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E84	 Estudos socioculturais / Cláudio Damaceno Paz, Elvis Dieni Bardini, 	
		 Leandro Kingeski Pacheco, Maria Terezinha da Silva do
		 Sacramento, Tade-Ane de Amorim ; design instrucional Marina 	
		 Melhado Gomes da Silva. – Palhoça : UnisulVirtual, 2013.
110 p. : il. ; 28 cm.
Inclui bibliografia.
1. Ciências sociais. 2. Cultura – Aspectos sociais. 3.
Sociedades. I. Paz, Cláudio Damaceno. II. Bardini, Elvis Dieni. III.
Pacheco, Leandro Kingeski. IV. Sacramento, Maria Terezinha da
Silva. V. Amorim, Tade-Ane de. VI. Título.
Sumário
Introdução  I  7
Capítulo 1
Sociedade: teorias clássicas e
contemporâneas  I  9
Capítulo 2
Estado, cidadania, ética e direitos humanos  I  27
Capítulo 3
Cultura e identidade  I  67
Capítulo 4
Práticas culturais e processos midiáticos  I  85
Considerações Finais  I  101
Referências  I  103
Sobre os Professores Conteudistas  I  109
7
Introdução
Caro(a) estudante,
Você inicia agora o estudo do livro didático Estudos socioculturais, com o intuito
de procurar compreender a dinâmica e a diversidade das sociedades humanas,
para agir responsavelmente nos contextos sociais. Nesse sentido, saiba que você
será exigido(a) em termos de análise e compreensão de contextos e de diálogo
com as diferenças socioculturais.
Os conteúdos aqui reunidos seguem uma abordagem temática, bem como uma
abordagem relacionada à sociedade e à cultura. Especificamente, por meio de
quatro capítulos, você estuda teorias clássicas e contemporâneas relativas à
sociedade; a questão do Estado e da cidadania, da ética e dos direitos humanos;
acerca da cultura e da identidade; das práticas culturais e dos processos
midiáticos.
Este livro não tem a mínima pretensão de esgotar o assunto, mas tão somente
de desenvolver uma abordagem didática, sistemática e humildemente parcial.
Diante dessa limitação, procure ampliar seus conhecimentos sobre as temáticas
abordadas, consultando os textos originais dos pensadores citados, dicionários e
outras obras, sempre que considerar pertinente.
Desejamos-lhes boa aprendizagem!
Professoras Maria Terezinha e Tade-Ane
Professores Cláudio, Elvis e Leandro
9
Habilidades
Secões de estudo
Capítulo 1
Sociedade: teorias clássicas e
contemporâneas
Tade-Ane de Amorim
Considerando diferentes abordagens teóricas, este
capítulo instrumentaliza o(a) estudante a refletir
criticamente sobre as possibilidades de ação de
intervenção social.
Seção 1:  Concepções de sociedade: autores
clássicos
Seção 2:  Pensamento contemporâneo
10
Capítulo 1
Seção 1
Concepções de sociedade: autores clássicos
O que nos mantém juntos? Por quais motivos nós, homens e mulheres, vivemos
em sociedade? A palavra sociedade devirá do latim societas e significa
“associação amistosa com outros”. Assim, uma definição mais geral de sociedade
pode ser um conjunto de interações humanas padronizadas culturalmente. Dessa
forma, pode-se pensar em sociedade como valores, cultura, sistema de símbolos.
A sociedade não é apenas um conjunto de indivíduos que vivem juntos em
determinado local. Designa, também, o pertencimento a uma dada organização
social compartilhada entre seus membros, com a presença de instituições e leis
que regem a vida de cada indivíduo e da coletividade. A sociedade é objeto
de estudo de diferentes áreas das ciências sociais, como Sociologia, História,
Geografia e Antropologia. Também é amplamente estudada pela Filosofia.
O sociólogo Norbert Elias (1994, p.13) apresenta-nos uma questão bastante
interessante:
Que tipo de formação é esse, esta “sociedade” que compomos
em conjunto, que não foi pretendida ou planejada por nenhum de
nós, nem tampouco por todos nós juntos? Ela só existe porque
existe um grande número de pessoas, só continua a funcionar
porque muitas pessoas, isoladamente, querem e fazem certas
coisas, e no entanto sua estrutura e suas grandes transformações
históricas independem, claramente, das intenções de qualquer
pessoa em particular.
Essa é uma das questões que as Ciências Sociais vêm buscando responder
desde o início de sua trajetória. Nesta seção, mobilizaremos as teorias de
sociólogos considerados os clássicos da Sociologia: Emile Durkheim, Karl Marx e
Max Weber, para discutirmos por que vivemos juntos!
1.1 Emile Durkheim
Para Durkheim, a sociedade constituía-se como um reino social, com
individualidade distinta dos resinos animal e vegetal. Dessa forma, a sociedade
não é apenas a soma dos indivíduos que a compõem; ela é uma síntese que se
encontra em cada elemento que compõe os diferentes aspectos da vida.
Estudos Socioculturais
11
Durkheim definiu sociedade como um complexo integrado de fatos
sociais, que são as maneiras de agir, pensar e sentir, como práticas
coletivas de um grupo, e que exercem coerção sobre os indivíduos. Além
disso, os fatos sociais dizem respeito ao caráter objetivo da sociedade, isto
é, são independentes dos indivíduos.
Durkheim esforçou-se muito para afirmar a exterioridade dos fatos sociais, isto
é, para separá-los de razões pessoais ou de impulsos da consciência individual.
Segundo ele:
Fato social é toda maneira de agir fixa ou não, suscetível de
exercer sobre o indivíduo uma coerção exterior; ou ainda, que é
geral na extensão de uma sociedade dada, apresentando uma
existência própria, independente das manifestações individuais
que possa ter. (DURKHEIM,1978, p. 13).
Assim, para o autor a sociedade seria resultado da ligação existente entre as
partes e o todo, sendo que o todo predomina sobre as partes. Nesse sentido, o
fundamento da vida social estaria na sociedade e não no indivíduo. As estruturas
sociais, uma vez que foram criadas pelo homem, passariam a funcionar
independentes dele. E mais: passariam a condicionar suas ações.
O predomínio da sociedade sobre a ação individual é o que mais se destaca no
entendimento de sociedade de Durkheim. Para o autor, homens e mulheres não
agem como desejam agir, mas são condicionados pela sociedade, que exerce um
poder coercitivo sobre as ações individuais.
Desta forma, o modo como o homem age é sempre condicionado pela
sociedade, pois o agir individual origina-se no exterior, ou seja, na sociedade.
Ele é imposto pela sociedade ao indivíduo, por isso é coercitivo, tem existência
própria e independente da existência do indivíduo, que age como a sociedade
gostaria que ele agisse.
Durkheim chamou esse processo de coerção social, isto é, a sociedade dita
regras e os indivíduos as seguem, e na maior parte das vezes sem nem perceber
que estão seguindo regras que foram impostas.
Pense, por exemplo, que, ao acordar, você “naturalmente” vai escovar os dentes.
Esse ato de escovar os dentes não é “natural” e, sim, imposto como uma regra
que deve ser seguida por todos. Mas, como não pensamos se devemos ou não
escovar os dentes ao levantarmos, já interiorizamos essa regra, de tal modo que
ela não parece mais uma coerção social. E é exatamente no momento que não a
sentimos mais como impositiva que a regra obtém o sucesso.
12
Capítulo 1
De acordo com Durkheim, os fatos sociais têm objetividade porque eles
têm existência independente dos indivíduos. A sociedade, nesse sentido,
é mais do que a soma dos indivíduos, sendo uma espécie de síntese que
não se encontra em nenhum dos elementos que compõem os diferentes
aspectos da vida.
Uma vez constituído um fenômeno, ele tem uma forma que cada elemento
individual não possui. A sociedade, nesse sentido, é mais do que a soma das
partes. Por isso, os fenômenos, uma vez combinados e fundidos, fazem nascer
algo completamente novo, o qual não está mais nas motivações individuais e
nem é o resultado das partes colocadas mecanicamente uma ao lado da outra.
A interação entre os indivíduos possui uma força peculiar capaz de gerar novas
realidades.
Durkheim mostra que a mentalidade do grupo não é a mesma coisa que a
mentalidade individual; que o estado de consciência coletiva não é a mesma
coisa que o estado de consciência individual e que um pensamento encontrado
em todas as consciências particulares ou um movimento que se repete por todos,
não é, em si, um fato social.
Para ter um caráter social, é necessário que sua origem esteja na coletividade
e não nos membros da sociedade. A exterioridade do fato social é dada pela
possibilidade de entendê-lo como objeto de observação, independentemente das
ações dos indivíduos.
Os fatos sociais constituem-se a partir de causas externas que se processam
nas interações grupais, na pluralidade de consciência e como obra coletiva, com
ascendência sobre os indivíduos, e que, por isso, são externos a eles.
Como reconhecer se um fato é social ou não?
Podemos reconhecê-lo pela coerção que ele exerce sobre os indivíduos. Para
Durkheim, o organismo social precisa manter o estado saudável e identificar os
fenômenos doentes a fim de orientar sua cura. O caráter coercitivo nem sempre é
percebido pelos indivíduos.
A presença desse poder é reconhecível pela existência de alguma sanção
determinada, seja pela resistência que o fato opõe a qualquer empreendimento
individual que tenda a violentá-lo, ou pela difusão geral que se apresenta no
interior do grupo.
Em cada indivíduo só existe um fragmento da sociedade. Se olharmos os
indivíduos isoladamente, nunca compreenderemos a sociedade. É o todo que
tem precedência sobre as partes.
Estudos Socioculturais
13
Na concepção de Durkheim, é a sociedade que pensa, deseja, sente, embora o
faça sempre por meio dos indivíduos. Mas, estes são resultados diretos do que é
a sociedade. Nessa perspectiva, podemos afirmar que:
•• fenômenos gerais são fenômenos sociais porque existem como
fenômenos coletivos;
•• fenômenos comuns nem sempre são caracterizados como coletivos,
somente como gerais.
O fenômeno está bem longe de existir no todo, pelo fato de existir nas partes.
Porém, ele existe nas partes porque existe no todo.
Leia, na sequência, uma frase que serve como um exemplo utilizado por
Durkheim para diferenciar os fenômenos coletivos dos gerais: “A dureza do
bronze não figura nem no cobre, nem no estanho, nem no chumbo que serviram
para formá-lo e que são corpos maleáveis ou flexíveis; figura na mistura por eles
formada.” (DURKHEIM, 1978, p. 25).
Uma assembleia não é a soma dos indivíduos, mas é a produção de algo
novo, nas palavras de Durkheim, algo “Sui Generis”. A realidade Sui Generis da
sociedade pode ser chamada de representação coletiva de um fenômeno, ou seja,
a forma como a sociedade vê a si mesma e ao mundo que a rodeia, por meio de
suas lendas, mitos, concepções religiosas e suas crenças morais.
A partir das representações coletivas, encontramos as bases nas quais se
originam os conceitos, que são traduzidos nas palavras do vocabulário de uma
comunidade, de um grupo ou de uma nação. Note que, para Durkheim, os
conceitos e categorias são sociais e não individuais; assim, as percepções do
belo, do feio, do agradável não são inatas ao indivíduo, mas passadas pela
sociedade.
Para o autor, até mesmo num momento extremo, em que o indivíduo resolve
acabar com sua própria vida, é a sociedade que se manifesta nesse desejo.
Geralmente, atribuímos o ato do suicídio a um problema estritamente de ordem
individual. Contrariamente a essa ideia, e de forma bastante original, Durkheim
apontou que o suicídio deve-se a fatores sociais.
Importa considerar que, antes dele, várias pesquisas já haviam sido
desenvolvidas com a temática do suicídio, utilizando-se inclusive de fatores
sociais para explicar tal ação: o clima, a raça, ou a desordem mental. Foi
Durkheim, entretanto, em seu livro “O Suicídio”, publicado em 1897, o primeiro a
afirmar que o suicídio é um fato social e como tal deverá ser explicado por outros
14
Capítulo 1
fatores sociais. Assim, para o autor, o suicídio deve ser analisado de acordo
com o momento social em que se dá, para que possamos compreendê-lo como
manifestação de uma desordem social. Ele é resultado de vários fatores, mas o
principal fator, o que mais contribui para sua existência, é o estado de anomia
encontrado na sociedade.
O conceito de anomia empregado por Durkheim designa um estado
social sem regras e sem normas. Para o autor, tal estado é verificado,
principalmente, em tempos de grandes transformações sociais, como o
momento de um crescimento acelerado da divisão do trabalho, provocado
pela falta de interligação estável entre os indivíduos. Essas mudanças
rápidas dificultariam o desenvolvimento e o funcionamento de regras gerais
e gerariam espaço para manifestações individualistas que, nesse caso,
desestruturariam toda ordem social.
Observe que, nessa explicação sobre o suicídio, Durkheim enfatiza o peso da
sociedade sobre o indivíduo. O chamado suicídio egoísta é, para Durkheim, a
consequência do individualismo, isto é: o outro lado da fraca integração social.
Quanto mais frouxos os laços sociais, maior a probabilidade de se cometer
suicídio. Como verdadeiro conservador, ele contrariava as ideias do liberalismo
e do individualismo, as quais interpretavam a falta de integração grupal como
liberdade individual. Durkheim a identificou como egoísmo.
O suicídio altruístico é o suicídio decorrente de uma integração social
extremamente forte, colocando o indivíduo em certas situações sob pressão,
conduzindo-o ao suicídio. Esse tipo de suicídio já se deu entre os membros do
serviço militar na França, na Alemanha, no Japão; entre viúvas na Índia, que
aceitavam serem colocadas na fogueira junto com o corpo do marido morto.
E, atualmente, acontece entre os homens-bomba muçulmanos. Perceba que
nesse tipo de suicídio o indivíduo não o comete pela falta de laços sociais, mas o
contrário: os valores sociais são tão fortemente introjetados nos indivíduos, que
eles abrem mão do direito de viver por uma causa social.
O suicídio anômico não é resultado da falta de integração social, tampouco
consequência do poder exagerado do coletivo sobre o indivíduo. Ele aparece
em tempos de mudanças sociais rápidas que, de acordo com Durkheim, sempre
andam junto com a desestruturação da sociedade. O autor apontou que a
decadência econômica bem como o seu oposto, a prosperidade súbita, levam às
mesmas consequências: aumento da taxa de suicídio. Esse fenômeno anômico
enfraquece os laços que ligam o indivíduo à sociedade e, em casos extremos,
leva ao suicídio.
Estudos Socioculturais
15
Mas o suicídio anômico não é só aquele que aumenta durante as crises
econômicas; é também aquele cuja frequência cresce paralelamente ao número
de divórcios. Em suas pesquisas, Durkheim percebeu que o homem divorciado
está mais “ameaçado” pelo suicídio do que a mulher. Para compreender o
fenômeno é preciso analisar o que o homem e a mulher recebem de equilíbrio, de
satisfação e de disciplina no casamento.
O homem encontra equilíbrio e disciplina no casamento; porém, graças à
tolerância dos costumes, conserva certa liberdade porque para ele são permitidas
atitudes sociais e práticas sexuais fora do casamento. A mulher vai achar no
casamento mais disciplina do que liberdade. Por outro lado, o homem divorciado
busca novos relacionamentos estáveis para superar a disparidade entre desejo e
satisfação, enquanto a mulher divorciada beneficia-se de uma liberdade adicional
que compensa, em parte, a perda de proteção familiar.
A teoria de Durkheim não é apenas uma curiosidade histórica. Ela também ajuda
a esclarecer o suicídio aqui e agora, pois existem dados de 2004 que apontam
que aproximadamente cinco em cada 100 mil brasileiros cometem suicídio a cada
ano (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2012).
1.2 Marx
Marx viveu no século XIX, no período da consolidação do sistema capitalista,
que imprimiu uma nova maneira de ser da sociedade. Suas formulações teóricas
sobre a vida social, com destaque para as análises que fez da sociedade
capitalista da sua época, causaram repercussões entre os intelectuais, a ponto
de a Sociologia Ocidental Moderna preocupar-se basicamente em confirmar ou
negar as questões levantadas por ele.
Ele cumpriu o papel de desvendar o sistema capitalista de forma ampla,
analisando seus aspectos políticos, sociais e econômicos, com a utilização do
método dialético. Isso é tão marcante que se pode afirmar que o conceito de
realidade social de Marx é dialético.
Caracterizando o método, Marx (1982, p. 179) afirmava que “o movimento
do pensamento é o reflexo do movimento real, transportado e transposto no
cérebro do homem”. É o movimento da matéria, da realidade social e da vida
do ser humano que é objetivamente dialético. Marx reencontrou a dialética na
sua unidade, isto é, no conjunto de seu movimento. A realidade em estado de
movimento, a realidade em processo, impulsionada pela superação de elementos
contraditórios que a permeiam, é uma ideia básica no método dialético. Para
ele, tudo parecia levar à própria contradição e, por consequência, à mudança, à
transformação.
16
Capítulo 1
Para os historiadores, as teorias ou abstrações são representações que os
homens fizeram para si mesmos na história. Neste aspecto, elas são o resultado
da história humana, estando ao mesmo tempo destinadas a descrevê-la e a
permitir sua continuidade ou descontinuidade. Portanto, são contextualizadas e
podem ser modificadas, porque toda história traz em si o germe da sua própria
destruição.
A dinâmica das relações sociais, o movimento das mudanças e transformações
constantes, e a dialética da realidade e do pensamento constituem a força motora
da história. As circunstâncias fazem os homens tanto quanto os homens fazem
as circunstâncias. Ao produzir seus meios de existência, os homens produzem
indiretamente a sua própria vida material e social, processo que implica o
surgimento de contradições. Nesse sentido, o sociólogo poderia compreender a
sociedade capitalista e a direção na qual ela estaria transformando-se graças as
suas contradições internas.
Na verdade, Marx nunca tratou da produção em geral, mas referiu- se à produção
num estágio de desenvolvimento social, como sendo a produção dos indivíduos
que vivem em sociedade. A sociedade depende do estágio de desenvolvimento
social, de suas forças produtivas e das relações sociais de produção, conforme
citação que segue:
[...] os homens não são livres árbitros de suas forças produtivas,
pois toda força produtiva é uma força adquirida, produto de
uma atividade anterior. Portanto, as forças produtivas são os
resultados da energia prática dos homens, [...] determinada pelas
condições em que os homens se encontram colocados, pelas
forças produtivas já adquiridas [...]. (MARX apud QUINTANEIRO,
BARBOSA e OLIVEIRA, 2001, p. 71).
A maneira pela qual os homens produzem seus meios de existência depende da
natureza dos meios de existência já conhecidos e que precisam ser reproduzidos
ou substituídos. A compreensão dos processos históricos não pode ser feita sem
referência à maneira como os homens produzem sua sobrevivência material. Por
isso, o conceito de trabalho é fundamental para o entendimento, pois é nesse
processo que se estabelece a interação com a natureza e é por meio do trabalho
que o homem a transforma.
Na concepção marxista, o homem trabalhando é considerado como força
de trabalho, significando a energia despendida no processo de trabalho, por
meio do qual chega ao produto. E é o trabalho que atribui ao produto um valor
determinado.
Estudos Socioculturais
17
Para uma compreensão mais adequada da sociedade moderna, é imprescindível
que se tenha o domínio de alguns conceitos básicos relativos a sua economia.
Como você está estudando as ideias sociológicas de Marx, nesta seção, você
terá contato com alguns fundamentos conceituais da Sociologia econômica
marxista. Isso porque, no pensamento de Marx, os aspectos econômicos
adquiriram destaque e estão muito presentes em toda a análise da sociedade
capitalista.
Na sociedade atual, vende-se a própria força de trabalho como mercadoria, mas
é uma mercadoria produtora de outras mercadorias, multiplicadora de dinheiro.
Nesse contexto, a força de trabalho surge, então, como uma nova mercadoria.
O trabalhador livre vende a sua força de trabalho pelo valor de um determinado
salário.
É bom lembrar que a força de trabalho nem sempre foi uma mercadoria ou
trabalho assalariado. O escravo, por exemplo, não vendia a sua força de trabalho
ao seu dono, assim como o boi não vende o seu trabalho ao lavrador. O escravo
era vendido de uma vez para sempre com a sua força de trabalho. Era uma
mercadoria que podia passar das mãos de um dono às mãos de outro. Assim, ele
era uma mercadoria, mas a sua força de trabalho não lhe pertencia.
Já o trabalhador livre, no sistema capitalista, vende 8, 10, 12, 15 horas de sua
vida, dia após dia, ao proprietário dos meios de produção, dos instrumentos de
trabalho e meios de vida. (QUINTANEIRO; BARBOSA; OLIVEIRA, 2001).
Na concepção de Marx, o salário deve ser determinado considerando-se o valor
dos meios necessários para a subsistência, para produzir, desenvolver, manter e
perpetuar a força de trabalho. E considerando-se, ainda, tudo o que é necessário
para que o trabalhador reproduza-se de acordo com o seu nível de vida, que varia
historicamente entre épocas e regiões, e de acordo com suas habilidades.
A força de trabalho é a única mercadoria que pode produzir valor.
Para Marx (1982), uma parte desse valor, apropriada sob forma de
trabalho excedente, é trabalho não pago e passa a integrar o capital,
transformando-se em riqueza. No Capitalismo, esse trabalho excedente
assume a forma de mais-valia, expressão do grau de exploração da força
de trabalho pelo capital. Ela é considerada pelos sociólogos como sendo a
alma do Capitalismo, pois produz, na teoria e na prática, a desigualdade e
os antagonismos sociais.
18
Capítulo 1
Aquilo que o trabalhador produz a mais do que recebe, em forma de salário, é
apropriado pelo dono dos meios de produção e, normalmente, é chamado de
apropriação do excedente de trabalho. É por meio da extração de mais-valia
que se estabeleceu a via fundamental da acumulação capitalista, por intermédio
da qual, segundo Marx (1982), o capital realiza a sua vocação histórica à custa
do trabalhador. Movido pela ideia do lucro, o capitalista seria necessariamente
explorador.
É importante destacar que há uma diferença entre lucro e mais-valia. A mais-
valia origina-se somente do trabalhador, já o lucro pode vir de outras fontes: da
compra e venda de mercadorias, do lucro, do arrendamento.
Segundo Demo (1989), as classes sociais são grupos sociais antagônicos,
em que um se apropria do trabalho do outro devido à posição diferente que
ocupam na estrutura econômica de um modo de produção, determinada
fundamentalmente pela forma específica com que se relaciona com os meios
de produção. A distinção está entre os que possuem e os que não possuem os
meios de produção.
