacioso e equivocado. Com tal propósito
este trabalho procura apresentar uma posição, não dominante, pois
não esta em consonância com o discurso da maioria da mídia sobre a
problemática, porém apresenta uma visão não só legalista, mas uma
análise histórica e sociológica do fenômeno da marginalidade
juvenil.

Ao longo da história o homem tem lutado pelo poder, quer para
conquistá-lo, quer para preservá-lo, e muitas vezes de forma egoísta,
criando com isto uma verdadeira batalha social, e propiciando, nesta
filosofia de vida por ele adotada uma desigualdade social, que faz
parte constante da conjuntura social vigente.

Neste contexto de extrema exclusão social, percebe-se o fenômeno
da marginalização, que é o contingente populacional não integrado,
não participante do sistema produtivo. Assim, o calibrador do
dinamismo da economia seria o mercado de trabalho.

A experiência histórica, não só no caso brasileiro, tem mostrado que
quando uma economia se industrializa, a oferta de mão-de-obra não
qualificada é geralmente muito abundante. Isto se deve ao fato de
que, por um lado, o deslocamento de amplas massas humanas, que
são expelidas do meio rural e vêm à cidade a procura de melhores
condições de vida e, por outro lado, à aceleração do crescimento
demográfico que resulta da queda dos índices de mortalidade,
fenômeno que se observa em toda a sociedade em processo de
industrialização e modernidade.

Então a marginalidade seria uma prática moldada nas e pelas
condições sociais e históricas em que os homens vivem.

Neste sentido o menor marginalizado não surge por acaso. Ele é
fruto de um estado de injustiça social crônico que gera e agrava o
pauperismo em que sobrevive a maior parte da população. Na
medida em que a desigualdade econômica e a decadência moral
foram crescendo nestes últimos anos, aumentou cada vez mais o
número de menores empobrecidos.

Onde está a explicação para tudo isso? Em geral se diz, e com razão,
que a explicação reside nas rápidas transformações que se dão por
causa da industrialização e da urbanização do país. Tal processo
provoca um impacto sobre a economia, organização social e a
cultura do mundo rural. Entre outras coisas surge o êxodo rural com
conseqüente inchaço das cidades brasileiras, para as quais acorre
um número imenso de famílias em busca de melhores condições de
vida e de trabalho. A capacidade de atendimento social da infra-
estrutura urbana é demasiado pequena para receber esta demanda.
Não há como dar trabalho, moradia, escola, alimento, assistência
médico-hospitalar para tanta gente. O resultado só pode ser a
marginalização das famílias, dos cidadãos, das crianças. Estas em
especial, são vítimas de inúmeras carências e, expostas aos perigos
da cidade, vítimas também do abandono total ou parcial, da
malandragem e da delinqüência.

A causa real deste fenômeno doloroso vem do próprio modelo
econômico. É sobre ele que se assenta o inegável crescimento de
nossa produção industrial e agrícola. Só que este modelo gera para
uns poucos uma acumulação crescente de riqueza e a renda fica
desigualmente distribuída. Somando-se ao fato de que os grandes
recursos e investimentos que entram no país (boa parte da dívida
externa e os capitais nacionais) são aplicados dentro dos objetivos de
expansão, produção, consumo e fabricação de armas. Ignoram-se os
despossuídos, os 50% da população que não têm, nem nunca
tiveram, participação nos benefícios e no produto do trabalho que
sacrificadamente realizam.

Assim o egoísmo pessoal se estrutura em nível social e ocasiona uma
tão grande desorganização nas relações entre as pessoas e as classes
que umas passam a dominar sobre as outras, a oprimi-las e
escravizá-las. E este egoísmo se torna ainda mais cruel quando
rodeado pelos ídolos do poder, do dinheiro, do prazer, e do saber,
opressores. É neste nível que devemos buscar soluções, iniciativas
adequadas à nossa realidade, se quisermos chegar à raiz verdadeira e
última do problema social posto, no qual a criança empobrecida é
uma das vítimas mais atingidas.

O governo, pelo outro lado, inoperante, com um sistema educacional
fragilizado, onde mais exclui do que insere, com professores
desmotivados, em face das condições de trabalho e por políticas de
remuneração inexpressivas.

Neste contexto, a saída do menor de sua casa é inevitável, pois está
tentando fugir das condições precárias da vida familiar e vê na rua
sua única saída, inserindo-se no mundo do crime. Uma vez na rua,
depara-se com uma estrutura de desigualdade gigantesca, e tenta a
todo custo igualar-se às demais crianças com poder econômico
superior ao seu, por meio de práticas de diferentes atos infracionais.

A rua para o menor marginalizado passa a ser palco de sua vida,
onde encontra outros menores, que não o discriminam, e com estes
passa a ter relacionamentos de partilha de miséria, das angústias,
sonhos, formando o que chama grupos ou bandos de menores de rua

Neste sentido os menores excluídos aumentam, e
proporcionalmente o Estado não acha alternativa, dentro do atual
modelo, para controlar os elevados números de atos infracionais
cometidos por estes.

Por outro lado, a pressão da sociedade que excluiu, e agora além de
excluir, quer punir, quer garantias para a tranqüilidade social.

Logo, a sociedade com o apoio da mídia tem trazido para a discussão
a questão da redução da maioridade penal, pois segundo alguns
desavisados, a imputabilidade penal deve ser reduzida para
dezesseis anos, e chegam ao cúmulo de afirmar que a Lei 8.069/90,
o Estatuto da Criança e do Adolescente, é um incentivo à
criminalidade, pois não pune o menor infrator.

Primeiramente, há que se ressaltar que o número de atos
infracionais cometidos por menores tem aumentado, como os
índices de violência, em igual proporção, tem aumentado, mas jogar
para o Direito Penal a responsabilidade para a solução de grave
problema social, que é crônico e estrutural, é pura ingenuidade.

Outro aspecto falacioso é afirmar que os menores não são punidos
por seus atos, porque a imputação existe, há apenas uma diferença
do ponto de vista da conseqüência jurídica, onde ao maior aplica-se
pena, e quando menor, aplica-se medida sócio-educativa. Então
temos a pena como conseqüência para quem pratica crime, e
medidas sócio-educativas para quem comete ato infracional.
Portanto, o que o Estatuto da Criança e do Adolescente quer é
proteger a criança excluída socialmente como já foi visto, da
realidade do sistema prisional brasileiro, onde se constata a sua
ineficiência para a clientela que possui, ainda mais agora, para
atender os adolescentes, se tal proposta vier a ser implementada.

Percebe-se pelas razões aqui tratadas, sob os aspectos sociológicos, o
menor é vitima de uma sociedade de consumo desumana e muitas
vezes cruel. Há, portanto, a necessidade de ser tratado e amparado
por políticas sociais fortes, e não ser apenas punido do ponto de
vista penal.

Cabe, neste sentido, ao Estado mantenedor da ordem pública,
representante dos interesses coletivos, responsável pela elaboração e
aplicação das leis, chamar para si a responsabilidade pelo
crescimento do numero de menores infratores, e certamente
perceberá a flagrante omissão e a total falta de políticas que
propiciem condições dignas às famílias de menor poder aquisitivo.

Portanto, há necessidade do Estado fazer a sua parte, contribuindo
com a erradicação da pobreza, instituindo programas sociais sérios
que garantam moradia, saúde, educação e trabalho, ou seja, políticas
de inclusão séria, eficientes, e não políticas compensatória,
obsoletas.

Então este discurso da redução da maioridade penal, manipulado
muitas vezes por interesses políticos demagógicos que vêm ao
encontro a uma sociedade assustada, é sem sobra de dúvida um
retrocesso de uma legislação moderna e emancipadora como é o
ECA. Ao mesmo tempo ferem de morte os direitos humanos
daqueles que não têm e nunca tiveram a oportunidade de inclusão
social.

É alarmante como as manifestações frente aos números de violência,
em favor da redução da maioridade penal, até de setores que
lutaram pela implantação do ECA, manifestações emocionalmente
muitas vezes comprometidas, que acham que a única reação social,
frente a estes números é a redução da maioridade penal. Não
podemos permitir que este discurso, como já aconteceu com outros
temas jurídicos, como, por exemplo, a lei dos crimes hediondos,
assuma uma discussão eminentemente modista, sob pena de
promovermos mudanças que não venham de encontro aos interesses
da justiça social.

Já vimos este filme, políticas imediatistas, resoluções tomadas no
calor dos acontecimentos, que, pela ingenuidade da população e pelo
sensacionalismo da mídia, geralmente, tendem a serem políticas
desastrosas e equivocadas, do ponto de vista jurídico.

Outro aspecto que há de ser levando em consideração, são os dados
estatísticos que apontam para impossibilidade da recepção de mais
presos no atual sistema prisional, senão vejamos: o sistema prisional
nacional tem 331.457 presos, para um total de vagas de 180.950, ou
seja, já possui uma superlotação. Existe déficit de aproximadamente
70.852 vagas. (Estatística Criminal de 2004)

No Estado de Santa Catarina, se possui dados estatísticos bastante
complexos: do total de 494.271 boletins de ocorrência, foram
oferecidas 41.139 denúncias e, destas, 7.266 foram condenados,
existindo 7.558 presos no Estado, o qual possui capacidade
carcerária de 5.871 vagas. Isso, com 7.500 mandados de prisão para
serem cumpridos. Existe déficit de 9.187 vagas em Santa Catarina
(Estatística Criminal de 2004).

Não precisa ser um especialista em política criminal para perceber
que o sistema é ineficiente para punir, além do que não se entrará no
mérito do atendimento dado aos presos fazendo-se análise tão-só
das estatísticas. Assim, implementar a redução da maioridade penal
é aumentar em muito o número de apenados e, portanto, será estar
diante de um monstro cuja capacidade de resposta é ineficiente e
ineficaz.

Ademais, esta discussão sobre a redução da maioridade penal não é
algo novo, esteve na pauta do império e no governo de Jânio
Quadros, onde existia um anteprojeto, cujo enfoque era tentar punir
os jovens que praticavam a “subversão”: fumavam maconha.

Repita-se que no Brasil temos uma legislação de excelente
qualidade, reconhecida por diversos paises como uma das mais
evoluídas, que é o ECA, o qual possui bons comandos legais. Porém,
o que é falha é a seriedade na aplicação do mesmo. O ECA, além de
medidas sancionadoras, possui as medidas de caráter protetivo que
jamais foram implementadas pelo Estado Brasileiro. Neste caso,
deveria a população exigir do Estado primar pela lei existente,
através da correta aplicação, ao invés de buscar outras alternativas
instáveis e inseguras.

