[1] A reunião-almoço da Federasul discutiu a crise econômica global e seus impactos nos negócios. [2] Empresários, banqueiros e advogados expressaram preocupação com a desvalorização do real, aumento dos juros e queda na bolsa. [3] O economista da Federasul prevê que os efeitos da crise serão maiores do que o esperado.
Empresários debatem os impactos da crise global nos negócios
1. TURBULÊNCIA GLOBAL
A crise Tradicional ponto de encontro
para empresários e executivos
discutirem temas de interesse
na mesa cinco comum, reunião-almoço da
Federasul teve como prato
principal a economia mundial
FEDERASUL, DIVULGAÇÃO
CARDÁPIO INDIGESTO
expectativas quanto ao
SEBASTIÃO RIBEIRO tiga CRT que reivindicam perdas na emis- escassez de cré- futuro dos negócios
são dos papéis nas décadas de 1980 e 1990. dito, que resultou ANDRÉ AZEVEDO, dominaram as conversas
Q
uarta-feira. Reunião almoço Quem ganha esse tipo de contenda recebe em juros mais de participantes do evento
Tá na Mesa, da Federação das um valor indexado pelas ações da Brasil Te- altos. Funcioná- ECONOMISTA
Associações Comerciais e de lecom, empresa que ficou com o que era a rios temem que a
Serviços do Estado (Federa- CRT após a privatização. O problema é que redução da ven- “Não tenho feito outra
sul), um dos mais tradicionais os papéis da BrT caíram 45% desde o pico da de produtos
pontos de encontro dos ho- da Bovespa, em maio, até o dia do almoço. financeiros nas
coisa senão falar se limita a essa roda
mens e mulheres de negócios gaúchos. Na – Às vezes, tem um carinha lá no Interior, agências afete as sobre isso (a situação de conversa. Crise, cri-
mesa cinco, um grupo de empresários do que não tem nada a ver com essa crise e en-
ramo da construção, funcionários do Ban- trou com ação esperando ganhar R$ 15 mil
contas do banco.
Mesmo para
econômica)” se, crise. Assim come-
ça o dia de Zelio Hocs-
co do Brasil (BB) e um advogado dividem ou R$ 20 mil. Hoje vai ganhar bem menos quem está longe man, corretor da Bolsa
o espaço. Habitué do evento, ainda durante – cita como exemplo Damim, entre uma da boca do caixa, a crise se faz presente. No Brasileira de Mercadorias (BBM) que atua
o couvert, pão com pasta temperada, a ge- garfada e outra no quiche de alho-poró ser- setor de Rosângela, que gerencia obras, o com contratos de arroz. Antes de debater o
rente do centro de serviços de logística do vido de entrada. problema maior é o câmbio. Com a dispa- tema no Tá Na Mesa, ele já havia participa-
BB, Rosângela Schuch, quebra o gelo com o O que é ruim para o cliente também é rada do dólar, empreiteiras ou empresas for- do de uma reunião da BBM e de outra da
desconhecido engravatado que senta a sua ruim para o advogado, cujos honorários necedoras de materiais de construção para o diretoria da Federasul, ambas sobre o mes-
frente. correspondem a 20% do valor da causa. banco têm os custos aumentados. O proble- mo assunto.
– E tu, com o que trabalhas? Não bastasse isso, Damim teve prejuízos ma é que não podem repassar o aumento ao – Por onde eu ando se fala de crise. Até o
– Sou advogado – diz Cícero Damim. diretos. Profissional liberal, passou a aplicar BB, porque assumiram o compromisso em Grêmio, que é líder do campeonato, querem
– Ah, então deve ganhar muito dinheiro na bolsa há um ano e meio. Investiu todas licitações. inventar que está em crise – brinca o gre-
– brinca Rosângela. as suas economias em ações. E viu o valor – Fica mais difícil para eles honrarem os mista.– Falando sério, o sentimento geral é
– Com esta crise, nem tanto – retruca. dos papéis despencar 60% de abril deste contratos em reais, porque recebem os pro- de que virá uma onda maior do que a ma-
É a senha para o início da mesma conver- ano até a metade de outubro. dutos importados com preço maior – expli- rola que estamos sentindo hoje – afirma.
sa que domina outras rodas empresariais. A – Cheguei a tirar as aplicações logo que ca Rosângela, abanando-se com o cardápio É o que prevê o economista da Federasul,
descontração do bate-papo é o invólucro a bolsa despencou, mas achei que já tinha para enfrentar o calor do salão lotado, onde André Azevedo. Nos últimos tempos, o as-
para a preocupação geral com a turbulência caído bastante e recoloquei. Reduzi as per- o ar-condicionado estragou. sunto crise tomou conta da sua rotina. Nas
financeira internacio- das, mas acho que Diretor de engenharia da Buildway, uma escadas da entidade empresarial ou nos
nal. Na mesa cinco, a vai levar dois ou três das empresas que executa obras para o BB, corredores da Unisinos, onde leciona, todo
mais de 8 mil quilô- SÉRGIO BORGES, anos para recuperar Sérgio Borges confirma a dificuldade, mas mundo quer saber: e agora?
metros de Wall Street, – projeta. conta que a dependência dos produtos im- – Não tenho feito outra coisa senão falar
a crise já é uma reali- EMPRESÁRIO Não é difícil ima- portados já foi maior: sobre isso. Todos me perguntam o que ocor-
dade para os comen- ginar como o as- – Se (a desvalorização do real) fosse há rerá com o lado real da economia, para onde
sais. Damim é sócio “Se a desvalorização sunto crise domina uns dois ou três anos, bah!, teria sido um vão os juros, que setores sofrerão mais...
de um escritório de do real fosse há dois o ambiente bancá- inferno. O carpete era 100% importado. O Nas 31 mesas do almoço da Federasul ou
advocacia. Das quase
2 mil causas da ban-
ou três anos, teria rio vivenciado por
Rosângela. Um dos
forro também. Usávamos 32% de materiais em qualquer conversa empresarial, é difícil
importados. Hoje, são de 10% a 15%. Há escapar da crise. Ela está no corredor, no ele-
ca, cerca de 150 são sido um inferno” primeiros efeitos mais fornecedores aqui no Brasil. vador, no cafezinho. Tá na mesa cinco e em
de acionistas da an- da turbulência foi a A situação financeira global, porém, não toda parte.
ZERO HORA > DOMINGO | 2 | NOVEMBRO | 2008 DINHEIRO 9