Como você já viu, a compra e a venda da força de trabalho produz um
distanciamento entre os que compram e os que vendem essa força de trabalho.
Marx chamou isso de antagonismo de classe, cuja base de sustentação é a
propriedade privada dos meios de produção. Com a proposta de eliminação
da propriedade privada, ele via a possibilidade de eliminar os antagonismos de
classe.
Marx (1982) demonstrou que a existência das classes está vinculada a
determinadas fases da história do desenvolvimento da produção; que a luta de
classes conduz necessariamente, ao longo do tempo, à ditadura do proletariado;
e que esta mesma ditadura não passa de uma transição para a abolição de todas
as classes e para uma sociedade sem classes.
É na obra Manifesto Comunista, de 1848, que se encontram as principais
considerações políticas de Marx sobre a luta de classes, conforme citação que
segue:
[...] a história de toda a sociedade até hoje é a história da luta de
classes. [...] na nossa época, a época da burguesia, caracteriza-
se, por ter simplificado os antagonismos de classe. A sociedade
vai se dividindo cada vez mais em dois grandes campos inimigos,
[...] burguesia e proletariado. (MAR X; ENGELS, 1985, p. 45).
Estudos Socioculturais
19
Mesmo reconhecendo a importância do papel da burguesia na dissolução
do feudalismo e na construção da ordem capitalista, Marx prognosticou que
cabe aos operários dar o próximo passo, o da destruição do Capitalismo e da
instauração da sociedade socialista:
O progresso da indústria, cujo agente involuntário e passivo
é a própria burguesia, substitui o isolamento dos operários,
resultante da concorrência, por sua união revolucionária
resultante da associação. [...] a burguesia produz, acima de tudo,
seus próprios coveiros. Seu declínio e a vitória do proletariado
são igualmente inevitáveis. (MARX; ENGELS, 1985, p. 64).
Na verdade, Marx reconheceu no Capitalismo apenas duas classes: a burguesia e
o proletariado; o que seria para ele uma simplificação, se comparadas ao sistema
feudal de produção. Algumas vezes ele usou o termo “pequena burguesia”
para designar uma classe em transição, composta pelo pequeno produtor
independente, artesão ou camponês, donos dos seus meios de produção.
Hoje existem salários que permitem acumulação de capital, cujo valor vai
muito além do necessário para a satisfação das necessidades básicas (atletas
diferenciados, top models, executivos de grandes empresas), em que as
características da mais-valia praticamente desaparecem ou não se aplicam, o que
Marx desconhecia.
Também é comum falar-se em consciência de classe, quando ela está ciente de
seus reais interesses. Marx falava de “classe em si” para indicar o seu potencial
contestatório. A “classe para si”, quando levada pela consciência do conflito
e da exploração, organiza-se politicamente para a defesa consciente de seus
interesses, o que supõe uma identidade construída para a luta de classe.
Mas essa consciência e luta de classes levaria à abolição das classes sociais na
construção essencial da sociedade comunista:
O que caracteriza o Comunismo não é a abolição da propriedade
privada em geral, mas a abolição da propriedade burguesa. [...]
em lugar da velha sociedade burguesa, com suas classes e
seus antagonismos de classe, surge uma associação na qual
o livre desenvolvimento de cada um é a condição para o livre
desenvolvimento de todos. (MAR X; ENGELS 1985, p. 64).
Chegando ao fim a divisão da sociedade em classes, o Estado, enquanto
estrutura política, também teria que ser destruído. No entender de Marx, o Estado
era um instrumento da luta de classes, logo não faria sentido em uma sociedade
20
Capítulo 1
sem classes. Como ele entendia que o proletariado precisava do Estado para
derrubar a burguesia, ele afirmava que era necessário um momento de transição
entre o Capitalismo e o Comunismo, e chamou isso de Socialismo. A transição
seria implantada por meio da ditadura do proletariado.
Lênin (apud HARNECKER, 1972, p. 145) dizia que:
A essência fundamental da ditadura do proletariado residia
na organização e disciplina do destacamento avançado dos
trabalhadores, de sua vanguarda, de seu único dirigente: o
proletariado. Seu objetivo é construir o Socialismo, suprimir a
divisão da sociedade em classes, converter a todos os membros
da sociedade em trabalhadores, destruir a base sobre a qual
descansa a exploração do homem pelo homem. [...] exige um
período bastante longo de transição do Capitalismo para o
Socialismo, porque é difícil reorganizar a produção, como se
necessita de tempo para introduzir mudanças radicais em todos
os domínios da vida e porque a enorme força da tradição de um
modo burguês de dirigir a economia somente pode ser superada
numa luta vasta e tenaz.
Por isso, Marx falou de todo um período de ditadura do proletariado como
período de transição.
Assim, era preciso que a classe operária se tornasse revolucionária, primeiro
tomando consciência de seus interesses de classe e percebendo as
condições objetivas de construção do Socialismo para, numa continuidade de
aprimoramento deste modelo, chegar ao Comunismo como uma sociedade
perfeita, sem propriedade privada, sem classe e sem o Estado.
1.3 Weber e a sociedade
Diferentemente de Marx e Durkheim, Weber apontou que, para compreendermos
a sociedade, precisamos centrar a análise no sujeito, pois é a partir da ação
individual que se dará a constituição da sociedade.
Weber não apresentou uma teoria geral sobre a sociedade, estando mais
preocupado em discutir situações sociais concretas. Dese modo, esse pensador
partiu da ideia de que o indivíduo é o elemento primordial para compreender a
realidade social. E essa análise passava pelo comportamento dos indivíduos,
já que tudo que existe na sociedade é resultado da vontade e da ação dos
indivíduos. É em suas condutas individuais que o agente associa um sentido que
é orientado pelo comportamento dos outros. Leia as palavras do próprio autor:
Estudos Socioculturais
21
Falaremos de ação na medida em que o indivíduo atuante atribua
um significado subjetivo ao seu comportamento– seja ele claro
ou disfarçado, omissão ou aquiescência. A ação é “social” na
medida em que o seu significado subjetivo leva em conta o
comportamento dos outros e é por ele orientado em seu curso.
(WEBER, 1994, p. 4).
A ação social está, deste modo, profundamente ligada ao
conceito de relação social. A expressão ‘ação social’ será usada
para indicar o comportamento de uma pluralidade de atores na
medida em que, em seu conteúdo significativo, a ação de cada
um deles leva em conta a ação de outros, e é orientada nesses
termos. (IDEM, p. 26).
Weber deu ênfase à relação na qual a atribuição de sentido é uma ação
necessária e até mesmo fundadora do intercâmbio social. É por isso que ele
afirmava ser a Sociologia uma ciência voltada para a compreensão interpretativa
da ação social e para a explicação causal no seu transcurso e nos seus efeitos.
É o sentido que os homens estabelecem em suas ações que, segundo Weber,
fundamenta a ordem social. Assim, o homem passa a ter, na teoria de Weber,
como indivíduo, um significado e uma especificidade que não encontramos no
positivismo. Não existe nesse autor a mesma oposição presente em Durkheim
entre sociedade e indivíduo. Em Weber, as normas sociais só se tornam concretas
quando se manifestam nos indivíduos sob a forma de uma motivação. Cada
indivíduo é levado a agir por um motivo que é dado pela tradição, por interesses
racionais ou pela emotividade.
Weber deixou dito que, por mais individual que seja a ação, o fato de o
indivíduo agir segundo a expectativa do outro faz com que a sua ação
tenha um caráter coletivo e social. É o que ele denominou ação social.
Quando esse sentido da ação social é compartilhado, temos a relação social.
Isso é diferente da ação individual e, para que se estabeleça uma relação social, é
preciso que haja um sentido compartilhado.
A ação social é a conduta do agente que está orientada pela conduta do outro,
pela expectativa que você possui sobre o que o outro espera que você faça. Na
relação social, a conduta de cada qual entre múltiplos agentes envolvidos orienta-
se por um conteúdo de sentido reciprocamente compartilhado.
Ainda é preciso considerar que essa relação orienta-se pelas ações dos outros,
que podem ser passadas, presentes ou esperadas como futuras (vingança por
ataques anteriores, réplica a ataques presentes, medidas de defesa diante de
22
Capítulo 1
ataques futuros). Porém, nem toda espécie de ação, incluindo a ação externa, é
social. A conduta humana é ação social somente quando ela está orientada pelas
ações dos outros. Por exemplo: um choque de dois ciclistas é um simples evento
como um fenômeno natural. Por outro lado, haveria ação social na tentativa dos
ciclistas se desviarem, ou na briga ou considerações amistosas subsequentes ao
choque.
Os tipos de ação
Devido à infinidade das ações humanas, Weber construiu uma teoria dos tipos de
ação para apontar quais seriam os motivos básicos da ação social. Entre os tipos
de ação social temos, segundo Weber, os seguintes:
•• Ação racional referente a fins: é a ação determinada por
expectativas quanto ao comportamento de objetos do mundo
exterior e de outras pessoas. Essas expectativas funcionam
como “condições” ou como “meios” para alcançar fins próprios,
ponderados e perseguidos racionalmente como sucesso.
Nesse tipo de ação, o homem coloca determinados objetivos e
busca os meios mais adequados para consegui-los. O importante
é perceber que o motivo da ação é alcançar sempre um resultado
eficiente. É uma ação instrumental voltada para um fim utilitário. A
empresa capitalista e o estrategista militar funcionam nessa lógica.
•• Ação racional referente a valores: é determinada pela crença
consciente no valor: ético, estético, religioso ou qualquer outro que
seja absoluto e inerente à ação e independe do seu resultado. O
motivo da ação, nesse caso, não é um resultado, mas um valor,
independentemente se o resultado for positivo ou negativo. O
capitão que afunda junto com o seu navio é um exemplo, pois age
racionalmente baseado num valor.
•• Ação social afetiva: é a ação determinada de modo afetivo, guiada
por paixões, por afetos ou estados emocionais. Uma resposta
intempestiva está incluída nesse grupo.
No centro de relações sociais moldadas pelas lutas, Weber percebeu o fato da
dominação. Na verdade, entre os conceitos mais usados da teoria weberiana
estão os conceitos de poder e dominação. De acordo com o autor, poder é a
capacidade de impor a própria vontade dentro de uma relação social. Porém,
poder é diferente de dominação, o qual significa probabilidade de encontrar uma
pessoa pronta a obedecer a uma ordem de conteúdo determinado. A dominação
pode ser entendida como uma relação social.
Estudos Socioculturais
23
Assim, para Weber, o importante é analisar o que torna legítima a autoridade, pois
é com a legitimidade social que a dominação é justificada e efetivada.
Weber distinguiu três tipos de dominação e legitimidade, que são:
•• Dominação legal racional: a obediência apoia-se na crença, na
legalidade da lei e dos direitos de mando das pessoas autorizadas
a comandar pela lei. Assenta-se no poder de um direito abstrato
e impessoal. Assim, esse poder está ligado à função e não à
pessoa. São exemplos desse tipo de dominação o código civil e o
regimento interno de uma empresa.
•• Dominação tradicional: sua legitimidade apoia-se na crença
de que o poder de mando tem um caráter sagrado, herdado dos
tempos antigos. O poder patriarcal dentro da família é um exemplo.
•• Dominação carismática: o chefe carismático tem origem numa
personalidade excepcional. A legitimidade da autoridade do líder
carismático lhe é conferida pelo afeto e confiança que os indivíduos
depositam nele. Profetas, fundadores de impérios, guias espirituais
são exemplos de líderes carismáticos.
Seção 2
Pensamento contemporâneo
Na seção anterior, discutimos três diferentes perspectivas da análise da relação
entre indivíduo e sociedade. Emile Durkheim apontou para a coerção que a
sociedade exerce sobre os indivíduos. Para Karl Marx, a discussão maior se
colocou sobre a inserção dos indivíduos em suas classes sociais. E Max Weber
discutiu as ações individuais como constituintes da sociedade. Mesmo olhando a
sociedade e os indivíduos por diferentes perspectivas, todos os autores clássicos
da sociologia procuraram explicar como se dá a constituição da sociedade.
Contemporaneamente, vários outros sociólogos vêm discutindo essa interessante
relação entre indivíduos e sociedade. A ênfase mais contemporânea é tentar
superar a dicotomia entre indivíduo e sociedade, ou seja, mostrar que não são as
ações individuais que determinam a sociedade e nem a sociedade que determina
a ação social, mas que há uma relação entre sociedade e indivíduo, que
nessa relação há uma constante transformação tanto da sociedade como dos
indivíduos. Dessa forma, os indivíduos modificam a sociedade ao mesmo tempo
em que são modificados por ela.
24
Capítulo 1
Um dos sociólogos que discute essa relação é o francês Pierre Bourdieu (1983),
que desenvolveu o conceito de habitus. Segundo esse autor, habitus significa:
[...] um sistema de disposições duráveis e transponíveis que,
integrando todas as experiências passadas, funciona a cada
momento como uma matriz de percepções, de apreciações e
de ações – e torna possível a realização de tarefas infinitamente
diferenciadas, graças às transferências analógicas de esquemas
[...]. (BOURDIEU, 1983, p. 65, grifo nosso).
A questão central de Bourdieu é mostrar a articulação entre como os indivíduos
vivem e suas condições de existência e percepções dentro e fora de grupos
sociais. Assim, o conceito de habitus relaciona-se com as práticas cotidianas
com as formas de organização social dos indivíduos, com sua vida concreta
como indivíduo, e com suas condições predeterminadas pela sociedade, como
sua condição de classe. Assim, ele explica que as condições objetivas e pré-
determinadas pela sociedade fundem-se com as condições subjetivas. A
superação da oposição entre indivíduo e sociedade na obra de Bourdieu é, assim,
proporcionada por meio do conceito de habitus:
[...] o todo social não se opõe ao indivíduo. Ele está presente em
cada um de nós, sob a forma do habitus, que se implanta e se
impõe a cada um de nós através da educação, da linguagem...
Tudo o que somos é produto de incorporação da totalidade.
(BOURDIEU, 2002, p. 33).
O conceito de habitus concilia o que outros sociólogos colocaram como
oposição: a relação ente realidade exterior e as realidades individuais. O
sociólogo explica que habitus é um sistema de esquemas individuais, socialmente
constituído de disposições estruturadas (no social) e estruturantes (nas mentes).
Tais disposições e experiências são adquiridas pelas experiências práticas, em
condições sociais que são definidas pela existência. O habitus é estruturado
através das instituições que atuam na socialização do ator social (a família, a
escola, são exemplos de instituições sociais).
É importante destacarmos que o habitus não é algo estático ou imutável, mas
apresenta uma perspectiva histórica, uma perspectiva de movimento. Em
consonância com sua visão de sociedade, Bourdieu (2002, p. 178) reafirmou
o caráter histórico desse conceito: “[...] produto da história, o habitus produz
práticas, individuais e coletivas, e portanto história em conformidade com os
esquemas engendrados por essa mesma história”.
Outro sociólogo que fez significativas contribuições para a discussão sobre
o estudo das sociedades foi o inglês Anthony Giddens. O autor desenvolveu
Estudos Socioculturais
25
a teoria da estruturação, procurando resolver a dicotomia entre indivíduo e
sociedade. (GIDDENS, 1989).
Como já foi discutido anteriormente, alguns autores destacam a importância dos
atores e do sentido ao qual tais atores atribuem as suas ações. Por outro lado, há
autores que mostram que a estrutura social sobrepõe-se ao indivíduo. Giddens
procurou superar as teorias deterministas, que reduzem a ação individual à
coerção da sociedade, sendo esta considerada autônoma e coercitiva. Dessa
forma, o autor levou a um entendimento de reprodução social como mecânica,
entendendo o ator como totalmente livre dos condicionantes sociais. Giddens,
portanto, entendeu que tal antagonismo pode ser superado com a proposta
teórica que articula estrutura e ação. Nas palavras do autor:
Cada investigação realizada nas ciências sociais ou na história
está envolvida em relacionar a ação à estrutura, em traçar,
explicitamente ou não, a conjunção ou as disjunções de
consequências premeditadas ou impremeditadas da atividade, e
em verificar como elas afetam o destino de indivíduos. Nenhum
malabarismo com conceitos abstratos poderá substituir o estudo
direto de tais problemas nos contextos reais de interação. Pois
as permutas de influências são intermináveis, e não há um (único)
sentido em que a estrutura ‘determine’ a ação ou vice -versa. A
natureza das coerções a que os indivíduos estão sujeitos, os
usos que eles dão às capacidades que possuem e as formas de
cognoscitividade que revelam são todos eles manifestamente
variáveis do ponto de vista histórico. (GIDDENS, 1989, p. 178-179).
Na Teoria da Estruturação, proposta por Giddens em seu livro “A Constituição
da Sociedade” ( publicado originalmente no ano de 1986), ele procurou mostrar
que a relação entre indivíduo e sociedade é dinâmica. Para o autor, a sociedade
(estrutura) e o indivíduo (ator social) estão em constante processo de mudança
mútua. Entende-se “estrutura” como um coletivo de regras e recursos que se
constituem na reprodução social. “As estruturas são conjuntos de regras que
ajudam a constituir e regular as atividades, definido-as como de uma certa espécie
e sujeitas a uma determinada gama de sanções”. (GIDDENS, 1984, p. 102).
É importante destacar que, para o autor, as regras que regulam as atividades
não podem ser assumidas como apenas restritivas, ou coercitivas. “A estrutura
não deve ser equiparada à restrição, à coerção, mas é sempre, simultaneamente,
restritiva e facilitadora”. (GIDDENS, 1984, p. 30). Nessa concepção, não há
indivíduos independentes da estrutura social, bem como não existe estrutura
dada, prévia à ação dos indivíduos. Assim, para entendermos os processos
sociais, temos de compreender a ação individual e a relação de tal ação com as
estruturas sociais. As estruturas são significadas por meio da ação individual e a
ação efetiva-se estruturalmente.
26
Capítulo 1
Assim, de acordo com a teoria da estruturação, as ações dos indivíduos são
entendidas como dotadas de consciência e intencionalidade. Mas isso não
significa que os indivíduos podem prever seus atos, pois, para Giddens, uma
das principais características da modernidade é a imprevisibilidade. Já que não
há leis gerais que governam o processo histórico, não é possível prever o que
acontecerá no futuro, apesar de a vida social possuir regularidades.
Giddens enfatizou que todos os indivíduos desempenham agência, ou seja, agem
na sociedade como atores sociais. Dessa forma, o agente é entendido como um
ser que age de forma intencional e que monitora a sua ação de modo reflexivo,
isto é, que pode mudar tal forma de ação a partir de informações renovadas. Nas
palavras do autor: “Tal como a utilizo aqui, a ideia de ‘ação’ ou de agência, não
se refere a uma série de atos discretos combinados entre si, mas a um fluxo
contínuo da conduta.” (1989, p. 14). A ação do agente não pode ser estudada
separadamente de modo mais amplo, isso porque agência é um processo
dinâmico, que resulta da ação reflexiva dos atores sociais.
As teorias de Bourdieu e de Giddens foram desenvolvidas no intuito de superar a
oposição entre objetivismo e subjetivismo, ou ação e estrutura. E ambas analisam
a ação social como um processo em constante mudança, em que há o peso da
sociedade, mas há também capacidade de os indivíduos constituírem sua história.
27
Habilidades
Secões de estudo
Capítulo 2
Estado, cidadania, ética e
direitos humanos
Para conhecer a gênese do Estado como
organização política, o estudante precisa identificar,
no significado lógico das categorias políticas,
as diferenças e semelhanças nas formas de
cada povo conceber a sua origem e significar a
organização social e a forma de governo. Ainda,
precisa compreender que a política é um processo
mais amplo e anterior ao Estado e, a partir daí,
contextualizar e relacionar o surgimento do Estado
constitucional moderno com os fatos políticos e as
ideologias que marcaram as mudanças ao longo da
história, refletindo criticamente sobre as diferenças
e contrastes nas formas de institucionalização e
legitimação do poder no mundo contemporâneo.
Considerando o contexto político, ético e humano,
este capítulo remete o estudante para analisar e
compreender contextos, refletindo criticamente,
administrando conflitos e projetando ações de
intervenção.
Seção 1:  Estado como organização política
Seção 2:  Cidadania como conquista de direitos
Seção 3:  Ética e o agir valorativo
Seção 4:  Direitos humanos como prática social
28
Capítulo 2
Seção 1
Estado como organização política
Maria Terezinha da Silva do Sacramento
A história humana tem sido rica de idéias relacionadas com a
estrutura física, a geografia, o espaço cósmico e o significado
espiritual e /ou secular do mundo: movimentos e organizações
preocupados com a padronização e /ou a unificação do mundo
como um todo volta e meia têm surgido, pelo menos nesses
dois últimos milênios, idéias em torno do relacionamento entre
o universal e o particular tem sido fundamental para todas as
civilizações. (ROBERTSON, 1994, p. 29)
Nesta seção convidamos você para uma incursão na história da organização
política. Não se pretende oferecer um panorama completo dos tipos de
organização política, mas apresentar um quadro esquemático do processo
evolutivo das antigas civilizações que influíram no pensamento político nos dias
de hoje. A história das formas originárias da política no Ocidente é apresentada
de forma a possibilitar uma compreensão dos pressupostos conceituais que
alimentaram ao longo da história, as ideias políticas em torno da democracia,
direito, igualdade, liberdade, Estado, limitação do poder e representação.
Nosso propósito é estimular a reflexão e para isso oferecemos uma abordagem
histórico-conceitual de forma que você, compreendendo o sentido estrutural que
os conceitos assumem no processo de organização da política no Ocidente,
tenha condições de refletir sobre a dinâmica da política no cenário global.
O elemento que não pode faltar nesta reflexão é a gênese
da distinção moderna entre sociedade civil e Estado e os
conceitos que emergem das teorias do contrato social e
dos ideais libertários em favor do laicismo, na construção
jurídica do político que configura como ciência da
legitimação do poder.
A origem da palavra Estado é muito pouco precisa. Os
gregos empregaram a palavra Estado com o mesmo
sentido que denominaram a cidade. A palavra pólis,
portanto, foi a forma originária com que os gregos
definiram a atividade política.
Laicismo é um termo
originário da palavra
laico, que significa
próprio do mundo, do
século, secular por
oposição a eclesiástico.
Doutrina que proclama
a laicidade absoluta
das instituições
sociopolíticas e da
cultura ou que pelo
menos reclama, para
estas, autonomia em
face da religião.