Defender esta postura de redução é andar na contramão da historia,
pois se sabe da falência da pena de prisão. As sociedades mais
evoluídas estão defendendo no sentido de minimizar a intervenção
estatal, impondo cada vez mais a diminuição de penas restritivas de
liberdade, pois os sistemas prisionais existentes não cumprem seu
papel, porquanto se tornaram centros de depósitos humanos
antiquados, que não tem conseguido ressocializar ninguém, muito
pelo contrario, tem aumentado mais a revolta desta população
encarcerada.
É preciso um amplo debate nacional, sem paixões, um debate
amadurecido, analisando a problemática sobre vários aspectos, não
só o aspecto legalista, mas os fatores de ordem estrutural. Aplicar o
ECA na sua plenitude, e não só seus instrumentos rígidos, ou seja, as
medidas punitivas, mas sim seu caráter de ressocialização, apesar de
seus instrumentos possuir na sua maioria o caráter punitivo de suas
ações. Precisa-se também, transformar os centros de atendimentos,
hoje reduzidos a casas de tortura, e não centros de recuperação de
jovens, enfrentando o desrespeito ao estatuto como algo presente.

É preciso, também, ter a compreensão de que o Brasil é um país
jovem, em que quase a metade da população está na faixa etária de 0
a 24 anos, e, portanto, há de merecer deste e de futuros governantes
toda atenção com relação a políticas sociais sólidas, que venham ao
encontro da solução para esta catástrofe social imposta, que é o
fenômeno da marginalidade social juvenil.

Concluo, afirmando ser equivocada a idéia de redução da
maioridade penal, que coloca o adolescente que comete ato
infracional, como sendo o único responsável pela crescente onda de
criminalidade, e que, enquanto ficamos nesta discussão estéril,
famílias inteiras estão sem um teto, crianças cada vez mais dormem
ao relento, e governos irresponsáveis continuam a nos governar.

A vida social requer mais do que isto colocado, ou de qualquer lei
punitiva: exige solidariedade, fraternidade e igualdade de
oportunidade para todos. E termos a consciência de que uma opção
equivocada pode representar o recrudescimento da delinqüência, e a
implantação de um estado de barbárie, onde a violência passe a ser
algo rotineiro, que vai representar um retrocesso, jogando um
grande número de adolescentes num sistema carcerário falido.

Diante de todo o exposto, resta a clareza de que a violência não se dá
por falta de medidas repressoras, mas sim por falta de políticas de
inserção, e que possam dar uma perspectiva social mínima à
população excluída
Aconteceu em novembro de 2003, quando um adolescente de 16 anos, o Champinha, torturou, estuprou e degolou a adolescente Liana
Friedenbach depois de ter assassinado a tiros o namorado dela. Aconteceu novamente em dezembro passado, em Araucária, no Paraná, quando
um jovem de 17 anos abriu fogo contra uma multidão e matou uma garota de 9 anos. E foi assim também em fevereiro deste ano, quando João
Hélio Fernandes, de 7 anos, ficou preso pelo cinto durante um assalto e acabou arrastado por 6 quilômetros, com a cabeça batendo no asfalto.
Como no caso de Liana e da criança do Paraná, entre os culpados pela morte de João Hélio estava um menor. E, como em todas as outras vezes,
pouco após o crime a polêmica estava posta: o Brasil deve reduzir a maioridade penal, hoje fixada em 18 anos, para levar à prisão os assassinos
de João Hélio? Horas depois do crime, os governadores do Rio, Sérgio Cabral, de São Paulo, José Serra, e de Minas Gerais, Aécio Neves,
respondiam que sim, que a idade em que o adolescente passa a responder por seus crimes deve ser diminuída. E uma semana mais tarde
deputados e senadores já adicionavam aos arquivos do Congresso 3 novos projetos com esse teor. Também foram retiradas das gavetas várias
propostas antigas. Há quem queira reduzir a maioridade a 16, 14, 13, 12 e até 11 anos.
Hoje, ninguém com menos de 12 anos pode ser punido pelo Estado. Dos 12 aos 18, as condenações vão da prestação de serviços comunitários à
internação em estabelecimentos educacionais. Nesses casos, os menores devem passar por reavaliações semestrais e podem ficar detidos por até
3 anos. Na pesquisa mais recente sobre o assunto, divulgada em agosto, 84% dos entrevistados disseram ser favoráveis a reduzir para 16 anos a
maioridade. O presidente Lula já disse ser contra. A Confederação Nacional dos Bispos do Brasil também – apesar de o arcebispo emérito de
Aparecida, dom Aloísio Lorscheider, ter opinião diferente: “Os adolescentes sabem o que estão fazendo”.
A questão obviamente é polêmica, daquelas em que o maior erro é buscar respostas simples. De um lado, afirma-se que a lei não cumpre seu
papel de desestimular o crime e ainda provoca distorções no tamanho do castigo. É verdade. De outro, argumenta-se que colocar adolescentes
em contato com presidiários só aumentará a periculosidade deles, além de não resolver as questões que levam adolescentes ao crime. Também
é verdade.
Se não bastasse a complexidade de todas essas questões, há ainda a emoção. Tragédias como a de João Hélio fazem ser especialmente difícil
manter a serenidade. O que nós buscamos aqui é exatamente o contrário – afinal de contas, é assim que as leis devem ser pensadas. Levamos a
especialistas 4 perguntas essenciais para entender o debate. A seguir, você conhecerá as respostas.
Adolescentes são capazes de responder por seus atos?
Testes de QI vêm sendo revisados constantemente para ficar mais difíceis. Pesquisadores sentiram necessidade de fazer essas atualizações ao
perceber que a nota de 100 pontos, antes considerada a média da população, estava sendo ultrapassada com facilidade pela maioria das
pessoas. As revisões têm evitado que sejamos todos considerados superdotados, mas não impedem que uma realidade venha à tona: o QI médio
sobe ano a ano. Nos países desenvolvidos, algo como 4 pontos por década. No Brasil, o crescimento total é de 20 pontos desde os anos 70.
É nos jovens que esse fenômeno se manifesta com mais força. Os motivos? Principalmente, a revolução tecnológica e cultural que dá aos
adolescentes, cada vez mais cedo, acesso a uma enormidade de informações. E é aí que a conversa chega ao almoço de domingo, quando em
plena discussão alguém afirma que os jovens hoje são muito mais inteligentes que os de antigamente. E, portanto, é lógico reduzir a idade em
que eles passam a responder pelos seus atos.
Sim e não, responderiam os especialistas. Verdade, o acesso à informação faz os jovens de hoje conhecer muito mais que seus antepassados.
Mas inteligência não é sinônimo de maturidade. Entre os 16 e os 20 anos, o corpo humano passa por transformações que influenciam nossa
maneira de agir. Não é à toa que adolescentes desafiam o perigo, a autoridade e fazem qualquer coisa para impressionar amigos (e amigas). “O
adolescente é emocionalmente imaturo. Até os 20 anos, toda pessoa está desenvolvendo a capacidade de julgamento moral”, diz o psicólogo
Sergio Kodato, professor da USP em Ribeirão Preto.
Pesquisas com o uso de tomografias vêm explicando por que isso ocorre. Um antigo conceito médico dizia que o desenvolvimento do cérebro se
completava na infância. Hoje sabemos que o córtex frontal, área localizada na frente do crânio, na altura dos olhos, passa por grandes
alterações na adolescência. O córtex frontal é responsável pelo controle dos impulsos e pela empatia, a capacidade de se colocar no lugar de
outras pessoas. Enquanto essa região não se desenvolve, o comportamento dos adolescentes guarda uma certa semelhança com o dos psicopatas
– que não conseguem desenvolver sentimentos afetivos. “A habilidade de se comportar socialmente muda muito rápido nessa fase, e o córtex
frontal de um jovem de 16 é visivelmente menos desenvolvido do que outro de 18. Claro que isso não justifica que adolescentes cometam
crimes, mas é importante ter essa informação em mente quando discutimos a maioridade penal”, afirma a psiquistra Sarah-Jayne Blakemore,
pesquisadora do Instituto de Neurociência Cognitiva da University College London.
Qual a real participação dos jovens no mundo do crime?
O Brasil tem aproximadamente 35 milhões de adolescentes entre 12 e 18 anos. Desses, 15 mil, ou 0,04%, são jovens infratores internados – a
população de adultos presos é, proporcionalmente, 7 vezes maior. Eles têm um perfil bem claro: 90% são homens, 76% têm de 16 a 18 anos, 60%
são negros e 90% largaram o colégio. “Quando discutimos a idade em que os adolescentes começarão a ser levados a presídios, estamos falando
de homens pobres, com deficiências graves na formação intelectual, cultural e social, que não têm renda nem casa própria e se encontram sem
muita expectativa de futuro”, diz Sergio Kodato. Metade desses jovens são punidos na Região Sudeste, 16% cometeram infrações no Nordeste e
outros 15% foram detidos no Sul. Dentro das unidades para adolescentes, o motivo mais comum para a detenção é o roubo, seguido de
homicídio, furto e tráfico de drogas.
Ao contrário do que você costuma ler nos jornais, não é nas grandes capitais que os jovens causam mais problemas. Os crimes nas metrópoles
têm mais repercussão, mas é no interior que a situação se agrava. “O Brasil vive um momento de interiorização dos crimes mais graves, como
homicídio. E um dos motivos para explicar esse fenômeno é o crescimento da participação dos jovens”, afirma o coronel José Vicente da Silva,
especialista em segurança pública e ex-secretário nacional de Segurança. Em São Paulo, os jovens da capital se envolvem mais com tráfico de
drogas e porte de armas. Os do interior se destacam pelos crimes contra a vida. Dados de 2003 da Secretaria da Segurança Pública mostram que,
na região metropolitana, os menores estão envolvidos em apenas 0,4% do total de homicídios. No interior, esse índice é mais de 5 vezes maior:
2,3%. Os jovens das cidades menores também estupram 3 vezes mais – são responsáveis por 6,3% de todos os ataques, contra 2,6% da capital. Em
ambos os casos, porém, os crimes dos menores de 18 representam uma porção mínima dentro do universo total.
No tráfico e no porte de armas a coisa não é assim. A participação dos menores é mais expressiva que em outros crimes. Na capital, 13,1% das
ocorrências de venda de drogas e 17,2% das prisões por porte ilegal envolvem menores. Especialistas sugerem uma explicação para essa
desproporcionalidade: “É normal menores assumirem o crime em nome de algum maior. Nos grupos de traficantes, ir para a Febem é considera-
do muito mais tranqüilo do que ser levado a uma penitenciária, principalmente porque o adolescente nunca fica preso por mais de 3 anos”, diz
José Vicente.
Isso significa que diminuir a idade da maioridade penal reduziria os homicídios no interior? Atrapalharia os planos dos traficantes de drogas na
capital? Diminuiria os roubos? É a próxima pergunta que fizemos aos especialistas.
Prender menores pode diminuir os índices de violência?
Como os jovens com menos de 18 anos não estão emocionalmente amadurecidos, faz sentido acreditar que eles tampouco se preocupam com os
riscos que correm ao cometer crimes. Ainda assim, aumentar o rigor (e o cumprimento) da lei poderia inibir pelo menos uma parte desses
infratores. É o que acredita o coronel José Vicente. “Vivemos em uma cultura de baixo controle, em que a sensação de impunidade joga muitos
jovens na direção do crime”, diz. “A ameaça de ir para a cadeia resolve, sim, para jovens e para adultos. Ela modera o apetite do criminoso
porque faz com que ele pense duas vezes antes de agir. Prender mais é a forma mais rápida de conseguir resultados em curto prazo. Deu certo
em Nova York, em Bogotá e em São Paulo, onde a polícia começou a agir com mais força e a prender mais”, afirma, citando 3 cidades que
reduziram seus índices de homicídios.
Para os críticos da redução da maioridade, a questão precisa ser olhada por outro lado: prender adolescentes como criminosos comuns é inócuo.
E, considerando-se o nível das penitenciárias brasileiras, é difícil esperar outra coisa de um adolescente colocado na cadeia além da reincidência
no crime. Na prática, prender criminosos mais cedo poderia aumentar os números da violência a médio prazo. “Quando um jovem que cometeu
um crime pouco grave vai para um presídio, pode ter certeza de que ele sairá de lá pronto para fazer coisas bem piores”, diz Sergio Kodato.
Mas, se deter adolescentes é uma bobagem, por que tantos países que têm índices de violência tão mais baixos que os brasileiros fazem isso? A
Inglaterra prende jovens a partir de 10 anos. A Holanda, a partir de 12. “A maioria dos países considera que a gravidade do delito é mais
importante do que a idade do infrator. O regime jurídico brasileiro não funciona assim. Aqui, a idade pesa mais do que o crime em si”, explica o
advogado Walter Ceneviva, professor aposentado de direito civil da PUC-SP e contrário à redução. A prioridade do delito sobre a idade é um
conceito jurídico antigo. Na Roma antiga, a Lei das 12 Tábuas, escrita no ano 450 a.C., determinava que homens com 7 a 18 anos e mulheres de
7 a 14 poderiam responder criminalmente, desde que o juiz interpretasse que eles estivessem conscientes de seus atos. É esse tipo de análise
prévia que permitiu que, em 1993, na Inglaterra, dois garotos de 10 anos fossem julgados e condenados a 11 anos de prisão por torturar e matar
James Bulger, um bebê de 2 anos. Eles levaram James para uma linha férrea, jogaram tinta em seus olhos e o espancaram com tijolos e barras
de metal. Na avaliação do juiz que os condenou, o crime revelou premeditação e intenção, duas características de adultos. Por isso, a gravidade
do homicídio prevaleceu sobre a idade, e ambos foram levados para um presídio comum. Ao final da pena, os dois jovens, considerados
recuperados, foram libertados e ganharam um novo nome para fugir do estigma de assassinos. “Em países como a Inglaterra, o crime cometido
tem mais peso, e a idade é apenas um atenuante. Quem avalia isso, caso a caso, é o próprio juiz”, diz Ceneviva. “No Brasil não temos essa
sofisticação. Simplesmente levamos o jovem para qualquer Febem, tenha ele roubado uma bicicleta ou matado 3 pessoas.”
Nos EUA, a legislação varia tanto de estado para estado que jovens de 6 a 18 anos podem ser responsabilizados, dependendo do lugar onde
cometeram seus crimes. Nos últimos 35 anos, 137 menores de 18 foram condenados à morte – coisa que não acontece na China, onde
adolescentes de 14 a 18 anos podem pegar, no máximo, prisão perpétua. Outros países, como o Japão, não aceitam a prisão de jovens de menos
de 20 anos. Adolescentes são julgados por um tribunal de família e podem ser submetidos a penas de, no máximo, 5 anos. Dados da Unicef
mostram que a variação de leis no mundo é enorme e não obedece a padrões claros: na Europa, há países que prendem crianças e outros que
esperam até os 18 anos. Por que estamos mais próximos dos japoneses do que dos ingleses? Porque, desde o começo do século 20, definimos
maioridade como o momento em que o jovem completa sua escolaridade. Mas nem sempre foi assim. O primeiro código criminal do Brasil
independente, de 1830, determinava que a idade de responsabilidade penal era 14 anos. O Código Penal da república seguiu esse padrão, mas
dava aos tribunais condições de condenar jovens de 9 a 14 anos, desde que sua intenção de cometer um crime ficasse clara. Foi só a partir de
1921 que chegamos ao formato atual, com maioridade aos 18 e instituições educativas para os menores.
O que fazer com os jovens infratores?
Apesar de popular, a redução da maioridade penal para 16 anos tem poucas chances de virar realidade. Existe uma controvérsia jurídica a
respeito do assunto: a maioridade está estabelecida em um artigo da Constituição. Para mudá-la, seria necessário um enorme esforço no
Legislativo. E, como a maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal se diz contrária à alteração, inclusive Ellen Grace, presidenta do
tribunal, a lei seria bombardeada juridicamente. Quer dizer então que ficamos do jeito que estamos? Não necessariamente. Existem alternativas
já propostas para atacar o problema.
Em fevereiro, uma semana depois do assassinato de João Hélio, a Câmara dos Deputados e o Senado aprovaram dois projetos de lei similares,
que aumentam a pena dos maiores de idade que cometerem crimes em companhia de menores. Ter cúmplices menores seria um agravante, um
motivo suficiente para aumentar a pena. “É uma boa idéia. Desestimularia a formação de gangues com integrantes jovens. Muitos menores de 18
entram para o crime dessa forma, agindo ao lado de líderes mais velhos”, opina Ceneviva.
A outra proposta em pauta é alterar o conteúdo do Estatuto da Criança e do Adolescente para permitir que menores de 18 anos possam ficar
detidos por mais de 3 anos. “Hoje, um assassino comportado pode ser liberado depois de 6 meses, desde que a análise psicológica determine
que ele aprendeu a lição. Só que um ladrão de galinhas que não aceite as condições da Febem pode ficar os 3 anos. Falta critério. Isso para não
falar dos casos em que o garoto de 14 mata uma vez, passa um ano detido, sai e mata de novo. Ele continua sendo considerado incapaz de
responder por seus atos”, critica o advogado Ari Friedenbach, pai da estudante Liana, morta por Champinha em 2004. Ari afirma que hoje não
mais defende a redução da maioridade, como fez logo após o assassinato da filha, por considerar que ela não resolveria a atual falta de
proporção entre o tamanho da condenação e o crime cometido. “Precisamos garantir que um menor que comete crime hediondo passe por uma
análise psiquiátrica e fique preso o tempo necessário. Mesmo que seja décadas”, ele defende. “Em alguns casos, temos que desistir da
ressocialização.”
O aumento da pena para adolescentes infratores é defendido pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). A pedido do Ministério da Justiça, o
juiz Luiz Flávio Gomes chegou a esboçar um projeto de lei, nunca colocado em votação, que cria penas diferenciadas para menores que
cometam crimes hediondos. Elas poderiam passar de 3 anos, mas não seriam tão longas quanto a de um adulto. Dessa forma, no caso de crimes
mais graves, o réu seria automaticamente emancipado e julgado como adulto, e a idade serviria apenas de atenuante na hora de determinar a
pena. Essa medida parece agradar aos dois lados dessa discussão. “Se adotado em casos mais graves, aumentar o tempo de internação seria
positivo”, diz o coronel José Vicente. “Seria um grande avanço, muito maior do que a própria redução da maioridade”, reforça Ceneviva.
É um consenso, ainda que pequeno dentro de toda a discussão. Na verdade, existe outro ponto em que todos concordam: a polêmica logo sumirá
da mídia. Somente para voltar a ser discutida tão logo um adolescente participe de um crime chocante.
Na Colômbia, um adolescente só é tratado como adulto após os 18 anos. Na Inglaterra, aos 10. São países que adotam medidas opostas para lidar
com seus jovens criminosos. Na Colômbia, os jovens menores de 18 anos são responsáveis por 14% dos homicídios que acontecem no país. Na
Inglaterra, essa mesma faixa etária comete 12% dos assassinatos . Nos EUA, onde a idade da maioridade varia de estado para estado, 10,9% dos
homicídios são cometidos por menores de 18 anos. Moral da história: os países têm legislações bastante diferentes, mas índices de criminalidade
juvenil muito parecidos. Sinal de que a lei em si não tem impacto direto na redução da violência. A violência cometida por jovens é um
fenômeno muito real, que precisa ser enfrentado imediatamente. Mas beira a inocência acreditar que a redução da maioridade penal no Brasil
possa ser a solução da epidemia nacional de violência. “Vamos apenas jogar mais 11 mil jovens por ano nos presídios para conviver com
criminosos profissionais”, diz Walter Ceneviva. “Existe uma distorção clara na forma como julgamos nossos jovens, e isso deveria ser corrigido
para tornar nosso sistema judiciário mais justo. Mas a solução para o problema da violência não está aí.” Então é o caso de perguntar: onde
está? Aí mora a charada: como resolver a questão da segurança pública? É preciso acabar com a impunidade generalizada. Melhorar a polícia.
Diminuir as desigualdades sociais. Fazer o Estado mais presente. Corrigir desvios éticos em toda a sociedade. “Antes de serem criminosos, os
adolescentes pobres são vítimas de uma sociedade injusta. Sem mudar esse quadro, nunca vamos reduzir a violência”, argumenta o psicólogo
Sergio Kodato. Para o coronel José Vicente, caso de polícia se resolve com polícia bem treinada e bem remunerada, que não aceite propina nem
precise ter um segundo emprego. E, também, com uma legislação mais dura. Que inclua mandar jovens para a cadeia.
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Maioridade penal e direito de voto no Brasil