Estudos Socioculturais
29
O Estado como uma organização política assumiu sentidos diferentes em cada
povo, em cada cultura. Para alcançar o grau complexo da organização política
que conhecemos como civilização, o homem superou fronteiras, domesticou
animais e espécies, revolucionou o conhecimento e superou os obstáculos da
natureza. Esse processo de evolução mantém variações significativas.
É impossível falar das diversas formas de organização política sem fazer
referência às formas de governo encontradas na antiguidade oriental, como
a civilização egípcia e mesopotâmica. Os Estados da África meridional, as
civilizações da América pré-espânica são alguns dos exemplos que evidenciam a
complexidade da organização política.
Alguns historiadores fazem restrições ao uso da palavra Estado da forma como foi
cunhada no Ocidente. Naturalmente não se pode esperar que o sistema político
dos astecas ou dos egípcios encontre correspondência com a organização
política dos sistemas feudais da Europa Ocidental.
A concepção clássica usada por Aristóteles preserva a mesma natureza
sociológica e política da relação particular entre o povo e o governo ou entre o
povo e o centro do poder.
Jellinek (2002), em sua obra Teoría general del Estado, apresenta duas formas
de investigação científica do Estado: O Estado como realidade física e subjetiva.
Na primeira, o Estado é apresentado como fenômeno social em seu aspecto
histórico e político; na segunda, como um ente jurídico.
De qualquer forma, o autor reconhece que essa ordem não designa nenhuma
forma de homogeneidade na identificação dos Estados com seus elementos.
Essa forma varia de acordo com a história e com o significado que cada povo
atribuiu ao Estado. Isso inclui a história, os seus valores, as lutas e conquistas.
1.1 A polis e a organização política na Grécia
Os gregos conceberam o Estado como uma organização político social, a partir
da identidade comum do povo grego com a civilização helênica. Não havia,
segundo os estudiosos da política até aquele momento, relação direta do Estado
com o espaço territorial.
Até o fim do século IX, a.C. aproximadamente – época de Homero, que
corresponde à cultura clássica grega e que alguns historiadores chamam
de idade média grega – , as instituições políticas da Grécia eram baseadas
numa monarquia patriarcal. A estrutura política e jurídica de cada cidade era
constituída de um rei, um Conselho de anciãos e, em casos de guerra ou outros
assuntos considerados importantes, todos os cidadãos eram convocados e uma
assembleia era formada para decidir a vida da cidade.
30
Capítulo 2
O período entre os séculos VI e IV a.C sofreu profundas mudanças. Além das
conquistas territoriais e da influência que a Grécia passou a exercer sobre o
conjunto do mediterrâneo, outras inovações surgiram, como a ascensão das
cidades (pólis) como referência à vida comum e verdadeiro sentido da vida
política e o florescimento da filosofia.
Uma nova forma de conceber a vida e a realidade social pelo pensamento
abstrato desenvolveu-se emancipada das crenças religiosas. O laicismo começa,
portanto, pelos gregos.
O desaparecimento gradual da monarquia deu lugar a uma nova concepção
de poder na Grécia. Isso significa dizer que a autoridade do senhor – que se
baseava na noção de arché, cujo princípio do comando estava centrado na
figura do patriarca onipotente que exercia o poder e autoridade sobre as diversas
esferas da vida social – foi gradualmente substituída por uma nova concepção de
poder desvinculado do homem que o exerce. Uma protoburocracia determinava
a impessoalidade das funções e cargos públicos e definia as responsabilidades
civis dos cidadãos no exercício das funções públicas.
É importante notar, entretanto, que, apesar do laicismo, as divindades e
os ritos continuavam sendo cultuados pelos gregos, mas colocados sob a
responsabilidade da pólis. Assim, numa interpretação da cultura política grega
(MORRALL, 2000), os gregos politizaram os seus deuses. Por exemplo: a
veneração das divindades olímpicas, os rituais e o sacerdócio foram assimilados
pelo espírito do homem cívico, instalando assim uma religião oficial que se
distinguia da administração dos assuntos públicos. As festas e as cerimônias
eram controladas pela comunidade inteira.
1.2 Da Civitas romana ao Estado como organização política
Alguns estudiosos da política e historiadores veem semelhança entre a
organização política das cidades romanas com as cidades-estado gregas.
Os romanos usavam o mesmo significado para a civitas – a comunidade de
cidadãos – e para a res-pública – espaço público ou coisa pública.
A organização política romana esteve presente entre as cidades italianas mais
antigas. Nelas, o governo era composto por um rei e pelo senado. E, em tempos
ainda mais remotos, era composto pelos chefes das antigas tribos ou gentes
patrícias. Os comícios eram formados pelas assembleias do povo.
A história da antiguidade romana é dividida em vários períodos: o primeiro
foi marcado pelo desaparecimento do modelo grego de cidades, e o
Estudos Socioculturais
31
restabelecimento das monarquias. Os reis, nessa época, eram venerados como
entidades sagradas, e mais tarde continuavam exercendo autoridade e fonte de
leis.
A República Romana a partir do século III correspondeu ao tempo da expansão
romana, segundo período da Antiguidade, tendo sido marcada pelas primeiras
conquistas territoriais. Em dois séculos, Roma assumiu o controle do conjunto do
mediterrâneo, das regiões Ibéricas (Espanha) até a Mesopotâmia (oriente Médio),
passando pela África do Norte, pela Macedônia, Ilhas gregas e entrando, por fim,
na Ásia Menor. O sistema republicano adotado nesse período visava impedir o
poder tirânico sobre as terras conquistadas.
As distâncias entre as cidades começaram a representar o maior obstáculo às
reuniões dos Comícios do Fórum. Observam Mosca e Bouthoul (1987, p. 61) que
essas reuniões ficaram restritas aos habitantes das cidades. Além disso, outras
dificuldades começaram a se impor à manutenção dos encargos públicos, como
as longas viagens dos Cônsules às províncias.
As províncias do Império foram divididas em províncias imperiais e senatoriais.
Algumas eram administradas pelo imperador, que nomeava seus funcionários;
outras eram administradas por funcionários nomeados pelo senado.
Na interpretação de Jellinek, (2002), a complexidade do Império romano deve
ser entendida enquanto países aliados e dependentes da grande cidade. A
capacidade plena do direito de cidadania somente era concedida àqueles
admitidos para formar a comunidade de cidadãos. Pertencer à civis romanus era
uma condição daquele cidadão da cidade de Roma, ainda que o Estado romano
ocupasse a maior extensão territorial da antiguidade.
A palavra Stato até então desconhecida começou a ser empregada para
demarcar a posição política de algumas cidades como Florença, Veneza, Gênova ,
Pisa, entre outras.
foi aí que começou também a referência à cidade como espaço territorial unido
aos cidadãos como um corpo politicamente organizado. Para alguns teóricos da
política, como Burckhardt, (apud JELLINEK, 2002,p. 155), o que designaria a
expressão stato, até então, seria o governo e sua corte. Mas não há consenso a
esse respeito.
No conjunto, o maior legado romano para a cultura política dos nossos tempos
foi ter definido o vínculo entre cidadão e Estado e a própria comunidade
enquanto unidade politicamente organizada, pelo direito.
32
Capítulo 2
1.3 O Estado na Idade Média
Marcar o início da Idade Média não tem sido uma tarefa fácil. Mesmo assim o
início tem sido dado pelo ano de 395 estendendo-se até o século V, depois do
nascimento de Cristo.
A Idade Média foi marcada pela ruptura com a tradição política greco-romana,
pelas tentativas carolíngias de restauração do Império, pelo feudalismo e pelo
cristianismo. Durante três séculos o Ocidente viveu uma sequência de mudanças
na economia, na política e de mentalidade. Nesse cenário, predominaram os
regimes monárquicos e o senso individualista interpretado pelos filósofos da
Igreja, segundo a fé cristã.
Nessa fase de expansão do cristianismo no Ocidente, a política perdeu a sua
autonomia e só ganhou sentido na religião. O poder temporal entrou em disputa
com o poder de Deus, interpretado pela filosofia patrística – que, na visão de
Santo Agostinho, tinha suas raízes no mito do pecado original – e assim constrói
os fundamentos de uma sociedade regida pelos princípios do cristianismo,
segundo o qual o poder político era um mistério de Deus.
Ao estabelecer uma fronteira entre a ordem divina e a ordem terrena, a doutrina
cristã pretendia uma universalidade. Assim, os papas tornaram-se tão poderosos
que já não se contentavam com a direção espiritual do cristianismo. À frente
da única organização que pretensamente possuía prerrogativas universalistas,
conquistavam as classes feudais locais e assim dominavam os poderes seculares
que, na pretensão de buscar aliados para a legitimação do poder, acabaram
unindo o poder político ao religioso.
A unificação de Carlos Magno (768-814), rei dos francos, restaurou a ideia do
poder com base nos ideais imperialistas agora aliados à Igreja. Com esse projeto
formado por duas cabeças – o imperador e o papa – , Carlos Magno lançou as
bases ideológicas para a constituição de uma república cristã.
O enfraquecimento das instituições públicas, causado pela pretensão
universalista do pensamento político da Idade Média, produziiu a fragmentação
política do século X. Nesse contexto, os reis já não conseguiam ter pleno controle
sobre seus territórios. A consequência foi o enfraquecimento do direito de
patrimonialização do poder.
O feudalismo fez desaparecer o legado das instituições políticas e jurídica e o
poder político foi deslocado da prerrogativa do direito de cidadania – uma das
mais importantes conquistas da civilização greco-romana – para as mãos dos
proprietários da terra que podiam financiar as milícias e as guerras, assegurando
com isso a posse de cargos administrativo e religiosos.
Estudos Socioculturais
33
A estamentalização do poder político da Idade Média, longe de caracterizar a
unificação do sistema político, caracterizou uma sociedade hierarquizada em
ordens e controlada pela classe de proprietários. Weber (1991, p.203) observa
que o desenvolvimentos dos estamentos – uma sociedade de classe de
proprietários – foi, em regra, uma forma de apropriação hereditária de privilégios
e de poder monopolista de mando pela oportunidade de aquisição.
O Renascimento marcou um processo de mudanças, com a redução do prestígio
e do controle da Igreja sobre o saber. A importância do mecenato definiu-se nos
séculos XV e XVI como o divisor de águas entre o prestígio da Igreja, no comando
da justiça e do saber, e a ascensão dos artistas e escritores que, sob a proteção
dos príncipes, difundiam uma nova mentalidade em que o homem era estimulado
a tomar parte na organização da vida pública. Maquiavel e Giucciardini tornaram-
se célebres protagonistas dessa nova ordem social e política.(CHEVALLIER, 2001).
1.4 O Estado na Modernidade
A organização política da Idade moderna, que começou no século XVI, foi um
movimento que marcou a transição das ideias políticas da Idade Média, um
processo que o Renascimento já se encarregaria de romper para dar início a uma
nova forma de organização política inspirada na razão política e jurídica.
O fundamento do Estado constitucional desenvolveu-se, no pensamento
político entre os séculos XVII e XVIII, como uma oposição ao Estado absolutista
e ao modelo pluralista que caracterizou, já no fim da Idade Média, o Estado
estamental.
Nicolau Maquiavel foi o primeiro pensador do final do Renascimento a defender a
fundação do Estado sobre o poder absoluto do príncipe, ou seja, um princiopado
civil. Mas as premissas do maquiavelismo fundam-se na razão do Estado, ou seja,
na autonomia política do Estado. Nessa nova mentalidade política, a ação do
príncipe não poderia apoiar-se em motivações de ordem moral ou religiosa.
O filósofo inglês Thomas Hobbes, no mesmo sentido absolutista, defendeu uma
compreensão do homem como vivendo em constante conflito no seu estado de
natureza, conflito cuja solução defendida por Hobbes estaria na ideia do contrato
social. O fundamento do poder estatal hobbesiano está na unificação do corpo
político e na concepção do contrato de renúncia. Com essa ideia, Hobbes resolve
dois problemas: a legitimidade do poder e a unificação das diversas fontes de
ordenamento em uma única fonte de poder político e jurídico. A doutrina de
Hobbes constitui o mais importante fundamento do monismo. De acordo com
essa doutrina, o Estado é o detentor absoluto da lei e da força.
34
Capítulo 2
O contrato social é uma teoria, que representa o pensamento político do
iluminismo, conhecida também por contratualismo. Essa teoria explica a origem
da sociedade e o fundamento do Estado num contrato. Vejamos como é definido
o contratualismo:
O contratualismo compreende todas aquelas teorias políticas
que veem a origem da sociedade e o fundamento do poder
político, num contrato, isto é, num acordo tácito ou expresso
entre a maioria dos indivíduos, acordo que assinalaria o fim do
estado natural e o início do Estado social e político. (BOBBIO,
2004, p. 272).
Hobbes não foi o único a propor a ideia do contrato social como solução dos
problemas políticos e sociais da época. O inglês John Locke, diferentemente
de Hobbes que defendeu a soberania absoluta do Estado, limitou o poder do
governo pelo direito de resistência dos cidadãos em caso de quebra de contrato.
Considerado o pai do liberalismo, Locke defendeu a liberdade, a tolerância, e
o direito do povo eleger seus representantes. O poder legislativo tem um papel
preponderante na concepção política de Locke.
Já o francês Jean Jacques Rousseau defendeu a vontade do povo como
soberana. Recusou a ideia de que a liberdade pudesse ser representada.
Defensor da igualdade social, condenou a propriedade privada defendida por
Locke como um direito natural .
Outra importante doutrina que vigora até os dias de hoje é a separação dos
poderes de Montesquieu. Sua aversão ao despotismo inspirou a doutrina da
separação dos poderes apoiada na premissa de que o poder freia o poder, isto
é, a liberdade política só existe segundo leis e no governo em que o poder
seja moderado pela distribuição das forças, afirmando a equipotência e a
independência entre os poderes Legislativo, Executivo e Judiciário.
A teoria da separação dos poderes de Montesquieu representa uma das
instituições mais importantes nas democracias modernas. Inspirou a constituição
republicana dos Estados Unidos e do Brasil, a declaração Universal dos Direitos
Humanos do Homem e do Cidadão e continua inspirando os cidadãos e homens
públicos na defesa contra o abuso do poder político.
Nesta seção procuramos mapear alguns dos temas importantes que
determinaram o destino político dos povos ocidentais. Mostramos que
a concepção clássica de política usada pelos gregos e romanos foram
incorporadas ao longo da história. Mas, ao mesmo tempo, pretendemos mostrar
que a política não é um conceito unitário, tampouco segue a mesma natureza
sociológica e política em todos os tempos e em todos os lugares.
Estudos Socioculturais
35
Na Idade Média, uma ruptura decisiva na concepção de política desloca a
centralidade do pensamento político do demos, ou seja, povo – é importante
lembrar que os gregos não pensavam numa democracia representativa. O
governo só poderia ser exercido pelo povo (demos) porque é parte da polis – ,
para a ideia de um Deus único, criador e senhor das leis. A concepção de
comunidade desprende-se da tradição greco-romana para se filiar à concepção
de homem como uma criatura que tem com seu criador uma dívida originária do
pecado que se funda não em um projeto ético-político, muito menos sobre uma
concepção jurídica, mas sobre uma aliança religiosa. Sua pretensão universalista
coincide com as pretensões imperialistas de Roma, mas com o curso da história
abre caminho para o fortalecimento da instituição eclesiástica.
O Renascimento culmina com o enfraquecimento da Igreja. As dificuldades
políticas criadas pelos conflitos religiosos somam-se ao conjunto de
transformações das sociedades europeias.
O fim de uma ordem política culminando com a decadência das monarquias
absolutistas engendra uma nova mentalidade política, que coloca no centro das
preocupações o fundamento do Estado constitucional como oposição ao poder
soberano dos governantes. A razão do Estado sucumbe às formas tradicionais de
pensar as relações entre sociedade e governo. O Estado emerge como fonte de
ordenamento não mais apoiado nas crenças religiosas, mas numa ordem jurídico-
positiva.
Seção 2
Cidadania como conquista de direitos
Cláudio Damaceno Paz
A vida em sociedade constitui um imperativo, pois as interações entre os
humanos e com o meio em que estão inseridos não são escolha, mas necessárias
para a potencialização das suas capacidades. Porém, pela divergência de
interesses, essas relações tendem a se tornar conflituosas. Em decorrência,
para viabilizar suas existências, os humanos têm desenvolvido mecanismos que
viabilizem a resolução de conflitos. Diversos são os meios criados e utilizados
para disciplinar as condutas na busca da harmonia social. Dentre eles podemos
destacar o Direito.
36
Capítulo 2
É o Direito que deve garantir os interesses de cada um e impedir que uns sejam
prejudicados pelos outros. A pessoa que tem um direito violado está sofrendo
uma perda de alguma espécie. E quando uma pessoa que teve um direito
ofendido não reage, isso pode encorajar a ofensa de outros direitos seus, pois
sua passividade leva à conclusão de que ela não pode ou não quer defender-se.
(DALLARI, 1985).
A caminho do trabalho, no dia 1º de dezembro de 1955, uma costureira
negra de 42 anos, Rosa Parks (1913-2005), moradora de Montgomery,
capital do Alabama, nos EUA, tomou um ônibus, sentou-se numa poltrona
situada ao meio para frente do veículo de transporte coletivo. Minutos
depois, o motorista exigiu que ela e outros três trabalhadores negros
cedessem seus lugares para passageiros brancos que embarcaram no
ponto seguinte. Rosa Parks negou-se a cumprir a ordem do motorista. Foi,
então, retirada do ônibus, detida e levada para a prisão. Em decorrência do
seu ato, Rosa Parks enfrentou ameaças de morte, humilhações e teve até
de se mudar de estado por não conseguir arranjar emprego no Alabama.
No entanto, a atitude de resistência pacífica de Rosa Parks deflagrou uma
série de protestos contra a discriminação racial nos EUA. Trabalhadores
negros recusaram-se a embarcar em ônibus enquanto estivesse em vigor,
no estado do Alabama, a lei discriminatória que impunha aos negros
ocuparem os lugares do fundo dos transportes coletivos, enquanto aos
brancos eram reservados os lugares dianteiros. Durante os protestos, era
comum encontrar grupos de trabalhadores negros dirigindo-se a pé para
o trabalho, acenando e cantando nas ruas, enquanto eram xingados pelos
brancos.
O exemplo emblemático de Rosa Parks e os avanços ocorridos nos EUA em
relação aos direitos civis nas décadas subsequentes demonstram que os direitos
nascem das lutas dos seres humanos contra as formas de opressão. No entanto,
são conquistas gradativas que se configuram no processo histórico.
Os direitos do homem, por mais fundamentais que sejam, são
direitos históricos, ou seja, nascidos em certas circunstâncias,
caracterizados por lutas em defesa de novas liberdades contra
velhos poderes, e nascidos de modo gradual, não todos de uma
vez e nem de uma vez por todas. (BOBBIO, 1992, p.5).
Estudos Socioculturais
37
Compreender os direitos humanos como conquista
e construção humana ao longo da história afirma o
protagonismo das pessoas na luta pelos direitos a serem
positivados como direitos fundamentais. Ressalta-se que
as expressões “direitos humanos” e “direitos fundamentais”
são frequentemente utilizadas como sinônimos.
Segundo a sua origem e significado poderíamos distingui-
los da seguinte maneira: direitos do homem [humanos]
são direitos válidos para todos os povos e em todos os tempos; [...] os direitos
fundamentais seriam [são] os direitos objetivamente vigentes numa ordem jurídica
concreta. (CANOTILHO, 1998). Partindo do pressuposto de que os direitos
humanos resultam de conquistas que se materializam no processo histórico,
pela ação humana, evidencia-se a importância das Revoluções Liberais (Inglesa,
Americana e Francesa) para a emancipação dos indivíduos e das coletividades no
contexto de construção da modernidade e da criação dos direitos.
No processo da Revolução Inglesa, em 1689, o Parlamento inglês apresentou
à monarquia uma declaração de direitos (Bill of Rights), que assegurava aos
indivíduos os direitos de liberdade, de segurança e de propriedade, como
garantia frente ao poder soberano – e arbitrário – do Estado absolutista.
A Bill of Rights impunha limites ao poder real ao deslocar para o Parlamento as
competências de legislar e criar tributos. Ao mesmo tempo, instituía a separação
de poderes para evitar o autoritarismo do poder absolutista do monarca. No
entanto, ao consentir em manter a imposição de uma religião oficial, a anglicana, –
estabelecida pelo rei Henrique VIII – muitos ingleses, sem a liberdade de professar
e manifestar sua crença religiosa, distinta da oficial, viram-se constrangidos a
migrar para terras distantes, temerosos de perseguições. Para os puritanos
(calvinistas ingleses), a América consistiu em alternativa para viver em liberdade,
conforme suas crenças.
Depois de estabelecidos na “nova Canaã”, como denominavam a América
do Norte, os agora colonos americanos foram constrangidos, em 1765, pelas
imposições fiscais da autoridade metropolitana – que contrariava o estabelecido
na Bill of Rights – a recolher uma série de impostos para cobrir o déficit da Coroa
que havia-se envolvido na Guerra dos Sete Anos (1756-1763) contra a França.
Em 1773, na cidade de Boston, ocorreu a The Boston Tea Party. Colonos que
viviam do comércio, por se sentiram prejudicados com a Lei do Chá, disfarçaram-
se de índios peles-vermelhas, assaltaram os navios da companhia de transporte,
Direito positivado
decorre do ato de
positivar. Positivar,
em Direito, significa
codificar, transformar,
por exemplo, o que
é costume, portanto
legitimado socialmente,
em lei escrita.
38
Capítulo 2
que estavam ancorados no porto de Boston, lançando o carregamento de chá
no mar. A reação inglesa foi imediata e mesmo violenta. Em 1774, os rebelados
criaram um exército comum entre as colônias, demonstrando a fragilidade
das suas relações com a metrópole inglesa, fato que abriu caminho para a
independência.
Em 1776 foi elaborada a Declaração de Direitos do Bom Povo da Virgínia,
afirmando que todos os seres humanos são livres e independentes, possuindo
direitos inatos, tais como a vida, a liberdade, a propriedade, a felicidade e a
segurança, registrando o início do nascimento dos direitos humanos na história.
(COMPARATO, 2003).
A referida Declaração de Direitos, que abriu caminho para a independência dos
EUA ocorrida em 4 de julho de 1776, proclamada na Filadélfia, positivada na
Constituição da República dos Estados Unidos da América em 1787, afirmou
que o governo tem de buscar a felicidade do povo, definiu a separação de
poderes, estabeleceu o direito dos cidadãos à participação política, a liberdade
de imprensa e a livre escolha da religião, conforme a consciência individual. No
entanto, a pátria da liberdade manteve a mácula da escravidão que deixou a
herança da segregação racial.