  • 1. Segundo o sistema jurídico vigente, a maioridade penal se dá aos 18 anos de idade. Essa norma encontra-se inscrita em três Diplomas Legais: 1) artigo 27 do Código Penal; 2) artigo 104 caput do Estatuto da Criança e do Adolescente; 3) e artigo 228 da Constituição Federal. O Legislador manteve-se fiel ao princípio de que a pessoa menor de 18 anos não possui desenvolvimento mental completo para compreender o caráter ilícito de seus atos, ou de determinar-se de acordo com esse entendimento, erigindo, inclusive, o dogma constitucional (CF, art. 228). Adotou-se o sistema biológico, em que é considerada tão- somente a idade do agente, independentemente da sua capacidade psíquica. Mas essa não foi uma constante. O Código Penal de 1969 (Decreto-lei nº 1.004/69), que não chegou a viger, embora já estivesse em período de vacatio legis [1], possibilitava a imposição de sanção penal a menor entre 16 e 18 anos, se este revelasse suficiente desenvolvimento psíquico, bastante para entender o caráter ilícito do fato e de determinar-se de acordo com esse entendimento. Aqui, o sistema adotado foi o biopsicológico, ou seja, o de submissão da pessoa entre 16 e 18 anos a avaliação psicológica para saber se, ao tempo do fato, possuía discernimento sobre a ilicitude de seus atos. À época, houve insurgência quanto à possibilidade da redução da maioridade penal. Juristas e outros estudiosos combateram veementemente essa inovação não implementada. Justamente em face das críticas, o Código Penal de 1969 não entrou em vigor, e a reforma de 1984 (Lei nº 7.209/84) manteve a inimputabilidade penal ao menor de 18 anos. Na exposição de motivos da nova parte geral do Código Penal, o então Ministro da Justiça Ibrahim Abi-Ackel justificou a opção legislativa aduzindo que "De resto, com a legislação de menores recentemente editada, dispõe o Estado dos instrumentos necessários ao afastamento do jovem delinqüente, menor de 18 (dezoito) anos, do convívio social, sem sua necessária submissão ao tratamento do delinqüente adulto, expondo-o à contaminação carcerária". [2] Textos relacionados • Blade Runner. Estado de Direito Penal: o caso do Caçador de Andróides • Crime organizado transnacional. O canto da sereia dos adolescentes em conflito com a lei • Crimes da ditadura: investigação urgente • A ação dos movimentos dos sem terra. Ofensa a propriedade privada ou busca pela sua função social? • Considerações sobre a legalidade da apreensão de elevada quantia em dinheiro sem origem aparente O eminente Ministro se referia ao Código de Menores (Lei nº 6.697/79), que esteve em vigência por onze anos. Não obstante, a delinqüência junto a menores de dezoito anos, ao invés de diminuir, aumentou.
  • 2. Adveio o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069/90), substituindo o antigo Código de Menores. Pensava-se ser esta Lei capaz de coibir a prática de condutas criminosas por menores de 18 anos [3]. Tal, entretanto, igualmente não se verificou. Em verdade, hoje se constata evolução crescente do número de adolescentes na prática de atitudes criminosas, os quais já não mais se limitam ao cometimento de pequenos delitos. A imprensa noticia com freqüência o envolvimento de menores em crimes hediondos, como homicídio qualificado, tráfico de entorpecentes, estupro, extorsão mediante seqüestro, latrocínio etc. Surge, então, novamente, o debate sobre a questão da redução da maioridade penal. É inolvidável, o jovem deste novo milênio não é aquele ingênuo de meados do Século XX. Nos últimos cinqüenta anos, assistiu-se a evolução jamais vista em outro período da humanidade. As transformações foram de ordem política, tecno-científica, social e econômica. Caiu o muro de Berlim, surgiu o fenômeno da globalização, arrefeceram-se as correntes ideológicas. No campo do conhecimento científico, houve a conquista do espaço, o domínio da engenharia genética, a expansão da informática, a popularização da internet, só para exemplificar. Atualmente, o acesso à informação é quase compulsivo. Novas tecnologias fazem parte do dia-a-dia das pessoas, inclusive dos jovens (telefone celular, internet, correio eletrônico, rádio, tv aberta e fechada, etc). São tantos os canais de comunicação, que se torna impossível manter-se ilhado, alheio aos acontecimentos. Não há espaço para a ingenuidade, e com maior razão no que concerne aos adolescentes. Aliás, estes estão mais afetos a essas inovações. Em algumas situações, há inversão da ordem natural. É comum, por exemplo, filhos orientarem os pais sobre informática. Nesse contexto, o menor entre 16 e 18 anos precisa ser encarado como pessoa capaz de entender as conseqüências de seus atos, vale dizer, deve se submeter às sanções de ordem penal. Como exposto, o jovem nessa faixa etária possui plena capacidade de discernimento. Sabe e consegue determinar-se de acordo com esse entendimento. Veja, quando se fala em maturidade para efeitos penais, não se busca inteligência destacada, capacidade de tomar decisões complexas, mas tão-somente a formação mínima de valores humanos que uma pessoa deve ser dotada, podendo discernir entre o bem e o mal, entre o certo e o errado, entre o que constitui crime e a atipicidade (livre- arbítrio). É a imputabilidade, que se faz presente quando o sujeito compreende a ilicitude de sua conduta e age de acordo com esse entendimento. [4] Para esse grau de compreensão, bastam inteligência e amadurecimento medianos, tranqüilamente verificáveis nos adolescentes entre 16 e 18 anos. Ora, será que o menor de dezoito e maior de dezesseis anos não sabe o que é matar alguém, subtrair coisa alheia móvel, seqüestrar pessoa com o fim de obter qualquer vantagem, como condição ou preço do resgate? Será que não é capaz de determinar-se de acordo com esse entendimento? A realidade hodierna diz que sim. Indiscutível, pois, o desenvolvimento psíquico-intelectual do adolescente nessa faixa etária. Bem por isso, tem sido comum o ingresso de menores de 18 anos em universidades, nos mais variados cursos. E mais, jovens que sequer concluíram o
  • 3. segundo grau têm conseguido se matricular em cursos de nível superior, graças a liminares. Como, então, considerar essas pessoas inimputáveis? O próprio legislador-constituinte reconhece aos maiores de dezesseis e menores de dezoito anos lucidez e discernimento na tomada de decisões ao lhes conferir capacidade eleitoral ativa, conforme expressa previsão constante no artigo 14, § 1º, inciso II, alínea c, da Magna Carta. Segundo a Constituição da República, homens e mulheres entre 16 e 18 anos estão aptos a votar em candidatos para qualquer cargo público eletivo (vereador, prefeito, deputado estadual, deputado federal, senador e Presidente da República). Cuida-se, evidentemente, de responsabilidade só atribuída a quem possua elevado grau de maturidade. Esta é a conclusão lógica diante das implicações do voto no processo político e no destino da nação. A propósito, o Professor e jusfilósofo MIGUEL REALE, comentando a necessidade de reduzir a maioridade penal, já em 1990 escreveu [5]: No Brasil, especialmente, há um outro motivo determinante, que é a extensão do direito ao voto, embora facultativo aos menores entre dezesseis e dezoito anos, como decidiu a Assembléia Nacional Constituinte para gáudio de ilustre senador que sempre cultiva o seu ‘progressismo’... Aliás, não se compreende que possa exercer o direito de voto quem, nos termos da lei vigente, não seria imputável pela prática de delito eleitoral. Dessa forma, se de um lado a Constituição Federal considera o menor de dezoito e maior de dezesseis anos inimputável (artigo 228), por outro, o permite exercer o direito ao voto (artigo 14, § 1º, inciso II, alínea c). Distingue o Texto Supremo a maioridade penal, da maioridade eleitoral [6]. Embora ambos os dispositivos emanem do mesmo Poder Constituinte, verifica-se certa antinomia principiológica entre essas normas. Como um jovem pode ter discernimento para votar, v.g., no Presidente da República, mas não o tem em relação à pratica de crimes, ainda que hediondos? Vale dizer, o menor conhece toda importância da escolha dos integrantes dos Poderes Legislativo e Executivo, mas não tem consciência das condutas delituosas, por isso é inimputável. O que é mais complexo? Evidente, o processo eleitoral. Impõe-se sim uma revisão do preceito constitucional atinente à maioridade penal. O debate é atual, pois a violência e o envolvimento de menores de dezoito anos tem aumentado. Há respeitáveis vozes defendendo a diminuição da maioridade penal, entretanto grande parte dessa corrente a condiciona à comprovação do desenvolvimento intelectual e emocional do adolescente entre 16 e 18 anos [7]. Adoção do sistema biopsicológico (ou biopsicológico normativo ou misto), onde as pessoas nessa faixa etária necessariamente serão submetidas a avaliação psiquiátrica e psicológica para aferir o seu grau de amadurecimento. O grande inconveniente dessa opção está na necessidade de perícia psicológica e psiquiátrica em todo menor entre 16 e 18 anos que venha a cometer infração penal. Como é cediço, inexiste em nosso País estrutura organizacional para a realização desses exames. Em cada crime ou contravenção praticada por adolescente nessa faixa etária, ter-se-ia de providenciar perícia médico-psicológica para apurar a imputabilidade ou inimputabilidade, mesmo em se cuidando de delito de bagatela. Ora, isso atrasaria