A prática da escravidão foi abolida nos Estados Unidos da América em
1863, com a Declaração de Emancipação promulgada pelo presidente
Abraham Lincoln, no contexto de uma guerra civil, a Guerra da Secessão.
No entanto, a discriminação racial, mesmo com a abolição, assumiu
na cultura estadunidense um caráter segregacionista que deu origem a
inúmeras ações afirmativas e reações violentas.
Em virtude das manifestações decorrentes do protesto pacífico de Rosa Parks,
em 13 de novembro de 1956, a Suprema Corte aboliu a segregação racial nos
transportes coletivos de Montgomery, tornando também ilegal esta discriminação
racial em todo o território dos EUA. Em 21 de dezembro de 1956, o ativista negro
Martin Luther King e o sacerdote branco Glen Smiley entraram juntos num ônibus
e ocuparam lugares na primeira fila.
Martin Luther King organizou e liderou marchas que reivindicavam para os
negros o direito ao voto, o fim da segregação e das discriminações, bem como a
conquista de outros direitos civis básicos. A maior parte destes direitos foi, mais
tarde, agregada à constituição estadunidense com a aprovação da Lei de Direitos
Civis (1964) e da Lei de Direitos Eleitorais (1965).
Estudos Socioculturais
39
Em 4 de abril de 1968 Martin Luther King foi assassinado em Memphis, no
Tennessee. Em 20 de janeiro de 2009 Barack Obama tomou posse da
presidência dos Estados Unidos como primeiro negro eleito para o
comando executivo do mais influente Estado-nação do mundo.
Neste dia, estamos reunidos porque escolhemos a esperança
acima do medo, a unidade de objetivos acima do conflito e da
discórdia. Neste dia, vimos proclamar o fim dos sentimentos
mesquinhos e das falsas promessas, das recriminações e dos
dogmas desgastados que por tanto tempo estrangularam nossa
política. (OBAMA, 2009).
A sociedade organizada com justiça é aquela em que os encargos e os benefícios
são partilhados entre todos, pois os direitos, para além da sua criação histórica e
positivação jurídica, precisam constituir-se em prática social. A Declaração de
Direitos do Povo da Virgínia (1776) consistiu numa ação pioneira na luta pelos
direitos humanos ao reivindicar direitos políticos e justiça social, porém
apresentava, na época, como referido, caráter seletivo. No entanto, foi a
Declaração dos Direitos do Homem, aprovada pela Assembleia Nacional francesa,
no contexto revolucionário, em 1789, que exerceu grande influência sobre os
movimentos emancipacionistas e libertários na modernidade, pelo seu caráter de
universalidade.
A França quer ser exemplar, não para ensinar, mas porque é a
história dela, é sua mensagem. Exemplar para as liberdades
fundamentais: é a sua luta, é também sua honra. Esta é a razão
pela qual a França vai continuar a realizar todas essas lutas:
para a abolição da pena de morte, pelos direitos das mulheres
à igualdade e dignidade, para a descriminalização universal da
homossexualidade, que não deve ser reconhecida como um
crime, mas, pelo contrário, reconhecida como uma orientação.
[...]. Todos os países membros [da ONU] têm a obrigação de
garantir a segurança de seus cidadãos, e se um país adere a
esta obrigação, então é imperativo que nós, nas Nações Unidas,
facilitemos os meios necessários para fazer essa garantia. Estas
são as questões que a França vai levar e defender nas Nações
Unidas. Digo isso com seriedade. Quando há paralisia e inação,
então a injustiça e a intolerância podem encontrar o seu lugar.
(HOLLANDE, 2012).
OBAMA, Barack.
Discurso de posse
à presidência dos
Estados Unidos
da América, em
20/01/2009.
HOLLANDE,
François. Fragmento
do discurso proferido
pelo presidente da
França na Assembleia
Geral da ONU, em
25/09/2012.
40
Capítulo 2
Os revolucionários franceses de 1789 iniciaram a Declaração de Direitos do
Homem afirmando, no artigo primeiro, que “Os homens nascem e são livres e
iguais em direitos”, e no artigo quarto enfatizam que
A liberdade consiste em poder fazer tudo que não prejudique o
próximo. Assim, o exercício dos direitos naturais de cada homem
não tem por limites senão aqueles que asseguram aos outros
membros da sociedade o gozo dos mesmos direitos. Estes
limites apenas podem ser determinados pela lei.
Outro aspecto relevante da Declaração de Direitos criada pelos franceses está
explicitado no artigo dezesseis, nos seguintes termos: “A sociedade em que não
esteja assegurada a garantia dos direitos nem estabelecida a separação dos
poderes não tem Constituição.” (DALARI, 1985, p. 53-54).
O século XX foi marcado por duas grandes guerras de proporções mundiais. Na
origem destas guerras está o choque entre interesses imperialistas das potências
capitalistas e seus asseclas. A ambição pelo poder e pela riqueza, somada ao
desprezo aos direitos humanos, explicam os horrores gerados pelos referidos
conflitos, materializados em privações das liberdades e das garantias individuais
e sociais, crises de desabastecimento, bombardeios, destruição, terror e mortes
físicas e psicológicas.
O trauma causado pelas referidas guerras impeliu as lideranças mundiais
à criação e consolidação de uma organização (ONU) com o propósito
de: assegurar, por meios pacíficos, a manutenção da paz internacional;
lutar pela defesa dos direitos humanos; estabelecer relações amistosas
entre as nações, com base no princípio de autodeterminação dos povos;
gerar mecanismos de cooperação entre os países na busca de solução
para os problemas internacionais de ordem econômica, social, cultural
e humanitária; e constituir-se em centro de convergência das ações dos
Estados-nação na luta por objetivos comuns.
Para que fosse permanentemente relembrado o valor da pessoa humana e para
estabelecer o mínimo necessário que todos os países e todas as pessoas devem
respeitar, a ONU encarregou um grupo de pessoas muito respeitadas, entre
as quais havia filósofos, juristas, cineastas, políticos, historiadores, de várias
partes do mundo, de redigir uma nova Declaração de Direitos. Esses estudiosos
reunira-se, pediram a opinião de muitas outras pessoas e, afinal, prepararam um
documento que proclama os Direitos Humanos, que em nossa época devem ser
considerados fundamentais. (DALLARI, 1985, p. 51 e 52).
Estudos Socioculturais
41
Os autores da Declaração Universal dos Direitos Humanos, aprovada pela
Assembleia Geral das Nações Unidas, em Paris, no dia 10 de dezembro de 1948,
evitaram redigir uma mera carta de intenções. Nos artigos da referida declaração
foram incluídas exigências que devem ser atendidas para que a dignidade
humana seja respeitada. O artigo terceiro, por exemplo, lembra que “Todo homem
tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal”. Em decorrência, no artigo
quarto está expressamente ordenado que “Ninguém será mantido em escravidão
ou servidão; a escravidão e o tráfico de escravos serão proibidos em todas as
suas formas.”
A Declaração Universal dos Direitos Humanos foi assinada por países do mundo
inteiro, inclusive pelo Brasil, valendo como um compromisso moral desses países.
É necessário que o maior número possível de pessoas conheça a Declaração,
para cobrar de seus governos o respeito ao compromisso assumido. (DALLARI,
1985, p. 52).
A ênfase da referida Declaração está na internacionalização dos direitos humanos,
fixando-o no contexto internacional dos direitos fundamentais, ensejando a
prevalência destes no ordenamento jurídico dos Estados signatários do referido
documento e daqueles que se integram à comunidade das nações unidas como
filiados da ONU.
O Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas, criado em 2006 em
substituição à Comissão das Nações Unidas sobre os Direitos Humanos, criticada
pela tolerância com Estados cujas ações constituíam desrespeito aos direitos
humanos, tem como objetivo combater as violações aos direitos humanos em
todo o mundo.
O Brasil, membro da ONU, signatário da Declaração Universal dos Direitos
Humanos, define na Constituição Federal, promulgada em 1988, os direitos
fundamentais no título II, Dos Direitos e Garantias fundamentais. O capítulo I
dos Direitos Individuais e Coletivos é constituído pelo artigo 5º, com 78 incisos,
alinhados com o referido documento da ONU. No caput deste artigo lê-se: “Todos
são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos
brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida,
à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, [...].”
A dificuldade da concretização dos direitos humanos, dentre outros fatores,
reside na adoção, pelos Estados-nação, de políticas seletivas, dando prioridade a
alguns direitos e postergando a positivação de outros.
42
Capítulo 2
Ressalta-se que os direitos humanos foram sendo positivados de maneira
gradativa. Estudiosos do tema, para fins didáticos, sem desconsiderar o princípio
estrutural de indivisibilidade, apontam para quatro gerações de direitos que foram
sendo criados e incorporados às constituições dos Estados-nação ao longo do
processo histórico-social na modernidade.
Na escala evolutiva dos direitos, legislados ao longo dos séculos XIX e XX, há
quatro gerações sucessivas de direitos fundamentais. Direitos de primeira
geração, os direitos de liberdade foram os primeiros a constar dos instrumentos
normativos constitucionais, a saber: os direitos civis e políticos.
Os direitos de primeira geração, direitos de liberdade, têm por titular o indivíduo.
Os direitos de liberdade fazem ressaltar, na ordem dos valores políticos, a
nítida separação entre a Sociedade e o Estado, e a submissão do segundo à
primeira. Os direitos de segunda geração decorrem dos efeitos provocados
pelas transformações econômicas e sociais gerados pela industrialização e a
urbanização. São os direitos sociais vinculados aos econômicos, bem como os
direitos coletivos e os de coletividades. Nasceram em decorrência das lutas dos
trabalhadores e estão articulados ao princípio da igualdade. A consciência de um
mundo partido entre nações desenvolvidas e subdesenvolvidas deu lugar a que
se buscasse outra dimensão dos direitos fundamentais, aquela que se assenta
sobre a fraternidade. Dotados de altíssimo teor de humanismo e universalidade,
os direitos de terceira geração tendem a cristalizar-se enquanto direitos que
não se destinam especificamente à proteção dos interesses de um indivíduo, de
um grupo ou determinada sociedade, pois seu destinatário primeiro é o gênero
humano e sua existencialidade concreta. Emergiram da reflexão sobre temas
referentes à autodeterminação dos povos, incluindo o direito ao desenvolvimento,
à paz, à dignidade humana, o combate às diferentes formas de discriminação,
bem como a necessidade de universalizar o acesso aos bens necessários para a
vida digna, ao meio ambiente equilibrado, ao patrimônio comum da humanidade.
Constituem direitos de quarta geração o direito à democracia, à informação, à
defesa da vida, à proteção da intimidade, o direito à diferença e o respeito ao
pluralismo num mundo multicultural. (Texto adaptado de palestra proferida por
Paulo Bonavides quando do aniversário de quinze anos da Constituição Federal
do Brasil, promulgada em outubro de 1988).
Os direitos fundamentais positivados na Constituição da Republica Federativa do
Brasil, de acordo com Moraes (2006), podem ser categorizados em:
[...] direitos individuais e coletivos - correspondem aos direitos
diretamente ligados ao conceito de pessoa humana e de sua
própria personalidade, como, por exemplo: vida, dignidade,
honra, liberdade. Basicamente, a Constituição de 1988 os prevê
no art. 5º [...];
Estudos Socioculturais
43
[...] direitos sociais - caracterizam-se como verdadeiras
liberdades positivas, de observância obrigatória em um Estado
Social de Direito, tendo por finalidade a melhoria das condições
de vida aos hipossuficientes, visando à concretização da
igualdade social, que configura um dos fundamentos de nosso
Estado Democrático, como preleciona o art. 1º, IV. [...]. A
constituição consagra os direitos sociais a partir do art. 6º;
[...] direitos de nacionalidade - nacionalidade é o vínculo jurídico
político que liga um indivíduo a um certo e determinado Estado,
fazendo deste indivíduo um componente do povo, da dimensão
pessoal deste Estado, capacitando-o a exigir sua proteção e
sujeitando-se ao cumprimento de deveres impostos; [Este tema
aparece na constituição no art. 12).
[...] direitos políticos - conjunto de regras que disciplina as formas
de atuação da soberania popular. São direitos públicos subjetivos
que investem o indivíduo no status activae civitatis, permitindo-
lhe o exercício concreto da liberdade de participação nos
negócios políticos do Estado, de maneira a conferir os atributos
da cidadania. Tais normas constituem um desdobramento do
princípio democrático inscrito no art. 1º, parágrafo único, da
Constituição Federal, que afirma que todo o poder emana
do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou
diretamente. A Constituição regulamenta os direitos políticos no
art. 14;
[...] direitos relacionados à existência, organização e participação
em partidos políticos - a Constituição Federal regulamentou
os partidos políticos como instrumentos necessários e
importantes para preservação do Estado Democrático de Direito,
assegurando-lhes autonomia e plena liberdade de atuação, para
concretizar o sistema representativo. (MORAES, 2006, p. 43-44).
Apesar de inúmeras dificuldades produzidas historicamente, o Brasil tem buscado,
em meio às desigualdades econômicas e sociais, promover ações destinadas à
emancipação dos indivíduos na busca e efetivação dos direitos fundamentais. A
discussão dos direitos humanos e as ações políticas e práticas empreendidas por
meio de programas governamentais e iniciativas da sociedade civil tem criado
condições objetivas para a promoção da cidadania e o respeito aos direitos
humanos. No entanto, ainda existem brasileiros sem acesso aos meios que os
assegurem usufruir dos direitos fundamentais.
44
Capítulo 2
Seção 3
Ética e o agir valorativo
Leandro Kingeski Pacheco
3.1 Ética
A Ética pode contribuir para o seu agir valorativo? Esta questão é fundamental
para o homem contemporâneo, pois, sob essa condição, não pode agir de
qualquer modo. Ao estudar o sentido da Ética você já poderá projetar o seu agir
valorativo.
Bittar defende, por exemplo, que a Ética implica refletir e deliberar sobre os
problemas ou desafios que enfrentamos na nossa existência; implica rever nossa
ação em relação ao outro, à realidade e à nossa prática. Segundo Bittar (2004, p. 4-5)
[...] a ética deve ser uma atitude reflexiva da vida, algo
impregnado à dimensão da razão de deliberativa, em constante
confronto com as inquirições, dificuldades, os desafios e
problemas inerentes à existência em si. É-se frequentemente
interrogado pela existência acerca dos modos de agir. Perceber
isto é perceber que se está permanentemente revisando os
modos como se intervém sobre a realidade, em geral, e sobre
a realidade do outro, mais especificamente. Desta forma é que
não existe ética fora da prática, e nem maturidade ética fora de
uma atitude atenciosa de pensar e repensar das ocorrências
intersubjetivas.
Singer (2006, p. 9-23) explica que a Ética não é uma série de proibições ligadas
ao sexo; nem um sistema ideal e nobre do ponto de vista teórico e inaplicável na
prática; e, nem se restringe à religião. Por outro lado, a ética é uma concepção
que concede à razão importante papel, pois o ser humano é capaz de justificar
racionalmente o modo como vive, ao considerar as alternativas possíveis, ao
procurar pautar-se pelo critério da universalidade (ao procurar atender a um público
maior, tanto quanto possível), e por privilegiar as consequências da ação moral em
detrimento de uma simples regra (às vezes inaplicável, ineficaz ou descabida).
Para Singer (2006, p. 18)
A ideia de viver de acordo com padrões éticos está ligada à ideia
de defender o modo como se vive, de dar-lhe uma razão de ser,
de justificá-lo. Desse modo, as pessoas podem fazer todos os
tipos de coisas que consideramos erradas, mas, ainda assim,
estar vivendo de acordo com padrões éticos, desde que tenham
Estudos Socioculturais
45
condições de defender e justificar aquilo que fazem. Podemos
achar a justificativa inadequada e sustentar que as ações estão
erradas, mas a tentativa de justificação, seja ela bem sucedida ou
não, é suficiente para trazer a conduta da pessoa para a esfera
do ético, em oposição ao não-ético. Quando, por outro lado, as
pessoas não conseguem apresentar nenhuma justificativa para o
que fazem, podemos rejeitar a sua alegação de estarem vivendo
de acordo com padrões éticos, mesmo se aquilo que fazem
estiver de acordo com princípios morais convencionais.
Sá (2007, p. 15), ao falar da Ética em sentido amplo, entende-se como ciência
que versa sobre a ação humana perante os seus semelhantes, por meio de
um juízo de (des)aprovação, em função de um valor e em vistas da felicidade
individual e coletiva.
Borges, Dall’Agnol e Dutra (2002) explicam que a Ética investiga o como, o
porquê e os critérios que permitem julgar uma ação como moralmente errada ou
correta. Nesse investigar, a ação correta pode ser associada à máxima felicidade
de todos; à prática de um agente virtuoso; ao respeito a regras estabelecidas; e, à
justificativa razoável para os outros.
Para Borges, Dall’Agnol e Dutra (2002, p. 7)
[...] a ética é a disciplina que procura responder às seguintes
questões: como e por que julgamos que uma ação é moralmente
errada ou correta? E que critérios devem orientar esse julgamento?
Hoje várias respostas atendem a essas perguntas: é possível
afirmar que a ação correta é aquela que (i) maximiza a felicidade de
todos, (ii) é praticada por um agente virtuoso, (iii) está de acordo
com regras determinadas, ou, ainda, (iv) pode ser justificada aos
outros de forma razoável. O procedimento de determinação da
ação correta varia conforme a escola filosófica, bem como de
acordo com a razão pela qual se adota esse procedimento.
Sánchez Vázquez (1990, p.7-12) explica que os seres
humanos adotam certos comportamentos para certas
situações vividas, e esses são qualificados de morais ou de
éticos: Morais, ao referir o agir em uma situação concreta,
prática (como ser bom em relação ao mendigo que lhe pede
uma esmola para cuidar de seu carro); e éticos, ao referir
uma teoria sobre o agir, caracterizada pela generalidade
(como investigar o sentido de bom, válido para todo agir).
Enfim, em relação ao agir humano, a prática e a teoria são distintas, mas não estão
isoladas e, sim, influenciam-se. Ainda, a Ética, enquanto teoria historicamente
situada, enquanto ciência, não cria a moral, e, sim, investiga-a.
Sánchez Vázquez
(1990, p. 12) define
a ética como “[...]
teoria ou ciência do
comportamento moral
dos homens em
sociedade.”.
46
Capítulo 2
Nesta acepção, a Ética, investida de caráter científico, aspira ser racional,
objetiva, sistemática etc.; e, tem um objeto de estudo próprio: o mundo moral,
o comportamento humano moral. Esse, por sua vez e por sua condição, está
sujeito à mutabilidade, à transformação, à autocriação.
Sánchez Vázquez (1990, p. 14) defende que o sentido originário de ética e de
moral é insuficiente para apanhar a distinção atual e referida, respectivamente,
entre ciência e objeto:
[...] originariamente, ethos e mos, caráter e costume, assentam-
se num modo de comportamento que não corresponde a uma
disposição natural, mas que é adquirido ou conquistado por
hábito [...] Vemos, pois, que o significado etimológico de moral
e de ética não nos fornecem o significado atual dos dois termos
[...].
Ao analisar as definições abordadas, você deve ter percebido que, basicamente,
a Ética é a teoria que estuda a moral; e a moral refere-se às práticas humanas,
aos comportamentos, que são classificados em função de critérios como certos
(bons) ou errados (maus) pela própria consciência humana. A avaliação dos
comportamentos também depende de valores que aceitamos, estabelecemos ou
rejeitamos, em vistas de nossa felicidade e dos demais envolvidos.
Ainda, refletir criticamente sobre o nosso agir, implica
pensar e decidir se esse deve ser revisto, reiterado ou
aprimorado à luz de certos valores. Ao analisarmos
algumas culturas, podemos encontrar alguns valores
comuns, dignos de serem imitados, tais como ‘não roubar’,
‘não mentir’, ‘ser honesto’ etc. Contudo, tais valores são
mutáveis, relativos a uma cultura e a uma época.
Hoje, em nossa sociedade, tratar a mulher como sendo igual ao homem
é considerado certo; enquanto que, em algumas sociedades africanas e
asiáticas, esse nível de igualdade é errado. Hoje a escravidão é considerada
errada, inaceitável. Mas, na Antiguidade, e mesmo há pouco tempo, no Brasil, a
escravidão era aceitável.
O exemplo seguinte permite ampliar o entendimento sobe o agir valorativo, sob o
enfoque ético ou moral:
Suponha que você está em casa, assistindo à televisão e, de repente,
surge no noticiário: ‘Mãe desempregada é presa em supermercado por
roubar dois pães e uma margarina. A mãe alegou, na confissão, que
roubou para alimentar o filho de dois anos que passa fome.’. Você é
Conforme Valls (2006,
p. 10) “Os costumes
mudam e o que ontem
era considerado errado
hoje pode ser aceito
[...].”