  • 4. sobremaneira a instrução do processo, congestionaria a rede pública de saúde e obstaria por completo a entrega da prestação jurisdicional. De salientar que em grande parte das comarcas do interior do Brasil não há profissionais habilitados para tal. Haveria, então, necessidade de transportar os menores para centro maior, aumentando os riscos de resgate, fuga, além de considerável ônus para o Estado. Quando se tentou implantar sistema semelhante em 1969, por ocasião da edição do Decreto-lei nº 1.004/69 [8], o grande argumento contrário foi exatamente a dificuldade para se aferir a capacidade de culpa na faixa dos 16 a 18 anos, mediante perícia sofisticada e de difícil praticabilidade. Pensamos que o mais justo e socialmente adequado para os dias atuais é a redução da maioridade penal de 18 para 16 anos, sem necessidade de avaliação do grau de desenvolvimento psíquico-emocional do menor. Adoção do critério puramente biológico, porém a partir do décimo sexto aniversário do adolescente. Uma vez completados 16 anos de idade, a pessoa sujeitar-se-ia às regras do Código Penal e leis esparsas pertinentes. Não haveria qualquer subjetivismo. A fim de corroborar esse ponto de vista, novamente trago à colação a abalizada lição do mestre MIGUEL REALE [9], verbis: Tendo o agente ciência de sua impunidade, está dando justo motivo à imperiosa mudança na idade limite da imputabilidade penal, que deve efetivamente começar aos dezesseis anos, inclusive, devido à precocidade da consciência delitual resultante dos acelerados processos de comunicação que caracterizam nosso tempo. É incompreensível a resistência quanto ao rebaixamento da maioridade penal. O discurso pela manutenção da regra atual pode ser politicamente defensável e até romântico, porém completamente divorciado da realidade, se considerarmos o nível de amadurecimento do jovem entre 16 e 18 anos de idade e, ainda, espantosa violência com que costumam agir. Há diversos países onde a maioridade penal inicia-se aos 16 anos (p. ex: Argentina, Espanha, Bélgica e Israel); em outros, aos 15 anos (Índia, Egito, Síria, Honduras, Guatemala, Paraguai, Líbano); na Alemanha e Haiti, aos 14 anos. E por incrível que pareça, na Inglaterra a pessoa é considerada imputável a partir dos 10 anos. Não podemos assistir de braços cruzados a escalada de violência, onde menores de 18 anos praticam os mais hediondos crimes e já integram organizações delituosas, sendo inteiramente capazes de entender o caráter ilícito do fato e de determinar-se de acordo com esse entendimento. O Estatuto da Criança e do Adolescente, por benevolente que é, não tem intimidado os menores. Como forma de ajustamento à realidade social e de criar meios para enfrentar a criminalidade com eficácia, impõe-se seja considerado imputável qualquer homem ou mulher a partir dos dezesseis anos de idade. Notas 1. Exposição de Motivos da Nova Parte Geral do Código Penal, itens 2 a 4. 2. Exposição de Motivos da Nova Parte Geral do Código Penal, item 23.
  • 5. 3. O Professor JULIO FABBRINI MIRABETE deixa claro essa esperança em sua obra Manual de Direito Penal, vol. 1, Editora Atlas, 8ª edição, 1994, p. 209. 4. HELENO CLÁUDIO FRAGOSO, Lições de direito penal, parte geral, 4ª edição, editora Forense, p. 205. 5. In Nova Fase do Direito Moderno, Ed. Saraiva, São Paulo, 1990, p. 161. 6. Pinto Ferreira, Código Eleitoral Comentado, 4ª edição, 1997, editora Saraiva, p. 40. 7. A esse respeito PEC nº 20, de 1999, de autoria do Senador José Roberto Arruda. 8. O aludido Decreto-lei, em seu art. 33 previa a redução da maioridade penal para 16 anos, desde que comprovado por perícia o suficiente grau de discernimento do jovem. 9. Ob. Cit., p. 161. Nota do artigo: sem nota 982 votos 1 2 3 4 5 ok A morte do menino João Hélio, de 6 anos, arrastado por um carro depois de um assalto no Rio de Janeiro, reacendeu o debate sobre a redução da maioridade penal no país. Como em outros crimes violentos, menores de idade tiveram papel ativo no brutal crime - mas poderão ficar no máximo 3 anos presos. Saiba quais são os principais argumentos dos defensores e dos críticos da medida - e como a mudança na lei poderia ser realizada. 1. O que é maioridade penal? 2. O que diz a legislação brasileira sobre infrações de quem não atingiu a maioridade penal? 3. Como é a legislação brasileira em relação a outros países? 4. Quais os argumentos para reduzir a maioridade penal? 5. Quais mudanças são as propostas em relação à maioridade penal? 6. O que dizem os que são contra a redução da maioridade penal? 7. Quem é contra a redução da maioridade penal? 8. Quem se manifestou a favor da redução da maioridade penal? 9. Quais são os trâmites legais para reduzir a maioridade penal? 10. Que propostas sobre maioridade penal serão avaliadas pelo Congresso Nacional? 11. Quando a Câmara dos Deputados votará as propostas de redução de maioridade penal?
  • 6. O que é maioridade penal? A maioridade penal fixada em 18 anos é definida pelo artigo 228 da Constituição. É a idade em que, diante da lei, um jovem passa a responder inteiramente por seus atos, como cidadão adulto. É a idade-limite para que alguém responda na Justiça de acordo com o Código Penal. Um menor é julgado pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). • topo O que diz a legislação brasileira sobre infrações de quem não atingiu a maioridade penal? Pela legislação brasileira, um menor infrator não pode ficar mais de três anos internado em instituição de reeducação, como a Febem. É uma das questões mais polêmicas a respeito da maioridade penal. As penalidades previstas são chamadas de “medidas socioeducativas”. Apenas crianças até 12 anos são inimputáveis, ou seja, não podem ser julgadas ou punidas pelo Estado. De 12 a 17 anos, o jovem infrator será levado a julgamento numa Vara da Infância e da Juventude e poderá receber punições como advertência, obrigação de reparar o dano, prestação de serviços à comunidade, liberdade assistida, inserção em regime de semiliberdade ou internação em estabelecimento educacional. Não poderá ser encaminhado ao sistema penitenciário. • topo Como é a legislação brasileira em relação a outros países? A legislação brasileira sobre a maioridade penal entende que o menor deve receber tratamento diferenciado daquele aplicado ao adulto. Estabelece que o menor de 18 anos não possui desenvolvimento mental completo para compreender o caráter ilícito de seus atos. Adota o sistema biológico, em que é considerada somente a idade do jovem, independentemente de sua capacidade psíquica. Em países como Estados Unidos e Inglaterra não existe idade mínima para a aplicação de penas. Nesses países são levadas em conta a índole do criminoso, tenha a idade que tiver, e sua consciência a respeito da gravidade do ato que cometeu. Em Portugal e na Argentina, o jovem atinge a maioridade penal aos 16 anos. Na Alemanha, a idade-limite é 14 anos e na Índia, 7 anos. • topo Quais os argumentos para reduzir a maioridade penal? Os que defendem a redução da maioridade penal acreditam que os adolescentes infratores não recebem a punição devida. Para eles, o Estatuto da Criança e do Adolescente é muito tolerante com os infratores e não intimida os que pretendem transgredir a lei. Eles argumentam que se a legislação eleitoral considera que jovem de 16 anos com discernimento para votar, ele deve ter também tem idade suficiente para responder diante da Justiça por seus crimes. • topo Quais mudanças são as propostas em relação à maioridade penal? Discute-se a redução da idade da responsabilidade criminal para o jovem. A maioria fala em 16 anos, mas há quem proponha até 12 anos como idade-limite. Propõe-se também punições mais severas aos infratores, que só poderiam deixar as instituições onde estão internados quando estivessem realmente “ressocializados”. O tempo máximo de permanência de menores infratores em instituições não seria três anos, como determina hoje a legislação, mas até dez anos. Fala-se em reduzir a maioridade penal somente quando o caso envolver crime hediondo e também em imputabilidade penal quando o menor apresentar "idade psicológica" igual ou superior a 18 anos. • topo
  • 7. O que dizem os que são contra a redução da maioridade penal? Os que combatem as mudanças na legislação para reduzir a maioridade penal acreditam que ela não traria resultados na diminuição da violência e só acentuaria a exclusão de parte da população. Como alternativa, eles propõem melhorar o sistema socioeducativo dos infratores, investir em educação de uma forma ampla e também mudar a forma de julgamento de menores muito violentos. Alguns defendem mudanças no Estatuto da Criança e do Adolescente para estabelecer regras mais rígidas. Outros dizem que já faria diferença a aplicação adequada da legislação vigente • topo Quem é contra a redução da maioridade penal? Representantes da Igreja Católica e do Poder Judiciário combatem a redução da maioridade penal. Para a presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministra Ellen Gracie, a melhor solução seria ter uma “justiça penal mais ágil e rápida”. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva diz que o Estado “não pode agir emocionalmente”, pressionado pela indignação provocada por crimes bárbaros. Karina Sposato, diretora do Instituto Latino-Americano das Nações Unidas para a Prevenção e Tratamento da Delinqüência (Ilanud), diz que o país não deveria “neutralizar” parte da população e sim procurar “gerir um sistema onde as pessoas possam superar a delinqüência”. Tanto o presidente nacional da Ordem dos Advogados do Brasil, Cezar Britto, como o presidente da Câmara dos Deputados, Arlindo Chinaglia, afirmam que reduzir a maioridade penal não seria uma solução para a violência. • topo Quem se manifestou a favor da redução da maioridade penal? Os quatro governadores da região Sudeste - José Serra (PSDB-SP), Sérgio Cabral Filho (PMDB-RJ), Aécio Neves (PSDB-MG) e Paulo Hartung (PMDB-ES) propõem ao Congresso Nacional alterar a legislação para reduzir a maioridade penal. Eles querem também aumentar o prazo de detenção do infrator para até dez anos. Além dos governadores, vários deputados e senadores querem colocar em votação propostas de redução da maioridade. • topo Quais são os trâmites legais para reduzir a maioridade penal? Depois de ser discutida pelo Senado, a proposta de emenda constitucional (PEC) deve ir a plenário para votação em dois turnos. Na seqüência, a proposta tem de ser votada pela Câmara dos Deputados para transformar-se em lei. • topo Que propostas sobre maioridade penal serão avaliadas pelo Congresso Nacional? Das seis propostas de redução da maioridade penal que a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado avalia, quatro reduzem a maioridade de 18 para 16 anos, e uma para 13 anos, em caso de crimes hediondos. Há ainda uma proposta de emenda constitucional (PEC), do senador Papaléo Paes (PSDB-AP) que determina a imputabilidade penal quando o menor apresentar "idade psicológica" igual ou superior a 18 anos.