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Estudos socioculturais

  • 1. Universidade do Sul de Santa Catarina UnisulVirtual Palhoça, 2013 Estudos socioculturais
  • 2. Reitor Ailton Nazareno Soares Vice-Reitor Sebastião Salésio Herdt Chefe de Gabinete da Reitoria Willian Máximo Créditos Pró-Reitor de Ensino e Pró-Reitor de Pesquisa, Pós- Graduação e Inovação Mauri Luiz Heerdt Pró-Reitor de Desenvolvimento e Inovação Institucional Valter Alves Schmitz Neto Diretora do Campus Universitário de Tubarão Milene Pacheco Kindermann Diretor do Campus Universitário Grande Florianópolis Hércules Nunes de Araújo Diretor do Campus Universitário UnisulVirtual Moacir Heerdt Universidade do Sul de Santa Catarina – Unisul Gerente de Administração Acadêmica Angelita Marçal Flores Secretária de Ensino a Distância Samara Josten Flores Gerente Administrativo e Financeiro Renato André Luz Gerente de Ensino, Pesquisa e Extensão Roberto Iunskovski Coordenadora da Biblioteca Salete Cecília de Souza Gerente de Desenho e Desenvolvimento de Materiais Didáticos Márcia Loch Coordenadora do Desenho Educacional Cristina Klipp de Oliveira Campus Universitário UnisulVirtual Coordenadora da Acessibilidade Vanessa de Andrade Manoel Gerente de Logística Jeferson Cassiano Almeida da Costa Gerente de Marketing Eliza Bianchini Dallanhol Coordenadora do Portal e Comunicação Cátia Melissa Silveira Rodrigues Gerente de Produção Arthur Emmanuel F. Silveira Coordenador do Design Gráfico Pedro Paulo Teixeira Coordenador do Laboratório Multimídia Sérgio Giron Coordenador de Produção Industrial Marcelo Bitencourt Coordenadora de Webconferência Carla Feltrin Raimundo Gerência Serviço de Atenção Integral ao Acadêmico Maria Isabel Aragon Assessor de Assuntos Internacionais Murilo Matos Mendonça Assessora para DAD - Disciplinas a Distância Patrícia da Silva Meneghel Assessora de Inovação e Qualidade da EaD Dênia Falcão de Bittencourt Assessoria de relação com Poder Público e Forças Armadas Adenir Siqueira Viana Walter Félix Cardoso Junior Assessor de Tecnologia Osmar de Oliveira Braz Júnior Educação, Humanidades e Artes Marciel Evangelista Cataneo Articulador Graduação Jorge Alexandre Nogared Cardoso Pedagogia Marciel Evangelista Cataneo Filosofia Maria Cristina Schweitzer Veit Docência em Educação Infantil, Docência em Filosofia, Docência em Química, Docência em Sociologia Rose Clér Estivalete Beche Formação Pedagógica para Formadores de Educação Profissional. Pós-graduação Daniela Ernani Monteiro Will Metodologia da Educação a Distância Docência em EAD Karla Leonora Dahse Nunes História Militar Ciências Sociais, Direito, Negócios e Serviços Roberto Iunskovski Articulador Graduação Aloísio José Rodrigues Serviços Penais Ana Paula Reusing Pacheco Administração Bernardino José da Silva Gestão Financeira Dilsa Mondardo Direito Itamar Pedro Bevilaqua Segurança Pública Janaína Baeta Neves Marketing José Onildo Truppel Filho Segurança no Trânsito Joseane Borges de Miranda Ciências Econômicas Luiz Guilherme Buchmann Figueiredo Turismo Maria da Graça Poyer Comércio Exterior Moacir Fogaça Logística Processos Gerenciais Nélio Herzmann Ciências Contábeis Onei Tadeu Dutra Gestão Pública Roberto Iunskovski Gestão de Cooperativas Pós-graduação Aloísio José Rodrigues Gestão de Segurança Pública Danielle Maria Espezim da Silva Direitos Difusos e Coletivos Giovani de Paula Segurança Letícia Cristina B. Barbosa Gestão de Cooperativas de Crédito Sidenir Niehuns Meurer Programa de Pós-Graduação em Gestão Pública. Thiago Coelho Soares Programa de Pós-Graduação em Gestão Empresarial Produção, Construção e Agro- indústria Diva Marília Flemming Articulador Graduação Ana Luísa Mülbert Gestão da Tecnologia da Informação Charles Odair Cesconetto da Silva Produção Multimídia Diva Marília Flemming Matemática. Ivete de Fátima Rossato Gestão da Produção Industrial Jairo Afonso Henkes Gestão Ambiental. José Carlos da Silva Júnior Ciências Aeronáuticas José Gabriel da Silva Agronegócios Mauro Faccioni Filho Sistemas para Internet Pós-graduação Luiz Otávio Botelho Lento Gestão da Segurança da Informação. Vera Rejane Niedersberg Schuhmacher Programa em Gestão de Tecnologia da Informação Unidades de Articulação Acadêmica (UnA)
  • 3. Livro didático UnisulVirtual Palhoça, 2013 Designer instrucional Marina Melhado Gomes da Silva Cláudio Damaceno Paz Elvis Dieni Bardini Leandro Kingeski Pacheco Maria Terezinha da Silva do Sacramento Tade-Ane de Amorim Estudos socioculturais
  • 4. Livro Didático Ficha catalográfica elaborada pela Biblioteca Universitária da Unisul Copyright © UnisulVirtual 2013 Professores conteudistas Cláudio Damaceno Paz Elvis Dieni Bardini Leandro Kingeski Pacheco Maria Terezinha da Silva do Sacramento Tade-Ane de Amorim Designer instrucional Marina Melhado Gomes da Silva Projeto gráfico e capa Equipe UnisulVirtual Diagramador(a) Jordana Paula Schulka Revisor(a) Perpétua Guimarães Prudêncio Nenhuma parte desta publicação pode ser reproduzida por qualquer meio sem a prévia autorização desta instituição. 301 E84 Estudos socioculturais / Cláudio Damaceno Paz, Elvis Dieni Bardini, Leandro Kingeski Pacheco, Maria Terezinha da Silva do Sacramento, Tade-Ane de Amorim ; design instrucional Marina Melhado Gomes da Silva. – Palhoça : UnisulVirtual, 2013. 110 p. : il. ; 28 cm. Inclui bibliografia. 1. Ciências sociais. 2. Cultura – Aspectos sociais. 3. Sociedades. I. Paz, Cláudio Damaceno. II. Bardini, Elvis Dieni. III. Pacheco, Leandro Kingeski. IV. Sacramento, Maria Terezinha da Silva. V. Amorim, Tade-Ane de. VI. Título.
  • 5. Sumário Introdução  I  7 Capítulo 1 Sociedade: teorias clássicas e contemporâneas  I  9 Capítulo 2 Estado, cidadania, ética e direitos humanos  I  27 Capítulo 3 Cultura e identidade  I  67 Capítulo 4 Práticas culturais e processos midiáticos  I  85 Considerações Finais  I  101 Referências  I  103 Sobre os Professores Conteudistas  I  109
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  • 7. 7 Introdução Caro(a) estudante, Você inicia agora o estudo do livro didático Estudos socioculturais, com o intuito de procurar compreender a dinâmica e a diversidade das sociedades humanas, para agir responsavelmente nos contextos sociais. Nesse sentido, saiba que você será exigido(a) em termos de análise e compreensão de contextos e de diálogo com as diferenças socioculturais. Os conteúdos aqui reunidos seguem uma abordagem temática, bem como uma abordagem relacionada à sociedade e à cultura. Especificamente, por meio de quatro capítulos, você estuda teorias clássicas e contemporâneas relativas à sociedade; a questão do Estado e da cidadania, da ética e dos direitos humanos; acerca da cultura e da identidade; das práticas culturais e dos processos midiáticos. Este livro não tem a mínima pretensão de esgotar o assunto, mas tão somente de desenvolver uma abordagem didática, sistemática e humildemente parcial. Diante dessa limitação, procure ampliar seus conhecimentos sobre as temáticas abordadas, consultando os textos originais dos pensadores citados, dicionários e outras obras, sempre que considerar pertinente. Desejamos-lhes boa aprendizagem! Professoras Maria Terezinha e Tade-Ane Professores Cláudio, Elvis e Leandro
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  • 9. 9 Habilidades Secões de estudo Capítulo 1 Sociedade: teorias clássicas e contemporâneas Tade-Ane de Amorim Considerando diferentes abordagens teóricas, este capítulo instrumentaliza o(a) estudante a refletir criticamente sobre as possibilidades de ação de intervenção social. Seção 1:  Concepções de sociedade: autores clássicos Seção 2:  Pensamento contemporâneo
  • 10. 10 Capítulo 1 Seção 1 Concepções de sociedade: autores clássicos O que nos mantém juntos? Por quais motivos nós, homens e mulheres, vivemos em sociedade? A palavra sociedade devirá do latim societas e significa “associação amistosa com outros”. Assim, uma definição mais geral de sociedade pode ser um conjunto de interações humanas padronizadas culturalmente. Dessa forma, pode-se pensar em sociedade como valores, cultura, sistema de símbolos. A sociedade não é apenas um conjunto de indivíduos que vivem juntos em determinado local. Designa, também, o pertencimento a uma dada organização social compartilhada entre seus membros, com a presença de instituições e leis que regem a vida de cada indivíduo e da coletividade. A sociedade é objeto de estudo de diferentes áreas das ciências sociais, como Sociologia, História, Geografia e Antropologia. Também é amplamente estudada pela Filosofia. O sociólogo Norbert Elias (1994, p.13) apresenta-nos uma questão bastante interessante: Que tipo de formação é esse, esta “sociedade” que compomos em conjunto, que não foi pretendida ou planejada por nenhum de nós, nem tampouco por todos nós juntos? Ela só existe porque existe um grande número de pessoas, só continua a funcionar porque muitas pessoas, isoladamente, querem e fazem certas coisas, e no entanto sua estrutura e suas grandes transformações históricas independem, claramente, das intenções de qualquer pessoa em particular. Essa é uma das questões que as Ciências Sociais vêm buscando responder desde o início de sua trajetória. Nesta seção, mobilizaremos as teorias de sociólogos considerados os clássicos da Sociologia: Emile Durkheim, Karl Marx e Max Weber, para discutirmos por que vivemos juntos! 1.1 Emile Durkheim Para Durkheim, a sociedade constituía-se como um reino social, com individualidade distinta dos resinos animal e vegetal. Dessa forma, a sociedade não é apenas a soma dos indivíduos que a compõem; ela é uma síntese que se encontra em cada elemento que compõe os diferentes aspectos da vida.
  • 11. Estudos Socioculturais 11 Durkheim definiu sociedade como um complexo integrado de fatos sociais, que são as maneiras de agir, pensar e sentir, como práticas coletivas de um grupo, e que exercem coerção sobre os indivíduos. Além disso, os fatos sociais dizem respeito ao caráter objetivo da sociedade, isto é, são independentes dos indivíduos. Durkheim esforçou-se muito para afirmar a exterioridade dos fatos sociais, isto é, para separá-los de razões pessoais ou de impulsos da consciência individual. Segundo ele: Fato social é toda maneira de agir fixa ou não, suscetível de exercer sobre o indivíduo uma coerção exterior; ou ainda, que é geral na extensão de uma sociedade dada, apresentando uma existência própria, independente das manifestações individuais que possa ter. (DURKHEIM,1978, p. 13). Assim, para o autor a sociedade seria resultado da ligação existente entre as partes e o todo, sendo que o todo predomina sobre as partes. Nesse sentido, o fundamento da vida social estaria na sociedade e não no indivíduo. As estruturas sociais, uma vez que foram criadas pelo homem, passariam a funcionar independentes dele. E mais: passariam a condicionar suas ações. O predomínio da sociedade sobre a ação individual é o que mais se destaca no entendimento de sociedade de Durkheim. Para o autor, homens e mulheres não agem como desejam agir, mas são condicionados pela sociedade, que exerce um poder coercitivo sobre as ações individuais. Desta forma, o modo como o homem age é sempre condicionado pela sociedade, pois o agir individual origina-se no exterior, ou seja, na sociedade. Ele é imposto pela sociedade ao indivíduo, por isso é coercitivo, tem existência própria e independente da existência do indivíduo, que age como a sociedade gostaria que ele agisse. Durkheim chamou esse processo de coerção social, isto é, a sociedade dita regras e os indivíduos as seguem, e na maior parte das vezes sem nem perceber que estão seguindo regras que foram impostas. Pense, por exemplo, que, ao acordar, você “naturalmente” vai escovar os dentes. Esse ato de escovar os dentes não é “natural” e, sim, imposto como uma regra que deve ser seguida por todos. Mas, como não pensamos se devemos ou não escovar os dentes ao levantarmos, já interiorizamos essa regra, de tal modo que ela não parece mais uma coerção social. E é exatamente no momento que não a sentimos mais como impositiva que a regra obtém o sucesso.
  • 12. 12 Capítulo 1 De acordo com Durkheim, os fatos sociais têm objetividade porque eles têm existência independente dos indivíduos. A sociedade, nesse sentido, é mais do que a soma dos indivíduos, sendo uma espécie de síntese que não se encontra em nenhum dos elementos que compõem os diferentes aspectos da vida. Uma vez constituído um fenômeno, ele tem uma forma que cada elemento individual não possui. A sociedade, nesse sentido, é mais do que a soma das partes. Por isso, os fenômenos, uma vez combinados e fundidos, fazem nascer algo completamente novo, o qual não está mais nas motivações individuais e nem é o resultado das partes colocadas mecanicamente uma ao lado da outra. A interação entre os indivíduos possui uma força peculiar capaz de gerar novas realidades. Durkheim mostra que a mentalidade do grupo não é a mesma coisa que a mentalidade individual; que o estado de consciência coletiva não é a mesma coisa que o estado de consciência individual e que um pensamento encontrado em todas as consciências particulares ou um movimento que se repete por todos, não é, em si, um fato social. Para ter um caráter social, é necessário que sua origem esteja na coletividade e não nos membros da sociedade. A exterioridade do fato social é dada pela possibilidade de entendê-lo como objeto de observação, independentemente das ações dos indivíduos. Os fatos sociais constituem-se a partir de causas externas que se processam nas interações grupais, na pluralidade de consciência e como obra coletiva, com ascendência sobre os indivíduos, e que, por isso, são externos a eles. Como reconhecer se um fato é social ou não? Podemos reconhecê-lo pela coerção que ele exerce sobre os indivíduos. Para Durkheim, o organismo social precisa manter o estado saudável e identificar os fenômenos doentes a fim de orientar sua cura. O caráter coercitivo nem sempre é percebido pelos indivíduos. A presença desse poder é reconhecível pela existência de alguma sanção determinada, seja pela resistência que o fato opõe a qualquer empreendimento individual que tenda a violentá-lo, ou pela difusão geral que se apresenta no interior do grupo. Em cada indivíduo só existe um fragmento da sociedade. Se olharmos os indivíduos isoladamente, nunca compreenderemos a sociedade. É o todo que tem precedência sobre as partes.
  • 13. Estudos Socioculturais 13 Na concepção de Durkheim, é a sociedade que pensa, deseja, sente, embora o faça sempre por meio dos indivíduos. Mas, estes são resultados diretos do que é a sociedade. Nessa perspectiva, podemos afirmar que: •• fenômenos gerais são fenômenos sociais porque existem como fenômenos coletivos; •• fenômenos comuns nem sempre são caracterizados como coletivos, somente como gerais. O fenômeno está bem longe de existir no todo, pelo fato de existir nas partes. Porém, ele existe nas partes porque existe no todo. Leia, na sequência, uma frase que serve como um exemplo utilizado por Durkheim para diferenciar os fenômenos coletivos dos gerais: “A dureza do bronze não figura nem no cobre, nem no estanho, nem no chumbo que serviram para formá-lo e que são corpos maleáveis ou flexíveis; figura na mistura por eles formada.” (DURKHEIM, 1978, p. 25). Uma assembleia não é a soma dos indivíduos, mas é a produção de algo novo, nas palavras de Durkheim, algo “Sui Generis”. A realidade Sui Generis da sociedade pode ser chamada de representação coletiva de um fenômeno, ou seja, a forma como a sociedade vê a si mesma e ao mundo que a rodeia, por meio de suas lendas, mitos, concepções religiosas e suas crenças morais. A partir das representações coletivas, encontramos as bases nas quais se originam os conceitos, que são traduzidos nas palavras do vocabulário de uma comunidade, de um grupo ou de uma nação. Note que, para Durkheim, os conceitos e categorias são sociais e não individuais; assim, as percepções do belo, do feio, do agradável não são inatas ao indivíduo, mas passadas pela sociedade. Para o autor, até mesmo num momento extremo, em que o indivíduo resolve acabar com sua própria vida, é a sociedade que se manifesta nesse desejo. Geralmente, atribuímos o ato do suicídio a um problema estritamente de ordem individual. Contrariamente a essa ideia, e de forma bastante original, Durkheim apontou que o suicídio deve-se a fatores sociais. Importa considerar que, antes dele, várias pesquisas já haviam sido desenvolvidas com a temática do suicídio, utilizando-se inclusive de fatores sociais para explicar tal ação: o clima, a raça, ou a desordem mental. Foi Durkheim, entretanto, em seu livro “O Suicídio”, publicado em 1897, o primeiro a afirmar que o suicídio é um fato social e como tal deverá ser explicado por outros
  • 14. 14 Capítulo 1 fatores sociais. Assim, para o autor, o suicídio deve ser analisado de acordo com o momento social em que se dá, para que possamos compreendê-lo como manifestação de uma desordem social. Ele é resultado de vários fatores, mas o principal fator, o que mais contribui para sua existência, é o estado de anomia encontrado na sociedade. O conceito de anomia empregado por Durkheim designa um estado social sem regras e sem normas. Para o autor, tal estado é verificado, principalmente, em tempos de grandes transformações sociais, como o momento de um crescimento acelerado da divisão do trabalho, provocado pela falta de interligação estável entre os indivíduos. Essas mudanças rápidas dificultariam o desenvolvimento e o funcionamento de regras gerais e gerariam espaço para manifestações individualistas que, nesse caso, desestruturariam toda ordem social. Observe que, nessa explicação sobre o suicídio, Durkheim enfatiza o peso da sociedade sobre o indivíduo. O chamado suicídio egoísta é, para Durkheim, a consequência do individualismo, isto é: o outro lado da fraca integração social. Quanto mais frouxos os laços sociais, maior a probabilidade de se cometer suicídio. Como verdadeiro conservador, ele contrariava as ideias do liberalismo e do individualismo, as quais interpretavam a falta de integração grupal como liberdade individual. Durkheim a identificou como egoísmo. O suicídio altruístico é o suicídio decorrente de uma integração social extremamente forte, colocando o indivíduo em certas situações sob pressão, conduzindo-o ao suicídio. Esse tipo de suicídio já se deu entre os membros do serviço militar na França, na Alemanha, no Japão; entre viúvas na Índia, que aceitavam serem colocadas na fogueira junto com o corpo do marido morto. E, atualmente, acontece entre os homens-bomba muçulmanos. Perceba que nesse tipo de suicídio o indivíduo não o comete pela falta de laços sociais, mas o contrário: os valores sociais são tão fortemente introjetados nos indivíduos, que eles abrem mão do direito de viver por uma causa social. O suicídio anômico não é resultado da falta de integração social, tampouco consequência do poder exagerado do coletivo sobre o indivíduo. Ele aparece em tempos de mudanças sociais rápidas que, de acordo com Durkheim, sempre andam junto com a desestruturação da sociedade. O autor apontou que a decadência econômica bem como o seu oposto, a prosperidade súbita, levam às mesmas consequências: aumento da taxa de suicídio. Esse fenômeno anômico enfraquece os laços que ligam o indivíduo à sociedade e, em casos extremos, leva ao suicídio.
  • 15. Estudos Socioculturais 15 Mas o suicídio anômico não é só aquele que aumenta durante as crises econômicas; é também aquele cuja frequência cresce paralelamente ao número de divórcios. Em suas pesquisas, Durkheim percebeu que o homem divorciado está mais “ameaçado” pelo suicídio do que a mulher. Para compreender o fenômeno é preciso analisar o que o homem e a mulher recebem de equilíbrio, de satisfação e de disciplina no casamento. O homem encontra equilíbrio e disciplina no casamento; porém, graças à tolerância dos costumes, conserva certa liberdade porque para ele são permitidas atitudes sociais e práticas sexuais fora do casamento. A mulher vai achar no casamento mais disciplina do que liberdade. Por outro lado, o homem divorciado busca novos relacionamentos estáveis para superar a disparidade entre desejo e satisfação, enquanto a mulher divorciada beneficia-se de uma liberdade adicional que compensa, em parte, a perda de proteção familiar. A teoria de Durkheim não é apenas uma curiosidade histórica. Ela também ajuda a esclarecer o suicídio aqui e agora, pois existem dados de 2004 que apontam que aproximadamente cinco em cada 100 mil brasileiros cometem suicídio a cada ano (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2012). 1.2 Marx Marx viveu no século XIX, no período da consolidação do sistema capitalista, que imprimiu uma nova maneira de ser da sociedade. Suas formulações teóricas sobre a vida social, com destaque para as análises que fez da sociedade capitalista da sua época, causaram repercussões entre os intelectuais, a ponto de a Sociologia Ocidental Moderna preocupar-se basicamente em confirmar ou negar as questões levantadas por ele. Ele cumpriu o papel de desvendar o sistema capitalista de forma ampla, analisando seus aspectos políticos, sociais e econômicos, com a utilização do método dialético. Isso é tão marcante que se pode afirmar que o conceito de realidade social de Marx é dialético. Caracterizando o método, Marx (1982, p. 179) afirmava que “o movimento do pensamento é o reflexo do movimento real, transportado e transposto no cérebro do homem”. É o movimento da matéria, da realidade social e da vida do ser humano que é objetivamente dialético. Marx reencontrou a dialética na sua unidade, isto é, no conjunto de seu movimento. A realidade em estado de movimento, a realidade em processo, impulsionada pela superação de elementos contraditórios que a permeiam, é uma ideia básica no método dialético. Para ele, tudo parecia levar à própria contradição e, por consequência, à mudança, à transformação.
  • 16. 16 Capítulo 1 Para os historiadores, as teorias ou abstrações são representações que os homens fizeram para si mesmos na história. Neste aspecto, elas são o resultado da história humana, estando ao mesmo tempo destinadas a descrevê-la e a permitir sua continuidade ou descontinuidade. Portanto, são contextualizadas e podem ser modificadas, porque toda história traz em si o germe da sua própria destruição. A dinâmica das relações sociais, o movimento das mudanças e transformações constantes, e a dialética da realidade e do pensamento constituem a força motora da história. As circunstâncias fazem os homens tanto quanto os homens fazem as circunstâncias. Ao produzir seus meios de existência, os homens produzem indiretamente a sua própria vida material e social, processo que implica o surgimento de contradições. Nesse sentido, o sociólogo poderia compreender a sociedade capitalista e a direção na qual ela estaria transformando-se graças as suas contradições internas. Na verdade, Marx nunca tratou da produção em geral, mas referiu- se à produção num estágio de desenvolvimento social, como sendo a produção dos indivíduos que vivem em sociedade. A sociedade depende do estágio de desenvolvimento social, de suas forças produtivas e das relações sociais de produção, conforme citação que segue: [...] os homens não são livres árbitros de suas forças produtivas, pois toda força produtiva é uma força adquirida, produto de uma atividade anterior. Portanto, as forças produtivas são os resultados da energia prática dos homens, [...] determinada pelas condições em que os homens se encontram colocados, pelas forças produtivas já adquiridas [...]. (MARX apud QUINTANEIRO, BARBOSA e OLIVEIRA, 2001, p. 71). A maneira pela qual os homens produzem seus meios de existência depende da natureza dos meios de existência já conhecidos e que precisam ser reproduzidos ou substituídos. A compreensão dos processos históricos não pode ser feita sem referência à maneira como os homens produzem sua sobrevivência material. Por isso, o conceito de trabalho é fundamental para o entendimento, pois é nesse processo que se estabelece a interação com a natureza e é por meio do trabalho que o homem a transforma. Na concepção marxista, o homem trabalhando é considerado como força de trabalho, significando a energia despendida no processo de trabalho, por meio do qual chega ao produto. E é o trabalho que atribui ao produto um valor determinado.
  • 17. Estudos Socioculturais 17 Para uma compreensão mais adequada da sociedade moderna, é imprescindível que se tenha o domínio de alguns conceitos básicos relativos a sua economia. Como você está estudando as ideias sociológicas de Marx, nesta seção, você terá contato com alguns fundamentos conceituais da Sociologia econômica marxista. Isso porque, no pensamento de Marx, os aspectos econômicos adquiriram destaque e estão muito presentes em toda a análise da sociedade capitalista. Na sociedade atual, vende-se a própria força de trabalho como mercadoria, mas é uma mercadoria produtora de outras mercadorias, multiplicadora de dinheiro. Nesse contexto, a força de trabalho surge, então, como uma nova mercadoria. O trabalhador livre vende a sua força de trabalho pelo valor de um determinado salário. É bom lembrar que a força de trabalho nem sempre foi uma mercadoria ou trabalho assalariado. O escravo, por exemplo, não vendia a sua força de trabalho ao seu dono, assim como o boi não vende o seu trabalho ao lavrador. O escravo era vendido de uma vez para sempre com a sua força de trabalho. Era uma mercadoria que podia passar das mãos de um dono às mãos de outro. Assim, ele era uma mercadoria, mas a sua força de trabalho não lhe pertencia. Já o trabalhador livre, no sistema capitalista, vende 8, 10, 12, 15 horas de sua vida, dia após dia, ao proprietário dos meios de produção, dos instrumentos de trabalho e meios de vida. (QUINTANEIRO; BARBOSA; OLIVEIRA, 2001). Na concepção de Marx, o salário deve ser determinado considerando-se o valor dos meios necessários para a subsistência, para produzir, desenvolver, manter e perpetuar a força de trabalho. E considerando-se, ainda, tudo o que é necessário para que o trabalhador reproduza-se de acordo com o seu nível de vida, que varia historicamente entre épocas e regiões, e de acordo com suas habilidades. A força de trabalho é a única mercadoria que pode produzir valor. Para Marx (1982), uma parte desse valor, apropriada sob forma de trabalho excedente, é trabalho não pago e passa a integrar o capital, transformando-se em riqueza. No Capitalismo, esse trabalho excedente assume a forma de mais-valia, expressão do grau de exploração da força de trabalho pelo capital. Ela é considerada pelos sociólogos como sendo a alma do Capitalismo, pois produz, na teoria e na prática, a desigualdade e os antagonismos sociais.
  • 18. 18 Capítulo 1 Aquilo que o trabalhador produz a mais do que recebe, em forma de salário, é apropriado pelo dono dos meios de produção e, normalmente, é chamado de apropriação do excedente de trabalho. É por meio da extração de mais-valia que se estabeleceu a via fundamental da acumulação capitalista, por intermédio da qual, segundo Marx (1982), o capital realiza a sua vocação histórica à custa do trabalhador. Movido pela ideia do lucro, o capitalista seria necessariamente explorador. É importante destacar que há uma diferença entre lucro e mais-valia. A mais- valia origina-se somente do trabalhador, já o lucro pode vir de outras fontes: da compra e venda de mercadorias, do lucro, do arrendamento. Segundo Demo (1989), as classes sociais são grupos sociais antagônicos, em que um se apropria do trabalho do outro devido à posição diferente que ocupam na estrutura econômica de um modo de produção, determinada fundamentalmente pela forma específica com que se relaciona com os meios de produção. A distinção está entre os que possuem e os que não possuem os meios de produção. Como você já viu, a compra e a venda da força de trabalho produz um distanciamento entre os que compram e os que vendem essa força de trabalho. Marx chamou isso de antagonismo de classe, cuja base de sustentação é a propriedade privada dos meios de produção. Com a proposta de eliminação da propriedade privada, ele via a possibilidade de eliminar os antagonismos de classe. Marx (1982) demonstrou que a existência das classes está vinculada a determinadas fases da história do desenvolvimento da produção; que a luta de classes conduz necessariamente, ao longo do tempo, à ditadura do proletariado; e que esta mesma ditadura não passa de uma transição para a abolição de todas as classes e para uma sociedade sem classes. É na obra Manifesto Comunista, de 1848, que se encontram as principais considerações políticas de Marx sobre a luta de classes, conforme citação que segue: [...] a história de toda a sociedade até hoje é a história da luta de classes. [...] na nossa época, a época da burguesia, caracteriza- se, por ter simplificado os antagonismos de classe. A sociedade vai se dividindo cada vez mais em dois grandes campos inimigos, [...] burguesia e proletariado. (MAR X; ENGELS, 1985, p. 45).
  • 19. Estudos Socioculturais 19 Mesmo reconhecendo a importância do papel da burguesia na dissolução do feudalismo e na construção da ordem capitalista, Marx prognosticou que cabe aos operários dar o próximo passo, o da destruição do Capitalismo e da instauração da sociedade socialista: O progresso da indústria, cujo agente involuntário e passivo é a própria burguesia, substitui o isolamento dos operários, resultante da concorrência, por sua união revolucionária resultante da associação. [...] a burguesia produz, acima de tudo, seus próprios coveiros. Seu declínio e a vitória do proletariado são igualmente inevitáveis. (MARX; ENGELS, 1985, p. 64). Na verdade, Marx reconheceu no Capitalismo apenas duas classes: a burguesia e o proletariado; o que seria para ele uma simplificação, se comparadas ao sistema feudal de produção. Algumas vezes ele usou o termo “pequena burguesia” para designar uma classe em transição, composta pelo pequeno produtor independente, artesão ou camponês, donos dos seus meios de produção. Hoje existem salários que permitem acumulação de capital, cujo valor vai muito além do necessário para a satisfação das necessidades básicas (atletas diferenciados, top models, executivos de grandes empresas), em que as características da mais-valia praticamente desaparecem ou não se aplicam, o que Marx desconhecia. Também é comum falar-se em consciência de classe, quando ela está ciente de seus reais interesses. Marx falava de “classe em si” para indicar o seu potencial contestatório. A “classe para si”, quando levada pela consciência do conflito e da exploração, organiza-se politicamente para a defesa consciente de seus interesses, o que supõe uma identidade construída para a luta de classe. Mas essa consciência e luta de classes levaria à abolição das classes sociais na construção essencial da sociedade comunista: O que caracteriza o Comunismo não é a abolição da propriedade privada em geral, mas a abolição da propriedade burguesa. [...] em lugar da velha sociedade burguesa, com suas classes e seus antagonismos de classe, surge uma associação na qual o livre desenvolvimento de cada um é a condição para o livre desenvolvimento de todos. (MAR X; ENGELS 1985, p. 64). Chegando ao fim a divisão da sociedade em classes, o Estado, enquanto estrutura política, também teria que ser destruído. No entender de Marx, o Estado era um instrumento da luta de classes, logo não faria sentido em uma sociedade
  • 20. 20 Capítulo 1 sem classes. Como ele entendia que o proletariado precisava do Estado para derrubar a burguesia, ele afirmava que era necessário um momento de transição entre o Capitalismo e o Comunismo, e chamou isso de Socialismo. A transição seria implantada por meio da ditadura do proletariado. Lênin (apud HARNECKER, 1972, p. 145) dizia que: A essência fundamental da ditadura do proletariado residia na organização e disciplina do destacamento avançado dos trabalhadores, de sua vanguarda, de seu único dirigente: o proletariado. Seu objetivo é construir o Socialismo, suprimir a divisão da sociedade em classes, converter a todos os membros da sociedade em trabalhadores, destruir a base sobre a qual descansa a exploração do homem pelo homem. [...] exige um período bastante longo de transição do Capitalismo para o Socialismo, porque é difícil reorganizar a produção, como se necessita de tempo para introduzir mudanças radicais em todos os domínios da vida e porque a enorme força da tradição de um modo burguês de dirigir a economia somente pode ser superada numa luta vasta e tenaz. Por isso, Marx falou de todo um período de ditadura do proletariado como período de transição. Assim, era preciso que a classe operária se tornasse revolucionária, primeiro tomando consciência de seus interesses de classe e percebendo as condições objetivas de construção do Socialismo para, numa continuidade de aprimoramento deste modelo, chegar ao Comunismo como uma sociedade perfeita, sem propriedade privada, sem classe e sem o Estado. 1.3 Weber e a sociedade Diferentemente de Marx e Durkheim, Weber apontou que, para compreendermos a sociedade, precisamos centrar a análise no sujeito, pois é a partir da ação individual que se dará a constituição da sociedade. Weber não apresentou uma teoria geral sobre a sociedade, estando mais preocupado em discutir situações sociais concretas. Dese modo, esse pensador partiu da ideia de que o indivíduo é o elemento primordial para compreender a realidade social. E essa análise passava pelo comportamento dos indivíduos, já que tudo que existe na sociedade é resultado da vontade e da ação dos indivíduos. É em suas condutas individuais que o agente associa um sentido que é orientado pelo comportamento dos outros. Leia as palavras do próprio autor:
  • 21. Estudos Socioculturais 21 Falaremos de ação na medida em que o indivíduo atuante atribua um significado subjetivo ao seu comportamento– seja ele claro ou disfarçado, omissão ou aquiescência. A ação é “social” na medida em que o seu significado subjetivo leva em conta o comportamento dos outros e é por ele orientado em seu curso. (WEBER, 1994, p. 4). A ação social está, deste modo, profundamente ligada ao conceito de relação social. A expressão ‘ação social’ será usada para indicar o comportamento de uma pluralidade de atores na medida em que, em seu conteúdo significativo, a ação de cada um deles leva em conta a ação de outros, e é orientada nesses termos. (IDEM, p. 26). Weber deu ênfase à relação na qual a atribuição de sentido é uma ação necessária e até mesmo fundadora do intercâmbio social. É por isso que ele afirmava ser a Sociologia uma ciência voltada para a compreensão interpretativa da ação social e para a explicação causal no seu transcurso e nos seus efeitos. É o sentido que os homens estabelecem em suas ações que, segundo Weber, fundamenta a ordem social. Assim, o homem passa a ter, na teoria de Weber, como indivíduo, um significado e uma especificidade que não encontramos no positivismo. Não existe nesse autor a mesma oposição presente em Durkheim entre sociedade e indivíduo. Em Weber, as normas sociais só se tornam concretas quando se manifestam nos indivíduos sob a forma de uma motivação. Cada indivíduo é levado a agir por um motivo que é dado pela tradição, por interesses racionais ou pela emotividade. Weber deixou dito que, por mais individual que seja a ação, o fato de o indivíduo agir segundo a expectativa do outro faz com que a sua ação tenha um caráter coletivo e social. É o que ele denominou ação social. Quando esse sentido da ação social é compartilhado, temos a relação social. Isso é diferente da ação individual e, para que se estabeleça uma relação social, é preciso que haja um sentido compartilhado. A ação social é a conduta do agente que está orientada pela conduta do outro, pela expectativa que você possui sobre o que o outro espera que você faça. Na relação social, a conduta de cada qual entre múltiplos agentes envolvidos orienta- se por um conteúdo de sentido reciprocamente compartilhado. Ainda é preciso considerar que essa relação orienta-se pelas ações dos outros, que podem ser passadas, presentes ou esperadas como futuras (vingança por ataques anteriores, réplica a ataques presentes, medidas de defesa diante de
  • 22. 22 Capítulo 1 ataques futuros). Porém, nem toda espécie de ação, incluindo a ação externa, é social. A conduta humana é ação social somente quando ela está orientada pelas ações dos outros. Por exemplo: um choque de dois ciclistas é um simples evento como um fenômeno natural. Por outro lado, haveria ação social na tentativa dos ciclistas se desviarem, ou na briga ou considerações amistosas subsequentes ao choque. Os tipos de ação Devido à infinidade das ações humanas, Weber construiu uma teoria dos tipos de ação para apontar quais seriam os motivos básicos da ação social. Entre os tipos de ação social temos, segundo Weber, os seguintes: •• Ação racional referente a fins: é a ação determinada por expectativas quanto ao comportamento de objetos do mundo exterior e de outras pessoas. Essas expectativas funcionam como “condições” ou como “meios” para alcançar fins próprios, ponderados e perseguidos racionalmente como sucesso. Nesse tipo de ação, o homem coloca determinados objetivos e busca os meios mais adequados para consegui-los. O importante é perceber que o motivo da ação é alcançar sempre um resultado eficiente. É uma ação instrumental voltada para um fim utilitário. A empresa capitalista e o estrategista militar funcionam nessa lógica. •• Ação racional referente a valores: é determinada pela crença consciente no valor: ético, estético, religioso ou qualquer outro que seja absoluto e inerente à ação e independe do seu resultado. O motivo da ação, nesse caso, não é um resultado, mas um valor, independentemente se o resultado for positivo ou negativo. O capitão que afunda junto com o seu navio é um exemplo, pois age racionalmente baseado num valor. •• Ação social afetiva: é a ação determinada de modo afetivo, guiada por paixões, por afetos ou estados emocionais. Uma resposta intempestiva está incluída nesse grupo. No centro de relações sociais moldadas pelas lutas, Weber percebeu o fato da dominação. Na verdade, entre os conceitos mais usados da teoria weberiana estão os conceitos de poder e dominação. De acordo com o autor, poder é a capacidade de impor a própria vontade dentro de uma relação social. Porém, poder é diferente de dominação, o qual significa probabilidade de encontrar uma pessoa pronta a obedecer a uma ordem de conteúdo determinado. A dominação pode ser entendida como uma relação social.
  • 23. Estudos Socioculturais 23 Assim, para Weber, o importante é analisar o que torna legítima a autoridade, pois é com a legitimidade social que a dominação é justificada e efetivada. Weber distinguiu três tipos de dominação e legitimidade, que são: •• Dominação legal racional: a obediência apoia-se na crença, na legalidade da lei e dos direitos de mando das pessoas autorizadas a comandar pela lei. Assenta-se no poder de um direito abstrato e impessoal. Assim, esse poder está ligado à função e não à pessoa. São exemplos desse tipo de dominação o código civil e o regimento interno de uma empresa. •• Dominação tradicional: sua legitimidade apoia-se na crença de que o poder de mando tem um caráter sagrado, herdado dos tempos antigos. O poder patriarcal dentro da família é um exemplo. •• Dominação carismática: o chefe carismático tem origem numa personalidade excepcional. A legitimidade da autoridade do líder carismático lhe é conferida pelo afeto e confiança que os indivíduos depositam nele. Profetas, fundadores de impérios, guias espirituais são exemplos de líderes carismáticos. Seção 2 Pensamento contemporâneo Na seção anterior, discutimos três diferentes perspectivas da análise da relação entre indivíduo e sociedade. Emile Durkheim apontou para a coerção que a sociedade exerce sobre os indivíduos. Para Karl Marx, a discussão maior se colocou sobre a inserção dos indivíduos em suas classes sociais. E Max Weber discutiu as ações individuais como constituintes da sociedade. Mesmo olhando a sociedade e os indivíduos por diferentes perspectivas, todos os autores clássicos da sociologia procuraram explicar como se dá a constituição da sociedade. Contemporaneamente, vários outros sociólogos vêm discutindo essa interessante relação entre indivíduos e sociedade. A ênfase mais contemporânea é tentar superar a dicotomia entre indivíduo e sociedade, ou seja, mostrar que não são as ações individuais que determinam a sociedade e nem a sociedade que determina a ação social, mas que há uma relação entre sociedade e indivíduo, que nessa relação há uma constante transformação tanto da sociedade como dos indivíduos. Dessa forma, os indivíduos modificam a sociedade ao mesmo tempo em que são modificados por ela.
  • 24. 24 Capítulo 1 Um dos sociólogos que discute essa relação é o francês Pierre Bourdieu (1983), que desenvolveu o conceito de habitus. Segundo esse autor, habitus significa: [...] um sistema de disposições duráveis e transponíveis que, integrando todas as experiências passadas, funciona a cada momento como uma matriz de percepções, de apreciações e de ações – e torna possível a realização de tarefas infinitamente diferenciadas, graças às transferências analógicas de esquemas [...]. (BOURDIEU, 1983, p. 65, grifo nosso). A questão central de Bourdieu é mostrar a articulação entre como os indivíduos vivem e suas condições de existência e percepções dentro e fora de grupos sociais. Assim, o conceito de habitus relaciona-se com as práticas cotidianas com as formas de organização social dos indivíduos, com sua vida concreta como indivíduo, e com suas condições predeterminadas pela sociedade, como sua condição de classe. Assim, ele explica que as condições objetivas e pré- determinadas pela sociedade fundem-se com as condições subjetivas. A superação da oposição entre indivíduo e sociedade na obra de Bourdieu é, assim, proporcionada por meio do conceito de habitus: [...] o todo social não se opõe ao indivíduo. Ele está presente em cada um de nós, sob a forma do habitus, que se implanta e se impõe a cada um de nós através da educação, da linguagem... Tudo o que somos é produto de incorporação da totalidade. (BOURDIEU, 2002, p. 33). O conceito de habitus concilia o que outros sociólogos colocaram como oposição: a relação ente realidade exterior e as realidades individuais. O sociólogo explica que habitus é um sistema de esquemas individuais, socialmente constituído de disposições estruturadas (no social) e estruturantes (nas mentes). Tais disposições e experiências são adquiridas pelas experiências práticas, em condições sociais que são definidas pela existência. O habitus é estruturado através das instituições que atuam na socialização do ator social (a família, a escola, são exemplos de instituições sociais). É importante destacarmos que o habitus não é algo estático ou imutável, mas apresenta uma perspectiva histórica, uma perspectiva de movimento. Em consonância com sua visão de sociedade, Bourdieu (2002, p. 178) reafirmou o caráter histórico desse conceito: “[...] produto da história, o habitus produz práticas, individuais e coletivas, e portanto história em conformidade com os esquemas engendrados por essa mesma história”. Outro sociólogo que fez significativas contribuições para a discussão sobre o estudo das sociedades foi o inglês Anthony Giddens. O autor desenvolveu
  • 25. Estudos Socioculturais 25 a teoria da estruturação, procurando resolver a dicotomia entre indivíduo e sociedade. (GIDDENS, 1989). Como já foi discutido anteriormente, alguns autores destacam a importância dos atores e do sentido ao qual tais atores atribuem as suas ações. Por outro lado, há autores que mostram que a estrutura social sobrepõe-se ao indivíduo. Giddens procurou superar as teorias deterministas, que reduzem a ação individual à coerção da sociedade, sendo esta considerada autônoma e coercitiva. Dessa forma, o autor levou a um entendimento de reprodução social como mecânica, entendendo o ator como totalmente livre dos condicionantes sociais. Giddens, portanto, entendeu que tal antagonismo pode ser superado com a proposta teórica que articula estrutura e ação. Nas palavras do autor: Cada investigação realizada nas ciências sociais ou na história está envolvida em relacionar a ação à estrutura, em traçar, explicitamente ou não, a conjunção ou as disjunções de consequências premeditadas ou impremeditadas da atividade, e em verificar como elas afetam o destino de indivíduos. Nenhum malabarismo com conceitos abstratos poderá substituir o estudo direto de tais problemas nos contextos reais de interação. Pois as permutas de influências são intermináveis, e não há um (único) sentido em que a estrutura ‘determine’ a ação ou vice -versa. A natureza das coerções a que os indivíduos estão sujeitos, os usos que eles dão às capacidades que possuem e as formas de cognoscitividade que revelam são todos eles manifestamente variáveis do ponto de vista histórico. (GIDDENS, 1989, p. 178-179). Na Teoria da Estruturação, proposta por Giddens em seu livro “A Constituição da Sociedade” ( publicado originalmente no ano de 1986), ele procurou mostrar que a relação entre indivíduo e sociedade é dinâmica. Para o autor, a sociedade (estrutura) e o indivíduo (ator social) estão em constante processo de mudança mútua. Entende-se “estrutura” como um coletivo de regras e recursos que se constituem na reprodução social. “As estruturas são conjuntos de regras que ajudam a constituir e regular as atividades, definido-as como de uma certa espécie e sujeitas a uma determinada gama de sanções”. (GIDDENS, 1984, p. 102). É importante destacar que, para o autor, as regras que regulam as atividades não podem ser assumidas como apenas restritivas, ou coercitivas. “A estrutura não deve ser equiparada à restrição, à coerção, mas é sempre, simultaneamente, restritiva e facilitadora”. (GIDDENS, 1984, p. 30). Nessa concepção, não há indivíduos independentes da estrutura social, bem como não existe estrutura dada, prévia à ação dos indivíduos. Assim, para entendermos os processos sociais, temos de compreender a ação individual e a relação de tal ação com as estruturas sociais. As estruturas são significadas por meio da ação individual e a ação efetiva-se estruturalmente.
  • 26. 26 Capítulo 1 Assim, de acordo com a teoria da estruturação, as ações dos indivíduos são entendidas como dotadas de consciência e intencionalidade. Mas isso não significa que os indivíduos podem prever seus atos, pois, para Giddens, uma das principais características da modernidade é a imprevisibilidade. Já que não há leis gerais que governam o processo histórico, não é possível prever o que acontecerá no futuro, apesar de a vida social possuir regularidades. Giddens enfatizou que todos os indivíduos desempenham agência, ou seja, agem na sociedade como atores sociais. Dessa forma, o agente é entendido como um ser que age de forma intencional e que monitora a sua ação de modo reflexivo, isto é, que pode mudar tal forma de ação a partir de informações renovadas. Nas palavras do autor: “Tal como a utilizo aqui, a ideia de ‘ação’ ou de agência, não se refere a uma série de atos discretos combinados entre si, mas a um fluxo contínuo da conduta.” (1989, p. 14). A ação do agente não pode ser estudada separadamente de modo mais amplo, isso porque agência é um processo dinâmico, que resulta da ação reflexiva dos atores sociais. As teorias de Bourdieu e de Giddens foram desenvolvidas no intuito de superar a oposição entre objetivismo e subjetivismo, ou ação e estrutura. E ambas analisam a ação social como um processo em constante mudança, em que há o peso da sociedade, mas há também capacidade de os indivíduos constituírem sua história.