  • 8. • topo Quando a Câmara dos Deputados votará as propostas de redução de maioridade penal? Não há prazo definido. O presidente da Câmara dos Deputados, Arlindo Chinaglia (PT-SP), não quis incluir o assunto entre as primeiras medidas do chamado “pacote da segurança”. O que tem ocorrido é que em períodos de comoção e mobilização da opinião pública o assunto ganha visibilidade e várias propostas chegam ao Congresso. Passada a motivação inicial, os projetos caem no esquecimento. A proposta para redução da maioridade está parada no Congresso desde 1999. Desde 2000, esta é a quarta vez que um “pacote de segurança” é proposto. O último “esforço concentrado” foi em junho de 2006, após os ataques do PCC em São Paulo, quando o Senado aprovou 13 projetos de endurecimento da legislação penal, que não incluíam a discussão sobre a maioridade. Em 2003, após a morte de dois juízes, houve uma “semana da segurança”. Em 2000, depois de um sequestrador de um ônibus ser morto ao lado de uma refém, a Câmara e o Senado criaram uma comissão mista para discutir o endurecimento das leis. Não houve votação originada desta comissão Muitos vêem na alternativa da redução da maioridade penal uma formula para diminuir o crescente nível de violência em nosso país, o que é um argumento falacioso e equivocado. Com tal propósito este trabalho procura apresentar uma posição, não dominante, pois não esta em consonância com o discurso da maioria da mídia sobre a problemática, porém apresenta uma visão não só legalista, mas uma análise histórica e sociológica do fenômeno da marginalidade juvenil. Ao longo da história o homem tem lutado pelo poder, quer para conquistá-lo, quer para preservá-lo, e muitas vezes de forma egoísta, criando com isto uma verdadeira batalha social, e propiciando, nesta filosofia de vida por ele adotada uma desigualdade social, que faz parte constante da conjuntura social vigente. Neste contexto de extrema exclusão social, percebe-se o fenômeno da marginalização, que é o contingente populacional não integrado, não participante do sistema produtivo. Assim, o calibrador do dinamismo da economia seria o mercado de trabalho. A experiência histórica, não só no caso brasileiro, tem mostrado que quando uma economia se industrializa, a oferta de mão-de-obra não qualificada é geralmente muito abundante. Isto se deve ao fato de que, por um lado, o deslocamento de amplas massas humanas, que são expelidas do meio rural e vêm à cidade a procura de melhores condições de vida e, por outro lado, à aceleração do crescimento demográfico que resulta da queda dos índices de mortalidade, fenômeno que se observa em toda a sociedade em processo de
  • 9. industrialização e modernidade. Então a marginalidade seria uma prática moldada nas e pelas condições sociais e históricas em que os homens vivem. Neste sentido o menor marginalizado não surge por acaso. Ele é fruto de um estado de injustiça social crônico que gera e agrava o pauperismo em que sobrevive a maior parte da população. Na medida em que a desigualdade econômica e a decadência moral foram crescendo nestes últimos anos, aumentou cada vez mais o número de menores empobrecidos. Onde está a explicação para tudo isso? Em geral se diz, e com razão, que a explicação reside nas rápidas transformações que se dão por causa da industrialização e da urbanização do país. Tal processo provoca um impacto sobre a economia, organização social e a cultura do mundo rural. Entre outras coisas surge o êxodo rural com conseqüente inchaço das cidades brasileiras, para as quais acorre um número imenso de famílias em busca de melhores condições de vida e de trabalho. A capacidade de atendimento social da infra- estrutura urbana é demasiado pequena para receber esta demanda. Não há como dar trabalho, moradia, escola, alimento, assistência médico-hospitalar para tanta gente. O resultado só pode ser a marginalização das famílias, dos cidadãos, das crianças. Estas em especial, são vítimas de inúmeras carências e, expostas aos perigos da cidade, vítimas também do abandono total ou parcial, da malandragem e da delinqüência. A causa real deste fenômeno doloroso vem do próprio modelo econômico. É sobre ele que se assenta o inegável crescimento de nossa produção industrial e agrícola. Só que este modelo gera para uns poucos uma acumulação crescente de riqueza e a renda fica desigualmente distribuída. Somando-se ao fato de que os grandes recursos e investimentos que entram no país (boa parte da dívida externa e os capitais nacionais) são aplicados dentro dos objetivos de expansão, produção, consumo e fabricação de armas. Ignoram-se os despossuídos, os 50% da população que não têm, nem nunca tiveram, participação nos benefícios e no produto do trabalho que
  • 10. sacrificadamente realizam. Assim o egoísmo pessoal se estrutura em nível social e ocasiona uma tão grande desorganização nas relações entre as pessoas e as classes que umas passam a dominar sobre as outras, a oprimi-las e escravizá-las. E este egoísmo se torna ainda mais cruel quando rodeado pelos ídolos do poder, do dinheiro, do prazer, e do saber, opressores. É neste nível que devemos buscar soluções, iniciativas adequadas à nossa realidade, se quisermos chegar à raiz verdadeira e última do problema social posto, no qual a criança empobrecida é uma das vítimas mais atingidas. O governo, pelo outro lado, inoperante, com um sistema educacional fragilizado, onde mais exclui do que insere, com professores desmotivados, em face das condições de trabalho e por políticas de remuneração inexpressivas. Neste contexto, a saída do menor de sua casa é inevitável, pois está tentando fugir das condições precárias da vida familiar e vê na rua sua única saída, inserindo-se no mundo do crime. Uma vez na rua, depara-se com uma estrutura de desigualdade gigantesca, e tenta a todo custo igualar-se às demais crianças com poder econômico superior ao seu, por meio de práticas de diferentes atos infracionais. A rua para o menor marginalizado passa a ser palco de sua vida, onde encontra outros menores, que não o discriminam, e com estes passa a ter relacionamentos de partilha de miséria, das angústias, sonhos, formando o que chama grupos ou bandos de menores de rua Neste sentido os menores excluídos aumentam, e proporcionalmente o Estado não acha alternativa, dentro do atual modelo, para controlar os elevados números de atos infracionais cometidos por estes. Por outro lado, a pressão da sociedade que excluiu, e agora além de excluir, quer punir, quer garantias para a tranqüilidade social. Logo, a sociedade com o apoio da mídia tem trazido para a discussão
  • 11. a questão da redução da maioridade penal, pois segundo alguns desavisados, a imputabilidade penal deve ser reduzida para dezesseis anos, e chegam ao cúmulo de afirmar que a Lei 8.069/90, o Estatuto da Criança e do Adolescente, é um incentivo à criminalidade, pois não pune o menor infrator. Primeiramente, há que se ressaltar que o número de atos infracionais cometidos por menores tem aumentado, como os índices de violência, em igual proporção, tem aumentado, mas jogar para o Direito Penal a responsabilidade para a solução de grave problema social, que é crônico e estrutural, é pura ingenuidade. Outro aspecto falacioso é afirmar que os menores não são punidos por seus atos, porque a imputação existe, há apenas uma diferença do ponto de vista da conseqüência jurídica, onde ao maior aplica-se pena, e quando menor, aplica-se medida sócio-educativa. Então temos a pena como conseqüência para quem pratica crime, e medidas sócio-educativas para quem comete ato infracional. Portanto, o que o Estatuto da Criança e do Adolescente quer é proteger a criança excluída socialmente como já foi visto, da realidade do sistema prisional brasileiro, onde se constata a sua ineficiência para a clientela que possui, ainda mais agora, para atender os adolescentes, se tal proposta vier a ser implementada. Percebe-se pelas razões aqui tratadas, sob os aspectos sociológicos, o menor é vitima de uma sociedade de consumo desumana e muitas vezes cruel. Há, portanto, a necessidade de ser tratado e amparado por políticas sociais fortes, e não ser apenas punido do ponto de vista penal. Cabe, neste sentido, ao Estado mantenedor da ordem pública, representante dos interesses coletivos, responsável pela elaboração e aplicação das leis, chamar para si a responsabilidade pelo crescimento do numero de menores infratores, e certamente perceberá a flagrante omissão e a total falta de políticas que propiciem condições dignas às famílias de menor poder aquisitivo. Portanto, há necessidade do Estado fazer a sua parte, contribuindo
  • 12. com a erradicação da pobreza, instituindo programas sociais sérios que garantam moradia, saúde, educação e trabalho, ou seja, políticas de inclusão séria, eficientes, e não políticas compensatória, obsoletas. Então este discurso da redução da maioridade penal, manipulado muitas vezes por interesses políticos demagógicos que vêm ao encontro a uma sociedade assustada, é sem sobra de dúvida um retrocesso de uma legislação moderna e emancipadora como é o ECA. Ao mesmo tempo ferem de morte os direitos humanos daqueles que não têm e nunca tiveram a oportunidade de inclusão social. É alarmante como as manifestações frente aos números de violência, em favor da redução da maioridade penal, até de setores que lutaram pela implantação do ECA, manifestações emocionalmente muitas vezes comprometidas, que acham que a única reação social, frente a estes números é a redução da maioridade penal. Não podemos permitir que este discurso, como já aconteceu com outros temas jurídicos, como, por exemplo, a lei dos crimes hediondos, assuma uma discussão eminentemente modista, sob pena de promovermos mudanças que não venham de encontro aos interesses da justiça social. Já vimos este filme, políticas imediatistas, resoluções tomadas no calor dos acontecimentos, que, pela ingenuidade da população e pelo sensacionalismo da mídia, geralmente, tendem a serem políticas desastrosas e equivocadas, do ponto de vista jurídico. Outro aspecto que há de ser levando em consideração, são os dados estatísticos que apontam para impossibilidade da recepção de mais presos no atual sistema prisional, senão vejamos: o sistema prisional nacional tem 331.457 presos, para um total de vagas de 180.950, ou seja, já possui uma superlotação. Existe déficit de aproximadamente 70.852 vagas. (Estatística Criminal de 2004) No Estado de Santa Catarina, se possui dados estatísticos bastante complexos: do total de 494.271 boletins de ocorrência, foram