  • 27. 27 Habilidades Secões de estudo Capítulo 2 Estado, cidadania, ética e direitos humanos Para conhecer a gênese do Estado como organização política, o estudante precisa identificar, no significado lógico das categorias políticas, as diferenças e semelhanças nas formas de cada povo conceber a sua origem e significar a organização social e a forma de governo. Ainda, precisa compreender que a política é um processo mais amplo e anterior ao Estado e, a partir daí, contextualizar e relacionar o surgimento do Estado constitucional moderno com os fatos políticos e as ideologias que marcaram as mudanças ao longo da história, refletindo criticamente sobre as diferenças e contrastes nas formas de institucionalização e legitimação do poder no mundo contemporâneo. Considerando o contexto político, ético e humano, este capítulo remete o estudante para analisar e compreender contextos, refletindo criticamente, administrando conflitos e projetando ações de intervenção. Seção 1:  Estado como organização política Seção 2:  Cidadania como conquista de direitos Seção 3:  Ética e o agir valorativo Seção 4:  Direitos humanos como prática social
  • 28. 28 Capítulo 2 Seção 1 Estado como organização política Maria Terezinha da Silva do Sacramento A história humana tem sido rica de idéias relacionadas com a estrutura física, a geografia, o espaço cósmico e o significado espiritual e /ou secular do mundo: movimentos e organizações preocupados com a padronização e /ou a unificação do mundo como um todo volta e meia têm surgido, pelo menos nesses dois últimos milênios, idéias em torno do relacionamento entre o universal e o particular tem sido fundamental para todas as civilizações. (ROBERTSON, 1994, p. 29) Nesta seção convidamos você para uma incursão na história da organização política. Não se pretende oferecer um panorama completo dos tipos de organização política, mas apresentar um quadro esquemático do processo evolutivo das antigas civilizações que influíram no pensamento político nos dias de hoje. A história das formas originárias da política no Ocidente é apresentada de forma a possibilitar uma compreensão dos pressupostos conceituais que alimentaram ao longo da história, as ideias políticas em torno da democracia, direito, igualdade, liberdade, Estado, limitação do poder e representação. Nosso propósito é estimular a reflexão e para isso oferecemos uma abordagem histórico-conceitual de forma que você, compreendendo o sentido estrutural que os conceitos assumem no processo de organização da política no Ocidente, tenha condições de refletir sobre a dinâmica da política no cenário global. O elemento que não pode faltar nesta reflexão é a gênese da distinção moderna entre sociedade civil e Estado e os conceitos que emergem das teorias do contrato social e dos ideais libertários em favor do laicismo, na construção jurídica do político que configura como ciência da legitimação do poder. A origem da palavra Estado é muito pouco precisa. Os gregos empregaram a palavra Estado com o mesmo sentido que denominaram a cidade. A palavra pólis, portanto, foi a forma originária com que os gregos definiram a atividade política. Laicismo é um termo originário da palavra laico, que significa próprio do mundo, do século, secular por oposição a eclesiástico. Doutrina que proclama a laicidade absoluta das instituições sociopolíticas e da cultura ou que pelo menos reclama, para estas, autonomia em face da religião.
  • 29. Estudos Socioculturais 29 O Estado como uma organização política assumiu sentidos diferentes em cada povo, em cada cultura. Para alcançar o grau complexo da organização política que conhecemos como civilização, o homem superou fronteiras, domesticou animais e espécies, revolucionou o conhecimento e superou os obstáculos da natureza. Esse processo de evolução mantém variações significativas. É impossível falar das diversas formas de organização política sem fazer referência às formas de governo encontradas na antiguidade oriental, como a civilização egípcia e mesopotâmica. Os Estados da África meridional, as civilizações da América pré-espânica são alguns dos exemplos que evidenciam a complexidade da organização política. Alguns historiadores fazem restrições ao uso da palavra Estado da forma como foi cunhada no Ocidente. Naturalmente não se pode esperar que o sistema político dos astecas ou dos egípcios encontre correspondência com a organização política dos sistemas feudais da Europa Ocidental. A concepção clássica usada por Aristóteles preserva a mesma natureza sociológica e política da relação particular entre o povo e o governo ou entre o povo e o centro do poder. Jellinek (2002), em sua obra Teoría general del Estado, apresenta duas formas de investigação científica do Estado: O Estado como realidade física e subjetiva. Na primeira, o Estado é apresentado como fenômeno social em seu aspecto histórico e político; na segunda, como um ente jurídico. De qualquer forma, o autor reconhece que essa ordem não designa nenhuma forma de homogeneidade na identificação dos Estados com seus elementos. Essa forma varia de acordo com a história e com o significado que cada povo atribuiu ao Estado. Isso inclui a história, os seus valores, as lutas e conquistas. 1.1 A polis e a organização política na Grécia Os gregos conceberam o Estado como uma organização político social, a partir da identidade comum do povo grego com a civilização helênica. Não havia, segundo os estudiosos da política até aquele momento, relação direta do Estado com o espaço territorial. Até o fim do século IX, a.C. aproximadamente – época de Homero, que corresponde à cultura clássica grega e que alguns historiadores chamam de idade média grega – , as instituições políticas da Grécia eram baseadas numa monarquia patriarcal. A estrutura política e jurídica de cada cidade era constituída de um rei, um Conselho de anciãos e, em casos de guerra ou outros assuntos considerados importantes, todos os cidadãos eram convocados e uma assembleia era formada para decidir a vida da cidade.
  • 30. 30 Capítulo 2 O período entre os séculos VI e IV a.C sofreu profundas mudanças. Além das conquistas territoriais e da influência que a Grécia passou a exercer sobre o conjunto do mediterrâneo, outras inovações surgiram, como a ascensão das cidades (pólis) como referência à vida comum e verdadeiro sentido da vida política e o florescimento da filosofia. Uma nova forma de conceber a vida e a realidade social pelo pensamento abstrato desenvolveu-se emancipada das crenças religiosas. O laicismo começa, portanto, pelos gregos. O desaparecimento gradual da monarquia deu lugar a uma nova concepção de poder na Grécia. Isso significa dizer que a autoridade do senhor – que se baseava na noção de arché, cujo princípio do comando estava centrado na figura do patriarca onipotente que exercia o poder e autoridade sobre as diversas esferas da vida social – foi gradualmente substituída por uma nova concepção de poder desvinculado do homem que o exerce. Uma protoburocracia determinava a impessoalidade das funções e cargos públicos e definia as responsabilidades civis dos cidadãos no exercício das funções públicas. É importante notar, entretanto, que, apesar do laicismo, as divindades e os ritos continuavam sendo cultuados pelos gregos, mas colocados sob a responsabilidade da pólis. Assim, numa interpretação da cultura política grega (MORRALL, 2000), os gregos politizaram os seus deuses. Por exemplo: a veneração das divindades olímpicas, os rituais e o sacerdócio foram assimilados pelo espírito do homem cívico, instalando assim uma religião oficial que se distinguia da administração dos assuntos públicos. As festas e as cerimônias eram controladas pela comunidade inteira. 1.2 Da Civitas romana ao Estado como organização política Alguns estudiosos da política e historiadores veem semelhança entre a organização política das cidades romanas com as cidades-estado gregas. Os romanos usavam o mesmo significado para a civitas – a comunidade de cidadãos – e para a res-pública – espaço público ou coisa pública. A organização política romana esteve presente entre as cidades italianas mais antigas. Nelas, o governo era composto por um rei e pelo senado. E, em tempos ainda mais remotos, era composto pelos chefes das antigas tribos ou gentes patrícias. Os comícios eram formados pelas assembleias do povo. A história da antiguidade romana é dividida em vários períodos: o primeiro foi marcado pelo desaparecimento do modelo grego de cidades, e o
  • 31. Estudos Socioculturais 31 restabelecimento das monarquias. Os reis, nessa época, eram venerados como entidades sagradas, e mais tarde continuavam exercendo autoridade e fonte de leis. A República Romana a partir do século III correspondeu ao tempo da expansão romana, segundo período da Antiguidade, tendo sido marcada pelas primeiras conquistas territoriais. Em dois séculos, Roma assumiu o controle do conjunto do mediterrâneo, das regiões Ibéricas (Espanha) até a Mesopotâmia (oriente Médio), passando pela África do Norte, pela Macedônia, Ilhas gregas e entrando, por fim, na Ásia Menor. O sistema republicano adotado nesse período visava impedir o poder tirânico sobre as terras conquistadas. As distâncias entre as cidades começaram a representar o maior obstáculo às reuniões dos Comícios do Fórum. Observam Mosca e Bouthoul (1987, p. 61) que essas reuniões ficaram restritas aos habitantes das cidades. Além disso, outras dificuldades começaram a se impor à manutenção dos encargos públicos, como as longas viagens dos Cônsules às províncias. As províncias do Império foram divididas em províncias imperiais e senatoriais. Algumas eram administradas pelo imperador, que nomeava seus funcionários; outras eram administradas por funcionários nomeados pelo senado. Na interpretação de Jellinek, (2002), a complexidade do Império romano deve ser entendida enquanto países aliados e dependentes da grande cidade. A capacidade plena do direito de cidadania somente era concedida àqueles admitidos para formar a comunidade de cidadãos. Pertencer à civis romanus era uma condição daquele cidadão da cidade de Roma, ainda que o Estado romano ocupasse a maior extensão territorial da antiguidade. A palavra Stato até então desconhecida começou a ser empregada para demarcar a posição política de algumas cidades como Florença, Veneza, Gênova , Pisa, entre outras. foi aí que começou também a referência à cidade como espaço territorial unido aos cidadãos como um corpo politicamente organizado. Para alguns teóricos da política, como Burckhardt, (apud JELLINEK, 2002,p. 155), o que designaria a expressão stato, até então, seria o governo e sua corte. Mas não há consenso a esse respeito. No conjunto, o maior legado romano para a cultura política dos nossos tempos foi ter definido o vínculo entre cidadão e Estado e a própria comunidade enquanto unidade politicamente organizada, pelo direito.
  • 32. 32 Capítulo 2 1.3 O Estado na Idade Média Marcar o início da Idade Média não tem sido uma tarefa fácil. Mesmo assim o início tem sido dado pelo ano de 395 estendendo-se até o século V, depois do nascimento de Cristo. A Idade Média foi marcada pela ruptura com a tradição política greco-romana, pelas tentativas carolíngias de restauração do Império, pelo feudalismo e pelo cristianismo. Durante três séculos o Ocidente viveu uma sequência de mudanças na economia, na política e de mentalidade. Nesse cenário, predominaram os regimes monárquicos e o senso individualista interpretado pelos filósofos da Igreja, segundo a fé cristã. Nessa fase de expansão do cristianismo no Ocidente, a política perdeu a sua autonomia e só ganhou sentido na religião. O poder temporal entrou em disputa com o poder de Deus, interpretado pela filosofia patrística – que, na visão de Santo Agostinho, tinha suas raízes no mito do pecado original – e assim constrói os fundamentos de uma sociedade regida pelos princípios do cristianismo, segundo o qual o poder político era um mistério de Deus. Ao estabelecer uma fronteira entre a ordem divina e a ordem terrena, a doutrina cristã pretendia uma universalidade. Assim, os papas tornaram-se tão poderosos que já não se contentavam com a direção espiritual do cristianismo. À frente da única organização que pretensamente possuía prerrogativas universalistas, conquistavam as classes feudais locais e assim dominavam os poderes seculares que, na pretensão de buscar aliados para a legitimação do poder, acabaram unindo o poder político ao religioso. A unificação de Carlos Magno (768-814), rei dos francos, restaurou a ideia do poder com base nos ideais imperialistas agora aliados à Igreja. Com esse projeto formado por duas cabeças – o imperador e o papa – , Carlos Magno lançou as bases ideológicas para a constituição de uma república cristã. O enfraquecimento das instituições públicas, causado pela pretensão universalista do pensamento político da Idade Média, produziiu a fragmentação política do século X. Nesse contexto, os reis já não conseguiam ter pleno controle sobre seus territórios. A consequência foi o enfraquecimento do direito de patrimonialização do poder. O feudalismo fez desaparecer o legado das instituições políticas e jurídica e o poder político foi deslocado da prerrogativa do direito de cidadania – uma das mais importantes conquistas da civilização greco-romana – para as mãos dos proprietários da terra que podiam financiar as milícias e as guerras, assegurando com isso a posse de cargos administrativo e religiosos.
  • 33. Estudos Socioculturais 33 A estamentalização do poder político da Idade Média, longe de caracterizar a unificação do sistema político, caracterizou uma sociedade hierarquizada em ordens e controlada pela classe de proprietários. Weber (1991, p.203) observa que o desenvolvimentos dos estamentos – uma sociedade de classe de proprietários – foi, em regra, uma forma de apropriação hereditária de privilégios e de poder monopolista de mando pela oportunidade de aquisição. O Renascimento marcou um processo de mudanças, com a redução do prestígio e do controle da Igreja sobre o saber. A importância do mecenato definiu-se nos séculos XV e XVI como o divisor de águas entre o prestígio da Igreja, no comando da justiça e do saber, e a ascensão dos artistas e escritores que, sob a proteção dos príncipes, difundiam uma nova mentalidade em que o homem era estimulado a tomar parte na organização da vida pública. Maquiavel e Giucciardini tornaram- se célebres protagonistas dessa nova ordem social e política.(CHEVALLIER, 2001). 1.4 O Estado na Modernidade A organização política da Idade moderna, que começou no século XVI, foi um movimento que marcou a transição das ideias políticas da Idade Média, um processo que o Renascimento já se encarregaria de romper para dar início a uma nova forma de organização política inspirada na razão política e jurídica. O fundamento do Estado constitucional desenvolveu-se, no pensamento político entre os séculos XVII e XVIII, como uma oposição ao Estado absolutista e ao modelo pluralista que caracterizou, já no fim da Idade Média, o Estado estamental. Nicolau Maquiavel foi o primeiro pensador do final do Renascimento a defender a fundação do Estado sobre o poder absoluto do príncipe, ou seja, um princiopado civil. Mas as premissas do maquiavelismo fundam-se na razão do Estado, ou seja, na autonomia política do Estado. Nessa nova mentalidade política, a ação do príncipe não poderia apoiar-se em motivações de ordem moral ou religiosa. O filósofo inglês Thomas Hobbes, no mesmo sentido absolutista, defendeu uma compreensão do homem como vivendo em constante conflito no seu estado de natureza, conflito cuja solução defendida por Hobbes estaria na ideia do contrato social. O fundamento do poder estatal hobbesiano está na unificação do corpo político e na concepção do contrato de renúncia. Com essa ideia, Hobbes resolve dois problemas: a legitimidade do poder e a unificação das diversas fontes de ordenamento em uma única fonte de poder político e jurídico. A doutrina de Hobbes constitui o mais importante fundamento do monismo. De acordo com essa doutrina, o Estado é o detentor absoluto da lei e da força.
  • 34. 34 Capítulo 2 O contrato social é uma teoria, que representa o pensamento político do iluminismo, conhecida também por contratualismo. Essa teoria explica a origem da sociedade e o fundamento do Estado num contrato. Vejamos como é definido o contratualismo: O contratualismo compreende todas aquelas teorias políticas que veem a origem da sociedade e o fundamento do poder político, num contrato, isto é, num acordo tácito ou expresso entre a maioria dos indivíduos, acordo que assinalaria o fim do estado natural e o início do Estado social e político. (BOBBIO, 2004, p. 272). Hobbes não foi o único a propor a ideia do contrato social como solução dos problemas políticos e sociais da época. O inglês John Locke, diferentemente de Hobbes que defendeu a soberania absoluta do Estado, limitou o poder do governo pelo direito de resistência dos cidadãos em caso de quebra de contrato. Considerado o pai do liberalismo, Locke defendeu a liberdade, a tolerância, e o direito do povo eleger seus representantes. O poder legislativo tem um papel preponderante na concepção política de Locke. Já o francês Jean Jacques Rousseau defendeu a vontade do povo como soberana. Recusou a ideia de que a liberdade pudesse ser representada. Defensor da igualdade social, condenou a propriedade privada defendida por Locke como um direito natural . Outra importante doutrina que vigora até os dias de hoje é a separação dos poderes de Montesquieu. Sua aversão ao despotismo inspirou a doutrina da separação dos poderes apoiada na premissa de que o poder freia o poder, isto é, a liberdade política só existe segundo leis e no governo em que o poder seja moderado pela distribuição das forças, afirmando a equipotência e a independência entre os poderes Legislativo, Executivo e Judiciário. A teoria da separação dos poderes de Montesquieu representa uma das instituições mais importantes nas democracias modernas. Inspirou a constituição republicana dos Estados Unidos e do Brasil, a declaração Universal dos Direitos Humanos do Homem e do Cidadão e continua inspirando os cidadãos e homens públicos na defesa contra o abuso do poder político. Nesta seção procuramos mapear alguns dos temas importantes que determinaram o destino político dos povos ocidentais. Mostramos que a concepção clássica de política usada pelos gregos e romanos foram incorporadas ao longo da história. Mas, ao mesmo tempo, pretendemos mostrar que a política não é um conceito unitário, tampouco segue a mesma natureza sociológica e política em todos os tempos e em todos os lugares.
  • 35. Estudos Socioculturais 35 Na Idade Média, uma ruptura decisiva na concepção de política desloca a centralidade do pensamento político do demos, ou seja, povo – é importante lembrar que os gregos não pensavam numa democracia representativa. O governo só poderia ser exercido pelo povo (demos) porque é parte da polis – , para a ideia de um Deus único, criador e senhor das leis. A concepção de comunidade desprende-se da tradição greco-romana para se filiar à concepção de homem como uma criatura que tem com seu criador uma dívida originária do pecado que se funda não em um projeto ético-político, muito menos sobre uma concepção jurídica, mas sobre uma aliança religiosa. Sua pretensão universalista coincide com as pretensões imperialistas de Roma, mas com o curso da história abre caminho para o fortalecimento da instituição eclesiástica. O Renascimento culmina com o enfraquecimento da Igreja. As dificuldades políticas criadas pelos conflitos religiosos somam-se ao conjunto de transformações das sociedades europeias. O fim de uma ordem política culminando com a decadência das monarquias absolutistas engendra uma nova mentalidade política, que coloca no centro das preocupações o fundamento do Estado constitucional como oposição ao poder soberano dos governantes. A razão do Estado sucumbe às formas tradicionais de pensar as relações entre sociedade e governo. O Estado emerge como fonte de ordenamento não mais apoiado nas crenças religiosas, mas numa ordem jurídico- positiva. Seção 2 Cidadania como conquista de direitos Cláudio Damaceno Paz A vida em sociedade constitui um imperativo, pois as interações entre os humanos e com o meio em que estão inseridos não são escolha, mas necessárias para a potencialização das suas capacidades. Porém, pela divergência de interesses, essas relações tendem a se tornar conflituosas. Em decorrência, para viabilizar suas existências, os humanos têm desenvolvido mecanismos que viabilizem a resolução de conflitos. Diversos são os meios criados e utilizados para disciplinar as condutas na busca da harmonia social. Dentre eles podemos destacar o Direito.
  • 36. 36 Capítulo 2 É o Direito que deve garantir os interesses de cada um e impedir que uns sejam prejudicados pelos outros. A pessoa que tem um direito violado está sofrendo uma perda de alguma espécie. E quando uma pessoa que teve um direito ofendido não reage, isso pode encorajar a ofensa de outros direitos seus, pois sua passividade leva à conclusão de que ela não pode ou não quer defender-se. (DALLARI, 1985). A caminho do trabalho, no dia 1º de dezembro de 1955, uma costureira negra de 42 anos, Rosa Parks (1913-2005), moradora de Montgomery, capital do Alabama, nos EUA, tomou um ônibus, sentou-se numa poltrona situada ao meio para frente do veículo de transporte coletivo. Minutos depois, o motorista exigiu que ela e outros três trabalhadores negros cedessem seus lugares para passageiros brancos que embarcaram no ponto seguinte. Rosa Parks negou-se a cumprir a ordem do motorista. Foi, então, retirada do ônibus, detida e levada para a prisão. Em decorrência do seu ato, Rosa Parks enfrentou ameaças de morte, humilhações e teve até de se mudar de estado por não conseguir arranjar emprego no Alabama. No entanto, a atitude de resistência pacífica de Rosa Parks deflagrou uma série de protestos contra a discriminação racial nos EUA. Trabalhadores negros recusaram-se a embarcar em ônibus enquanto estivesse em vigor, no estado do Alabama, a lei discriminatória que impunha aos negros ocuparem os lugares do fundo dos transportes coletivos, enquanto aos brancos eram reservados os lugares dianteiros. Durante os protestos, era comum encontrar grupos de trabalhadores negros dirigindo-se a pé para o trabalho, acenando e cantando nas ruas, enquanto eram xingados pelos brancos. O exemplo emblemático de Rosa Parks e os avanços ocorridos nos EUA em relação aos direitos civis nas décadas subsequentes demonstram que os direitos nascem das lutas dos seres humanos contra as formas de opressão. No entanto, são conquistas gradativas que se configuram no processo histórico. Os direitos do homem, por mais fundamentais que sejam, são direitos históricos, ou seja, nascidos em certas circunstâncias, caracterizados por lutas em defesa de novas liberdades contra velhos poderes, e nascidos de modo gradual, não todos de uma vez e nem de uma vez por todas. (BOBBIO, 1992, p.5).
  • 37. Estudos Socioculturais 37 Compreender os direitos humanos como conquista e construção humana ao longo da história afirma o protagonismo das pessoas na luta pelos direitos a serem positivados como direitos fundamentais. Ressalta-se que as expressões “direitos humanos” e “direitos fundamentais” são frequentemente utilizadas como sinônimos. Segundo a sua origem e significado poderíamos distingui- los da seguinte maneira: direitos do homem [humanos] são direitos válidos para todos os povos e em todos os tempos; [...] os direitos fundamentais seriam [são] os direitos objetivamente vigentes numa ordem jurídica concreta. (CANOTILHO, 1998). Partindo do pressuposto de que os direitos humanos resultam de conquistas que se materializam no processo histórico, pela ação humana, evidencia-se a importância das Revoluções Liberais (Inglesa, Americana e Francesa) para a emancipação dos indivíduos e das coletividades no contexto de construção da modernidade e da criação dos direitos. No processo da Revolução Inglesa, em 1689, o Parlamento inglês apresentou à monarquia uma declaração de direitos (Bill of Rights), que assegurava aos indivíduos os direitos de liberdade, de segurança e de propriedade, como garantia frente ao poder soberano – e arbitrário – do Estado absolutista. A Bill of Rights impunha limites ao poder real ao deslocar para o Parlamento as competências de legislar e criar tributos. Ao mesmo tempo, instituía a separação de poderes para evitar o autoritarismo do poder absolutista do monarca. No entanto, ao consentir em manter a imposição de uma religião oficial, a anglicana, – estabelecida pelo rei Henrique VIII – muitos ingleses, sem a liberdade de professar e manifestar sua crença religiosa, distinta da oficial, viram-se constrangidos a migrar para terras distantes, temerosos de perseguições. Para os puritanos (calvinistas ingleses), a América consistiu em alternativa para viver em liberdade, conforme suas crenças. Depois de estabelecidos na “nova Canaã”, como denominavam a América do Norte, os agora colonos americanos foram constrangidos, em 1765, pelas imposições fiscais da autoridade metropolitana – que contrariava o estabelecido na Bill of Rights – a recolher uma série de impostos para cobrir o déficit da Coroa que havia-se envolvido na Guerra dos Sete Anos (1756-1763) contra a França. Em 1773, na cidade de Boston, ocorreu a The Boston Tea Party. Colonos que viviam do comércio, por se sentiram prejudicados com a Lei do Chá, disfarçaram- se de índios peles-vermelhas, assaltaram os navios da companhia de transporte, Direito positivado decorre do ato de positivar. Positivar, em Direito, significa codificar, transformar, por exemplo, o que é costume, portanto legitimado socialmente, em lei escrita.