  • 13. oferecidas 41.139 denúncias e, destas, 7.266 foram condenados, existindo 7.558 presos no Estado, o qual possui capacidade carcerária de 5.871 vagas. Isso, com 7.500 mandados de prisão para serem cumpridos. Existe déficit de 9.187 vagas em Santa Catarina (Estatística Criminal de 2004). Não precisa ser um especialista em política criminal para perceber que o sistema é ineficiente para punir, além do que não se entrará no mérito do atendimento dado aos presos fazendo-se análise tão-só das estatísticas. Assim, implementar a redução da maioridade penal é aumentar em muito o número de apenados e, portanto, será estar diante de um monstro cuja capacidade de resposta é ineficiente e ineficaz. Ademais, esta discussão sobre a redução da maioridade penal não é algo novo, esteve na pauta do império e no governo de Jânio Quadros, onde existia um anteprojeto, cujo enfoque era tentar punir os jovens que praticavam a “subversão”: fumavam maconha. Repita-se que no Brasil temos uma legislação de excelente qualidade, reconhecida por diversos paises como uma das mais evoluídas, que é o ECA, o qual possui bons comandos legais. Porém, o que é falha é a seriedade na aplicação do mesmo. O ECA, além de medidas sancionadoras, possui as medidas de caráter protetivo que jamais foram implementadas pelo Estado Brasileiro. Neste caso, deveria a população exigir do Estado primar pela lei existente, através da correta aplicação, ao invés de buscar outras alternativas instáveis e inseguras. Defender esta postura de redução é andar na contramão da historia, pois se sabe da falência da pena de prisão. As sociedades mais evoluídas estão defendendo no sentido de minimizar a intervenção estatal, impondo cada vez mais a diminuição de penas restritivas de liberdade, pois os sistemas prisionais existentes não cumprem seu papel, porquanto se tornaram centros de depósitos humanos antiquados, que não tem conseguido ressocializar ninguém, muito pelo contrario, tem aumentado mais a revolta desta população encarcerada.
  • 14. É preciso um amplo debate nacional, sem paixões, um debate amadurecido, analisando a problemática sobre vários aspectos, não só o aspecto legalista, mas os fatores de ordem estrutural. Aplicar o ECA na sua plenitude, e não só seus instrumentos rígidos, ou seja, as medidas punitivas, mas sim seu caráter de ressocialização, apesar de seus instrumentos possuir na sua maioria o caráter punitivo de suas ações. Precisa-se também, transformar os centros de atendimentos, hoje reduzidos a casas de tortura, e não centros de recuperação de jovens, enfrentando o desrespeito ao estatuto como algo presente. É preciso, também, ter a compreensão de que o Brasil é um país jovem, em que quase a metade da população está na faixa etária de 0 a 24 anos, e, portanto, há de merecer deste e de futuros governantes toda atenção com relação a políticas sociais sólidas, que venham ao encontro da solução para esta catástrofe social imposta, que é o fenômeno da marginalidade social juvenil. Concluo, afirmando ser equivocada a idéia de redução da maioridade penal, que coloca o adolescente que comete ato infracional, como sendo o único responsável pela crescente onda de criminalidade, e que, enquanto ficamos nesta discussão estéril, famílias inteiras estão sem um teto, crianças cada vez mais dormem ao relento, e governos irresponsáveis continuam a nos governar. A vida social requer mais do que isto colocado, ou de qualquer lei punitiva: exige solidariedade, fraternidade e igualdade de oportunidade para todos. E termos a consciência de que uma opção equivocada pode representar o recrudescimento da delinqüência, e a implantação de um estado de barbárie, onde a violência passe a ser algo rotineiro, que vai representar um retrocesso, jogando um grande número de adolescentes num sistema carcerário falido. Diante de todo o exposto, resta a clareza de que a violência não se dá por falta de medidas repressoras, mas sim por falta de políticas de inserção, e que possam dar uma perspectiva social mínima à população excluída
  • 15. Aconteceu em novembro de 2003, quando um adolescente de 16 anos, o Champinha, torturou, estuprou e degolou a adolescente Liana Friedenbach depois de ter assassinado a tiros o namorado dela. Aconteceu novamente em dezembro passado, em Araucária, no Paraná, quando um jovem de 17 anos abriu fogo contra uma multidão e matou uma garota de 9 anos. E foi assim também em fevereiro deste ano, quando João Hélio Fernandes, de 7 anos, ficou preso pelo cinto durante um assalto e acabou arrastado por 6 quilômetros, com a cabeça batendo no asfalto. Como no caso de Liana e da criança do Paraná, entre os culpados pela morte de João Hélio estava um menor. E, como em todas as outras vezes, pouco após o crime a polêmica estava posta: o Brasil deve reduzir a maioridade penal, hoje fixada em 18 anos, para levar à prisão os assassinos de João Hélio? Horas depois do crime, os governadores do Rio, Sérgio Cabral, de São Paulo, José Serra, e de Minas Gerais, Aécio Neves, respondiam que sim, que a idade em que o adolescente passa a responder por seus crimes deve ser diminuída. E uma semana mais tarde deputados e senadores já adicionavam aos arquivos do Congresso 3 novos projetos com esse teor. Também foram retiradas das gavetas várias propostas antigas. Há quem queira reduzir a maioridade a 16, 14, 13, 12 e até 11 anos. Hoje, ninguém com menos de 12 anos pode ser punido pelo Estado. Dos 12 aos 18, as condenações vão da prestação de serviços comunitários à internação em estabelecimentos educacionais. Nesses casos, os menores devem passar por reavaliações semestrais e podem ficar detidos por até 3 anos. Na pesquisa mais recente sobre o assunto, divulgada em agosto, 84% dos entrevistados disseram ser favoráveis a reduzir para 16 anos a maioridade. O presidente Lula já disse ser contra. A Confederação Nacional dos Bispos do Brasil também – apesar de o arcebispo emérito de Aparecida, dom Aloísio Lorscheider, ter opinião diferente: “Os adolescentes sabem o que estão fazendo”. A questão obviamente é polêmica, daquelas em que o maior erro é buscar respostas simples. De um lado, afirma-se que a lei não cumpre seu papel de desestimular o crime e ainda provoca distorções no tamanho do castigo. É verdade. De outro, argumenta-se que colocar adolescentes em contato com presidiários só aumentará a periculosidade deles, além de não resolver as questões que levam adolescentes ao crime. Também é verdade. Se não bastasse a complexidade de todas essas questões, há ainda a emoção. Tragédias como a de João Hélio fazem ser especialmente difícil manter a serenidade. O que nós buscamos aqui é exatamente o contrário – afinal de contas, é assim que as leis devem ser pensadas. Levamos a especialistas 4 perguntas essenciais para entender o debate. A seguir, você conhecerá as respostas. Adolescentes são capazes de responder por seus atos? Testes de QI vêm sendo revisados constantemente para ficar mais difíceis. Pesquisadores sentiram necessidade de fazer essas atualizações ao perceber que a nota de 100 pontos, antes considerada a média da população, estava sendo ultrapassada com facilidade pela maioria das pessoas. As revisões têm evitado que sejamos todos considerados superdotados, mas não impedem que uma realidade venha à tona: o QI médio sobe ano a ano. Nos países desenvolvidos, algo como 4 pontos por década. No Brasil, o crescimento total é de 20 pontos desde os anos 70. É nos jovens que esse fenômeno se manifesta com mais força. Os motivos? Principalmente, a revolução tecnológica e cultural que dá aos adolescentes, cada vez mais cedo, acesso a uma enormidade de informações. E é aí que a conversa chega ao almoço de domingo, quando em plena discussão alguém afirma que os jovens hoje são muito mais inteligentes que os de antigamente. E, portanto, é lógico reduzir a idade em que eles passam a responder pelos seus atos. Sim e não, responderiam os especialistas. Verdade, o acesso à informação faz os jovens de hoje conhecer muito mais que seus antepassados. Mas inteligência não é sinônimo de maturidade. Entre os 16 e os 20 anos, o corpo humano passa por transformações que influenciam nossa maneira de agir. Não é à toa que adolescentes desafiam o perigo, a autoridade e fazem qualquer coisa para impressionar amigos (e amigas). “O adolescente é emocionalmente imaturo. Até os 20 anos, toda pessoa está desenvolvendo a capacidade de julgamento moral”, diz o psicólogo Sergio Kodato, professor da USP em Ribeirão Preto. Pesquisas com o uso de tomografias vêm explicando por que isso ocorre. Um antigo conceito médico dizia que o desenvolvimento do cérebro se completava na infância. Hoje sabemos que o córtex frontal, área localizada na frente do crânio, na altura dos olhos, passa por grandes alterações na adolescência. O córtex frontal é responsável pelo controle dos impulsos e pela empatia, a capacidade de se colocar no lugar de outras pessoas. Enquanto essa região não se desenvolve, o comportamento dos adolescentes guarda uma certa semelhança com o dos psicopatas – que não conseguem desenvolver sentimentos afetivos. “A habilidade de se comportar socialmente muda muito rápido nessa fase, e o córtex frontal de um jovem de 16 é visivelmente menos desenvolvido do que outro de 18. Claro que isso não justifica que adolescentes cometam crimes, mas é importante ter essa informação em mente quando discutimos a maioridade penal”, afirma a psiquistra Sarah-Jayne Blakemore, pesquisadora do Instituto de Neurociência Cognitiva da University College London. Qual a real participação dos jovens no mundo do crime? O Brasil tem aproximadamente 35 milhões de adolescentes entre 12 e 18 anos. Desses, 15 mil, ou 0,04%, são jovens infratores internados – a população de adultos presos é, proporcionalmente, 7 vezes maior. Eles têm um perfil bem claro: 90% são homens, 76% têm de 16 a 18 anos, 60% são negros e 90% largaram o colégio. “Quando discutimos a idade em que os adolescentes começarão a ser levados a presídios, estamos falando de homens pobres, com deficiências graves na formação intelectual, cultural e social, que não têm renda nem casa própria e se encontram sem muita expectativa de futuro”, diz Sergio Kodato. Metade desses jovens são punidos na Região Sudeste, 16% cometeram infrações no Nordeste e outros 15% foram detidos no Sul. Dentro das unidades para adolescentes, o motivo mais comum para a detenção é o roubo, seguido de homicídio, furto e tráfico de drogas. Ao contrário do que você costuma ler nos jornais, não é nas grandes capitais que os jovens causam mais problemas. Os crimes nas metrópoles têm mais repercussão, mas é no interior que a situação se agrava. “O Brasil vive um momento de interiorização dos crimes mais graves, como homicídio. E um dos motivos para explicar esse fenômeno é o crescimento da participação dos jovens”, afirma o coronel José Vicente da Silva, especialista em segurança pública e ex-secretário nacional de Segurança. Em São Paulo, os jovens da capital se envolvem mais com tráfico de drogas e porte de armas. Os do interior se destacam pelos crimes contra a vida. Dados de 2003 da Secretaria da Segurança Pública mostram que, na região metropolitana, os menores estão envolvidos em apenas 0,4% do total de homicídios. No interior, esse índice é mais de 5 vezes maior: 2,3%. Os jovens das cidades menores também estupram 3 vezes mais – são responsáveis por 6,3% de todos os ataques, contra 2,6% da capital. Em ambos os casos, porém, os crimes dos menores de 18 representam uma porção mínima dentro do universo total. No tráfico e no porte de armas