  • 38. 38 Capítulo 2 que estavam ancorados no porto de Boston, lançando o carregamento de chá no mar. A reação inglesa foi imediata e mesmo violenta. Em 1774, os rebelados criaram um exército comum entre as colônias, demonstrando a fragilidade das suas relações com a metrópole inglesa, fato que abriu caminho para a independência. Em 1776 foi elaborada a Declaração de Direitos do Bom Povo da Virgínia, afirmando que todos os seres humanos são livres e independentes, possuindo direitos inatos, tais como a vida, a liberdade, a propriedade, a felicidade e a segurança, registrando o início do nascimento dos direitos humanos na história. (COMPARATO, 2003). A referida Declaração de Direitos, que abriu caminho para a independência dos EUA ocorrida em 4 de julho de 1776, proclamada na Filadélfia, positivada na Constituição da República dos Estados Unidos da América em 1787, afirmou que o governo tem de buscar a felicidade do povo, definiu a separação de poderes, estabeleceu o direito dos cidadãos à participação política, a liberdade de imprensa e a livre escolha da religião, conforme a consciência individual. No entanto, a pátria da liberdade manteve a mácula da escravidão que deixou a herança da segregação racial. A prática da escravidão foi abolida nos Estados Unidos da América em 1863, com a Declaração de Emancipação promulgada pelo presidente Abraham Lincoln, no contexto de uma guerra civil, a Guerra da Secessão. No entanto, a discriminação racial, mesmo com a abolição, assumiu na cultura estadunidense um caráter segregacionista que deu origem a inúmeras ações afirmativas e reações violentas. Em virtude das manifestações decorrentes do protesto pacífico de Rosa Parks, em 13 de novembro de 1956, a Suprema Corte aboliu a segregação racial nos transportes coletivos de Montgomery, tornando também ilegal esta discriminação racial em todo o território dos EUA. Em 21 de dezembro de 1956, o ativista negro Martin Luther King e o sacerdote branco Glen Smiley entraram juntos num ônibus e ocuparam lugares na primeira fila. Martin Luther King organizou e liderou marchas que reivindicavam para os negros o direito ao voto, o fim da segregação e das discriminações, bem como a conquista de outros direitos civis básicos. A maior parte destes direitos foi, mais tarde, agregada à constituição estadunidense com a aprovação da Lei de Direitos Civis (1964) e da Lei de Direitos Eleitorais (1965).
  • 39. Estudos Socioculturais 39 Em 4 de abril de 1968 Martin Luther King foi assassinado em Memphis, no Tennessee. Em 20 de janeiro de 2009 Barack Obama tomou posse da presidência dos Estados Unidos como primeiro negro eleito para o comando executivo do mais influente Estado-nação do mundo. Neste dia, estamos reunidos porque escolhemos a esperança acima do medo, a unidade de objetivos acima do conflito e da discórdia. Neste dia, vimos proclamar o fim dos sentimentos mesquinhos e das falsas promessas, das recriminações e dos dogmas desgastados que por tanto tempo estrangularam nossa política. (OBAMA, 2009). A sociedade organizada com justiça é aquela em que os encargos e os benefícios são partilhados entre todos, pois os direitos, para além da sua criação histórica e positivação jurídica, precisam constituir-se em prática social. A Declaração de Direitos do Povo da Virgínia (1776) consistiu numa ação pioneira na luta pelos direitos humanos ao reivindicar direitos políticos e justiça social, porém apresentava, na época, como referido, caráter seletivo. No entanto, foi a Declaração dos Direitos do Homem, aprovada pela Assembleia Nacional francesa, no contexto revolucionário, em 1789, que exerceu grande influência sobre os movimentos emancipacionistas e libertários na modernidade, pelo seu caráter de universalidade. A França quer ser exemplar, não para ensinar, mas porque é a história dela, é sua mensagem. Exemplar para as liberdades fundamentais: é a sua luta, é também sua honra. Esta é a razão pela qual a França vai continuar a realizar todas essas lutas: para a abolição da pena de morte, pelos direitos das mulheres à igualdade e dignidade, para a descriminalização universal da homossexualidade, que não deve ser reconhecida como um crime, mas, pelo contrário, reconhecida como uma orientação. [...]. Todos os países membros [da ONU] têm a obrigação de garantir a segurança de seus cidadãos, e se um país adere a esta obrigação, então é imperativo que nós, nas Nações Unidas, facilitemos os meios necessários para fazer essa garantia. Estas são as questões que a França vai levar e defender nas Nações Unidas. Digo isso com seriedade. Quando há paralisia e inação, então a injustiça e a intolerância podem encontrar o seu lugar. (HOLLANDE, 2012). OBAMA, Barack. Discurso de posse à presidência dos Estados Unidos da América, em 20/01/2009. HOLLANDE, François. Fragmento do discurso proferido pelo presidente da França na Assembleia Geral da ONU, em 25/09/2012.
  • 40. 40 Capítulo 2 Os revolucionários franceses de 1789 iniciaram a Declaração de Direitos do Homem afirmando, no artigo primeiro, que “Os homens nascem e são livres e iguais em direitos”, e no artigo quarto enfatizam que A liberdade consiste em poder fazer tudo que não prejudique o próximo. Assim, o exercício dos direitos naturais de cada homem não tem por limites senão aqueles que asseguram aos outros membros da sociedade o gozo dos mesmos direitos. Estes limites apenas podem ser determinados pela lei. Outro aspecto relevante da Declaração de Direitos criada pelos franceses está explicitado no artigo dezesseis, nos seguintes termos: “A sociedade em que não esteja assegurada a garantia dos direitos nem estabelecida a separação dos poderes não tem Constituição.” (DALARI, 1985, p. 53-54). O século XX foi marcado por duas grandes guerras de proporções mundiais. Na origem destas guerras está o choque entre interesses imperialistas das potências capitalistas e seus asseclas. A ambição pelo poder e pela riqueza, somada ao desprezo aos direitos humanos, explicam os horrores gerados pelos referidos conflitos, materializados em privações das liberdades e das garantias individuais e sociais, crises de desabastecimento, bombardeios, destruição, terror e mortes físicas e psicológicas. O trauma causado pelas referidas guerras impeliu as lideranças mundiais à criação e consolidação de uma organização (ONU) com o propósito de: assegurar, por meios pacíficos, a manutenção da paz internacional; lutar pela defesa dos direitos humanos; estabelecer relações amistosas entre as nações, com base no princípio de autodeterminação dos povos; gerar mecanismos de cooperação entre os países na busca de solução para os problemas internacionais de ordem econômica, social, cultural e humanitária; e constituir-se em centro de convergência das ações dos Estados-nação na luta por objetivos comuns. Para que fosse permanentemente relembrado o valor da pessoa humana e para estabelecer o mínimo necessário que todos os países e todas as pessoas devem respeitar, a ONU encarregou um grupo de pessoas muito respeitadas, entre as quais havia filósofos, juristas, cineastas, políticos, historiadores, de várias partes do mundo, de redigir uma nova Declaração de Direitos. Esses estudiosos reunira-se, pediram a opinião de muitas outras pessoas e, afinal, prepararam um documento que proclama os Direitos Humanos, que em nossa época devem ser considerados fundamentais. (DALLARI, 1985, p. 51 e 52).
  • 41. Estudos Socioculturais 41 Os autores da Declaração Universal dos Direitos Humanos, aprovada pela Assembleia Geral das Nações Unidas, em Paris, no dia 10 de dezembro de 1948, evitaram redigir uma mera carta de intenções. Nos artigos da referida declaração foram incluídas exigências que devem ser atendidas para que a dignidade humana seja respeitada. O artigo terceiro, por exemplo, lembra que “Todo homem tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal”. Em decorrência, no artigo quarto está expressamente ordenado que “Ninguém será mantido em escravidão ou servidão; a escravidão e o tráfico de escravos serão proibidos em todas as suas formas.” A Declaração Universal dos Direitos Humanos foi assinada por países do mundo inteiro, inclusive pelo Brasil, valendo como um compromisso moral desses países. É necessário que o maior número possível de pessoas conheça a Declaração, para cobrar de seus governos o respeito ao compromisso assumido. (DALLARI, 1985, p. 52). A ênfase da referida Declaração está na internacionalização dos direitos humanos, fixando-o no contexto internacional dos direitos fundamentais, ensejando a prevalência destes no ordenamento jurídico dos Estados signatários do referido documento e daqueles que se integram à comunidade das nações unidas como filiados da ONU. O Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas, criado em 2006 em substituição à Comissão das Nações Unidas sobre os Direitos Humanos, criticada pela tolerância com Estados cujas ações constituíam desrespeito aos direitos humanos, tem como objetivo combater as violações aos direitos humanos em todo o mundo. O Brasil, membro da ONU, signatário da Declaração Universal dos Direitos Humanos, define na Constituição Federal, promulgada em 1988, os direitos fundamentais no título II, Dos Direitos e Garantias fundamentais. O capítulo I dos Direitos Individuais e Coletivos é constituído pelo artigo 5º, com 78 incisos, alinhados com o referido documento da ONU. No caput deste artigo lê-se: “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, [...].” A dificuldade da concretização dos direitos humanos, dentre outros fatores, reside na adoção, pelos Estados-nação, de políticas seletivas, dando prioridade a alguns direitos e postergando a positivação de outros.
  • 42. 42 Capítulo 2 Ressalta-se que os direitos humanos foram sendo positivados de maneira gradativa. Estudiosos do tema, para fins didáticos, sem desconsiderar o princípio estrutural de indivisibilidade, apontam para quatro gerações de direitos que foram sendo criados e incorporados às constituições dos Estados-nação ao longo do processo histórico-social na modernidade. Na escala evolutiva dos direitos, legislados ao longo dos séculos XIX e XX, há quatro gerações sucessivas de direitos fundamentais. Direitos de primeira geração, os direitos de liberdade foram os primeiros a constar dos instrumentos normativos constitucionais, a saber: os direitos civis e políticos. Os direitos de primeira geração, direitos de liberdade, têm por titular o indivíduo. Os direitos de liberdade fazem ressaltar, na ordem dos valores políticos, a nítida separação entre a Sociedade e o Estado, e a submissão do segundo à primeira. Os direitos de segunda geração decorrem dos efeitos provocados pelas transformações econômicas e sociais gerados pela industrialização e a urbanização. São os direitos sociais vinculados aos econômicos, bem como os direitos coletivos e os de coletividades. Nasceram em decorrência das lutas dos trabalhadores e estão articulados ao princípio da igualdade. A consciência de um mundo partido entre nações desenvolvidas e subdesenvolvidas deu lugar a que se buscasse outra dimensão dos direitos fundamentais, aquela que se assenta sobre a fraternidade. Dotados de altíssimo teor de humanismo e universalidade, os direitos de terceira geração tendem a cristalizar-se enquanto direitos que não se destinam especificamente à proteção dos interesses de um indivíduo, de um grupo ou determinada sociedade, pois seu destinatário primeiro é o gênero humano e sua existencialidade concreta. Emergiram da reflexão sobre temas referentes à autodeterminação dos povos, incluindo o direito ao desenvolvimento, à paz, à dignidade humana, o combate às diferentes formas de discriminação, bem como a necessidade de universalizar o acesso aos bens necessários para a vida digna, ao meio ambiente equilibrado, ao patrimônio comum da humanidade. Constituem direitos de quarta geração o direito à democracia, à informação, à defesa da vida, à proteção da intimidade, o direito à diferença e o respeito ao pluralismo num mundo multicultural. (Texto adaptado de palestra proferida por Paulo Bonavides quando do aniversário de quinze anos da Constituição Federal do Brasil, promulgada em outubro de 1988). Os direitos fundamentais positivados na Constituição da Republica Federativa do Brasil, de acordo com Moraes (2006), podem ser categorizados em: [...] direitos individuais e coletivos - correspondem aos direitos diretamente ligados ao conceito de pessoa humana e de sua própria personalidade, como, por exemplo: vida, dignidade, honra, liberdade. Basicamente, a Constituição de 1988 os prevê no art. 5º [...];
  • 43. Estudos Socioculturais 43 [...] direitos sociais - caracterizam-se como verdadeiras liberdades positivas, de observância obrigatória em um Estado Social de Direito, tendo por finalidade a melhoria das condições de vida aos hipossuficientes, visando à concretização da igualdade social, que configura um dos fundamentos de nosso Estado Democrático, como preleciona o art. 1º, IV. [...]. A constituição consagra os direitos sociais a partir do art. 6º; [...] direitos de nacionalidade - nacionalidade é o vínculo jurídico político que liga um indivíduo a um certo e determinado Estado, fazendo deste indivíduo um componente do povo, da dimensão pessoal deste Estado, capacitando-o a exigir sua proteção e sujeitando-se ao cumprimento de deveres impostos; [Este tema aparece na constituição no art. 12). [...] direitos políticos - conjunto de regras que disciplina as formas de atuação da soberania popular. São direitos públicos subjetivos que investem o indivíduo no status activae civitatis, permitindo- lhe o exercício concreto da liberdade de participação nos negócios políticos do Estado, de maneira a conferir os atributos da cidadania. Tais normas constituem um desdobramento do princípio democrático inscrito no art. 1º, parágrafo único, da Constituição Federal, que afirma que todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente. A Constituição regulamenta os direitos políticos no art. 14; [...] direitos relacionados à existência, organização e participação em partidos políticos - a Constituição Federal regulamentou os partidos políticos como instrumentos necessários e importantes para preservação do Estado Democrático de Direito, assegurando-lhes autonomia e plena liberdade de atuação, para concretizar o sistema representativo. (MORAES, 2006, p. 43-44). Apesar de inúmeras dificuldades produzidas historicamente, o Brasil tem buscado, em meio às desigualdades econômicas e sociais, promover ações destinadas à emancipação dos indivíduos na busca e efetivação dos direitos fundamentais. A discussão dos direitos humanos e as ações políticas e práticas empreendidas por meio de programas governamentais e iniciativas da sociedade civil tem criado condições objetivas para a promoção da cidadania e o respeito aos direitos humanos. No entanto, ainda existem brasileiros sem acesso aos meios que os assegurem usufruir dos direitos fundamentais.
  • 44. 44 Capítulo 2 Seção 3 Ética e o agir valorativo Leandro Kingeski Pacheco 3.1 Ética A Ética pode contribuir para o seu agir valorativo? Esta questão é fundamental para o homem contemporâneo, pois, sob essa condição, não pode agir de qualquer modo. Ao estudar o sentido da Ética você já poderá projetar o seu agir valorativo. Bittar defende, por exemplo, que a Ética implica refletir e deliberar sobre os problemas ou desafios que enfrentamos na nossa existência; implica rever nossa ação em relação ao outro, à realidade e à nossa prática. Segundo Bittar (2004, p. 4-5) [...] a ética deve ser uma atitude reflexiva da vida, algo impregnado à dimensão da razão de deliberativa, em constante confronto com as inquirições, dificuldades, os desafios e problemas inerentes à existência em si. É-se frequentemente interrogado pela existência acerca dos modos de agir. Perceber isto é perceber que se está permanentemente revisando os modos como se intervém sobre a realidade, em geral, e sobre a realidade do outro, mais especificamente. Desta forma é que não existe ética fora da prática, e nem maturidade ética fora de uma atitude atenciosa de pensar e repensar das ocorrências intersubjetivas. Singer (2006, p. 9-23) explica que a Ética não é uma série de proibições ligadas ao sexo; nem um sistema ideal e nobre do ponto de vista teórico e inaplicável na prática; e, nem se restringe à religião. Por outro lado, a ética é uma concepção que concede à razão importante papel, pois o ser humano é capaz de justificar racionalmente o modo como vive, ao considerar as alternativas possíveis, ao procurar pautar-se pelo critério da universalidade (ao procurar atender a um público maior, tanto quanto possível), e por privilegiar as consequências da ação moral em detrimento de uma simples regra (às vezes inaplicável, ineficaz ou descabida). Para Singer (2006, p. 18) A ideia de viver de acordo com padrões éticos está ligada à ideia de defender o modo como se vive, de dar-lhe uma razão de ser, de justificá-lo. Desse modo, as pessoas podem fazer todos os tipos de coisas que consideramos erradas, mas, ainda assim, estar vivendo de acordo com padrões éticos, desde que tenham
  • 45. Estudos Socioculturais 45 condições de defender e justificar aquilo que fazem. Podemos achar a justificativa inadequada e sustentar que as ações estão erradas, mas a tentativa de justificação, seja ela bem sucedida ou não, é suficiente para trazer a conduta da pessoa para a esfera do ético, em oposição ao não-ético. Quando, por outro lado, as pessoas não conseguem apresentar nenhuma justificativa para o que fazem, podemos rejeitar a sua alegação de estarem vivendo de acordo com padrões éticos, mesmo se aquilo que fazem estiver de acordo com princípios morais convencionais. Sá (2007, p. 15), ao falar da Ética em sentido amplo, entende-se como ciência que versa sobre a ação humana perante os seus semelhantes, por meio de um juízo de (des)aprovação, em função de um valor e em vistas da felicidade individual e coletiva. Borges, Dall’Agnol e Dutra (2002) explicam que a Ética investiga o como, o porquê e os critérios que permitem julgar uma ação como moralmente errada ou correta. Nesse investigar, a ação correta pode ser associada à máxima felicidade de todos; à prática de um agente virtuoso; ao respeito a regras estabelecidas; e, à justificativa razoável para os outros. Para Borges, Dall’Agnol e Dutra (2002, p. 7) [...] a ética é a disciplina que procura responder às seguintes questões: como e por que julgamos que uma ação é moralmente errada ou correta? E que critérios devem orientar esse julgamento? Hoje várias respostas atendem a essas perguntas: é possível afirmar que a ação correta é aquela que (i) maximiza a felicidade de todos, (ii) é praticada por um agente virtuoso, (iii) está de acordo com regras determinadas, ou, ainda, (iv) pode ser justificada aos outros de forma razoável. O procedimento de determinação da ação correta varia conforme a escola filosófica, bem como de acordo com a razão pela qual se adota esse procedimento. Sánchez Vázquez (1990, p.7-12) explica que os seres humanos adotam certos comportamentos para certas situações vividas, e esses são qualificados de morais ou de éticos: Morais, ao referir o agir em uma situação concreta, prática (como ser bom em relação ao mendigo que lhe pede uma esmola para cuidar de seu carro); e éticos, ao referir uma teoria sobre o agir, caracterizada pela generalidade (como investigar o sentido de bom, válido para todo agir). Enfim, em relação ao agir humano, a prática e a teoria são distintas, mas não estão isoladas e, sim, influenciam-se. Ainda, a Ética, enquanto teoria historicamente situada, enquanto ciência, não cria a moral, e, sim, investiga-a. Sánchez Vázquez (1990, p. 12) define a ética como “[...] teoria ou ciência do comportamento moral dos homens em sociedade.”.
  • 46. 46 Capítulo 2 Nesta acepção, a Ética, investida de caráter científico, aspira ser racional, objetiva, sistemática etc.; e, tem um objeto de estudo próprio: o mundo moral, o comportamento humano moral. Esse, por sua vez e por sua condição, está sujeito à mutabilidade, à transformação, à autocriação. Sánchez Vázquez (1990, p. 14) defende que o sentido originário de ética e de moral é insuficiente para apanhar a distinção atual e referida, respectivamente, entre ciência e objeto: [...] originariamente, ethos e mos, caráter e costume, assentam- se num modo de comportamento que não corresponde a uma disposição natural, mas que é adquirido ou conquistado por hábito [...] Vemos, pois, que o significado etimológico de moral e de ética não nos fornecem o significado atual dos dois termos [...]. Ao analisar as definições abordadas, você deve ter percebido que, basicamente, a Ética é a teoria que estuda a moral; e a moral refere-se às práticas humanas, aos comportamentos, que são classificados em função de critérios como certos (bons) ou errados (maus) pela própria consciência humana. A avaliação dos comportamentos também depende de valores que aceitamos, estabelecemos ou rejeitamos, em vistas de nossa felicidade e dos demais envolvidos. Ainda, refletir criticamente sobre o nosso agir, implica pensar e decidir se esse deve ser revisto, reiterado ou aprimorado à luz de certos valores. Ao analisarmos algumas culturas, podemos encontrar alguns valores comuns, dignos de serem imitados, tais como ‘não roubar’, ‘não mentir’, ‘ser honesto’ etc. Contudo, tais valores são mutáveis, relativos a uma cultura e a uma época. Hoje, em nossa sociedade, tratar a mulher como sendo igual ao homem é considerado certo; enquanto que, em algumas sociedades africanas e asiáticas, esse nível de igualdade é errado. Hoje a escravidão é considerada errada, inaceitável. Mas, na Antiguidade, e mesmo há pouco tempo, no Brasil, a escravidão era aceitável. O exemplo seguinte permite ampliar o entendimento sobe o agir valorativo, sob o enfoque ético ou moral: Suponha que você está em casa, assistindo à televisão e, de repente, surge no noticiário: ‘Mãe desempregada é presa em supermercado por roubar dois pães e uma margarina. A mãe alegou, na confissão, que roubou para alimentar o filho de dois anos que passa fome.’. Você é Conforme Valls (2006, p. 10) “Os costumes mudam e o que ontem era considerado errado hoje pode ser aceito [...].”