a coisa não é assim. A participação dos menores é mais expressiva que em outros crimes. Na capital, 13,1% das ocorrências de venda de drogas e 17,2% das prisões por porte ilegal envolvem menores. Especialistas sugerem uma explicação para essa desproporcionalidade: “É normal menores assumirem o crime em nome de algum maior. Nos grupos de traficantes, ir para a Febem é considera- do muito mais tranqüilo do que ser levado a uma penitenciária, principalmente porque o adolescente nunca fica preso por mais de 3 anos”, diz José Vicente. Isso significa que diminuir a idade da maioridade penal reduziria os homicídios no interior? Atrapalharia os planos dos traficantes de drogas na capital? Diminuiria os roubos? É a próxima pergunta que fizemos aos especialistas. Prender menores pode diminuir os índices de violência? Como os jovens com menos de 18 anos não estão emocionalmente amadurecidos, faz sentido acreditar que eles tampouco se preocupam com os riscos que correm ao cometer crimes. Ainda assim, aumentar o rigor (e o cumprimento) da lei poderia inibir pelo menos uma parte desses infratores. É o que acredita o coronel José Vicente. “Vivemos em uma cultura de baixo controle, em que a sensação de impunidade joga muitos jovens na direção do crime”, diz. “A ameaça de ir para a cadeia resolve, sim, para jovens e para adultos. Ela modera o apetite do criminoso porque faz com que ele pense duas vezes antes de agir. Prender mais é a forma mais rápida de conseguir resultados em curto prazo. Deu certo em Nova York, em Bogotá e em São Paulo, onde a polícia começou a agir com mais força e a prender mais”, afirma, citando 3 cidades que reduziram seus índices de homicídios. Para os críticos da redução da maioridade, a questão precisa ser olhada por outro lado: prender adolescentes como criminosos comuns é inócuo. E, considerando-se o nível das penitenciárias brasileiras, é difícil esperar outra coisa de um adolescente colocado na cadeia além da reincidência no crime. Na prática, prender criminosos mais cedo poderia aumentar os números da violência a médio prazo. “Quando um jovem que cometeu um crime pouco grave vai para um presídio, pode ter certeza de que ele sairá de lá pronto para fazer coisas bem piores”, diz Sergio Kodato. Mas, se deter adolescentes é uma bobagem, por que tantos países que têm índices de violência tão mais baixos que os brasileiros fazem isso? A Inglaterra prende jovens a partir de 10 anos. A Holanda, a partir de 12. “A maioria dos países considera que a gravidade do delito é mais importante do que a idade do infrator. O regime jurídico brasileiro não funciona assim. Aqui, a idade pesa mais do que o crime em si”, explica o advogado Walter Ceneviva, professor aposentado de direito civil da PUC-SP e contrário à redução. A prioridade do delito sobre a idade é um conceito jurídico antigo. Na Roma antiga, a Lei das 12 Tábuas, escrita no ano 450 a.C., determinava que homens com 7 a 18 anos e mulheres de 7 a 14 poderiam responder criminalmente, desde que o juiz interpretasse que eles estivessem conscientes de seus atos. É esse tipo de análise prévia que permitiu que, em 1993, na Inglaterra, dois garotos de 10 anos fossem julgados e condenados a 11 anos de prisão por torturar e matar James Bulger, um bebê de 2 anos. Eles levaram James para uma linha férrea, jogaram tinta em seus olhos e o espancaram com tijolos e barras de metal. Na avaliação do juiz que os condenou, o crime revelou premeditação e intenção, duas características de adultos. Por isso, a gravidade do homicídio prevaleceu sobre a idade, e ambos foram levados para um presídio comum. Ao final da pena, os dois jovens, considerados recuperados, foram libertados e ganharam um novo nome para fugir do estigma de assassinos. “Em países como a Inglaterra, o crime cometido tem mais peso, e a idade é apenas um atenuante. Quem avalia isso, caso a caso, é o próprio juiz”, diz Ceneviva. “No Brasil não temos essa sofisticação. Simplesmente levamos o jovem para qualquer Febem, tenha ele roubado uma bicicleta ou matado 3 pessoas.”
  • 16. Nos EUA, a legislação varia tanto de estado para estado que jovens de 6 a 18 anos podem ser responsabilizados, dependendo do lugar onde cometeram seus crimes. Nos últimos 35 anos, 137 menores de 18 foram condenados à morte – coisa que não acontece na China, onde adolescentes de 14 a 18 anos podem pegar, no máximo, prisão perpétua. Outros países, como o Japão, não aceitam a prisão de jovens de menos de 20 anos. Adolescentes são julgados por um tribunal de família e podem ser submetidos a penas de, no máximo, 5 anos. Dados da Unicef mostram que a variação de leis no mundo é enorme e não obedece a padrões claros: na Europa, há países que prendem crianças e outros que esperam até os 18 anos. Por que estamos mais próximos dos japoneses do que dos ingleses? Porque, desde o começo do século 20, definimos maioridade como o momento em que o jovem completa sua escolaridade. Mas nem sempre foi assim. O primeiro código criminal do Brasil independente, de 1830, determinava que a idade de responsabilidade penal era 14 anos. O Código Penal da república seguiu esse padrão, mas dava aos tribunais condições de condenar jovens de 9 a 14 anos, desde que sua intenção de cometer um crime ficasse clara. Foi só a partir de 1921 que chegamos ao formato atual, com maioridade aos 18 e instituições educativas para os menores. O que fazer com os jovens infratores? Apesar de popular, a redução da maioridade penal para 16 anos tem poucas chances de virar realidade. Existe uma controvérsia jurídica a respeito do assunto: a maioridade está estabelecida em um artigo da Constituição. Para mudá-la, seria necessário um enorme esforço no Legislativo. E, como a maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal se diz contrária à alteração, inclusive Ellen Grace, presidenta do tribunal, a lei seria bombardeada juridicamente. Quer dizer então que ficamos do jeito que estamos? Não necessariamente. Existem alternativas já propostas para atacar o problema. Em fevereiro, uma semana depois do assassinato de João Hélio, a Câmara dos Deputados e o Senado aprovaram dois projetos de lei similares, que aumentam a pena dos maiores de idade que cometerem crimes em companhia de menores. Ter cúmplices menores seria um agravante, um motivo suficiente para aumentar a pena. “É uma boa idéia. Desestimularia a formação de gangues com integrantes jovens. Muitos menores de 18 entram para o crime dessa forma, agindo ao lado de líderes mais velhos”, opina Ceneviva. A outra proposta em pauta é alterar o conteúdo do Estatuto da Criança e do Adolescente para permitir que menores de 18 anos possam ficar detidos por mais de 3 anos. “Hoje, um assassino comportado pode ser liberado depois de 6 meses, desde que a análise psicológica determine que ele aprendeu a lição. Só que um ladrão de galinhas que não aceite as condições da Febem pode ficar os 3 anos. Falta critério. Isso para não falar dos casos em que o garoto de 14 mata uma vez, passa um ano detido, sai e mata de novo. Ele continua sendo considerado incapaz de responder por seus atos”, critica o advogado Ari Friedenbach, pai da estudante Liana, morta por Champinha em 2004. Ari afirma que hoje não mais defende a redução da maioridade, como fez logo após o assassinato da filha, por considerar que ela não resolveria a atual falta de proporção entre o tamanho da condenação e o crime cometido. “Precisamos garantir que um menor que comete crime hediondo passe por uma análise psiquiátrica e fique preso o tempo necessário. Mesmo que seja décadas”, ele defende. “Em alguns casos, temos que desistir da ressocialização.” O aumento da pena para adolescentes infratores é defendido pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). A pedido do Ministério da Justiça, o juiz Luiz Flávio Gomes chegou a esboçar um projeto de lei, nunca colocado em votação, que cria penas diferenciadas para menores que cometam crimes hediondos. Elas poderiam passar de 3 anos, mas não seriam tão longas quanto a de um adulto. Dessa forma, no caso de crimes mais graves, o réu seria automaticamente emancipado e julgado como adulto, e a idade serviria apenas de atenuante na hora de determinar a pena. Essa medida parece agradar aos dois lados dessa discussão. “Se adotado em casos mais graves, aumentar o tempo de internação seria positivo”, diz o coronel José Vicente. “Seria um grande avanço, muito maior do que a própria redução da maioridade”, reforça Ceneviva. É um consenso, ainda que pequeno dentro de toda a discussão. Na verdade, existe outro ponto em que todos concordam: a polêmica logo sumirá da mídia. Somente para voltar a ser discutida tão logo um adolescente participe de um crime chocante. Na Colômbia, um adolescente só é tratado como adulto após os 18 anos. Na Inglaterra, aos 10. São países que adotam medidas opostas para lidar com seus jovens criminosos. Na Colômbia, os jovens menores de 18 anos são responsáveis por 14% dos homicídios que acontecem no país. Na Inglaterra, essa mesma faixa etária comete 12% dos assassinatos . Nos EUA, onde a idade da maioridade varia de estado para estado, 10,9% dos homicídios são cometidos por menores de 18 anos. Moral da história: os países têm legislações bastante diferentes, mas índices de criminalidade juvenil muito parecidos. Sinal de que a lei em si não tem impacto direto na redução da violência. A violência cometida por jovens é um fenômeno muito real, que precisa ser enfrentado imediatamente. Mas beira a inocência acreditar que a redução da maioridade penal no Brasil possa ser a solução da epidemia nacional de violência. “Vamos apenas jogar mais 11 mil jovens por ano nos presídios para conviver com criminosos profissionais”, diz Walter Ceneviva. “Existe uma distorção clara na forma como julgamos nossos jovens, e isso deveria ser corrigido para tornar nosso sistema judiciário mais justo. Mas a solução para o problema da violência não está aí.” Então é o caso de perguntar: onde está? Aí mora a charada: como resolver a questão da segurança pública? É preciso acabar com a impunidade generalizada. Melhorar a polícia. Diminuir as desigualdades sociais. Fazer o Estado mais presente. Corrigir desvios éticos em toda a sociedade. “Antes de serem criminosos, os adolescentes pobres são vítimas de uma sociedade injusta. Sem mudar esse quadro, nunca vamos reduzir a violência”, argumenta o psicólogo Sergio Kodato. Para o coronel José Vicente, caso de polícia se resolve com polícia bem treinada e bem remunerada, que não aceite propina nem precise ter um segundo emprego. E, também, com uma legislação mais dura. Que inclua mandar jovens para a cadeia. A Adolescência